Capítulo 3. Velhas amizades, novos reencontros
A conversa com a Márcia havia rendido a Emily boas recordações, mas a notícia de que o amigo havia viajado a surpreendeu bastante. Emily acreditava que tudo estaria exatamente como ela deixara ao partir, seus amigos, sua família, sua vida. Mas o tempo muda as pessoas, muda os lugares, muda você.
Ao sair do apartamento a jovem retirou o celular do bolso e enviou uma mensagem a pessoa que faltava, marcando um encontro às 18:00 horas no Kaltes Bier Pub, um bar noturno que Emily sempre quis frequentar. A garota havia calculado o tempo exato que levaria para por a conversa em dia, se divertir e ainda ter tempo para o jantar com Anne.
Emily aproveitou o tempo que havia antes do encontro para rever Katrien, que já esperava ansiosamente pela chegada da filha. Emily havia herdado muitos traços da mãe, cujos cabelos também eram ruivos, porém cacheados. Os olhos de mãe e filha eram de uma tonalidade azul muito semelhante. Katrien era dona de um escritório de administração que possuía sedes em três outros estados, o que lhe permitia dar uma boa condição de vida para os dois filhos, uma vez que Elliot, o pai deles, havia ido embora com outra mulher há dois anos. Katrien acolheu a filha em um abraço caloroso. O retorno de Emily trazia novamente o sentimento de família reunida.
-- Filha! Como é bom ter você em casa de novo. -- Katrien beijava o rosto de Emily incontáveis vezes enquanto apertava o abraço. -- Você parece tão crescida desde a ultima vez que te vi. -- A emoção de rever a filha fez com que Katrien derramasse algumas lágrimas.
-- Mãe -- Emily chamou a atenção da mãe alterando o tom de voz -- Você me visitou no final de semana retrasado.
-- Não desse jeito, não na nossa casa. -- Katrien apertou a bochecha da filha, que logo enxugou as lágrimas da mãe. -- Querida, você está de volta, veio para ficar. Eu não poderia ter felicidade maior.
-- Acredite mãe, eu também estou muito feliz por finalmente voltar. Eu me sinto outra pessoa. Sinto que agora estou forte para enfrentar meus problemas. -- Emily se acomodou no sofá junto com a mãe.
-- Você sabe que como mãe, eu normalmente enxergo mais do que você fala, não sabe? -- Emily olhou a mãe, intrigada.
-- O que quer dizer com isso?
-- Anne. -- Katrien sorriu ao notar a confirmação da filha com o olhar.
-- Às vezes eu acho que você é uma mãe estilo Jean Grey, sério.
-- Acho que sou apenas mãe. -- Katrien tocou a mão da filha. -- Como foi reencontrá-la? O que você sentiu?
Embora Katrien não passasse muito tempo em casa com os filhos, ela mantinha uma intimidade forte com eles, tendo sempre uma conversa aberta a opiniões e novas idéias.
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~ Sete anos atrás ~
-- Eu e Anne nos beijamos essa noite. -- Emily estava com o rosto afundado no travesseiro ao confessar o que havia acontecido para a mãe.
Katrien ficou estagnada por alguns segundos, ela estava de boca entre aberta, surpresa. Emily nunca havia beijado uma menina antes, segundo os conhecimentos da mãe. E ter beijado a melhor amiga deixou Katrien preocupada.
-- Ual. Essa é nova. -- Katrien se aproximou da filha e sentou na borda da cama. Ela não sabia o que falar.
Emily se sentou na cama e olhou seriamente para a mãe.
-- Não é que eu seja lésbica ou coisa do tipo, não é isso. -- Emily falava rápido e atropelava algumas palavras. -- Foi uma brincadeira.
Katrien se manteve calada enquanto pensava no que dizer.
-- Nós estávamos em uma roda de verdade ou consequência. – A jovem percebeu o silêncio e a expressão analista da mãe e se calou.
O silêncio que se estabeleceu no quarto foi constrangedor para Emily. Ela não sabia como a mãe reagiria, Emily apenas decidiu contá-la o ocorrido, como sempre fazia. Mas depois de repensar a situação o arrependimento se instalou em seus pensamentos.
-- Mãe? – Emily buscou pelo olhar da mãe que estava perdido em um canto aleatório do quarto.
-- Desculpe Emily, essa me pegou de surpresa. Eu não sei o que te dizer.
“--Me chamou de Emily, talvez eu tenha falado mais do que deveria.” -- Emily pensou imediatamente após ouvir a mãe.
-- O que aconteceu não quer dizer que eu gosto de mulheres e que vou namorá-las e me casar com uma provavelmente. Eu acho. -- Emily tentava se explicar, mas acabava se enrolando com a própria sinceridade, ela tinha gostado do beijo e ponto.
-- Mas e quanto ao Kevin? Você não gostava dele? -- Katrien procurou as palavras que achava corretas.
-- Eu gosto dele.
-- Então você beijou sua melhor amiga mesmo gostando do Kevin? Eu não entendo vocês adolescentes. Na minha época.. -- Emily interrompeu.
-- Não foi uma escolha própria. – A jovem afirmou. -- Foi a minha consequência.
