Capítulo 15 - Giulia -
- Giulia -
Ouvi alguns barulhos vindos da cozinha, parecia que alguém estava derrubando todos os armários e panelas. Virei na cama, o barulho cessou, e quando o sono começou a dar indícios de querer voltar ao barulho recomeçou. Virei para o outro lado na cama e coloquei a cabeça debaixo do meu travesseiro. Não adiantou de muita coisa, o barulho não iria me deixar dormir novamente. O sono ainda me consumia, mas dormir novamente era impossível. Olhei o celular e já se passava das 10hs. Espreguicei-me demoradamente e resolvi tomar um banho pra espantar o sono de uma vez.
Sai do banheiro com uma toalha em volta do meu corpo e uma em meus cabelos, estava enxugando-os quando ouvi meu celular apitar na mesinha perto de minha cama. Quando li o nome de Marina na tela meu coração saltou dento do meu peito, de repente a boca ficou seca. Marina seria sim a responsável pela minha arritmia cardíaca. Respirei fundo e respondi o seu “Bom dia”.
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-- Bom dia Marina!
Respondi com o coração ainda feito um louco e as mãos trêmulas.
-- Desculpa, acho que acabei lhe acordando. Eu tentei, mas acabei não resistindo. Me desculpe.
-- Já estava acordada, não se preocupe. Vick que me acordou com um barulho ensurdecedor de panelas vindo da cozinha. Acho que ela está tentando preparar algo. Parece que ela vai receber alguém aqui em casa hoje. – foi o que eu deduzi já que ela nunca preparava o almoço, nem para mim - Está em casa? – perguntei sem pensar.
-- Estou, mas vou sair daqui a pouco. Estou esperando a Fernanda vir me buscar para sairmos para algum lugar que incrivelmente eu ainda não sei qual é.
-- Programa surpresa?
-- Acho que sim. Não está com sono?
-- Um pouco. – admiti.
-- Desculpe por isso.
-- Por qual motivo está me pedindo desculpa?
-- Bom, você não dormiu durante a noite por culpa minha.
-- Se estiver realmente me pedindo desculpa por isso nem ouse! Eu amei passar a noite conversando com você. Por mim faria mais vezes.
Ok, eu fiquei roxa de vergonha ao admitir isso tão facilmente pra ela. Não me importei nem um pouco de estar com sono por ter passado a noite falando com ela.
-- Faria?
-- Sem sombra de dúvidas!
-- Assim eu não vou resistir e vou lhe incomodar todas as noites.
-- Me incomodaria se não o fizesse.
Passaram-se alguns segundos, acho que uns dois minutos mais ou menos e logo ela me enviou uma nova mensagem.
-- A Fernanda chegou! Agora vou descobrir que lugar misterioso é esse.
-- Tudo bem. Eu vou dar uma forcinha aqui pra Vick antes que ela ateie fogo no prédio. Ela tá nervosa, até parece que vai receber o Obama aqui.
-- Podemos nos falar mais tarde?
-- Claro que sim! – acho que respondi com muita empolgação.
-- Então até mais tarde.
-- Até mais. Um beijo Marina.
-- Beijo Giulia.
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Quando cheguei a cozinha Vick estava toda atrapalhada, a cozinha estava toda desarrumada e tinha comida em tudo quanto era canto.
-- O que está havendo aqui? – perguntei espantada.
Sem querer eu assustei com a minha pergunta e ela derrubou a panela que tinha nas mãos. Ela estava totalmente distraída com uma panela em uma mão e um livro de receitas na outra.
-- Que susto pequena! – fechou os olhos e respirou fundo.
-- Será que você pode me explicar o que está fazendo com a minha cozinha? Qual o motivo dessa bagunça toda aqui? – perguntei me referindo a pilha de panelas sobre a pia.
-- Estou preparando o almoço. – disse desviando a sua atenção para o livro de receitas na sua mão.
-- Você nem gosta de cozinhar Vick. – a olhei com os olhos semicerrados a avaliando – Conta!
-- Contar o quê?
-- Qual o motivo desse almoço? Quem é que vem almoçar aqui que é tão importante?
-- É...é uma amiga, eu tava devendo um almoço pra ela, então resolvi oferecer um almoço aqui em casa.
Aquilo não me convenceu, seria muito mais fácil ela encomendar alguma comida ou até mesmo saírem para comer em algum restaurante, na nossa rua mesmo havia pelo menos uns 3 bons restaurantes. Estranho! Bem estranho! Mas era melhor eu ajuda-la antes que ela colocasse fogo no apartamento.
-- Tudo bem. Quer uma ajuda então?
-- Sério? Você vai mesmo me ajudar?
-- É claro que vou Vick!
-- Você é um máximo pequena. – disse me agarrando e me tirando do chão enquanto dava beijos em minha bochecha.
-- Chega Vick, me põe no chão. Ai! No chão Vick. – disse sorrindo.
-- Mas precisamos fazer um trato. – ela me olhava com a sua cara de menina séria .
-- Que trato?
-- Você não pode contar para a minha visita que não foi eu que fiz o almoço. Tá certo?
-- Posso contar pelo menos que eu ajudei a preparar? – brinquei.
-- Não!
-- Mas Vick quem lhe conhece sabe perfeitamente que os seus dotes culinários são nulos, como vai conseguir convencer a tal pessoa de que foi você que fez todo o almoço sem nenhuma ajudazinha? Am? – perguntei sorrindo e balançando as sobrancelhas.
-- Eu me viro! Mas não pode contar. Tá certo?
-- Tudo bem, vou ficar de bico calado. Agora, vai, me diz qual é a receita especial que você quer fazer.
-- É essa aqui oh! – disse com cara de dengo apontando para a receita no livro.
Moleza! Mãos à massa, mas antes eu tinha que organizar aquela cozinha ou teria alguma síncope nervosa, era impossível fazer algo naquela cozinha da maneira que ela estava. Arrumamos umas coisas, guardamos outras, uma organização ali e outra aqui e pronto! Já podíamos dar início.
A receita que ela havia escolhi não era difícil e nem complicada de se fazer, pelo contrário, era simples, mas por outro lado era muito gostosa. Havia acertado em cheio, com certeza iria impressionar a tal pessoa se conseguisse fazê-la acreditar que foi ela mesmo que havia feito.
Logo o almoço estava pronto, foi rápido, nos rendeu tempo suficiente para fazer uma sobremesa. Escolhi fazer algo que Vick gostava, e que facilmente agradava a outros paladares, pouco provável de errar. Tudo pronto e cozinha arrumada Vick anunciou que iria tomar o seu banho, o que me fez lembrar de algo.
-- Vick eu vou poder ficar por aqui ou terei que sair para dar mais espaço pra você e sua convidada especial. – perguntei balançando as sobrancelhas de forma sugestiva.
-- O que lhe faz achar que eu e minha convidada precisamos de espaço?
-- Não sei...só acho que você não teria tanto trabalho assim se não estivesse a fim dessa tal pessoa.
-- Isso não quer dizer nada. Só estou pagando um almoço que eu estava devendo, nada mais que isso. E respondendo a sua pergunta, você não pode ficar, você deve ficar! Não precisa sair não, e se eu fosse você ia logo tomar um banho porque o negócio ai tá meio... – fez uma careta e abanou a mão na frente do nariz.
Rapidamente e não tão discretamente dei uma checada na validade do desodorante e ela gargalhou.
-- Palhaça! – falei jogando o pano que tinha em minhas mãos em sua direção.
-- Vou tomar meu banho. – saiu da cozinha ainda sorrindo.
Dei mais uma conferida em como estavam as coisas na cozinha, e também fui tomar o meu banho. Sai do banho e ouvi que o chuveiro de Vick ainda estava ligado. Huuuum, almoço, banho demorado...ai tinha coisa! Peguei meu celular e meus fones de ouvido, deitei no sofá pra esperar Vick sair do banho.
Quando deitei, abri meu e-mail, não havia nada de muito importante, apenas algumas propagandas chatas que tentavam me convencer a comprar coisas nada úteis para a minha vida. Mas ao abrir o e-mail, acabei vendo o que Marina havia me enviado me parabenizando por meu ingresso na JUMP. Resolvi reler as mensagens que havíamos trocado na noite anterior. Li atenciosamente e minunciosamente cada uma delas, saboreei cada palavra que ela digitou. Elas me contagiaram de alegria, de carinho...e...e de...paixão!
No meu celular encontrei uma música que me fez pensar em Marina, cada palavra me fazia lembrar ela. Era uma música que eu gostava, e que até ouvia com certa frequência, mas dessa vez eu a ouvi com sentido, agora ela fazia sentido. Fazia todo sentido! Sorri! Sorri pela música, sorri pela imagem dela que havia invadido minha mente e sorri com a lembrança do beijo dela. “Como eu te queria aqui Marina!”
Voltei a música mais umas três vezes, estava tentando absorver cada palavra que Nando Reis cantava em meus ouvidos. Pousei o celular em meu ventre e me concentrei somente na imagem sorridente de Marina bem a minha frente. Parecia tão real e tão palpável aquela imagem.
