“A rebeldia, aos olhos de qualquer pessoa que tenha estudado um pouco de História, é a virtude original do ser humano. ” (Oscar Wilde)

            Valentina remexeu seu corpo sobre o meu retirando-me dos meus sonhos. Apertei meus olhos várias vezes até despertar melhor. Olhei para ela que ainda dormia. Não tinha a menor ideia de quanto tempo estávamos dormindo ali, mas já devia ter um bom tempo uma vez que senti meu estomago reclamar pela fome. Estava em duvida se devia ou não acorda-la. Optei pelo não e devagar puxei seu corpinho mais para cima. Encaixei sua cabeça em meu ombro envolvendo-a em meus braços e aos poucos fui levantando meu corpo da rede. Os bracinhos dela caíram ao lado de seu corpo. Já em pé, caminhei com ela até a entrada da casa e quando cheguei na cozinha estavam quase todos lá.

            - Oi – cumprimentei-os. Maressa me olhou e deu um sorriso doce, como se achasse àquela cena a coisa mais linda do mundo    .

            - Não acredito que ela ainda ta dormindo! – Patricia falou baixo e aproximou-se de nós tocando o rostinho dela.

            - A culpa é da piscina. – sussurrei - Agua da muito sono mesmo. – olhei em seus olhos encontrando duas safiras azuis lindas e brilhantes.

            - Desse jeito ela não vai dormir nada a noite. – sussurrou de volta e os demais presentes acompanhavam a conversa sem nada dizer. Naquele instante, nós parecíamos um casal partilhando um momento de família. Pelo menos era assim que eu me sentia.

            - Acho melhor coloca-la na cama – eu disse.

            - Eu te ajudo – disse indo na frente e eu a segui. Subi as escadas devagar e ela abriu a porta do quarto. Passei por ela e com cuidado a coloquei no meio da cama. Ela virou de lado e continuou a dormir.

            - Quanto mais tempo eu passo com ela mais ela me encanta! - confessei olhando-a.

            - Confesso que nunca vi a Valentina se apegar tão rápido a alguém como aconteceu com você! – disse me fazendo olhar em sua direção. – Vocês têm uma sintonia incrível. Você precisava ter visto como foi trabalhoso deixa-la na escolinha no primeiro dia. – levantei-me e caminhei até ela encostando meu corpo do outro lado do batente da porta onde ela estava. Minhas mãos estavam debaixo do meu corpo e estávamos uma de frente para a outra.

            - Ela chorou muito? – perguntei tentando imaginar a cena em minha cabeça.

            - Deu um show. E o pior não foi nem isso, você acredita que ela mordeu um menino no primeiro dia?

            - Não! – gargalhei – Sério? – disse contendo o riso.

            - Foi. Parece que o menino tinha pego o Sansão, o coelho de pelúcia dela, e ela não gostou nadinha.

            - Que gêniozinho forte. – eu disse.

            - E olha que ela tinha apenas um aninho. Imagina quando tiver com 15 anos. Acho que terei muitas dores de cabeça.

            - Vai ter trabalho em dobro... tanto pelo gênio quanto pela beleza dela! Principalmente se puxar a mãe. – ela corou com o que eu disse - Já imaginou o monte de menininhos que vai aparecer na porta da sua casa? – sorri e ela fechou a cara fingindo-se de brava.

            - Nem quero pensar nisso. Vou aprender a atirar até lá! – disse e eu ri de seu comentário. Eu estava toda boba observando o sorriso que ela dava, sua face bela, seus traços que mais pareciam ter sido desenhados de tão perfeitos que eram.  De repente um silencio inquisidor se instaurou entre nós. Ficamos nos encarando, uma esperando que a outra dissesse algo. Depois de um tempo ela prosseguiu.

            - Não podemos deixar que o aconteceu hoje de manhã se repita outra vez Cecília – tinha um tom de voz magoado enquanto falava sem desviar seus olhos de mim – Eu não quero machucar sua irmã e sei que você também não quer.

            - Não... eu não quero! – respondi no mesmo tom que ela. Eu realmente não queria magoar Júlia mas estava cada vez mais difícil separar meus sentimentos da realidade.

