A Chefe por Van Rodrigues
Capitulo 2
CAPÍTULO 02
Naquela noite, retornou a casa cabisbaixa. Não seria fácil se acostumar com a nova rotina de faculdade e trabalho. Alguns professores marcaram avaliações para próxima semana, isso queria dizer que teria que começar a passar a madrugada estudando, já que trabalhava na loja durante o dia.
Atravessou o pequeno portão já bem velho da residência amarela de dois andares com várias plantas na frente. Anita, desde o primeiro dia, sempre admirou a beleza daquele jardim. Dona Isabel cuidava de cada planta com muito carinho. Eram especiais para a senhora, sabia disso.
Abriu a porta e Anita se deparou com a senhora sentada no sofá sozinha assistindo uma novela. Ficou em silêncio se perguntando se dona Isabel não tinha com quem contar, além de Luiz que, às vezes, a visitava para saber como estava.
— Filha — a senhora notou a presença da jovem ao lado da porta —, venha mais para cá. Como foi seu primeiro dia no trabalho?
— Foi tranquilo. — Moveu-se devagar pelo cômodo por conta do cansaço. Aproximou-se do sofá retirando sua mochila para que pudesse se sentar sem pesos. Enquanto reparava no olhar ansioso de Isabel para saber das novidades, lembrou-se da forma como a chefe havia entrado na loja e sentiu um leve arrepio atrás da nuca. Respirou fundo, não podia se comportar daquela forma. Precisava agir como antes de ir ao trabalho. — Mas achei cansativo. — Tentou acompanhar a programação da TV para ver se preenchia sua mente com outros assuntos.
— É assim mesmo, ainda não está acostumada. Quer jantar?
— Não, obrigada. Estou sem fome. Comi na faculdade. Neste momento só quero um banho e dormir um pouco.
— Está bem, filha, tente descansar. O seu dia foi muito difícil.
— Boa noite! — Anita levantou já se despedindo.
Quando entrou no quarto, observou tudo organizado, no entanto sua cabeça não estava da mesma forma.
— O que está acontecendo comigo, Deus? — Sentou-se na beirada da cama e passou as mãos no rosto com certa força.
Sentindo-se completamente confusa, repousou as costas no colchão. Nunca havia pensado em alguém como naquele momento. Não compreendia o que se passava. Não entendia o porquê de lembrar o tempo todo de alguém tão inalcançável.
Carolina aparentava ser uma mulher incapaz de olhar para uma pessoa que não pertencesse a mesma classe social que ela. Andava sem olhar para os lados como se fosse superior a tudo e a todos.
Naquele dia, Anita ouviu dizer que Carolina era uma mulher de poucas palavras. Ela apenas passava e verificava se tudo estava em ordem. Não agia como Luciana que vivia dando advertências aos funcionários, entretanto era calada e intimidava todos mesmo sendo assim.
— Ela nunca olharia para mim! Mas por que estou me importando com isso? Fazendo meu trabalho direito é o que importa. — Um nó se formou em sua garganta. A ideia de nunca ser vista por Carolina a incomodou. Doeu. Doeu de mais, mas não podia continuar agindo daquela forma. — Quem sabe um banho não me faz esquecer essas loucuras que andam se passando por minha mente?
Ao chegar ao banheiro, Anita se despiu encarando a sua imagem cansada no banheiro. Era uma mulher negra com os cabelos longos e cacheados. Seu corpo não era muito magro. Havia belas curvas, porém a jovem não notava isso. Tinha 23 anos, mas sua voz e jeito doce davam a impressão de ser mais nova.
Quando retornou ao quarto vestindo um conjunto de dormir, deitou na cama planejando deixar para estudar no outro dia.
— Amanhã será um novo dia!
Na terça-feira, acordou ouvindo o som de chuva batendo contra a janela do quarto. Respirou profundamente, pois sabia que seria um longo dia. O trânsito sempre ficava caótico quando chovia.
Levantou-se com calma, movendo as mãos na intenção de prender os cabelos.
Após se arrumar para mais um dia de trabalho, tomou um café rápido. Queria sair um pouco mais cedo de casa. Os colegas haviam a alertado no dia anterior que Luciana odiava atrasos. E ela sabia que dia chuvoso era sinônimo de atraso.
No momento em que se sentou em uma bancada do ônibus, retirou o caderno da faculdade da mochila e começou a revisar os assuntos. Por conta do trabalho, ela ficaria muito cansada para estudar à noite e com menos tempo, isso significava que teria que usar cada minuto livre para se dedicar.