Estava delirando, em meio a devaneios com ela quando senti alguém depositar um beijo em minha testa. Um beijo suave e delicado. Só podia ser Vick! Abri os olhos e me deparei com uma miragem, só podia ser uma miragem. Assustei-me quando abri os olhos e vi parada alí na minha frente minha chefe, o motivo da minha falta de juízo, dos meus devaneios...Marina Amorim!
-- Como...o que...o que ta fazendo aqui Marina? – consegui perguntar enquanto ela sorria lindamente.
Sentia meu peito subir e descer freneticamente, quase podia sentir meu coração em minha boca. O que estava acontecendo alí?
-- Pela sua cara posso imaginar que não foi nada agradável abrir os olhos e dar de cara comigo bem aqui no meio da sua sala não é mesmo?
-- Claro! – saiu mais exasperado e confuso do que eu queria - Quer dizer, claro que não, é...não é isso. É que por um instante eu achei que tinha poderes sobrenaturais. – me olhou como se não entendesse muita coisa – Em um segundo eu estava pensando em você, e no outro, quando abro os olhos você pareceu se materializar bem aqui na minha frente. – “Nada melhor do que a verdade!”.
-- Quer dizer que estava pensando em mim?
Não consegui mais raciocinar, de minha boca já não saia mais palavra alguma, só conseguia tentar controlar a vontade absurda que me acometeu de abraçá-la, de senti-la nos meus braços como se ela fosse minha, nem que fosse por alguns segundos, minutos.
Ela sussurrou em meu ouvido que sentia minha falta e meu corpo inteiro reagiu, quase tirando mais uma vez a minha capacidade de raciocínio e de fala. Não soube bem definir se aquele estado quase catatônico foi por saber que ela sentia minha falta ou por ouvi-la sussurrar suavemente em ouvido despertando a minha libido. Porém com alguma concentração consegui responder sinceramente que eu também havia sentido a falta dela. E como!
Perto dela eu me sentia tão leve e tão feliz que eu simplesmente não conseguia deixar ou parar de sorrir. E era preciso apenas estar perto dela, nada mais. Isso era tão incrível! Era tão novo e ao mesmo tempo tão bom.
Estávamos ainda abraçadas no meio da sala quando ouvimos um pigarro.
-- Desculpe, não queria atrapalhar vocês.
Victória! Ah, ela ia me contar direitinho essa estória. Como ela faz uma coisa dessas e resolve não me contar nada? Ah, ela ia ver só!
-- Não foi nada. Quer dizer, alguém pode me explicar como Marina e Fernanda acabaram parando bem aqui no meio da minha sala?
Marina eximiu-se de culpa, provavelmente ela também nem sabia que naquele exato momento estaria alí. Vick simplesmente disse que as convidou para o almoço, me fazendo lembrar do que eu havia visto ontem: o beijo trocado por ela e Fernanda.
O corpo de Marina junto ao meu despertava sempre uma sensação incrível em mim, meu corpo parecia queimar, ficava tenso, quente e completamente arrepiado. Era uma corrente elétrica, eram faíscas que saiam sempre que nos aproximávamos.
Vick disse que precisava ir ao mercado comprar o refrigerante que havia esquecido, Fernanda se ofereceu para ir junto. Eu achava a coisa mais fofa as duas juntas, elas combinavam, talvez, quem sabe pudessem se completar. Eu desejava que ambas sentissem pelo menos um décimo do que eu sentia naquele momento.
Marina e eu tivemos um tempinho a sós, o que nos rendeu uma breve conversa sobre meus pais. Ah, como eu sentia saudades daqueles dois! Fazia tanto tempo que eu não os via. Uma pontinha de melancolia me atingiu. Eu morria de vontade de ir vê-los, sentia muita falta dos sorrisos sinceros de meu pai e do colo de minha mãe. Mas. A questão não era a falta de tempo, isso sempre se arruma quando realmente quer, a questão era conciliar tempo e dinheiro. Quando me restava tempo, faltava dinheiro no momento, e assim sucessivamente. Com a minha saída da Amaral, agora me sobrava dinheiro, porém a minha entrada na JUMP me consumia o tempo. Eu teria que dar algum jeito de viajar em uma sexta feira a noite e voltar pelo menos domingo de madrugada, e isso antes da viagem que teria que fazer com Marina. Quem sabe, eu até levasse Marina para conhecer as praias do Ceará.
Às vezes eu tinha a consciência de que eu olhava para Marina de uma maneira nada discreta, que a encarava. Mas era inevitável não olha-la, não admirar a mulher que estava a minha frente. Disfarçar era missão impossível quando uma pessoa lhe encantava de tal forma. O encanto não estava apenas na beleza, era algo bem mais complexo para se explicar com míseras palavras, vinha do coração, da alma.
Confessei que havia adorado a surpresa dela alí na minha frente. Foi realmente uma bela surpresa! Nos beijamos ali no sofá que antes eu “sonhava” com ela. O beijo dela era algo sublime, quase surreal. Despertava tantos sentimentos e sensações em mim que as vezes até parecia que eu explodiria, ou perderia o controle diante de tanta coisa nova que agora habitava meu ser. Meu coração acalmava-se quando ouvia e reconhecia o dela. Piegas, mas aquilo sim era a verdadeira mágica.
-- Meninas o almoço está pronto! – disse Vick lá da cozinha.
-- Vamos? – a chamei estendendo minha mão para ela, não tinha a menor vontade de ficar longe dela.
-- Vamos!
O almoço foi divertido, foi alegre e recheado de risadas. Não parávamos de rir um segundo sequer. Com Vick à mesa era impossível que isso acontecesse. Para a sobremesa eu havia preparado uma torta de prestígio.
Estávamos na sala, comendo nossa sobremesa e Vick parecia estar encarregado do papel de me deixar sem graça e totalmente envergonhada com alguns comentários e elogios que ela fazia. Chata!
Marina estava sentada ao meu lado, e devo dizer que fiquei surpresa quando a vi sentar no carpete de minha sala sem a menor cerimônia. Eu não perdia a oportunidade de olhá-la de soslaio sempre que podia, quando todas estavam rindo totalmente descontraídas era a brecha que eu encontrava para olhá-la sem que ninguém percebesse. Estávamos bem próximas, e isso me permitiu perceber quando o celular em seu bolso vibrou, ouvi o pequeno ruído sabe? Mas notei que ela não deu a menor bola para o aparelho, a história que Vick contava parecia sem muito interessante para ser interrompida. O celular vibrou, vibrou e vibrou até cair na caixa postal. Voltei a atenção para Vick até que Marina sussurrou em meu ouvido que precisava ir ao banheiro.
A levei até o banheiro de meu quarto. Só que estava um tanto quanto insegura. Não sei bem explicar, mas o fato é que Marina não estava acostumada com um apartamento tão simples como o meu, podia apostar que meu quarto era menor que o banheiro dela. Acho que fiquei meio receosa de levá-la ao meu quarto e nesse momento ficar bem evidente pra ela que éramos mesmo de mundos muito diferentes. Bem distantes um do outro! E se ela percebesse que não daríamos certo por esta razão? Medo? Com certeza!
-- Posso colocar em algum lugar? – perguntou se referindo aos objetos que ela havia retirado de seu bolso.
-- Eu seguro. – me prontifiquei.
Ela entrou no banheiro e eu fiquei encarando a porta que nem uma louca. Coisa mais boba não é? Mas é isso mesmo, eu estava me sentindo incrivelmente boba. E o pior, eu me sentia boba o tempo todo depois que beijei aqueles lábios, e tudo piorava quando estava ao lado dela.
Senti o celular dela vibrar em minha mão. Meu corpo inteiro também vibrou, tremeu quando li o nome estampado na tela: Verônica. Senti asco nesse momento. Não atendi, apenas fiquei encarando o celular até que a luz do mesmo se apagasse gradativamente, o que aconteceu para logo depois voltar a vibrar, mas dessa vez era uma mensagem de texto. Era dela, da loira aguada! Não sei bem o que deu em mim, se foi medo, insegurança, desconfiança, curiosidade, não sei, tudo o que sei é que abri a mensagem de texto.
De: Verônica
Para: Marina
“Amor tenho que lhe agradecer pela noite de ontem! Desculpe-me por sair tão tarde de sua casa ontem, provavelmente não dormiu tão bem não é? Eu dormi como um anjo, seu cheiro ainda está no meu corpo, ainda consigo sentir suas mãos passeando por minha pele, seus gemidos ecoam na minha cabeça. Você estava tão entregue! Eu sabia que você não resistiria a mim, fomos feitas uma para a outra, e na cama somos insuperáveis meu amor. Obrigada pela noite maravilhosa de amor!”
Terminei de ler aquela mensagem com os olhos ardendo. Tentei segurar as lágrimas e tentei reprimir meus pensamentos. Então talvez esse fosse o motivo de ontem, apesar de ser tarde ainda ter conseguido falar com Marina, ela realmente não havia dormido. Agora será que o motivo foi aquele que eu lia na tela do celular? Elas haviam tido uma noite de amor...arg...sex*? Não poderia ser! Mas ela confessou-me que já havia tido recaídas. Mas também me prometeu sinceridade. Arg que ódio!