            - Sei o quanto você gosta da Vavá e...

            - Eu amo essa baixinha – interrompi-a.

            - Se você quiser podemos tentar ser amigas... – olhava-me e eu permanecia calada sem saber o que falar. – isso é tudo que eu posso te oferecer, minha amizade! – baixou os olhos terminando de falar.

Meu Deus como eu a amava. Tudo que eu queria naquele momento era me aproximar dela e dizer-lhe que não, que eu não poderia ser amiga dela, que não era sua amizade que eu queria, que era o seu amor, o nosso amor! Mas eu estava ciente de que era a responsável por ter estragado tudo entre nós. Eu me cobrava isso todos os dias.

- É claro... como você quiser! – eu sabia que não fora apenas impressão minha, que o coração dela estava tão acelerado quanto o meu no nosso quase beijo, que seu corpo estava tão quente quanto o meu por tanto desejo. E talvez fosse apenas aquilo mesmo que rolasse entre nós. Desejo. Um desejo profundo e  latente, reaceso pelo reencontro. Era claro que existia muita tensão entre nós cada vez que estávamos próximas uma da outra, porém, no final de tudo ela sempre escolhia minha irmã e eu não podia condena-la por isso. Dei um sorriso tentando parecer natural, transparecer que aquela conversa não me afetava em nada, mas sabendo o quanto suas palavras despedaçavam minha alma.

- Vamos descer? – ela disse e  eu confirmei. Mal dei o primeiro passo e ela fez o mesmo fazendo nossos corpos pararem a centímetros um do outro. Baixei meu rosto para olha-la e seus olhos miraram minha boca. Aproveitei nossa proximidade e recostei minha boca testa dela num beijo demorado, inspirei o ar e o cheiro dela invadiu minhas narinas anestesiando meus sentidos. Sua respiração quente batia em meu pescoço causando um arrepio gostoso. Perto dela eu perdia toda a razão. Eu dizia uma coisa mas acabava fazendo outra. Afastei meu rosto ainda com os olhos fechados, abrindo-os devagar e fitando os olhos dela.

- Você primeiro – minha voz parecia que iria falhar, estiquei minha mão indicando o caminho das escadas a ela, num gesto cortês. Ela sorriu com meu gesto.

- Uma conquistadora nata! – brincou comigo.

- Educada é mais bonitinho! – ri ao ver sua expressão zombeteira. Descemos as escadas, ela na frente e eu atrás, com meus olhos atentos em cada detalhe de seu corpo, de seu caminhar, e assim que entramos na cozinha demos de cara com Júlia e Flávia. Elas estavam sentadas uma ao lado da outra, bem próximas conversando alegremente e seus olhos pousaram sobre nós imediatamente.

- Pelo visto achou elas! – Júlia disse com a voz tranquila e um sorriso relaxado no rosto aproximando-se dela e dando-lhe um beijo.

- Estavam dormindo na rede da varanda – Paty respondeu e minha irmã abraçou-a pelas costas apoiando a cabeça em seu ombro – Vavá continua a dormir. Acabamos de coloca-la na cama – disse de forma natural mas eu pude ver o cenho de minha irmã franzir-se sutilmente com o fato de estarmos juntas colocando Valentina para dormir

- A carne está quase pronta – Flávia disse desviando o foco do assunto. – Quer uma cerveja? – ofereceu-me uma latinha que estava em suas mãos.

- Sim. – aceitei e resolvi sair dali o mais rápido possível – Viu a Cintia por ai? – perguntei a ela.

- Na piscina – Júlia respondeu-me.

- Vou lá então... Vem comigo Flá? – chamei-a. Ela me acompanhou e seguimos até onde minha acompanhante estava. Tirei o short que eu usava e entrei na agua me aproximando dela.

- Oi – ela disse me olhando de uma forma sedutora.

- Oi – respondi.

- Senti sua falta na cama hoje de manhã – disse passando os braços em volta do meu pescoço.

