Capítulo 12 - Marina -
- Marina -
-- Marina, eu preciso...opa! Desculpa eu não sabia...eu, me desculpa por entrar assim. - era Pablo que entrava em minha sala com a sua velha mania de entrar sem bater.
Juro que por muito pouco eu não voei no pescoço de Pablo e o esganei. Como ele podia entrar em minha sala daquele jeito? Não adiantava falar, pedir, implorar pra que ele só entrasse quando batesse na porta. Por mais que ela estivesse aberta, não custava nada bater antes. Aposto que ele fazia pra me irritar, ele costumava dizer “Sua tirania não cai sobre mim Doutora Presidente!”. Por mais que estivesse um tanto quanto irritada por ter sido interrompida, estava tão feliz que eu não conseguia parar de sorrir. Um sentimento muito grande começou a me invadir no momento em que eu comecei a falar tudo o que sentia pra ela, quando expus toda a minha fragilidade e fiquei vulnerável, bem alí na sua frente, correndo o risco de ser rejeitada. Bem diferente do que eu pude imaginar ou do que pude esperar ouvir por parte dela, tudo o que ouvi foi o silêncio. O silêncio de nosso beijo. Era incrível sentir os lábios dela, o beijo era delicioso. Chegada a delirar naqueles lábios, e tudo o que eu menos queria era sair de seus braços. Ok, eu não conseguia parar de sorrir, Pablo já devia estar pensando absurdos, além de estar rindo de minha cara.
-- Como sabia que eu já estava na agência Pablo? - perguntei pra quebrar aquele silêncio.
-- Ei vi o seu carro lá embaixo. Preciso resolver logo isso com você.
Eu estava desconhecendo Pablo, desde de que ele entrou em minha sala e me pegou aos beijos com Giulia que ele não conseguia nos encarar, mantinha a cabeça baixa e falava comigo dessa maneira. Logo ele que sempre arrumava um jeito de fazer graça com em qualquer situação.
-- Ok, pode sentar-se.
-- Eu posso voltar depois.
-- Não precisa Pablo, podemos resolver agora. Sente-se. - disse sorrindo.
Eu olhava diretamente para Pablo, mas de soslaio eu olhava por alguns segundos Giulia que estava ao meu lado. Envergonhada, e levemente ruborizada, era assim que ela estava. Meu coração batia tranquilo em meu peito, em perfeita paz. Eu estava feliz, estava feliz por Pablo ter me pego aos beijos com Giulia, porque era assim que eu queria estar com ela sempre que a via, aos beijos, e eu não me importaria e nem pensaria duas vezes em beijá-la na frente dele, ou de qualquer um dos meus amigos. Ele não podia ter me pego em uma melhor situação. Era tudo bom demais!
Pablo sentou-se a nossa frente abrindo o seu paletó cinza e cruzando as pernas, logo depois veio aquele sorriso que eu sabia muito bem o que significava. O Pablo “cara de pau” estava de volta! Pra mim era esse o significado, apenas isso, já para outras mulheres se derreteriam diante dele. O sorriso dele era infalível, literalmente abria portar, e ele sabia aproveitar-se disso.
-- Bom já que invadi a sala e peguei vocês em uma situação inusitada vou resolver logo isso. E bom dia e nem vou dar porque pelo que vejo a manhã de vocês está sendo ótima. - entrelacei meus dedos ao dela e sorri para ela. “Isso é mesmo realidade!”
-- Deixa de enrolar Pablo. - voltei minha atenção para ele.
Pablo me olhou de um jeito que fiquei na dúvida se ele estava me recriminando ou me parabenizando. Ele olhou para mim e em seguida olhou para ela balançando a cabeça de um lado para o outro. Era uma negativa, só não sabia se era uma ironia ou era sério. Segundos depois ele continuou.
-- Tá certo, vou direto ao assunto. Uma das empresas que estamos representando quebrou o contrato conosco. E sabe-se lá por qual motivo eles nos processaram por danos morais. Vi toda uma defesa com o advogado da agência, e ele me sugeriu que conversasse com os outros sócios. Já falei com Juliano e já tenho uma resposta por parte dele. Então, a pergunta é: caso precise, entraremos em acordo?
Nunca gostei da ideia de dificultar a vida de alguém somente para o meu bem, eu era a favor de que as coisas fossem resolvidas da melhor maneira para ambos os envolvidos. Porém eu não estava apar de toda a situação, Pablo sim, e eu confiava completamente em meu amigo.