Um segundo tentando reler aquela mensagem foi o suficiente para lembrar do sonho que me fizera acordar na noite passada, nem foi bem um sonho, pelo contrário, foi um pesadelo. Foi parecido com outro pesadelo que eu já tivera, as duas estavam juntas, beijavam-se, e sorriam uma para a outra, riam de mim, da minha cara e depois beijavam-se novamente. Era como se o beijo fosse o selo de um pacto ou coisa parecida. O selo por terem conseguido juntas me enganarem, por terem me feito de idiota.
Ouvi a porta do banheiro ser destrancada, larguei os pertences dela de lado e passei as mãos de forma grosseira em meu rosto tentando limpar ou esconder o rastro molhado e quente de lágrimas. Meu peito estava dividido entre a raiva e talvez a desconfiança, mas tudo sanou, pelo menos parcialmente quando o perfume dela espalhou-se por todo o espaço de meu quarto assim que ela o adentrou. O cheiro gostoso e marcante me fez lembrar de seu sorriso sincero, das lágrimas contidas e da fala abafada no Ibirapuera quando ela confessou estar apaixonada por mim. Tudo aquilo não podia ser mentira, não tinha como ser uma farsa.
-- Giulia? – ela me chamou, mas eu não ousei revelar meu rosto naquele momento ainda de dúvida.
-- Podemos voltar para a sala?
Queria adiar, mas ela não aceitou muito isso, e com carinho e até uma certa preocupação em sua voz quase me desmontaram. Com a insistência veio até o início de uma conversa, ou quase isso. Ela ia começar a me contar algo, mas fomos interrompidas por Fernanda que já anunciava a sua ida. Quando ainda nos despedíamos no quarto tive algo a mais pra acreditar que tudo não podia ser mentira, ela não seria capaz. Ela distribui beijos em minha testa, bochechas e por último em meus lábios. Nesse momento quase tudo, todas as hipóteses, as desconfianças e dúvidas foram pelo ralo, porque tudo o que consegui sentir e pensar se resumia aquele momento, o encontro de nossos lábios.
A deixei na porta e ela despediu-se de mim com um selinho, e eu, com resquícios de frieza. Verônica e sua mensagem vieram mais uma vez em minha cabeça.
Assim que tranquei a porta da sala, sai quase que em disparada de volta para o meu quarto. Tranquei a porta afundei a cabeça em meu travesseiro e me permiti extravasar. Do nada soluços começaram a sacudir meu corpo, o choro havia vindo forte e eu já não conseguia controlar a vontade de chorar. Não sabia mais o que pensar, que conclusão tirar e no que realmente acreditar. Então tudo o que fiz foi apenas chorar, sem pensar em nada, apenas lágrimas e mais lágrimas percorrendo meu rosto.
-- Giulia? – ouvi Vick tentar abrir a porta – Giulia o que houve? Porque a porta está trancada?
Não conseguia falar, não naquele momento. Havia um grande nó em minha garganta, e ele estava tentando sair de uma maneira que quanto mais ele tentava mais eu sentia algumas pontadas em meu coração, como se fossem pequenas alfinetadas. Fui do céu ao inferno em alguns segundos.
-- Giulia me deixa entrar vai, prometo nem falar mais nada, eu fico de bico caladinho, mas preciso te ver. Abre vai.
Reuni forças e fui até a porta destrancando-a. Quando Vick entrou, ela realmente não pronunciou nenhuma palavra, apenas me abraçou com o seu melhor abraço, aquele que fazia eu me sentir melhor em alguns segundos sem importar o tamanho do meu problema ou da minha aflição. Permanecemos alguns minutos paradas alí perto da porta, e aos poucos o choro foi parando.
-- Vem cá! – falou me levando até a minha cama – Eu não sei o que aconteceu, estava tudo bem e agora você está assim...
-- Não consigo falar agora Vick... – disse num sussurro.
-- Não precisa me falar nada pequena, o que eu quero lhe dizer, é que mesmo não sabendo o que aconteceu eu estou aqui – balancei a cabeça sorrindo fraco.
-- Eu sei Vick, você sempre esteve aqui, e eu só preciso concatenar as idéias, pensar um pouco, ou talvez esvaziar a mente.
-- Então vamos fazer o seguinte: deita aqui, eu te faço um carinho, você não precisa falar nada, apenas ficar quietinha aqui. – disse já se deitando em minha cama.
Fiz como ela pediu, deitei-me em seu ombro, fecheis os olhos e respirei fundo tentando esvaziar a minha mente e apenas sentir o carinho que ela me fazia.
-- Promete que não vai me fazer falar nada? – perguntei.
-- Prometo pequena! Não vou pedir ou insistir para que me fale, quando você estiver pronta pra falar eu estarei pronta para ouvir.
-- Obrigada Vick! – agradeci me sentindo um pouco mais serena.
-- Isso você nem precisa agradecer pequena. – disse fazendo um carinho em meus cabelos.
-- Você e a Fernanda, como estão?
-- Na verdade ainda estamos nos conhecendo, temos algumas diferenças, ela é meio esquentadinha, marrenta, é meio grilada com esse papo de diferença de idade e tudo mais...
-- E o que sente em relação a ela?
-- Não quero dar nomes e nem definições, mas desde que a vi pela primeira vez senti um troço diferente sabe? O coração acelerou e depois desacelerou no mesmo segundo. Na hora até achei que fosse por causa do estresse que tava rolando.
-- Posso saber como se conheceram?
-- Ela bateu no meu carro.
-- Quando isso aconteceu?
-- No dia que eu fui dar um jeito no seu carro, e estacionei na vaga dela. Quando ela entrou distraída acabou acertando a traseira do meu carro, coisa leve, mas que a deixou altamente estressada. E mesmo ela quase gritando, com aquela carinha de brava eu a achei a coisa mais linda.
-- Vai investir?
-- Isso é algo que não depende muito de mim pequena, como eu disse ela tem essa coisa de diferença de idade, pra ela importa, pra mim não. Mas eu vou tentar conquista-la, mostrar que eu não sou apenas uma menina, que eu sou mulher de verdade!
-- É isso ai Vick, mostra pra ela quem você é! Tenho certeza que ela vai gamar em você. – ela gargalhou.
-- Não tenho tanta certeza, mas que sabe não dá certo não é mesmo?
-- Vai dar certo. Quem diria que um dia nos interessaríamos na mesma época e ainda mais por duas amigas?
-- Quem diria?
O silêncio voltou a tomar conta de meu quarto, Vick já não falava mais nada, apenas me fazia um cafuné. Ela parecia estar completamente absorta em seus pensamentos. E eu aproveitei aquele silêncio pra esvaziar de vez a minha mente. O fato de eu ter dormido poucas horas começou a trazer as suas conseqüências, meus olhos estavam pesados e ardiam. O sono estava chegando. Abracei a cintura de Vick, e com a cabeça em seu ombro acabei adormecendo.
Acordei com o barulho do interfone tocando de maneira insistente. Olhei para o lado e Vick já não estava mais ao meu lado. “Onde será que ela foi?” – me perguntei mentalmente. O interfone ainda tocava, levantei resignada de minha cama e fui atender o pequeno barulhento.
-- Dona Giulia?
-- Pois não seu Josimar.
-- Tem uma moça aqui na portaria com um monte de mala pedindo autorização pra falar com a senhora, ela diz que é sua amiga.
-- Quem é seu Josimar?
-- Só um minutinho.
“Como é mesmo o nome da senhora?” - Ouvi ele perguntar baixinho o nome da tal moça, e enquanto isso a curiosidade em mim apenas crescia.
-- Dona Giulia?
-- Oi.
-- Ela disse que lhe conhece lá da faculdade, o nome dela é Vanessa.
Vanessa? Como ela sabia onde eu morava? Fazia algum tempo que eu não falava com ela, e além disse eu nunca a levei até meu apartamento, e nem mesmo lhe dei meu endereço.
-- Pode a deixar subir seu Josimar.
-- Tudo bem.
Vanessa era uma colega da faculdade, fizemos algumas disciplinas juntas ela era uma boa pessoa, mas ao mesmo tempo era meio louquinha, ela costumava dizer que toda dor se curava com bebida. Não tínhamos bem uma amizade, por assim dizer, éramos colegas de faculdade, e já havíamos feito alguns trabalhos juntas, mas nunca fomos do tipo que saíamos para um programa de amigas, nossa relação se resumia a faculdade. Algumas vezes até saímos para um barzinho com mais algumas pessoas da turma. Victoria nunca gostou dela, ela costumava dizer que ela era muito soltinha para o gosto dela. Vanessa era hétero, mas Vick sempre insistiu que ela tinha uma queda por mim. Nunca acredite, até porque ela nunca deu indícios pra que eu acreditasse ou suspeitasse disso.
Meus pensamentos foram interrompidos pela campainha, e só ai me dei conta de que eu devia estar toda descabelada, afinal tinha acabado de acordar. Fui até o meu banheiro correndo, prendi meus cabelos em um rabo de cavalo, e voltei até a sala quando a campainha tocava pela segunda vez.
-- Oi Vanessa. – disse abrindo a porta.
-- Oi Giulia. – abraçou-me.
É! Aquilo foi bem esquisito. Não era comum aquele tipo de contato entre a gente quando nos víamos todos os dias, então foi bem estranho receber um abraço assim tão repentino depois de algum tempo sem contato nenhum. Nos separamos e ela ficou me olhando por alguns segundos, até que pareceu perceber o que estava fazendo e resolveu falar.