- Mesmo? – perguntei e ela balançou a cabeça confirmando. – Hum.... Deixo você matar as saudades mais tarde! – completei e ela avançou sobre minha boca com sua língua aprofundando nosso beijo. Não o prolonguei muito pois não estávamos sozinhas ali e eu não era muito chegada a agarramentos explícitos na frente dos outros, principalmente se tinha crianças por perto, achava extremamente sem educação, não importava se era um casal de gays ou de héteros.

Flávia parou ao nosso lado e puxou conversa sobre um assunto qualquer. Passamos um tempo brincando na agua, disputando quem ganhava no nado e plantando bananeira sob a agua. Eu era péssima nisso. Meu corpo nunca parava reto. Cintia era boa, além de ficar retinha ainda conseguia ficar muito tempo debaixo d’água. Carla nos chamou algum tempo depois. Já tinha carne assada e muita cerveja na mesa, além de uma batida feita com licor de coco e abacaxi. Estávamos comendo quando ouvimos Valentina chamando por sua mãe.

Patricia seguiu para dentro da casa e logo em seguida voltou com a pequena nos braços. Ela ainda tinha o rostinho amassado de quem acabara de acordar. Paty sentou-a no colo de minha irmã enquanto preparava um pratinho com comida para ela.

- Quanto soninho meu amor– Júlia disse abraçando-a. – Quem é a princesa mais linda da minha vida? – perguntou e ela não disse nada, apenas abriu um sorriso convencido como se dissesse que era ela.

- Vocês formam uma família linda! – Isabela disse olhando para Júlia. A palavra família naquela frase machucou meu coração.

- Obrigada! – minha irmã respondeu e passou os olhos por mim num lance rápido.

- Pretendem se casar e ter mais filhos? – perguntou e mesmo contra minha vontade eu olhei para Júlia esperando sua resposta. E comecei a me incomodar o rumo daquela conversa.

- Ainda não falamos sobre isso. – Júlia evitou olhar-me e sua resposta me trouxe um certo alivio.

- Deveriam... Luís e eu queremos dar um irmãozinho ou irmãzinha pro Cadú em breve. Não queremos deixar ele crescer muito para que a diferença de idade entre eles não seja muito extensa. - Patrícia voltou até onde estávamos e sentou-se ao lado de minha irmã.

- E vocês? – apontou Cintia e eu  - Pretendem ter filhos também? – eu estava tomando um gole de coca-cola e me engasguei. Cintia acudiu-me dando tapinhas leves em minhas costas.

- Desculpa – pedi cobrindo a boca ao tossir. – O que disse mesmo? – olhei-a timidamente.

- Se vocês duas pretendem ter filhos também? – eu sentia como se os olhos de todos ali estivessem em cima de mim. Sabe aqueles pesadelos onde alguém te pergunta uma coisa numa plateia imensa e de repente fica tudo silencioso só para você responder? Era assim que eu me sentia.

- Não... na verdade não estamos juntas... quer dizer estamos juntas mais não tão juntas entende? – eu não sabia o que dizer exatamente e pude ouvir Flávia soltar uma risadinha pelo meu constrangimento.

- Entendo. Então não são namoradas ainda?

- É... – olhei Cintia - não somos! – Patricia dava comida para Valentina sem me olhar mais eu percebia sua atenção na conversa.

- Ainda! – Cintia completou olhando-me com um sorriso meigo e passando a mãos pelo meu rosto. Seu tom de voz soava ligeiramente provocativo. E eu sabia muito bem para quem fora dirigido. Sorri, um pouco sem graça, e vi Paty olhando de relance, furiosa, para Cintia. “Era só o que me faltava – pensei.

- Own que lindas! – Carla e Maressa disseram juntas.

Depois de muita carne, muita cerveja e conversas mais agradáveis, todo mundo resolveu descer até a praia. Estávamos todos sentados na areia e as crianças brincavam mais próximas do mar. De repente Cadú e Valentina começaram a gritar nos pregando um susto. Valentina veio correndo e jogou-se no colo de Patricia. Cadú veio logo atrás dela.

- O que foi meu amor? – ela perguntou.

- Mamãe... tem bicho lá. Não quelo mais blincar.