-- Pablo eu não sei bem o que está acontecendo e por qual motivo eles estão nos processando ou até mesmo o que gerou a quebra de contrato. Sou a favor que tudo se resolva da melhor maneira. E como você é o que está mais a par da situação, eu te dou o livre arbítrio pra resolver isso, sei que você saberá discernir o que for melhor para as duas partes.
-- Obrigada pela confiança!
-- Eu conheço os meus sócios e ainda mais os meus amigos. - sorri.
-- Sendo assim se for preciso entrarei em acordo com eles, mas apenas se as duas partes saírem ilesas e sem serem prejudicadas. Mas não tomarei nenhuma decisão sem o seu conhecimento.
-- Tudo bem.
-- Primeiro assunto resolvido! Agora...será que eu posso saber o que estava acontecendo dentro dessa sala? - ele perguntou com o seu olhar mais sério, especulador.
Pablo perguntou e eu fiquei na dúvida se devia falar ou não, por mim eu falaria. Diria que eu estou me apaixonando por aquela mulher linda ao meu lado, diria que pedi uma chance pra nos conhecermos e diria que estou disposta a tudo pra que ela nos dê realmente uma chance, para tentarmos. Mas Giulia também estava envolvida, e eu não queria tomar a sua frente e contar o que me entusiasmava sem que ela concordasse ou me permitisse. Eu não sabia ainda o que se passava em sua cabeça com relação a nós duas, se era vergonhoso estar com uma mulher mais velha, o que ela pensava do que todos na agência diriam com certeza ao descobrir nosso envolvimento. Eu nada sabia. Apertei a sua mão como um pedido de permissão pra falar, eu entenderia se ela preferisse não falar nada. Mas como resposta veio um aperto.
-- Um beijo oras. - tentei brincar.
-- Isso eu vi! O que eu quero saber é como isso aconteceu espertinha.
-- Estamos nos conhecendo Pablo. - eu disse e não consegui ficar quieta, a puxei para mais perto de mim, ficando quase colada. Confirmando o que eu havia dito.
-- Isso é maravilhoso! Que bom Marina. Meus parabéns as duas. E Giulia – disse olhando para ela – muito obrigada por tirar esse mulher de seu casulo de proteção. Eu desejo tudo de bom pre vocês duas.
Era só o que me faltava, alguém agradecer diretamente a pessoa que era motivo do meu sorriso e felicidade por tal coisa!
-- Muito obrigada Pablo – ela disse e eu não consegui deixar de sorrir.
-- Mas Marina acho que você tem que resolver um probleminha antes não?
Engoli a seco, parecia descer por minha garganta milhares de cacos de vidro. Desceu cortando minha garganta. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde Pablo falaria algo do tipo, mas eu rezava, pedia aos céus que eu conseguisse conversar com ele antes que ele falasse algo como o que acabou de falar. Eu sabia muito bem qual era o “probleminha” a qual ele se referia. Era de Verônica que ele falava. Desde que a minha estória com Verônica tinha chegado ao fim e ela passou a atormentar a minha vida que Pablo me dizia que antes de um dia me envolver com outra pessoa e a levar para a minha vida, eu tinha que tirar Verônica completamente dela, dar um basta para que ai sim eu pudesse ser feliz a fazer a pessoa que estivesse ao meu lado feliz também. Tenho certeza de que eu ainda ouviria muitas coisas, não só de Pablo, mas como de Juliano e Nanda. Eram a favor de minha felicidade, mas defendiam a ideia de que eu jamais seria feliz com Verônica no meio de qualquer relacionamento meu. Eu concordava em número e grau, mas não sabia como resolver a situação.
Pensei em mil soluções em milésimos de segundos. Nada encontrei! Apenas me angustiei por não saber como resolver e principalmente por saber que quando Verônica descobrisse qualquer coisa ela faria um escândalo, e a sua perseguição a mim jamais terminaria. Eu estava de uma maneira ou de outra arrastando Giulia para o meio dessa confusão. Era provável ela não aceitar a situação ou simplesmente cansar-se de tudo, inclusive de mim. Senti meu corpo endurecer, de repente um aperto no peito, um friozinho me percorrer. Não poderia falar nada agora, eu tentaria ao meu jeito, se não desse certo eu teria que conversar com Giulia. Mas por enquanto nada falaria.
-- Depois falos disso Pablo, em outro momento.
