Estava exausta. Não sabia que rumo tomar. Há dias procurava por Sarah e sem nenhum sucesso. Até que através de um contato de uma colega de trabalho de Sarah, no observatório, que conhecera na festa de aniversário da amiga, lhe deu o paradeiro da ruiva.

A amiga estava na casa de praia do observatório, num pedacinho deserto, próprio para estudos, sua tarefa naquele pequeno paraíso era fotografar um eclipse da lua e outros corpos celestes. Clara acabou descobrindo não só o paradeiro da “amiga”, mas, que a mesma tinha planos de mudar-se para Fortaleza e trabalhar no observatório de lá.

Sarah se sentia muito sozinha e sentia muita falta de Clara. As duas vezes que fizeram amor trouxeram para a ruiva a certeza do quanto queria a amiga como namorada. Nunca havia se sentido tão completa. Não conseguiu entender tamanha confusão por parte de Clara, afinal quem estava se descobrindo era ela. Sentia falta de tudo... Da amizade, do sorriso, do jeito de moleca dela. Sentia uma dor que parecia não ter fim e às vezes a sensação de que lhe faltava o ar.

Já era noite, o céu estava maravilhosamente estrelado. Menos mal, no seu estado emocional atual um dia nublado seria capaz de deixá-la em depressão. Presenciaria um eclipse lunar, uma das coisas que mais adorava em seu trabalho de campo. As fotos iriam diretamente para o site do observatório. Candidatou-se para a tarefa para aliviar a tensão e se afastar do “mundo real”.
Preparou seu equipamento, e enquanto o fenômeno não começava, sentou-se na areia da praia, e lembrou-se do filme que assistira com Clara, da falta que ela estava a lhe fazer “Que droga, talvez não tenha sido boa idéia arriscar a amizade por uma noite de amor”.

Seu corpo estremeceu ao lembrar-se das cenas de amor compartilhada com a morena. Seus olhos ficaram úmidos. Mais uma vez choraria por ela? Quantas vezes chorara por ela?

“Por quê?”

Enxugou as lágrimas, estava naquele paraíso há oito dias e só conseguia pensar na dor que sentia, no desejo guardado, no amor frustrado que nem teve a chance de ser vivenciado.

Clara se afastou do serviço e tentou a todo custo chegar antes das 20 horas no local onde Sarah estava. Sabia que o acesso não era tão fácil porque precisaria passar por uma portaria, se identificar, corria o risco de nem ter a entrada permitida. Chegar até a ruiva daria um pouquinho de trabalho. Mas, estava decidida. Era agora ou nunca. O técnico que estava na portaria reconheceu Clara de imediato, tanto da festa de Sarah quanto da Conferência. Primeira etapa vencida. Agora, era achar aquela mulher e declarar seu amor.

Sarah ainda ajeitava seu equipamento. Comia distraidamente um pedaço de chocolate. Este virara seu melhor amigo no momento doloroso que enfrentava. Olhou a frente, para o mar... Lá surgia alguém que ainda não consegui identificar. Não havia sido avisada de que teria mais alguém do Observatório. Conforme a pessoa foi se aproximando a ruiva percebeu se tratar de uma mulher e algo no andar desta fizera seu coração disparar. “Meu Deus, eu já estou até delirando”.

À medida que mulher se aproximava mais surreal parecia a cena para Sarah.  Era de fato Clara quem estava ali.

Sarah ficou em pé, engoliu a seco, ficaram frente a frente e antes que a mesma pudesse pronunciar algo Clara a puxou para si e a abraçou. Os corações de ambas batiam aceleradamente numa sintonia perfeita. Um abraço demorado e silencioso. Seus corpos e seus sentidos sabiam como dizer que estavam sentindo muita saudade.

Desvencilharam-se e se olharam por um tempo maior do que o de costume. Clara estava emocionada. Estava realmente amando aquela mulher e pela primeira vez aquela certeza não a assustava.

- Posso assistir com você? – A ruiva deu um sorriso de lado e Clara se sentiu feliz.
- Claro!

Assistiram ao eclipse lunar, e como da outra vez Sarah deu algumas explicações sobre o espetáculo. Ficaram quase três horas observando o eclipse. O clima era quase feliz. Falavam sobre coisas amenas. Clara via Sarah fotografar e filmar o fenômeno da natureza. Quando sentiu que a outra terminava seu trabalho arriscou um início de conversa. Precisava falar.