- Bicho? Me mostra onde? – olhou para ela e levantou-se. Valentina segurou em sua mão e seguiram até lá. A pequena andava atrás dela como se Patrícia fosse sua proteção. Pararam e Paty ajoelhou-se na areia. Falou alguma coisa com ela e pegou o tal bicho na mão. Ela correu novamente até nós, desta vez para o colo de minha irmã enquanto patrícia carregava algo para longe dali.

- Tia Júlia... você nem sabe... – disse sentando-se.

- O que foi amor?

- Ele já tavo morto... – disse colocando as mãozinhas na cintura - mamãe disse que chama calan... calaguejo. – disse com uma carinha de quem se esforçava muito pra lembrar a palavra.

- É Carangueijo – Julia disse carinhosa. Logo em seguida Patricia voltou onde estávamos.

- Já pode brincar minha princesa! – beijou a testa dela. – Já tirei ele de lá.

- Eu quelo ir na agua. – pediu.

- Eu levo você então– Júlia ofereceu-se. Segurou a mão dela e foram caminhando. Resolvi acompanhar minha irmã. Dei um selinho em Cintia e corri até elas. Não fomos muito ao fundo pois o mar estava mais agitado.

- Adoro brincar com ela – Júlia disse segurando-a pelos braços e rodando-a devagar na agua.

- Ela me disse – minha irmã olhou-me – Uma vez na casa da mamãe ela me pediu pra brincar de avião com ela. Disse que você sempre fazia isso. – Julia sorriu.

- É eu faço mesmo. Fiquei surpresa ao encontrar você aqui. E com a Cintia.

- Ela é uma pessoa legal – eu disse molhando minha cabeça na agua.

- Parece que ela ta gostando muito de você. E você?

- Estamos nos conhecendo ainda.

- Cuidado para não a machucar está bem. Cintia é uma boa pessoa e não merece ser atingida por essa confusão que é nossa vida. Se por acaso não for possível corresponder as expectativas dela, não a use.

- Nunca tive essa intenção Júlia. Aliás ela sabe exatamente onde está se metendo. Eu mesma contei a ela ontem a noite.

- Tudo?

- Não. Só o que dizia respeito ao meu envolvimento com Patrícia. E sobre suas expectativas acho que só ela pode dizer se eu posso ou não corresponder.

- Joga eu!  – pediu Vavá e Júlia ficou sem entender.

- Ela quer que você a jogue pro alto e a pegue – eu disse. Minha irmã começou a brincar com ela e eu puxei outro assunto que me interessava muito.

- Você e a Flavia estão bem? Depois de ontem?

- Sim – ela respondeu. – Ela me contou sobre o fim do namoro dela. Você sabia que ela tinha sido traída?

- Sim. Ela me contou tudo.

- Você podia ter me dito. – disse com a voz chateada.

- Não era um assunto meu Jú... eu não podia dizer! Ela me contou do banho de mar de vocês. – eu disse e vi Júlia olhar-me com interesse no assunto.

- Contou? – balancei a cabeça confirmando - O que ela contou?

- Nada demais – dei de ombros – Que vocês se molharam só.

- Humm – resmungou – mais nada?

- Sim por que? Teve mais alguma coisa? – olhei para ela curiosa.

- Não! A gente só se molhou brincando na agua. – ela permaneceu brincando com Valentina enquanto eu apenas tomava banho de mar ao lado delas. Já no fim da tarde voltamos para a casa. Cada qual foi para seu respectivo quarto tomar banho e ajeitar-se. Saímos para jantar por que dois dias de pizza seguidos não dá certo né.

Na volta Cadu adormeceu ainda no carro mas Valentina estava com uma energia enorme. Parecia que a bateria dela estava carregada em cem por cento. Levei ela até uma sala de jogos que tinha na casa de Carla. Liguei o X-box que tinha lá e começamos a jogar Disneyland Adventure. O jogo simula um parque da Disney e você interage com os personagens. Tem algumas partes que é possível voar mexendo os braços, em cenários como o do Peter Pan. É um ótimo jogo para crianças e ela passou muito tempo jogando, até se cansar o bastante para dormir.  

- Filha ta na hora de dormir – Patrícia apareceu na sala para busca-la.

- Conta estolia? – ela pegou minha mão me puxando.