-- E então, eu posso entrar?
-- Ah sim, pode claro. Entra, pode ficar a vontade.
Sentamos no sofá lado a lado, mas ainda sim com uma distância.
-- Faz tempo que não nos falamos não é? – notei uma certa mágoa em sua voz.
-- É verdade, faz realmente um bom tempo que não nos falamos. Mas como conseguiu me encontrar?
-- Digamos que eu fiz uma coisa que é considerada falta de ética no trabalho. – fez uma pausa e depois continuou – Estou trabalhando na faculdade agora, dei um jeitinho de pegar seu endereço na sua ficha de matricula.
Ok, agora era super esquisito!
-- Agora está explicado. – tentei disfarçar a minha surpresa.
-- Bom, não pense que eu sou louca ou maníaca, é que vai rolar uma festa na casa da Alessandra, não sei se você lembra dela.
-- Lembro, claro que lembro – “Ah sim, claro que lembrava de minha ex”.
-- Então, vão fazer uma festa só para o pessoal da faculdade, os que fizeram pelo menos a disciplina do Bráulio juntos, a disciplina mais difícil de qualquer pessoa e tudo por causa do nosso adorado professor. Na verdade querem reunir o pessoal e a desculpa que acharam foi essa. Alessandra adora uma festa. – disse em tom de deboche - Perdemos contato com a maioria do pessoal, e eu como trabalho lá dentro, fiquei encarregada de conseguir o contato de cada um, e depois disso nos dividimos em quem chamaria quem. E aqui estou eu, fiquei encarregada de lhe convidar, e resolvi fazer isso pessoalmente. E claro, pediram para que eu me certificasse de que realmente você iria, ou seja, não aceitamos um não! Todo mundo estará lá.
-- Nossa! E quando vai acontecer essa festa?
-- Bom, eu acho que você tem mais ou menos duas horas pra se arrumar. – disse olhando o relógio em seu pulso. – A festa começa as 20:00hs.
-- Mas assim não vai dar tempo. Não sei se eu vou.
-- Você não pode deixar de ir, e eu também não.
-- Como assim?
-- Estou de carro, daqui a pouco a festa começa, já estamos pertinho da casa da Alessandra, eu já estou prontíssima, então nada mais justo do que lhe esperar, não custa nada. Vou lhe esperar! – falou com um sorriso largo e convencido.
Só ai olhei para a roupa que ela vestia. Uma jaqueta de couro preta, uma calça escura totalmente colada em seu corpo, uma blusinha branca e em seus pés botas de cano longo.
-- Não sei não!
-- Vamos Giulia, por favor, faz tempo que não nos reunimos, será uma boa oportunidade de rever o pessoal, de matar a saudade. Por favor. – olhou com cara de pidona.
-- Tudo bem, eu vou. Mas, você tem certeza de que vai mesmo me esperar? Não precisa, estou de carro também, daqui a pouquinho chego lá.
-- Eu espero, não tem problema, na volta lhe deixo aqui. Faço questão!
-- Ok então. Fique a vontade, sinta-se em casa.
Ela me lançou um sorriso e eu me encaminhei até meu quarto. A minha vontade de sair naquela noite era mínima, mas talvez valesse o esforço para rever alguns amigos e colegas da faculdade.
Sai do banho pensando em Vick. “Onde ela estaria? Não havia avisado nada!”. Peguei meu celular e não havia nenhuma ligação ou mensagem dela. Nada! Nesse mesmo instante senti vontade de falar com Marina, me senti na obrigação de dizer a ela que estava indo para uma festa. Mas logo depois a vontade foi embora, talvez ela entendesse aquele meu ato como se eu estivesse tentando adiantar as coisas, como se estivesse impondo um relacionamento a ela, onde devíamos explicações e satisfações.
Fiquei indecisa quanto ao que vestir, talvez se minha vontade de ir aquela festa fosse maior não fosse tão difícil e chato escolher uma roupa. Acabei optando pelo preto básico. Um vestido preto, um pouco acima do joelho. Nos pés uma sandália de salto alto também preta. Alguns acessórios dourados, uma maquiagem leve, uma bolsa de mão e...pronto! Estava prontíssima!
Quando cheguei à sala Vanessa tinha um sorriso no rosto enquanto lia algo em seu celular. Acho que nunca havia percebido a beleza dela.
-- Estou pronta!
-- Ah você nem – parou quando olhou para mim, o sorriso que tinha no rosto também havia sumido – Nossa!
-- O que foi?
-- Você está linda!
-- Obrigada. – disse sem jeito.
-- Uau! – disse me olhando dos pés a cabeça e me deixando completamente sem graça.
Ela me olhava de um jeito esquisito, mantinha-se séria, mas seus olhos brilhavam, alguns sorrisos apareciam em seus lábios de maneira repentina, mas desapareciam da mesma forma. O olhar dela estava me deixando constrangia e sem jeito. Nunca tinha percebido um olhar dela daquela maneira, do modo como me olhava.
-- Já podemos ir? – perguntei tentando quebrar aquele clima um tanto quando perturbador.
-- Ah sim, claro! É...é...podemos. – ela parecia sem jeito agora.
Antes de sair do apartamento ainda dei uma última olhada em meu celular, não havia nada, nem sinal de Vick e nem de Marina. As duas pareciam ter resolvido sumir juntas. Bufei consternada e logo depois sorri resolvendo que ia curtir a noite.
Assim que entramos na rua de Alessandra já podíamos ver a enorme fila de carros que se formava perto da entrada de sua casa. Alessandra sempre foi festeira, fazia o tipo popular da faculdade, até hoje acho que eu não era a única mulher na sua vida na época que ficávamos. Ela fazia o tipo cafajeste, que convence com qualquer um com a lábia. Era uma malandra. Linda! Mas nunca senti por ela algo que pudesse ser chamado ou comparado à paixão e muito menos amor. Todos diziam que ela era apaixonada por mim, mas diante do jeito peculiar que ela tinha eu nunca acreditei nisso, e a prova foi que depois que terminamos em menos de uma semana ela já desfilava com outra mulher para cima e para baixo nos corredores da faculdade. Mas o bom de tudo isso foi o carinho que ficou, a amizade que conseguimos manter de maneira saudável.
Vanessa estacionou o carro, desceu e encaminhou-se para o portão da casa, eu ainda fiquei alguns segundos no carro. Acho que me acostumei mal, porque os segundos que fiquei no carro foi esperando pelo gesto gentil de Marina, digo, Vanessa de abrir a porta do carro para mim. Senti falta! Não exatamente do fato de não abrirem a porta do carro pra mim, mas era daquela maneira que eu me sentia especial, não sei dizer os motivos. Senti falta de Marina, do seu sorriso e de seu cheiro que eu sentia quando ela abria a porta do carro. Olhei para Vanessa em pé no portão, e desejei que fosse ela, que fosse Marina. Vanessa acenou para mim e só então desci do carro. Alessandra já estava ao lado dela.
-- Olá Giulia! Você está mais linda do que nunca. – falou com um sorriso cafajeste.
-- Oi Alessandra! – nos cumprimentamos com beijinhos de comadre.
Olhei para Vanessa ao meu lado e vi que ela estava incomodada. Ela sempre ficava assim quando Alessandra e eu ficávamos, era só Alessandra chegar pra ela ficar calada e introspectiva. Nunca entendi. Olhei por cima do ombro de Alessandra e uma mulher loira, se aproximava de nós com um sorriso no rosto. Quando a tal mulher chegou surpreendeu minha ex com um beijo na bochecha, o que foi correspondido com um sorriso enorme e olhos cheios de brilho.
-- Então Giulia, queria te apresentar a Flávia, minha noiva. – sua voz saiu cheia de ternura. Em seus olhos eu podia ver admiração.
Alessandra noiva era quase inacreditável, finalmente ela tinha conhecido alguém capaz de consertar aquele coração bandido. Enfim ela tinha encontrado um amor que aquietasse seu coração. Senti-me feliz por isso, e sem querer acabei pensando em Marina outra vez.
Cumprimentei Flávia contente por Alessandra, se ela estivesse sentindo um pouquinho do que eu já sentia seria perfeito. A loira era uma mulher simpática, tinha o olhar doce, a voz suave e transmitia carinho em seus gestos e olhares. As duas pareciam apaixonadas, verdadeiramente apaixonadas.
Logo as duas saíram abraçadas deixando-me sozinha com Vanessa. Alguns garçons circulavam pela festa e ela não perdeu a oportunidade de pegar a primeira bebida da noite, uma pra ela e uma pra mim. Ela brindou ao início da noite.
O gramado a frente da casa estava repleto de gente, acho que podia dizer que aquela casa estava lotada. Não sei como alguém no mundo pode ter tantos amigos assim. A casa era enorme e mesmo assim faltava espaço por alí. Vi muitos de meus colegas, nos cumprimentamos e conversamos, mas nunca por muito tempo, estavam todos empolgados com o encontro, e queriam falar com todos ou o máximo que podiam.
A música rolava alto, todos dançavam animados, muita gente conversando, outras apenas bebendo e dançando. Alguns homens tentaram me chamar pra dançar, mas recusei educadamente, e cada homem novo mais a cara de Vanessa fechava-se numa expressão de raiva.
