POV Charlie

Jodie e eu tínhamos completado dois anos de namoro e não poderíamos estar mais felizes, tudo parecia correr bem na vila, os desafios diminuíam conforme Jodie seguia vencendo sem dificuldades. Mas, aparentemente, éramos os únicos a estar funcionando corretamente como comunidade. Alguns dias antes um grupo de aproximadamente 20 pessoas havia chegado a nossa vila. Eles tinham fugido dos resquícios de uma cidade mais ao norte, ainda no estado de NY. A história que foi contada a Jeremy e que ele me disse foi de que metade da cidade se rebelou, muitos morreram e esse grupo conseguiu fugir antes que os líderes da região conseguissem se reorganizar.

Não eram o primeiro grupo que acolhíamos, mas era o maior e o vindo de mais longe. Geralmente eram apenas uma ou duas famílias vindas de vilas vizinhas que nos procuravam pedindo abrigo. Nós os aceitávamos, desde que eles nos respeitassem. Eram designados aos serviços que poderiam ou sabiam fazer, recebiam umas das casas vagas próximas ao centro, com o tempo poderiam ter uma parte de terra para cultivarem, mas quando chegavam tinham que colocar a nossa disposição tudo o que possuíssem. A verdade era que Jeremy só recolhia armas e munições; fazia uma pequena entrevista com cada um e os colocava em algum lugar onde poderiam ganhar a vida.

Geralmente o que conseguíamos eram alguns facões e coisas do tipo, mas dessa vez esse grupo tinha chegado com outras armas e Jeremy decidiu dividi-las entre os seus homens, principalmente para os que faziam a segurança dos entornos da vila. Mas antes disso ele me disse para ir dar uma olhada e ver se não queríamos ficar com nenhuma, porque ele achava que, por morarmos longe, seria bom termos armas extras. Não discuti com ele e vim junto com Jodie, Max e Sam ver o que o novo grupo tinha trazido para nós.

POV Narradora

Charlie e Jodie chegaram na casa de Jeremy de mãos dadas, Max vinha com Sam mais atrás e entraram logo depois das duas quando a esposa do líder da vila abriu a porta para elas. Jack, de 6 anos, e a pequena Clarice, de apenas 4 anos, desceram correndo as escadas gritando o nome de Sam e logo se atirando sobre ela num abraço. Todos riram da cena e deixaram Sam brincando com as crianças sob a supervisão da mãe das mesmas enquanto Jeremy as levava para o lugar onde estavam as armas, o porão da casa.

- Ainda estão todas aqui – disse ele acendendo uma vela que estava num canto e trazendo para perto de uma mesa de madeira no meio do porão – Não olhei elas eu mesmo, apenas as trouxe para cá.

- Nossa – disse Jodie se impressionando com a quantidade de armas e munições.

- Sim – riu Jeremy se virando para Charlie que não havia se aproximado da mesa ainda – Pelo que sei eles saquearam os corpos dos membros da gangue que controlava o lugar de onde vieram, pegaram tudo o que podiam antes de fugirem. Tem pistolas, algumas armas maiores, e bastante munição que não sei como ainda existe. Acho que os antigos donos dessas armas não eram muito bons em usá-las ou esse grupo estaria morto, todo ele.

- Acha que isso vai nos trazer problemas Jeremy? – perguntou Charlie se referindo a possibilidade da tal gangue vir atrás dos fugitivos.

- Não sei, eles dizem que vieram de Albany, isso é bem longe – falou Jeremy se recostando à parede – Mas eles mesmos não sabem dizer o estado da gangue quando fugiram. Não temos como saber. Mas eu não podia deixa-los vagando por ai.

Charlie suspirou, sabia que ele tinha razão, aquelas pessoas não podiam ficar vagando por ai eternamente e, se não fossem eles, ninguém mais os acolheria. Pelo que ele havia contado eram 11 jovens entre 14 e 17 anos, um casal com a filha pequena, um senhor por volta dos 50 anos e mais cinco adultos. Exceto dois homens adultos e três rapazes mais velhos, nenhum dos outros tinha condições de se defender por muito tempo, não iriam resistir.

- Esse revolver é lindo – comentou Jodie admirando uma das armas junto com Max.

- Parece meio velho também, não sei nem que munição dá pra usar com isso – comentou a garota rindo.

- Não é tão velho assim não – riu Jodie – Mas não tenho certeza de que calibre usa.

Charlie se aproximou das duas colocando uma mão na cintura da loira para ver o que ela segurava. Era um revólver completamente preto, mesmo a madeira do cabo também era negra, possuía um pequeno símbolo que parecia uma estrela e também algumas inscrições no cano. Assim que viu a arma Charlie paralisou com os olhos arregalados.

- Charlie? – a loira percebeu que algo não estava certo com a médica e soltou a arma na mesa para se virar para a namorada – Charlie, o que houve??

Ignorando o que Jodie dizia Charlie estendeu a mão e pegou a arma, ainda com uma expressão assustada e incrédula. Ela segurou o revólver com ambas as mãos e aproximou os olhos do símbolo reconhecendo a letra ‘h’ desenhada dentro da pequena estrela. Logo depois seus olhos vagaram pela mesa como se procurassem algo, até acharem uma caixa de madeira numa extremidade e pegá-la também.