O percurso até o emprego era um pouco longo. Durante o caminho, notava que alguns homens a olhavam e isso a deixava desconfortável. Mesmo tendo 23 anos nunca havia se relacionado antes com alguém. E se sentia estranha quando percebia algum rapaz se interessando por ela, pois não ficava entusiasmada como suas amigas do interior.
Quando chegou ao trabalho, já não chovia mais, para seu alivio. Encarou o delicado relógio no pulso constatando que teria tempo de sobra para trocar a roupa molhada e ir para sua função.
Estando vestida com a camisa preta com alguns detalhes verdes, Anita notou que em um dos cantos da loja Rogério, Paulo e Clarice estavam rindo alto.
— Bom dia! — Anita cumprimentou.
— Bom dia! — Os três responderam juntos.
— Estávamos aqui falando sobre a festa de aniversário que fomos ontem, Anita. — Paulo esclareceu.
— Rogério chegou em uma menina e levou um fora daqueles. A moça tinha namorada. — Clarice comentou, deixando Anita pensativa.
Os colegas começaram a relatar tudo que havia acontecido no evento, porém a história sobre a moça com uma namorada não saiu de sua cabeça. Nunca havia visto duas mulheres juntas, porém ouviam conhecidos comentar sobre o assunto sempre num tom preconceituoso.
Relembrar tudo que já tinha escutado sobre o assunto fez um nó se formar em sua garganta. Seus batimentos se aceleraram um pouco e não conseguiu mais prestar atenção no que os colegas diziam.
— Vocês não são pagos para ficarem rindo — Luciana surgiu com o seu típico mau humor. Fazendo com que a jovem de cabelos encaracolados voltasse a realidade.
Os quatro foram para as suas funções.
Anita agiu mecanicamente nos primeiros minutos após a conversa. Parecia que a história sobre a moça com uma namorada não saía de sua cabeça. Será?
Respirou fundo e balançou a cabeça negativamente, porque imaginava que já estava começando a colocar besteiras em sua mente.
Durante todo o horário de trabalho, não se permitiu pensar em Carolina. Tentava se esquecer daquela mulher que ainda era uma completa desconhecida. Às vezes, dava certo, mas sempre recordava da forma como a senhora Santiago entrou na loja.
O seu dia foi um pouco longo. Luciana não era uma mulher fácil de lidar. Não perdia uma oportunidade para dar bronca nos funcionários. Começava a entender por que conseguiu tão facilmente uma vaga de emprego sem ter experiência, ninguém queria trabalhar ali, pois a gerente não tinha uma boa fama.
Antes de ir à faculdade, passou em uma lanchonete. Precisava se alimentar e não tinha como retornar a casa, já que se atrasaria para a aula. Sua vida havia ficado muito corrida.
Sentou-se em uma mesa e escolheu rapidamente no cardápio o que queria comer. Seu estômago roncava. Tinha pausas para lanchar no trabalho, porém gastava muita energia enquanto atendia várias pessoas sem parar.
Olhou para os lados com receio de ter sido ouvida e encontrou algo que chamou muito sua atenção sobre a mesa vizinha.
“Carolina Santiago", leu o título da matéria e ficou tentando enxergar o que era dito no jornal. A foto de sua chefe se destacava em um dos cantos. Por mais que quisesse não lembrar da mulher, sempre aparecia algo que fazia a senhora Santiago criar ainda mais raiz em sua mente.
Mesmo sabendo que os donos da lanchonete deixavam aqueles jornais pelo ambiente para os clientes, Anita pegou as folhas com certa vergonha.
Seu lanche logo chegou. No momento em que comia, lia com atenção a matéria. Não havia muita informação sobre a vida pessoal de Carolina, pois o texto focava na brilhante administração dos negócios da família da empresária.
A cada linha lida, Anita se encantava ainda mais, porém não compreendia o que esse fascínio por aquela mulher pudesse significar.
***
Passando quase uma semana desde seu primeiro dia no emprego, Anita aprendeu suas funções na loja, entretanto, até que isso ocorresse, ela levou muitas broncas da Luciana. A gerente não perdia a oportunidade de humilhar os funcionários.
Na faculdade, ela começava a se dar bem. Estava conseguindo acompanhar todas as disciplinas mesmo com aquela rotina exaustiva que levava. Era dedicada. Sabia que concluir seu curso tinha que ser sua maior prioridade. Apesar de ter pouco tempo e acesso à internet, ela não deixava nenhuma atividade ou trabalho sem fazer.
Em meio a tudo de bom que ocorria em sua vida, ela estava tendo uma admiradora secreta que havia se encantado com seu jeito todo meigo.
Fim do capítulo
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