Vanessa não saiu do meu lado nem por um segundo sequer, sua mão também não havia ficado vazia por muito tempo, sempre que um garçom passava ela pegava mais uma bebida, uma pra ela e uma pra mim. Eu estava quase chegando ao meu limite, mas mesmo assim ela não parava de me encher de bebida.
Depois de algum tempo dançando no mesmo lugar ouviu-se um murmurinho vindo do portão de entrada, o que dava para o jardim.
-- É a prima da meia irmã da Alessandra.
Ok. Eu nem sabia que Alessandra tinha uma meia irmã. Olhei para o portão quase ficando na ponta dos pés tentando ver que era pessoa capaz de causar aquele burburinho do nada. Tentei, me esforcei, mas nada vi, apenas um amontoado de gente a minha frente.
Desisti quando Vanessa me chamou e ofereceu outro copo de bebida que tinha em suas mãos. Eu não havia ido alí pra ficar bêbada, e sim para me divertir, para rever colegas e amigos, só que Vanessa estava mesmo decidida a me deixar bêbada. Aceitei o copo e prometi mentalmente que aquele seria o último. Minha coordenação motora já não era mais a mesma, minhas pernas já não eram mais tão firmes quanto no momento que eu havia chegado. Tinha desistido de tentar não pensar em Marina, tirei o celular de minha bolsa e vi que tinha uma chamada não atendida dela. Meu coração disparou, comecei a gelar. Como não senti o celular vibrar? Tinha que retornar a ligação.
-- Vanessa eu preciso ir ao banheiro. Onde fica?
-- Vem. Eu te levo.
Saímos na direção do fundo da enorme casa que ficava quase no centro de um amplo terreno completamente coberto com a grama mais verde que já vi. Eu já andava com um pouco de dificuldade, mas ainda sim conseguia seguir Vanessa no meio de toda aquela gente. Chegamos até a área da piscina, que na minha concepção era o lugar mais lotado.
-- Oh, o banheiro fica alí Giulia. – sua voz estava um pouco arrastada.
Olhei para onde ela havia apontado e senti uma ponta de decepção, havia uma grande fila. Talvez o banheiro fosse o lugar mais silencioso dali, e alí eu poderia ligar para Marina.
-- Acho que vou enfrentar. – disse me referindo a enorme fila.
-- Tudo bem, eu espero aqui com você.
Sorri em agradecimento. Olhei para o final da fila e vi que atrás de mim haviam pouquíssimas pessoas. Não demorou muito para que eu conseguisse entrar no banheiro, que mais parecia um vestiário de ginásio. Cheio de boxes e chuveiros. Vanessa havia dito que me esperaria do lado de fora.
Fui direto para um dos boxes, retirei o celular de minha bolsa novamente demonstrando um pouco de ansiedade quando ouvi alguém pronunciar do lado de fora o nome “Marina”.
-- E então, como é que você está com a Marina?
-- Ela é minha!
A voz me parecia conhecida, tentei puxar pela memória, mas nenhum rosto vinha a minha mente.
-- Me explica isso prima!
-- O que estou lhe dizendo é que Marina é minha, e eu sei que ela ainda me quer e me deseja. Nosso amor ainda não morreu.
Apertei meus olhos tentando me lembrar da pessoa que era dona daquela voz. Eu tinha certeza de que conseguiria. Até que um estalo me veio à mente. Era ela!
-- Ai Verônica eu não consigo compreender essa relação que você diz que tem com essa mulher não. Vocês já não terminaram? Como você sempre diz que vocês ainda sentem amor uma pela outra?
-- Ontem fui até o apartamento dela. Fui meio que sem pensar, havia bebido e cedi a vontade de ir vê-la, cheguei lá quase bem tarde e a encontrei de roupão. Você não sabe como o corpo daquela mulher é capaz de mexer comigo. Me sinto molhada só de imaginar.
-- E então, o que foi que aconteceu lá?
-- Não resisti é claro!
-- Vocês trans*ram? – perguntou em um tom mais alto.
-- Infelizmente não. Mas quando cheguei bem perto dela eu senti que o corpo dela reagiu, correspondeu. Ela não conseguiu esconder isso e muito menos o tremor de seu corpo quando a instiguei.
Senti asco nesse momento, uma vontade enorme de vomitar, e ainda não sabia definir se era pela conversa suja que eu ouvia dentro de um banheiro ou se pela bebida que eu havia ingerido. Mas ao mesmo tempo, senti-me aliviada por saber o quão mentirosa havia sido a mensagem que eu lera no celular de Marina. Verônica estava jogando, e eu havia caído no jogo sujo dela, eu quase acreditei no que tinha lido, e duvidei do caráter e da promessa que Marina havia me feito. Como eu fui burra!
-- Mas você acha mesmo que ainda tem alguma chance com ela? Digo de reatar e voltar a namorar?
Nesse momento abri um pouquinho da porta e olhei para as duas que maquiavam-se na frente do grande espelho. As duas eram muito parecidas.
-- Ai Thaís, claro que sim! – disse convencida - Ela acha que está apaixonada, mas eu sei bem que isso é coisa da cabeça dela. Marina não se apaixona por ninguém, se isso fosse possível eu teria conseguido durante todo esse tempo que fiquei com ela.
-- Mas e você...
Ouvi as vozes distanciarem-se, e só ai sai de onde estava. Olhei-me no espelho e vi a imagem de uma pessoa ingênua, boba. Passei um pouco de água em minha nuca, respirei fundo e conclui que precisava conversar com Marina. Nós precisávamos e merecíamos uma conversa. Eu havia sido injusta com ela, e no fundo devia desculpas a ela, afinal eu não fui capaz na promessa que ela me fez de ser sincera. E de qualquer maneira, o diálogo devia vir antes de tudo! Precisava vê-la, e precisava disso agora!
Sai do banheiro apressada, ansiosa, angustiada, afobada...um completo misto de sentimentos. Assim que sai olhei para o local onde havia deixado Vanessa, ela não estava mais lá. Olhei em volta, de um lado para o outro, passando o olhar rápido por aquele amontoado de gente e nem mesmo tinha a capacidade de reconhecer alguém. Minha mente estava turva, as pessoas pareciam estar mais longe do que realmente estavam, o que acabou resultando em alguns esbarrões.
A ansiedade em mim apenas crescia, e quanto mais tempo eu passava ali mais culpava por ter deixado as coisas daquela maneira. Sempre tive medo de deixar as horas, os minutos passarem e chegar a um ponto de não conseguir mais reverter, fazer de uma maneira diferente.
Tentei sair na direção do portão, ou pelo menos tentava me lembrar onde era realmente a direção, aquele lugar era tão grande e tinha tanta gente que ficava meio perdida. E claro, não tem como negar que isso também se devia a quantidade de bebida que eu havia ingerido. Eu não estava bêbada, apenas não tinha mais 100% de minha coordenação e meus sentidos.
Quando já havia desistido de encontrar Vanessa, eis que a encontro aos beijos com uma mulher. Fiquei completamente surpresa, não fazia ideia de que ela ficava com mulheres também. Bom, eu não tinha como esperar, tinha que sair dalí, não podia deixar o tempo passar, precisava falar com Marina, e tinha que ser pessoalmente.
Precisava da Vick. Peguei meu celular e liguei pra ela.
-- Eu preciso da sua ajuda Vick, preciso muito da sua ajuda. – falei assim que ela atendeu tentando disfarçar a minha voz arrastada.
-- Olha só, vou lhe ajudar, mas depois vai ter que me explicar o motivo pelo qual você está me ligando bêbada. Ok?
-- Tudo bem.
-- Pode mandar. Como posso lhe ajudar pequena?
...
-- Como acha que eu vou conseguir isso Giulia? – perguntou em tom de surpresa.
-- Por favor, eu sei que você pode dar um jeito.
Alguns minutos depois recebi uma mensagem de Vick com o que eu havia pedido. Liguei para o número de táxi que tinha em meu celular e mais uma vez fui obrigada a esperar. Sentei em uma mesa vazia que havia encontrado perto do portão de saída para esperar o táxi. Batia os pés impacientemente. Estava a ponto de roer as unhas. Ouvi uma buzina. O táxi havia chego.
Entrei no carro alvoroçada.
-- Para onde moça? – o taxista me perguntou me olhando pelo retrovisor.
-- Por favor, me leve até esse endereço. – disse mostrando a mensagem de Vick em meu celular.
--Tudo bem.
Quando o carro deixou a casa de Alessandra, respirei mais aliviada, afinal já estava a caminho, faltava pouco para encontrar Marina. Encostei a cabeça no vidro do carro, fechei os olhos por alguns segundos e senti um sentimento gostoso me invadir. Algo que eu não conseguia dar nome, mas que foi capaz de preencher meu coração. Um sorriso nasceu em meu rosto.
Sorri quando me dei conta do que eu estava prestes a fazer, era loucura. Chegaria a casa da minha chefe, a qual havia me apaixonado de maneira surpreendente e naturalmente sem avisar ou mesmo ser convidada. Sem falar que pra tudo isso contei com a ajuda da Fernanda, foi ela quem deu o endereço para Vick. Nota mental: Agradecer a Fernanda!