- Senti falta deste momento que compartilhamos tantas vezes.
- Também senti Clara. Muita falta da sua amizade e da sua compreensão.
- Eu não fui muito compreensiva contigo não é mesmo? – Sua voz saiu mais insegura do que gostaria.
- Talvez eu tenha atropelado as coisas, quando permiti... – Sarah tentou ponderar, sendo silenciada por Clara.
- Acho que se eu não disser agora o que vim para falar, pode ser que eu desista – Sarah ficou receosa, achou que aquela conversa poderia significar um adeus. Mas não disse nada, permitiu que Clara continuasse – Você é uma grande amiga. Ter te conhecido foi uma das melhores coisas que me aconteceu. Quantas vezes você tentou por um pouco de juízo em minha cabeça. – Ambas sorriram. - Eu tinha uma vida legal, trans*va mesmo sem paixão. Você sempre me aconselhou a me fixar com alguém, e tinha o Ricardo, não é mesmo? – Sarah confirmou – Pois bem, de repente passei a te observar de forma diferente, passei a te desejar – o coração de Sarah disparou – E estranhei isso. Pois nunca havia me passado pela cabeça ficar contigo, embora seja uma mulher bonita, inteligente enfim eu poderia passar a noite inteira lhe atribuindo qualidades... E outra você é minha amiga. – Clara tomou fôlego e continuou. – Estranhei aquele convite para ir ao cinema, fui, adorei sua reação por ser tão aberta. Mas entrei em crise quando voltei para casa, pois eu nunca teria você, você é hetero. Sarah, eu nunca tinha me apaixonado antes não sabia e ainda não sei lidar com o que estou sentindo – A esta altura os olhos de Sarah já lacrimejavam – Bebi um pouco para relaxar e você apareceu do nada, parecia uma miragem, confessei a ti que estava apaixonada, e aí você me beijou e eu adorei. Mas tentei te segurar porque eu não sabia que era correspondida, diante da sua insistência... Eu não resisti a você, foi quando finalmente eu fiz amor com alguém. Você repousou sobre meu corpo, e eu adorei aquilo, disse que o meu desejo a partir daquele momento teria dona, e parece que foi uma profecia. Porém no dia seguinte eu fiquei muito chateada contigo, senti que havia me usado para satisfazer um desejo ou uma curiosidade tola, eu perdi o chão. Tive medo de usar você ou de participar de qualquer joguinho que passasse pela sua cabeça. Mas transei com outra procurando você, fui à conferência, disposta a aceitar qualquer jogo, qualquer coisa só para te sentir novamente, sua reação me chocou porque pensei que era isso que você quisesse. Quando voltei vi a placa no seu apartamento e pirei. Aconselhei-me com uma amiga, que me pediu para te procurar e dizer o que estava sentindo, antes de te perder de vez. É isso, eu vim aqui para dizer que me apaixonei por você, embora saiba que seja hetero, precisava te falar o que estava sentindo.
- Por que não me disse naquele dia da Conferência?
- Porque tive medo, de que ao perceber minha seriedade você fugisse de mim. Mas vejo que não adiantou, você fugiu do mesmo jeito. – Sorriu com certa decepção.
- Você não faz idéia do inferno que mergulhei por você. Estou apaixonada por você há muito tempo. - O rosto de Clara mudara de expressão - Quando me convidou para assistir o filme na sua casa eu já estava apaixonada. Eu havia terminado com meu namorado assim que me descobri apaixonada por você. Por isso nunca o conheceu. Aquele dia no congresso quando falou em prazer, foi de uma forma tão sem compromisso que me senti mal. Me senti mais uma daquelas inúmeras mulheres com quem você saía e no dia seguinte nem recordava o nome. Aí passei a te evitar. Aquele outro dia, quando chegou com aquela mulher e me olhou daquela forma... Você foi tão insensível que quase me matou.
- Eu fui ao seu apartamento um pouco depois para pedir desculpas. – Clara percebia sua falta de tato com a situação. O quanto magoara a amiga durante o seu processo de autoaceitação.
- Eu havia saído. Não aguentaria ficar ouvindo vocês trans*rem, novamente. – Neste momento Sarah enxugou uma teimosa lágrima que lhe fugia do controle com insistência.

Elas ficaram em silêncio

- Temos alguma chance? – Clara perguntou insegura percebendo o quanto a amiga esta fora de seu alcance.
- Acho que seria melhor tentarmos ser amigas, Clara! – Disse em meio a um suspiro. Estava esgotada emocionalmente. Clara ficou momentaneamente sem fala.
- Você vai mesmo se mudar? – A vontade de chorar estava ficando insuportável de controlar.
- Estou avaliando a possibilidade de ir para o observatório de Fortaleza. – Ainda não havia entregado o pedido para a diretoria. Não sabia ao certo o que a impedia mas sempre acabava protelando a entrega do pedido.
- É muito longe. Não poderei ir todas as manhãs tomar café na sua casa.

Ambas sorriram. E o silêncio se fez presente entre elas momentaneamente.

- Como me achou aqui? –  o coração da ruiva  estava feliz por tê-la por perto e por saber-se correspondido.
- Deixei todo mundo louco. – Disse sorrindo – Fiquei desesperada com medo de te perder... – Se olharam. – Enfim, se precisar de mim estarei sempre aqui para você.

Ficaram em pé, Sarah já não continha as lágrimas. Se abraçaram demoradamente e Clara sussurrou no ouvido da ruiva enquanto a prendia num abraço.
- Amo você como amiga, como amante, como namorada enfim como mulher. Você é o amor da minha vida. Desculpe-me por ter sido tão idiota. Eu não percebi que pudesse ser correspondida e nem me entendi direito. - Sarah fechou os olhos, tremia de emoção. – Eu te amo, Sarah! Se possível, eu gostaria muito de tê-la ao meu lado. Desejo você em minha vida por tempo indeterminado.

Sarah se desvencilhou do abraço. Segurou o rosto da morena entre as mãos.

- Eu amo você, Clara! Há muito tempo... – Disse num sussurro.
- É quase inacreditável!!! – Disse deixando as lágrimas caírem.

Beijaram-se, deram inicio ao ritual do amor. Um prazer mais intenso desta vez, pois ambas sabiam que eram correspondidas. Chegaram ao orgasmo juntas, e fizeram juras de amor vivo e apaixonado.

Fim do capítulo