- Filha a Ana não vai dormir agora.

- Mas eu quelo que ela conta a estólia do ursinho de novo.

- Se quiser eu posso coloca-la na cama – disse a Paty – Vou adorar fazer essa princesa dormir! – disse já pegando Vavá no colo.

- Tem certeza?

- Claro.

- Tudo bem então. – subi com ela e só então me lembrei de que ela não estava de pijama.

- Vavá você sabe qual dessas duas é a mala da mamãe?

- A veide. – disse já em cima da cama tirando a roupa toda e ficando apenas com uma calcinha rosa com desenhos de ursinhos. Abaixei-me e abri a mala dela com receio por estar sendo invasiva mas eu não tinha escolha, e comecei a procurar o pijama dela. As roupas de Patrícia estavam todas separadas, por cor, como ela sempre fazia. Sorri de seu perfeccionismo, que algumas vezes era exagerado. Sobre as roupas o vidro de 212, ela sempre amou todos os perfumes de Carolina Herrera, mas este era de longe o seu favorito.  

Após achar o pijaminha dela vesti-a. Deitei-me na cama ao lado dela e voltei a contar mesma estorinha da manhã. Ela demorou mais para dormir pois ficava o tempo todo perguntando coisas sobre os ursos. Enquanto eu falava meus dedos enrolavam uma mecha de seu cabelo. Quando percebi que ela estava vencida pelo sono beijei sua testa e sai do quarto devagar deixando a porta entreaberta.

- Ela deu trabalho? – Júlia perguntou quando assim que encontrei as meninas no mesmo salão onde estava com Vavá antes. Paty estava sentada em seu colo.

- Não muito! – sentei-me ao lado de Cintia e ela entrelaçou suas mãos nas minhas. Na mesa de centro tinha uma garrafa de tequila e um prato com sal e limão. Cada uma tinha o seu copinho e pelo visto já estavam bebendo a algum tempo. Peguei um copo e virei duas doses, uma seguida da outra. A bebida desceu queimando minha garganta. Perto de nós Carla e Flávia disputavam uma partida de bilhar quando minha amiga comemorou a vitória sobre a outra.

- Não acredito que finalmente ganhou de alguém pocahontas – eu disse brincando com ela e fazendo todas rirem de seu apelido.

- Saiba que posso ganhar de você também – disse confiante apontando o taco em minha direção.

- Quer apostar? – perguntei e ela sorriu já relembrando as muitas vezes em que fazíamos isso.

- Acho melhor não fazerem isso... as apostas de vocês sempre acabam em confusão – Paty disse como se previsse o que aconteceria. – E vocês já beberam demais Flá – completou.

- O que eu ganho se você perder? – provoquei-a ignorando o comentário de Paty.

- Faço o que você quiser... – Flávinha respondeu - mas se eu ganhar você fará o que eu quero. Topa?

- Fechado! – respondi sem titubear. Estendemos nossas mãos selando o acordo. Enchi mais uma dose e escolhi um taco, seguindo até a mesa. Ví Patrícia olhar-nos contrariada.

Eu nem me lembrava da última vez em que Flávia e eu tínhamos disputado uma partida de bilhar. Eu estava confiante pois havia ganhado dela todas vezes em que havíamos disputado.

Arrumamos as bolinhas e eu já comecei ganhando no cara ou coroa. E com isso dei a primeira tacada estourando as bolinhas. Carla, Maressa e Cintia se divertiam agitando a disputa. O jogo estava acirrado e confesso que Flávinha tinha melhorada muito. Enquanto jogávamos vi Patricia conduzir minha irmã pela mão até saírem da sala. Flávia também viu a cena, e no mesmo instante encheu outro copo de tequila e virou, pura mesmo. Não era preciso ser um gênio para saber o que rolaria entre elas. Flá me olhou partilhando da mesma sensação dolorida.