-- Bom, pois eu vou indo porque daqui a pouquinho tenho mais uma chata e tediosa reunião com o nosso querido advogado. - disse levantando-se e encaminhando-se a porta – Ah meninas! Uma dica: tranquem a porta antes tá? Tenham um ótimo dia.
Eu devia mesmo ter fechado a porta, teria evitado que Pablo tivesse entrado em minha sala e adiantado, soltado aquele papo de “probleminha” na frente de Giulia. O que eu diria a ela se ela me perguntasse a que Pablo se referia. Não queria ter que mentir pra ela. Com certeza eu deveria ter fechado a porta, e se fosse outra pessoa a entrar ao invés dele, como por exemplo a própria Verônica? Não quero nem pensar.
Quando Pablo saiu trancando a porta o silêncio tomou conta do lugar. Eu não conseguia parar de imaginar uma solução, em um jeito de “arrumar” a minha vida. Giulia também permanecia calada, nossas mãos estavam unidas, os dedos entrelaçados. Eu podia sentir o calor do corpo dela ao meu lado, de sua mão na minha, mas não conseguia voltar para meu corpo, minha mente voava bem longe dali.
-- Acho que já vou indo para minha sala. - ela disse soltando minha mão e levantando rapidamente.
-- Não precisa, fica mais um pouquinho, por favor.
-- O expediente daqui a pouco começa. - me senti estranhamente triste – E além do mais, eu tenho que resolver um probleminha. Por falar nisso, é vetado o uso de aparelhos celulares dentro da agência?
Estranhei a pergunta.
-- Não. Até porque muita gente precisa deles pra manter contato com clientes, receber e-mails, e usam no dia a dia do trabalho mesmo. Mas porque a pergunta?
-- Por nada. Então...eu vou indo. - ela disse me olhando fixamente.
-- Espera.
Só então lembrei-me do buquê de cravos, eu não havia lhe dado, e pra mim ele era uma das partes mais importantes do que planejei para aquela manhã. Seria algo palpável de minha confissão. Fui até a minha mesa, peguei sua bolsa e o buquê. A mão em que eu levava o buquê mantive atrás de mim em minhas costas, escondendo-o. Voltei a sorrir com a lembrança do beijos que ganhei ao me declarar apaixonada por ela, e por ver que ela está me correspondendo da melhor maneira possível. Ela estava me permitindo conhecê-la, viver momentos com ela. Caminhei até ela sorrindo, e como resposta ela também me sorria lindamente. Parei a sua frente e lhe entreguei somente a sua bolsa.
-- Eu queria te presentear com algo singelo, que representasse um pouquinho do que sinto. Que quando você olhasse lembrasse que estou me apaixonando por você. Não sei se vou conseguir alcançar o meu objetivo, mas, o que eu quero te dizer é isso Giulia: “Estou me apaixonando por você!”. - disse olhando em seus olhos e os vi encherem-se d'água enquanto ela sorria – Pra você! - entendi o buquê em sua direção.
Ela recebeu o buquê com suaves lágrimas molhando seu delicado rosto, as mãos tremiam, e eu simplesmente senti necessidade de abraçá-la, mesmo sem nenhuma permissão. Precisava senti-la pertinho de mim, e impedir que ela chorasse. Não esperava e nem tinha a intenção de fazê-la chorar. Senti que ela me abraçou de volta, um abraço apertado, reconfortante e cheio de significados pra mim. Não queria mais soltá-la, o tempo podia parar naquele momento.
-- Obrigada! - ela sussurrou em meu ouvido e meu corpo reagiu ficando arrepiado.
-- Não precisa agradecer.
-- Você é incrível Marina.
Não sei explica, mas ela falar daquele jeito mexeu ainda mais comigo. Me despertava uma vontade de querer ser sempre o melhor pra ela, de surpreendê-la sempre. Como eu queria essa mulher com cara de menina do meu lado. Por Deus!
Dei-lhe um selinho e mais uma vez senti ao beijar seu pescoço o seu perfume. Era no lugar mais perfeito que eu poderia querer. Aquele perfume estava gravado em minha mente assim como a textura de sua pele e o gosto dos meus lábios. Mas bem melhor do que viver o que está em minha mente, é reviver cada momento com ela.
-- Ainda nos vemos hoje? - perguntei incerta.
-- Claro! Se você quiser nos veremos sim.
Sem sombra de dúvidas eu quero muito, e não vou esconder isso de você.
-- Eu quero, quero muito...
