CAPÍTULO 01

Observou com atenção o porta-retratos na mesinha ao lado. Sentou na cama deixando que algumas lágrimas escorressem pelo rosto. Na imagem havia sua mãe, Antônia, suas irmãs, Lara e Clara, e ela, Anita.

Pressionou um lábio no outro, erguendo um pouco a cabeça. A saudade de casa aumentava a cada dia. Era difícil acreditar que estava longe da mãe e de suas irmãs. Todos os dias, algo apertava ainda mais em seu peito esquerdo.

Pegou a mochila sobre a cadeira e saiu pela porta do quarto.

Descia as escadas enquanto secava seu rosto, quando viu Isabel, a dona da casa onde estava hospedada, com o telefone na mão.

— Desculpa, minha menina, mas a ligação caiu.

Já sabendo do que se tratava, voltou a chorar.

— Não fique dessa forma. — Envolveu o corpo da jovem num abraço. — Sua mãe e suas irmãs sabem que você está longe porque está lutando para garantir um futuro melhor a elas.

— Eu sei... Hoje será meu primeiro dia no trabalho. Depois, vou à faculdade.

— Fico muito feliz por você. — Isabel se afastou da jovem e a olhou nos olhos. — Espero que consiga realizar todos seus sonhos. Vou sempre torcer por você. — Tocou-a no rosto.

— Muito obrigada por tudo! — Agradeceu, pois, mesmo se conhecendo há apenas dois meses, a senhora a tratava como filha.

***

Após sair de casa, pegou o ônibus. Às oito horas em ponto teria que estar no trabalho, uma das lojas de roupa Santiago, emprego conseguido com a ajuda de Luiz, um conhecido de dona Isabel que trabalhava na seleção dos funcionários da empresa.

No momento em que sentou numa bancada, começou a pensar em como sua vida tinha mudado em tão pouco tempo. Nunca antes, havia saído de sua cidade natal no interior, porém a necessidade de buscar um futuro melhor para a família a obrigou a deixar todos os medos de lado.

Era muito apegada à família. Não tinha um dia que não chorava de saudade, porém após a morte do pai, Pedro, há 5 anos por conta de um acidente de moto, a situação em casa não era das melhores.

Sua mãe Antônia nunca reconheceu que precisava de ajuda.

Através dos estudos, decidiu mudar a situação em casa. Conseguiu uma vaga na faculdade, e sua professora de matemática, vendo o seu esforço, passou o endereço de dona Isabel.

A senhora, apesar de ser uma completa desconhecida, a recebeu bem desde o primeiro dia. A ensinou tudo que deveria saber para viver na nova cidade. E deu abrigo sem cobrar nada. Isabel precisava de companhia e a jovem Anita parecia ser a ideal.

“Dia 13 de Abril de 2015, o início de tudo”, anotou em seu caderno, pois sentia que aquela data significaria algo no futuro.

Dez minutos antes do horário, chegou ao trabalho. Começou a olhar todo o ambiente com admiração. Como vinha de uma cidade pequena, não era comum ver uma loja como aquela. A fachada era luxuosa. Era uma loja para pessoas de classe alta. Nenhuma das peças de roupa vendidas no local poderia ser comprada com o salário que receberia.

Observou uma mulher morena de cabelos lisos andando na sua direção. Tentou esconder o deslumbramento que sentiu ao entrar naquele lugar que nunca poderia frequentar como cliente.

— Bom dia! Você é a Anita, não é mesmo? — Estendeu a mão para um cumprimento.

— Sim, sou eu mesma. — Apertou a mão da desconhecida.

— Me chamo Clarice. Sou a encarregada de te mostrar como funciona tudo por aqui. — Sorriu e começou a andar. — Pelo visto, veio de uma cidade pequena. Fiz a mesma cara que você quando entrei aqui pela primeira vez. — Encarou a jovem toda tímida que a seguia. — Também sou do interior. Foi muito difícil me acostumar a viver aqui, a saudade da família é muito grande.

— Lidar com a saudade é o mais difícil — confessou enquanto observava melhor o local de dois andares.

— Você vai encontrar coisas bem piores por aqui.

Anita ficou sem entender o comentário da colega, no entanto continuou andando sem questionar.