-- Pronto moça, o endereço é este. Chegamos!
-- Obrigada moço.
Paguei a corrida de táxi e sai do carro. Parei na calçada e olhei para a portaria do prédio, sorri de nervoso. O prédio era imponente, era luxuoso. Olhei para o alto dele e quase tive uma vertigem quando cheguei ao último andar. Notei que um porteiro que estava na guarita me olhava, provavelmente esperando que eu dissesse para qual apartamento eu queria que ele interfonasse.
Um vento frio me fez tremer, o tempo estava começando a esfriar. Bateu uma vontade de ir embora, desistir alí mesmo. Mas já havia ido tão longe! Olhei para o porteiro e sorri, porém não falei nada. Peguei meu celular e mandei uma mensagem pra ela. Rezei pra que ela ainda estivesse acordada, que estivesse em casa e que pudesse me receber.
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-- Será que você pode liberar a minha entrada? Acho que precisamos conversar, e aqui está muito frio.
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Mandei e esperei alguns minutos, nada de resposta. Eu encarava o celular quando ouvi a voz dela. Era melodia.
-- Giulia? – chamou-me quando ainda aproximava-se do pequeno portão de entrada.
Olhei para ela e minha boca ficou completamente seca, e pra variar meu coração acelerou no mesmo instante.
-- O que está fazendo aqui? – perguntou quando já abria o portão.
Fiquei completamente sem graça. O que diria? Eu não havia pensando em nada, o que eu ia dizer, como ia justificar estar plantada no portão dela tarde da noite. O que eu diria? “A verdade!” – disse meu subconsciente.
-- Eu precisava falar com você... – quase sussurrei.
-- Mas...
-- Eu precisava falar com você pessoalmente. Me desculpe, eu sei que é tarde, apareci aqui na porta do seu prédio sem avisar, sem mais nem menos, eu sei que devo estar lhe incomodando, foi inoportuno...
-- Ei! Calma! – ela pediu de maneira suave.
-- Eu acho que vou embora.
-- Não! É...quer dizer...não precisa ir embora, você veio falar comigo. – disse um pouco alvoroçada.
Meu corpo sucumbiu ao frio, mais um vento daqueles que fez meu corpo tremer. Foi inevitável. E para o meu completo azar ela havia percebido e me olhou com uma cara de preocupada.
-- Vem me deixa te tirar desse frio. – disse passando o braço pelos meus ombros. – Nossa! Você está gelada Giulia!
Pronto, foi só ela encostar. Só bastou o breve contato de nossos corpos para que o meu esquentasse, nem parecia que segundos atrás eu estava tremendo de frio. O cheiro tão característico dela chegou até mim, era tão gostoso. Parei e pensei que eu devia estar fedendo a bebida. Quase me encolhi de vergonha. Eu realmente não havia pensando em nada quando decidi de uma hora para outra bater na casa dela.
Me deixei ser levada por Marina, quando entramos no elevador ela ainda mantinha seu braço por cima de meus ombros, me mantendo perto dela, dividindo o calor de seu corpo comigo. Nem me importei com a câmera daquele pequeno espaço, nem mesmo com a provável pessoa que nos assistia naquele momento. Tudo o que me importava naquele momento estava alí, era tudo o que eu precisada, Marina! Fechei os olhos e senti o momento, só voltei a abri-los quando senti o elevador parar. 7º andar!
-- Está tudo bem? Está precisando de algo? – perguntou-me assim que entramos em seu apartamento.
-- Estou bem.
-- Espera só um minutinho?
Balancei a cabeça concordando e ela logo saiu me deixando sozinha na sala. Olhei tudo em volta, com certa curiosidade, mas também com admiração. Tudo era luxuoso. A sala estava à meia luz, o ar condicionado estava ligado, mas não estava tão frio, estava agradável. O piso daquela sala era de mármore, daqueles mais reluzentes. Puro luxo! Tão diferente do apartamento que ela esteve hoje de manhã.
-- Prontinho! – disse me assustando quando colocou um casaco em meus ombros. – Assim você vai ficar mais quentinha. – disse sorrindo docemente.
-- Obrigada. – sorri de volta e senti meu corpo arrepiar quando senti o perfume dela que vinha daquele casaco.
Quase fechei os olhos.
-- Vem, senta aqui.
Sentei ao seu lado no sofá. A olhei e senti meu corpo ficar tenso. Ela vestia apenas um pijama, um curto pijama de algodão. Engoli a seco, desviei o olhar tentando disfarçar o desejo que ela acabara de despertar em mim, mas mesmo não olhando eu ainda o sentia. Ainda sentia um enorme desejo no corpo dela, uma enorme vontade de sentir o quão macia era aquela pele. Foi inevitável sentir uma certa umidade no meio de minhas pernas, e isso me deixou constrangida.
-- Giulia? – chamou-me aproximando-se mais no sofá. – Acho que precisamos conversar.
-- Sim, nós precisamos. – admiti.
Ficamos nos olhando enquanto o silêncio preenchia o espaço daquela enorme sala. Olhávamo-nos sem nada dizer, tudo era apenas silencio até que ela falou.
-- Ontem aconteceu algo que eu preciso lhe contar. Preciso falar antes que isso me sufoque. – vi que em seus olhos havia aflição.
Engoli a seco e tentei me concentrar no que tinha ouvido a pouco tempo no banheiro da casa de Alessandra. Não havia acontecido nada entre elas. Nada! A olhei de uma maneira que ela entendesse que tinha minha atenção e continuasse a falar.
-- Verônica esteve aqui ontem. Ela parecia meio bêbada, consegui sentir o cheiro de álcool. Ela tentou algo, mas eu não deixei, a mandei embora. É...é eu não ia lhe esconder isso, eu ia lhe contar, só não tinha encontrado a oportunidade. E eu sei o verdadeiro motivo pelo qual você estava chorando hoje cedo, eu sei que você leu aquela mensagem no meu celular, mas eu queria lhe dizer que... – falava atropelado e sem pausas até que eu a interrompi.
-- Eu sei de tudo. – a interrompi.
-- Sabe? – seu semblante alterou-se para um assustado.
-- Sei! Eu sei que ela estava mentindo naquela mensagem, e nem importa como fiquei sabendo, o que importa é apenas que eu sei, e que eu deveria ter sabido desde o início, eu devia ter acreditado em você antes de qualquer coisa. Você prometeu! – meus olhos ficaram úmidos.
-- Prometi, e eu jamais faria algo que fosse capaz de colocar em risco a confiança que você tem em mim, muito menos o que ainda está apenas no início.
-- Me desculpe Marina. – pedi sincera abaixando o olhar.
-- Por qual motivo me pede desculpa?
-- Porque eu quase cheguei a acreditar outra vez que você e ela estavam me fazendo de boba. Acabei lhe julgando e acreditando em palavras falsas. – uma lágrima solitária desceu por meu rosto.
-- Ei! Você não pode chorar. – ela me abraçou e eu me entreguei aquele abraço. – Acredite que eu jamais faria isso com você Giulia. Eu jamais faria algo proposital para lhe magoar, lhe ferir. Verônica e eu jamais acontecerá novamente, isso eu lhe prometo, e não é uma promessa de me manter longe, de resistir a tentação, a questão é que não quero mais ninguém, eu não preciso.
As palavras dela fizeram com que eu me sentisse mais culpada. Como eu duvidei? Como pude cogitar que aquilo que eu lia era mesmo verdade? Ao mesmo tempo que aquelas palavras pesaram me fazendo sentir culpa, também acalentaram meu coração. Ela se importava comigo, e não faria algo para me magoar. Eu tinha que aprender e confiar que agora estávamos construindo algo nosso, e que Verônica não fazia parte disso, jamais faria.
-- Vamos fazer um acordo. – disse com a voz chorosa e os lábios quase encostados em seu pescoço.
-- Qual?
-- Vamos combinar que antes de qualquer situação, seja qual for ela, vamos sempre conversar primeiro. Seja como for vamos nos dar a chance de dialogar, acho que a melhor saída para qualquer tipo de relacionamento é o diálogo. Então sempre vamos nos permitir isso, mesmo que fatos digam o contrário vamos permitir que cada uma conte o seu lado e sua versão antes de qualquer acusação ou julgamento. Pode ser?
-- Acordo fechado! Conversar antes de qualquer coisa.
-- Isso! – sorri.
Parei por um instante e pensei o quanto eu havia sido injusta, por pouca coisa, por quase nada eu não havia colocado um ponto final no que Marina e eu estávamos vivendo. Nunca fui assim, sempre procurei conversar antes de qualquer coisa, e com ela, justo com ela eu havia feito diferente. Isso não poderia acontecer novamente, jamais! Eu tinha que tomar cuidado com Verônica, ela parecia estar gostando muito do jogo de mentira e persuasão dela, e não dava nenhum indício que isso chegaria ao fim tão logo.
-- Giulia? – chamou-me após meus pensamentos transformarem tudo em silêncio.
-- Oi? – disse sem tirar a cabeça da curva de seu pescoço.
-- Eu estou muito apaixonada por você, como jamais estive por qualquer outra pessoa na minha vida. Todas as palavras que eu busco pra lhe dizer o que sinto são pequenas, são míseras e simples demais. Incapazes. Você chegou e já se tornou tão importante pra mim...tão essencial.