-- Se era uma brincadeira você poderia ter optado por não fazer. Certo?
As palavras de Katrien deixaram Emily confusa. Ela realmente podia ter optado por não fazer. Mas por que fez? Por que nem sequer questionou ou pensou na hipótese de não aceitar?
Emily encontrava-se em meio a um turbilhão de pensamentos e começava a cogitar a hipótese de ter estado apaixonada pela melhor amiga desde sempre.
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~ Nos dias atuais ~
-- Como se finalmente voltássemos a ser amigas, e somente amigas. -- Emily quis acreditar no que havia dito.
Katrien e Emily passaram a tarde conversando sobre os acontecimentos das duas semanas em que não se viam. Conversaram sobre os namoricos que Emily teve durante os anos fora, e também sobre a viagem do irmão mais velho, Robbert. Emily ficaria na casa da mãe até achar um apartamento para comprar.
No fim da tarde Emily pegou o carro da mãe e dirigiu-se para o Kaltes Bier Pub. Para a surpresa da jovem, a pessoa com quem ela se encontraria já estava no local, sentada próxima ao balcão, segurando um pequeno embrulho de presente. Emily se aproximou sem que fosse notada.
-- Sentiu a minha falta? – Emily pressionou os lábios e sorriu.
A jovem virou imediatamente e saltou para abraça-la, havia reconhecido a voz da amiga.
-- Finalmente! A hora não passou depois que sua mensagem chegou. Eu quase morri de tanta saudade.
-- Alice, linda como sempre. – Emily lançou um elogio para satisfazer a amiga. – Eu senti tanta a sua falta! -- O abraço foi longo.
-- Vem, senta aqui comigo. Ainda não liberaram uma mesa. -- Alice encaminhou a amiga até o balcão. -- Como foi de viagem?
-- Você sabe o quanto eu odeio viajar sozinha. Não tinha ninguém para conversar, e eu não tive tempo de comprar um livro para ler. -- Emily pareceu desanimada ao falar da viagem, fazendo com que Alice notasse que deveria mudar o assunto da conversa.
-- Eu trouxe algo para você. -- A jovem empurrou o pequeno embrulho que havia trazido pelo balcão até tocar as mãos de Emily. -- Espero que goste, eu não tive muito tempo para escolher, mas achei esse bem a nossa cara.
-- A nossa cara? -- Ao abrir o pequeno embrulho ela avistou um colar de prata delicado com o pingente da mulher maravilha. Emily caiu na gargalhada. -- Qual o narcisismo da vez?
-- Não tem narcisismo. Nós somos maravilhosas. -- Alice retirou o colar que estava coberto pela blusa que usava, mostrando a Emily que tinha um igual ao que tinha dado a amiga.
-- Você é incrível. Sério.
Emily deu outro abraço na amiga e quando fora beijar o rosto da mesma, foi interrompida por um dos garçons do bar.
-- Senhoritas desculpem se atrapalho, mas uma das mesas foi liberada. Acompanhem-me, por favor.
Alice e Emily pegaram seus pertences e foram até a mesa designada a elas e foi naquela mesa onde a jovem Emily pôde contar todas as novidades que não havia contado por telefone semanas antes. Alice perguntou sobre a festa de formatura, sobre os amigos que Emily teve que deixar para trás e principalmente sobre a namorada de Emily, uma menina da mesma universidade por quem Emily era “apaixonada”.
-- Eu ouvi direito ou o quê? -- Alice estava incrédula. -- Você terminou com a menina antes mesmo de contar a ela que voltaria para cá? Você terminou pois achava estar prendendo-a a um mundo que não era o dela?
-- Sim, Alice. A garota adorava sair, e eu gostava de ficar em casa. Todas as vezes que ela me chamava eu não estava com vontade de ir. E ela acabava ficando lá comigo. Não era certo prendê-la dentro de casa comigo.
-- Emily, querida, você tem um parafuso a menos, só pode. Pelo que eu entendi você nunca disse a ela “Fica em casa comigo”, certo?
-- Certo...-- Emily esperou que a amiga continuasse.
-- Então você não fazia nada, não a prendia e não a proibia de ir a lugar nenhum. Era ela quem optava ficar ao teu lado. -- Alice negou com a cabeça. -- E depois você é a inteligente de nós duas...
Emily não entendeu a negação da amiga, ela achava certo ter libertado a menina de um relacionamento tão chato e monótono.
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~ Sete anos atrás ~
-- Kevin! Kevin! -- Emily gritava enquanto corria atrás do rapaz pela festa quando foi surpreendida por um toque brusco no braço. Alguém a puxou e sem que a garota tivesse um tempo de reação, Emily sentiu os lábios gelados de alguém tocando a sua boca. A primeira atitude da menina foi de empurrar a pessoa, mas seus braços estavam cercados. Um gosto forte de vodka invadiu a boca, fazendo com que Emily se debatesse ainda mais, com o intuito de se afastar. E ela conseguiu.
-- Alice, o que você pensa que está fazendo?! -- Emily estava furiosa e gritava com a menina.
Fim do capítulo
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