Ao chegarem perto de dois homens, Clarice os cumprimentou e os apresentou a Anita.

— Este é Rogério — Apontou para um homem moreno e todo musculoso. — E este é Paulo. — Apontou para um homem também moreno e baixo que usava óculos.

— Olá, Anita. — Rogério estendeu a mão. — Seja bem-vinda. Espero não vê-la sofrer com as mudanças de humor da Luciana.

— Luciana? — Anita ainda não sabia de quem se tratava.

— Luciana é a gerente, Anita, uma mulher muito insuportável — Clarice respondeu. — Acho que ninguém comentou sobre ela quando foi selecionada para não correr o risco de você pedir demissão antes mesmo de começar.

— Fique tranquila. Fazendo o seu trabalho direitinho, você não acaba sofrendo com ela — Paulo avisou.

Como não tinha experiência no cargo de atendente, Anita pediu algumas dicas aos seus colegas, porém, em um determinado momento, percebeu que todos naquele lugar começaram a encarar duas mulheres que estavam entrando no estabelecimento.

 Sem conseguir evitar, olhou para a mesma direção e se deparou com a mulher mais bonita que já havia encontrado em toda sua vida. 

A cada passo que a desconhecida dava, ela sentia o coração querer sair pela boca.

“Quem é essa mulher?”, perguntou-se contemplando a mulher morena que estava acompanhada por uma loira.

— Essa morena é a dona, Carolina Santiago. A mulher ao lado é Luciana Lombardi, nossa gerente. Ela é uma mulher muito difícil de lidar — Clarice disse baixo.

Carolina, esse era o nome da mulher responsável por deixar Anita hipnotizada.

— Ela vem sempre aqui? — Embora não sabendo o porquê, ela sentiu a necessidade de fazer aquela pergunta.

— Não, apenas uma vez por semana. Todas as segundas.

 Anita não conseguia parar de admirar Carolina.

— Luciana não muda mesmo. A senhora Santiago que é a dona, e é ela quem se comporta como tal — Rogério disse ao ver Luciana reclamando com um funcionário.

— Acho melhor continuarmos o nosso trabalho, caso contrário, nós também receberemos reclamações — Paulo avisou ao voltar para seu posto.

— É, Anita, vamos! — Clarice puxou a colega pelo braço.

Durante boa parte do dia, sua mente ficou muito distante. A todo instante, recordava-se em câmera lenta a entrada da senhora Santiago naquela loja.   A mulher parecia ser tão imponente.

Recebeu alguns chamados de atenção de Clarice que não queria ver a nova colega recebendo advertência de Luciana, porém, sempre que podia, olhava para cima na tentativa de ver a mulher no andar superior.

Quando Carolina foi embora, o coração de Anita bateu forte ao vê-la passar com seu caminhar elegante.

Não sabia o que isso significava. Eram sensações desconhecidas e gostosas que a imagem da mulher causava em si.

***

Faltando poucos minutos para o início da aula, ela chegou à faculdade se sentindo cansada por conta de seu primeiro dia de trabalho. Não foi fácil atender pessoas que a olhavam como se não fosse nada. Em alguns momentos, ficou incomodada com a arrogância de determinados clientes, contudo Clarice alertou que era assim mesmo. Teria que se acostumar.

Na primeira aula, sua mente não parava de relembrar a entrada da senhora Santiago na loja. Por mais que quisesse, não prestou muita atenção no que seu professor falava. A todo instante, uma imagem vinha à mente: Carolina.

“Quem é aquela mulher? Por que ela não está saindo de meus pensamentos?”, questionava-se com frequência.

Tentando buscar um pouco de concentração, passou as mãos várias vezes no rosto.

— Você está bem, jovem? — o professor inquiriu.

Com a pergunta, todos naquela sala olharam para ela e isso a deixou envergonhada.

— Estou bem, professor! — Abaixou a cabeça. A última coisa que gostava de fazer era chamar a atenção.

— Certo! — Deu prosseguimento a aula.

Cada minuto que passou naquela sala, não teve um sequer que não pensou em Carolina.

 Por que aquela mulher havia lhe chamado tanto a atenção? Não havia tido nenhuma troca de olhares, não houve exatamente nada, mas mesmo assim havia a encantado. 

Fim do capítulo