Não respondi, apenas procurei seus lábios doces. Um beijo suave me encheu de paz, havíamos acertado as coisas, fora tudo um engano, um desencontro e um jogo de mentiras que Verônica estava adorando jogar. As palavras de Marina sempre conseguiam me emocionar, me calar. Eu também sentia tudo aquilo, eu também sentia que ela era importante pra mim, e tinha consciência de que havia me apaixonada em pouquíssimo tempo, mas era como se eu estivesse apaixonada por ela há muito tempo. Era tão forte e tão avassalador.
-- Eu também estou muito apaixonada por você Marina! Eu estou muito apaixonada por você, irremediavelmente.
Olhamos-nos e sorrimos, não só com os lábios, mas também com os olhos, em uma sintonia perfeita. Os corações falavam tudo, nenhuma palavra precisava ser dita quando nossos olhos se encontravam. Eu estremecia, eu gelava, eu me apaixonada cada vez mais.
-- Dorme comigo essa noite? – perguntou me surpreendendo.
-- Oi?
Acho que a cara que fiz era de completo espanto. Como assim dormir com ela? Será que...
-- Dormir, só dormir. Se quiser nem precisa dormir na mesma cama comigo, você pode dormir no quarto de hóspedes, só quero que durma aqui comigo. Eu quero acordar e ter a certeza de que vou encontrar a mulher mais linda desse mundo aqui, comigo e bem ao alcance. Além do mais, está tarde, eu não vou deixar você ir pra casa uma hora dessas. – Mas eu posso chamar um táxi - Nem mesmo de táxi! – disse lendo meus pensamentos.
Um táxi resolveria a situação oras.
Sorri sentindo minhas bochechas arderem, provavelmente vermelhas. Não sabia se dormir alí era realmente uma boa ideia, minha razão dizia que eu deviria ir embora, que era a melhor ideia e o melhor a se fazer. Mas meu coração não concordava com isso, eu queria mesmo dormir com ela, e de preferência na mesma cama. Mas era só dormir mesmo, seria perfeito dormir sentindo o cheiro e o calor do corpo dela.
-- O que me diz?
-- Não vou incomodar?
-- De maneira nenhuma Giulia, eu vou adorar.
Dane-se! Quando o assunto era Marina meu coração sempre vencia mesmo.
-- Tudo bem. Eu durmo aqui...
Ela levantou-se repentinamente entusiasmada. O sorriso em seu rosto era lindo, capaz de me derreter por inteiro. Tenho certeza de que faria qualquer coisa para ver aquele sorriso sempre.
-- Vou arrumar o quarto pra você, pegar roupas limpas e...está com fome? – atropelava as palavras outra vez.
Sorri e admiti que sim.
-- Espera só um instantinho. – falou e voltou a sair da sala.
Fiquei sentada no sofá enquanto via Marina ir e voltar algumas vezes desaparecendo no enorme corredor. Nas vezes que ela passava por mim eu não conseguia segurar, ela passava e meus olhos passeavam por suas pernas, suas curvas perfeitas e instigantes. Meu pensamento não ajudava nem um pouco, e minha imaginação muito menos. Não tinha conseguido reparar, então imaginava que talvez ela estivesse sem sutiã. – Para! Você não pode ficar pensando essas coisas! - Corei com isso, e novamente senti uma umidade, meu corpo ficou quente. Eu precisava de um banho.
Estava tão distraída tentando inibir meus pensamentos e minha imaginação que nem vi quando Marina pôs em cima da mesa de centro à frente do sofá um sanduíche e um copo de suco.
-- Bom, eu não sou tão boa na cozinha como você, mas sanduíche é a minha especialidade. Espero que goste, mas pode ser sincera se não gostar, não tem problema.
Ela tinha que sorrir sempre daquela maneira?
-- Obrigada Marina. Não queria te incomodar, você deve estar com sono, e eu aqui lhe atrapalhando.
-- Não é nenhum incomodo, e pra ser bem sincera, eu não conseguiria dormir se não conseguisse falar com você.
Já devo ter dito que sofro de arritmia cardíaca, mas Marina não sabia disso, e quando ela me falava coisas do tipo eu sempre lembrava que eu sofria desse pequeno problema. Por falar nesse problema, eu fui completamente irresponsável, havia bebido, mesmo estando terminantemente proibida. Mas até que estava tudo sob controle, não foi nada tão excessivo. Não queria nem imaginar os sermões que Vick me daria.
-- Eu acho que estava preocupada com você. Você não atendia o seu celular...
-- Me desculpe, eu havia ido para uma festa.
A olhei e percebi que ela havia ficado incomodada com o que falei. Claro que sim, eu também ficaria se soubesse que ela tinha ido para uma festa, que tinha bebido...enfim!
-- Esse sanduíche está uma delícia. – disse assim que mordi tentando desviar a atenção dela do assunto anterior.
Mas o sanduíche estava uma delicia mesmo, divino!
-- Eu disse que era a minha especialidade. – sorriu satisfeita.
-- Nossa! – disse saboreando mais um pedaço. – Onde aprendeu a fazer sanduíches assim?
-- Fiz um curso rápido de culinária em Paris.
-- Ah!
Eu terminei de lanchar em silêncio, apenas saboreando enquanto ela me olhava atentamente com um pequeno sorriso em seus lábios. Fiquei um pouco constrangida, mas sempre que podia também devolvia o olhar, sempre tentando não deixar o olhar descer até as suas pernas torneadas e alvas.
-- Preparei o quarto de hóspedes pra você, tem toalhas limpas no armário do banheiro. Também deixei uma roupa confortável pra você em cima da cama, e ah, uma peça íntima também. Não se preocupe, eu nunca usei. – brincou.
-- Posso tomar um banho?
-- Claro! Vem, eu te levo até lá.
Só quando saí da sala daquele apartamento foi que eu percebi o quanto ele era grande, quer dizer enorme! O corredor era grande e estava a meia luz, de cada lado havia no mínimo umas 5 portas.
-- Seu apartamento é lindo! – disse maravilhada.
-- Obrigada. Mas ele não é meu, é dos meus pais, eles insistiram para que eu morasse aqui para não mantê-lo fechado. Eles abominam a idéia de colocar o imóvel para alugar, dizem que deteriorariam o apartamento. Como eles moram no Rio de Janeiro, se eu não viesse morar aqui não teria outro jeito a não ser deixa-lo fechado. Mas digamos que eu não sinto que ele seja o meu lar, é tudo tão grandioso, tudo tão cheio de luxo e requinte que nem se parece comigo. Acho que tudo aqui tem mais a cara deles do que a minha.
-- E o que precisaria para se parecer com você?
Estávamos paradas no meio do corredor conversando, foi engraçado olhar para os lados e ver onde realmente estávamos. A conversa surgia tão fácil que vinha até em lugares não tão adequados assim.
-- Bom, - ela começou e parou por uns instantes como se estivesse vivendo uma cena a sua frente – Não gosto de tudo isso aqui, - disse abrindo os braços – Acho que eu amaria viver em uma casa de campo, ou uma casa grande para crianças, com uma churrasqueira para receber os amigos em um final de semana, com grama para o cachorro correr livre, uma piscina para refrescar em uma noite quente de domingo. Eu queria algo simples, que me lembrasse um pouco da casa dos meus avós. – sorriu melancólica.
-- Trocaria tudo?
-- Sem sombra de dúvidas. No fundo eu sou uma pessoa simples, e gosto das coisas simples. – voltamos a andar para o final do corredor.
-- Acho que por isso gostou de mim. – brinquei.
-- Você não está nem perto de um simples. – sorriu – É aqui, ficará neste quarto essa noite. Se precisar de algo não hesite em me chamar. Meu quarto é este aqui – disse apontando para a porta do outro lado do corredor – Vou deixar a porta aberta, então se precisar de algo pode me chamar.
-- Obrigada Marina!
-- Não precisa me agradecer, eu que me sinto lisonjeada por ter você aqui comigo. – disse e selou nossos lábios em um selinho demorado.
-- Boa noite.
-- Boa noite. – disse olhando em meus olhos.
Entrei no quarto e fechei a porta atrás de mim. Acho que nunca conseguiria me acostumar com todos aqueles sentimentos novos. Tudo era novo pra mim, todos os sentimentos e sensações. Ninguém jamais chegou perto de despertar tudo o que ela despertou em mim. Foi tudo tão natural, tão simples e singelo, não precisou de esforço algum, simplesmente aconteceu.
Nem preciso dizer que o quarto era enorme, a cama então nem se fala. Deixei minha bolsa em cima da cama e vi a roupa que Marina havia separado pra mim. Como em tudo alí, a camisola preta de seda tinha seu cheiro. Olhei a peça em minhas mãos e senti um tremor percorrer meu corpo. Era tesão. Imaginei-a vestida com aquela pequena peça quase transparente. Também havia uma calcinha preta junto à camisola. O desejo estava a mil, estava sedenta pra tocar a pele dela, para que meus lábios passeassem por todo o seu corpo. Meu corpo ardia de desejo. Por outro lado senti minhas bochechas arderem, com certeza elas estavam coradas só por me imaginar vestindo aquilo. Será que aquela peça talvez fosse um sinal verde? Não! Precisava tirar isso da minha cabeça ou o desejo me consumiria.