- Isso é um Colt Diamondback calibre 22 – disse ela num tom baixo e ainda surpreso – Jeremy, com quem estava essa arma?

- Charlie, o que é que está havendo? – perguntou Jodie completamente confusa.

- Quem estava com essa arma? – tornou a perguntar encarando Jeremy com um olhar sério.

- Era...um rapaz – ele disse um tanto assustado com a intensidade de Charlie – Ele pediu pra ficar com ele, mas disse que não poderia . Todas as armas tinham que ser entregues. Lembro dele ficar triste, mas me entregar. A...a caixa na sua mão, ele entregou junto.

- Onde está esse rapaz? – perguntou Charlie guardando a caixa num dos bolsos do sobretudo e colocando o revólver no cós da calça.

- Eu não...não tenho certeza – disse Jeremy tentando se lembrar.

- Onde Jeremy?! – ela insistiu fazendo todos se surpreenderem com o tom elevado e exigente – Eu preciso saber onde!

- Eu vou descobrir – disse ele correndo para cima e chamando por um dos seus homens para ajuda-lo a encontrar o rapaz.

Jodie ia perguntar algo, mas Charlie subiu as escadas do porão com pressa fazendo a loira e Max terem que correr para alcança-la.

- Charlie o que é que está acontecendo?? – perguntou Jodie de um jeito sério segurando a mão da mais velha e fazendo-a se virar.

- Eu explico – disse ela com uma expressão transtornada – Vou explicar, prometo – Charlie falou se aproximando da loira, segurando o rosto de Jodie com ambas as mãos e encostando as testas de ambas – Só espera um pouco, tenho que entender o que tá acontecendo.

- Tá, tá bem – disse Jodie dando um selinho na mais velha e a abraçando sem saber porque ela estava tão transtornada.

- Ele está, com mais dois dos garotos, naquele velho barracão cheio de carros velhos – disse Jeremy entrando na sala novamente e pegando sua jaqueta.

- Vamos até lá – disse Charlie respirando fundo, ela se aproximou das crianças e deu um beijo na cabeça de cada um – Até mais pequenos, trago Sam pra ver vocês mais vezes, prometo – ela disse se levantando – Vamos Sam.

As quatro saíram acompanhadas de Jeremy, Charlie sabia a que barracão ele havia se referido, então guiava o grupo com Jodie de um lado e Sam do outro. Mas quando chegaram no lugar, que era como uma velha garagem, foi Jeremy quem bateu a porta. Um rapaz loiro abriu e Jeremy logo falou que precisavam entrar. O garoto deveria ter por volta de 15 anos e ficou um tanto assustado, mas abriu caminho para todos entrarem.

Estavam num lugar que era como uma sala cheia de velhos sofás e bancos de carros; havia um rapaz também loiro, mas com o cabelo um pouco mais escuro, sentado num dos bancos, ele se levantou sem entender aquela quantidade de pessoas.

- Jeremy? O que houve?? Não fizemos nada errado – falou o que havia aberto a porta.

- Qual deles? – perguntou Charlie impaciente.

- Nenhum – disse Jeremy olhando em volta procurando o terceiro rapaz.

- O que houve? – perguntou um garoto de cabelos castanhos e com olhos escuros aparecendo por uma porta num outro canto do cômodo, ele olhou em volta confuso pela quantidade de pessoas desconhecidas, então notou o revólver preso à frente do cós da calça de Charlie – Hey! Porque você está com o meu.....

Antes que ele conseguisse terminar a frase Charlie tinha avançado, agarrado a frente da camisa do rapaz e jogado ele com as costas contra a parede.

- Charlie!!!! – gritou Jodie que não conseguiu impedir a reação exagerada da namorada.

- Ele não é seu – falou a médica encarando os olhos do rapaz com certa raiva.

O garoto não deveria ter mais do que 17 anos, apesar de ter se assustado, ao ouvir o que ela disse, voltou a ficar com uma expressão irritada. Ele agarrou os pulsos de Charlie e sustentou o olhar dela.

- E quem é você pra dizer isso? – ele disse com um certo toque de raiva no tom – Quer, por favor, me soltar? A mim e ao meu revólver?

- Já disse que ele não é seu – insistiu Charlie ainda num tom sério o que fez o garoto se irritar e começar a se debater para se soltar – Quieto! Onde achou isso? De onde tirou essa arma??? Onde está o dono dela??

- Sou EU. Já disse que é meu! Não tirei de lugar algum! – ele disse irritado e então tentou pegar o revólver.

Charlie agarrou o pulso da mão que ele usou para tentar pegar a arma, se afastou, girou o garoto e empurrou-o com o rosto contra a parede novamente.

- Charlie! – chamou Jodie tocando o ombro da namorada tentando acalmá-la – Pelo amor de deus, ele é só um garoto.

- Impossível! – falou Charlie ainda sobre o que o rapaz tinha dito e apertando ainda mais o rosto dele conta a parede de madeira – Esse era o revólver do meu pai e é bom você me dar uma ótima explicação para estar com ele!!! – o garoto, de repente, ficou sem reação, até parou de resistir – Responda!

continua...

Fim do capítulo