Mantínhamos o mesmo ritmo, eu derrubava uma bola e na vez dela ela derrubava outra. Além disso ela sempre dava um jeito de deixar suas bolinhas encobrindo as minhas, o que dificultava minhas tacadas. Depois de um tempo restou apenas duas bolinhas para cada e era minha vez de jogar. Matei a primeira, mas na volta a bola branca parou ao lado da bolinha da Flávia, praticamente colada nela. Joguei mas acabei errando. Flávia matou a bolinha dela e eu comecei a rezar para ela errar a segunda. Mas ela acertou e finalmente partiu para a tão esperada bola 15. Eu torcia mentalmente pra ela errar. Quando ela acertou a bolinha eu acompanhei a volta que ela deu, batendo na quina do buraco e caindo, para o meu desespero. Flávia comemorou com uma dancinha ridícula enquanto as meninas riam demais.

- Melhor de três? – arrisquei sem sucesso.

- Não senhorita. – ela disse e suspirei sem muita alternativa.

- O que vai querer de mim? – perguntei. Ela me deu um sorriso malvado, do tipo que eu sabia que pagaria caro.

- Deixa eu pensar... – colocou a mão no queixo enquanto andávamos, estávamos saindo da casa quando nos deparamos com Júlia e Paty escoradas num canto da parede de fora da casa, num beijo quente enquanto suas mãos se exploravam mutuamente. Perdi meu rumo ao ver a cena. Patrícia estava com os olhos fechados, a expressão de prazer no rosto enquanto a boca de Júlia explorava seu pescoço. Um sentimento de raiva começou a crescer dentro de mim e não fui a única a senti-lo. Ao abrir os olhos ela nos viu paradas ali. Percebi que hesitou em continuar e Júlia olhou-a e depois virou o rosto em nossa direção. Senti alguém puxando meu braço e quando olhei era Flavinha.

- Acha que ta muito tarde pra um banho de mar sem roupas? – perguntou, e eu voltei a olha-las inflamando mais ainda a minha raiva. Um banho de mar àquela hora da noite não seria nada desagradável. Comecei a caminhar em direção a areia e ouvi minha irmã me chamar. Descemos as escadas e chegamos na praia. Júlia e Paty chegaram logo depois. Flávia olhou para Paty com reprovação.

- O que ta acontecendo? – Júlia perguntou.

- Sua irmã perdeu o jogo – Carla respondeu. – Vai ter que nadar pelada!

- O que? - gritou desaprovando aquilo tudo. – Vocês estão loucas?

 Patricia mantinha-se calada ao lado de Júlia, encarei-a com o rosto sério e ela baixou a cabeça.  Júlia tentou me convencer do contrário.

- Você não precisa fazer isso Aninha!

- Mas eu vou! – bati o pé. Eu estava com raiva pelo que tinha acabado de presenciar e já não me importava muito com minhas atitudes naquele momento. Eu estava solteira e não devia satisfações a ninguém dali.

- Pra quê Ana? Por uma aposta idiota. Deixa de ser cabeça dura! Você já bebeu demais hoje não é seguro entrar no mar assim! – gritou comigo. Estávamos apenas nós ali. Ela me conhecia bem o bastante pra saber que não conseguiria nada comigo, então apelou para Flávia.

- Flávia por favor, não deixa ela fazer isso!

- Não se mete nisso Júlia – eu disse um pouco grossa e ela bufou. Segui até onde Flávia estava parada, com os braços cruzados,  e comecei a tirar minha blusa ficando apenas com um sutiã preto de renda. Em seguida retirei o short jogando-o aos seus pés, exibindo a calcinha que fazia conjunto com o sutiã. Não olhei em direção a Paty mas percebi pelo sorriso que Flávia deu que ela me olhava. Flávia mantinha um sorriso vitorioso no rosto, no fim das contas ganhar aquela aposta tinha vindo bem a calhar. Como diz aquele velho ditado popular, ao me fazer tirar a roupa ela acertou dois coelhos com uma paulada só, ou seja, Paty e Júlia.

- Você fica bem de preto – ela disse sorrindo debochada e arqueando as sobrancelhas.

- Fico ainda melhor ao natural – Sorri convencida e virei de costas para ela e desabotoei o sutiã e em seguida retirei a calcinha, jogando-os na areia e segui em direção ao mar.

- Uhuuuu – ouvi-a gritar comemorando minha rebeldia diante de todas.

Fim do capítulo