Banho. Eu precisava de um banho. E agora! Tomei um banho relaxante, que pareceu tirar de meus ombros toneladas que eu carregava desde cedo. O banho também levou embora os vestígios de uma noite regada a bebida alcoólica, que por sinal ainda me sentia mal por isso, não devia ter bebido. Vanessa realmente resolvia tudo com bebida, mas eu, eu não era assim!
Vesti a camisola e corri para o enorme espelho que havia no banheiro. Gostei do que vi, a camisola era linda e ficou bem em meu corpo. Não sou daquelas pessoas que ficam admirando-se no reflexo do espelho, mas eu realmente havia gostado do que via naquele reflexo. Ela valorizada meu corpo, meus seios ficavam quase a mostra, e minha calcinha era visível. Será que Marina havia me dado uma camisola tão sensual com algum intuito?
Deitei na cama de lençóis macios e fechei os olhos. Tentei dormir, mas simplesmente não conseguia, sentia uma enorme vontade de Marina. Virei na cama de um lado para o outro, o sono não chegava, eu estava inquieta, ansiosa. Coloquei a cabeça debaixo do travesseiro e suspirei fortemente. Ai que droga! Nada surtia efeito.
Olhei para a porta e vi que alguma luz estava acesa do lado de fora, talvez fosse do quarto de Marina. Sentei na cama e fiquei olhando por debaixo da porta. Ouvi passos e depois uma porta ser trancada, a luz apagou-se na mesma hora, era do quarto dela. Imaginar Marina tão pertinho estava tirando o meu juízo, a minha vontade era de ir até lá. Deitei novamente na tentativa de deter meus desejos, eu não podia ir até o quarto dela. Suspirei! Não ia conseguir. Levantei novamente, fui até o banheiro e passei um pouco de água em minha nuca. Do banheiro vi que a luz do quarto dela voltou a ascender, ela também não conseguia dormir. Joguei tudo para o alto e decidi ir até o quarto dela de uma vez por todas.
Sai de meu quarto e vi que dentro do quarto dela havia uma luz fraquinha acesa. Mas ainda sim era sinal de que ela estava acordada. Parei a frente do quarto dela, e hesitei em bater. Comecei a soar frio e mesmo assim sentir calor em meu corpo. Suspirei algumas vezes e dei uma leve batida, ela não respondeu. Suspirei novamente, dessa vez mais pesado, coloquei a mão na maçaneta e girei lentamente. Adentrei o quarto na ponta dos pés, quando a vi ela estava sentada, encostada na cabeceira. Usava um óculos de leitura e tinha um livro em suas mãos. Mas o que mais me chamou atenção foi a roupa que ela usava, não era mais o pijama que eu tinha visto, era uma camisola assim como a minha, porém vermelha, contrastando com sua pele alva. Sem intenção levei meu olhar até seus seios. Ela só podia estar querendo brincar comigo.
Fiquei parada alí perto da porta admirando aquela mulher que estava mexendo com todos os meus sentidos. Aquilo era uma tortura! Ela estava tão sexy, tão linda. Meu coração já batia sem nenhum ritmo, batia feito louco, sentia que algumas batidas falhavam.
-- Giulia? – falou baixinho assim que notou minha presença.
Não respondi nada, apenas me deixei levar pelo instinto, pelo desejo. Eu estava sedenta por ela. Aproximei-me a passos firmes, tentei olha-la de uma maneira que deixasse explicito o quanto eu a desejava. Tentei provoca-la assim como a imagem dela estava me provocando. Ela me olhava fixamente, o livro já não estava mais em suas mãos, e sim ao seu lado, completamente jogado e esquecido. Sua boca estava levemente aberta.
-- Você fica linda de óculos. – quase sussurrei.
Notei que ela segurava a respiração e seus olhos não saiam de mim. Sentei-me sobre suas penas que estavam esticadas a sua frente.
-- Preciso de você. – falei tirando seus óculos e olhando em seus olhos.
-- Não mais do que eu. - Sussurrou.
Marina me beijou com volúpia, um beijo fugaz e exigente. Completamente sensual e que incendiou de vez o meu corpo. Suas mãos seguravam firmemente minha cintura, as minhas já estavam enroscadas em seu cabelo sedoso. Estávamos ofegantes, e ainda nem havíamos tocado o corpo uma da outra. Nossas línguas tocavam-se em uma sincronia perfeita.
Marina puxou meu cabelo para trás e eu gemi com isso. Meu pescoço ficou livre, e ela não demorou em distribuir beijos e pequenas mordidas por toda sua extensão. Sua língua passeava deixando um rastro molhado, quente e gostoso. Meu corpo inteiro ficou arrepiado e comecei a rebol*r lentamente em seu colo.
Ela olhou em meus olhos e eu pude ver um brilho diferente neles, um brilho de desejo. Ela também me desejava assim como eu a desejava. Sua expressão estava diferente. Minhas mãos estavam em seu pescoço, arranhavam sua nuca, eu sentia os seus pelinhos arrepiados.
Lançou-me um olhar mais intenso, mordendo o canto da boca e deslizou as alças de minha camisola, exibindo meus seios que naquele momento também deixavam transparecer o quanto eu estava excitada, estavam eriçados. Marina não tardou em cobri-los com suas mãos. Queimaram minha pele assim que encostaram. Sufoquei um gemido. Ela os apertava com firmeza, massageava tirando toda a minha lucidez. Eu não conseguia parar com o movimento de vai e vem em seu colo.
Marina voltou a deixar rastros molhados em meu pescoço e foi descendo por meus ombros, até chegar a meus seios. Puxei firmemente seus cabelos a fazendo gem*r quando senti sua boca sobre meu seio. Ela ch*pava, sugava e mordiscava enquanto sua outra mão massageava e dava toda atenção ao bico de meu outro seio.
Arranhei suas costas por baixo da camisola, dessa vez já não me importava, eu gemia sem pudor, dando vazão aquele desejo. Gemia alto, gemia rouco, gemia seu nome...
De repente já não estava mais sentada em seu colo, minhas costas haviam encostado o colchão macio. Tirou minha camisola me deixando apenas de calcinha. Marina ficou de joelhos a minha frente, me olhava com um misto de desejo e admiração. Deitou-se sobre meu corpo mantendo uma de suas pernas no meio das minhas, tocando minha intimidade, onde ela friccionava me fazer suspirar e gem*r ao mesmo tempo. Sua língua passeava com maestria do meu pescoço até meu umbigo. Nem preciso dizer que minha pele queimava.
Do nada ela friccionou mais forte e eu gemi mais alto. Ela me lançou um sorriso cafajeste e eu adorei aquele sorriso.
-- Você é tão linda! – sussurrou com a voz rouca em meu ouvido.
Ela desceu beijando meu corpo até chegar a minha virilha, onde distribuiu mais beijos e mordiscadas. Eu estava indo a loucura, era como uma tortura não senti-la de uma vez por todas.
Olhando em meus olhos, com uma cara totalmente sedutora ela começou a deslizar minha calcinha por minhas pernas, sem quebrar o contato de nossos olhos. Eu mordia o canto da boca em sinal de ansiedade. Minha calcinha foi parar em um quanto qualquer do quarto, e os dedos ágeis dela tocaram meu sex*, me fazendo suspirar e arquear o corpo. Seus dedos moviam-se de baixo para cima, e de cima para baixo. Eu estava completamente molhada, e isso não passou despercebido por ela claro. Ela gem*u assim que constatou o quanto eu estava molhada, aquele gemido mexeu comigo, me excitando ainda mais se é que isso era possível.
Seus movimentos em meu clit*ris passaram a ser circulares, hora lentos e hora mais firmes e veloz. Eu me dividia entre segurar os lençóis de seda e seus cabelos. Meu corpo já se contorcia, meu peito subia e descia rapidamente, minha respiração nem de perto era normal. O orgasmo estava perto, bem próximo, até que ela parou do nada, voltou a me olhar com aquele sorriso e aquele olhar. Ela deitou-se no meio de minhas pernas as afastou lentamente, suspirei quando senti seu hálito quente bem próximo ao meu sex*, e puxei seus cabelos quando sua língua tocou meu clit*ris intumescido. Delirei quando sua língua começou a mover-se. Sem consegui controlar meu corpo e suas reações comecei a mover meu quadril de encontro a sua boca. Sua língua descia, subia, entrava e saia. Sugava e ch*pava. O orgasmo estava bem próximo novamente, meu corpo estava quase sucumbido e para me enlouquecer mais ainda ela penetrou-me sem parar de sugar...suas mãos me seguravam firme, me dando aquela sensação de estar submissa, totalmente entregue! Seus dedos moviam-se rápido dentro de mim e me faziam gem*r cada vez mais alto, como nunca antes. Suspirei, gemi, puxei seus cabelos e chamei seu nome quando explodi num orgasmo maravilhoso.
Meu corpo suado demonstrava o tamanho do prazer. Mantive meus olhos fechados enquanto tentava acalmar minha respiração. Senti seus dedos saírem lentamente de dentro de mim.
Um sorriso nasceu em meus lábios. Selávamos a nossa paixão.
Fim do capítulo
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