Eu não me aguentei. Saber que ela estava pra sair de minha sala e que talvez eu não pudesse beijá-la mais hoje me fez agir assim. Eu nem mesmo a deixei responder, dizer se ela queria ou não me ver, fui logo a calando com meus próprios lábios. Como eles eram doces, maravilhosos! A cada beijo eu sentia tudo ao meu redor parar, parecia que eu tinha engolido milhões de borboletas e pedras de gelo, algo remexia dentro de mim, vagava entre meu estômago e meu coração. Eu sentia um frio enorme na barriga. Ficava nervosa toda vida que ela chegava mais perto. Quando a beijava então quase tinha uma sensação de desmaio. Mais um pouco e ela poderia ouvir meu coração bater que nem um louco em meu peito.
-- Eu preciso ir. - ela disse contra meus lábios quando o ar nos faltou.
-- Eu sei. - infelizmente tinha que admitir isso. Selei nossos lábios suavemente. - Tenho uma reunião daqui a pouco, ainda tenho que me preparar. - “Acho que não deveria ter falado isso, ela irá apresar-se assim!”
-- Sendo assim vamos assumir nossos lados profissionais e nos vemos mais tarde. Tudo bem assim? - ela estava abraçada a mim e sua cabeça repousava em meu ombro.
Uma sensação gostosa e indescritível, eu me sentia totalmente diferente, não sei explicar. Sentimentos nunca antes experimentados agora que me acometiam com força total.
-- Tudo bem. - beijei seus cabelos que exalavam um suave cheiro floral.
Nos separamos e eu a olhei sem conseguir disfarçar a tristeza que eu estava sentindo por isso. Bobo isso né? Mas é que era tão bom ficar perto dela, sentir o cheiro dela,vê-la sorrir, ouvir a sua voz, tudo isso me acalmava de um jeito único, me fazia muito bem. Pude ver que em seus olhos também havia tristeza, e isso me deixou feliz. Não que fosse bom vê-la triste, mas sim porque aquilo acendeu em mim uma chama de que talvez ela também fosse sentir a minha falta, e era tão ruim pra ela nos separarmos quanto era pra mim.
A deixei ir, ela abriu a porta e antes dela sair da sala ela me presenteou com um enorme e lindo sorriso, capaz de iluminar o resto do meu dia.
-- Obrigada pelos cravos, eles são lindos! - logo após fechou a porta me deixando em pé no meio da sala com um sorriso bobo.
Como explicar tanto sentimento assim que surgiu do nada? Foi tão rápido! Eu quase já não tinha mais dúvidas eu estava mesmo me apaixonando por Giulia, e de uma forma que talvez fosse perigosa pra mim caso não déssemos certo. Eu queria estar com ela sempre que possível, um sorriso dela era o bastante pra me deixar bobamente feliz. Se isso não fosse paixão o que mais poderia ser? Nem mesmo com Larissa que foi minha noiva, que namorei por bastante tempo eu fui capaz de sentir o que estou sentindo por Giulia.
Saí de minha inércia e fui até a minha mesa, precisava me preparar para a reunião que teria logo mais. Olhei para o meu relógio, marcava 8:30hs, a reunião havia sido remarcada para as 9:30, teria um pequeno tempo para me organizar e não chegar despreparada na reunião. Olhei a minha volta, em minha mesa, perto de minha bolsa, e a pasta com os documentos não estava alí. Com certeza na pressa, e com tudo aquilo pra levar de meu carro até minha sala eu devo ter esquecido em meu carro. Tinha que buscá-la. Desci até o estacionamento praticamente saltitando de alegria, o cheiro e o gosto dos lábios de Giulia ainda estavam em mim.
-- Você é louca?
-- Olha só, não tem motivos pra você me chamar de louca não, eu apenas quis ajudar. E só estacionei o carro aqui porque precisava dar uma olhadinha no carro da minha amiga, você que entrou repentinamente e não me viu aqui, foi você que bateu no meu carro. E foi só um arranhãozinho.
Estava saindo do elevador quando ouvi o que parecia uma discussão, uma das vozes eu reconheci, era de Nanda, e ela parecia exaltada. A outra voz eu não reconheci, era uma mulher. Porém quando a mulher falou que tinha vindo até a agência para dar uma olhadinha no carro de sua amiga, me dei conta de que a amiga em questão poderia ser Giulia, então quem estava ali naquele estacionamento, discutindo com Nanda era Victória, a Vick.
-- Pois bem, agora você já pode sair da minha vaga, eu preciso estacionar e preciso trabalhar. E muito obrigada pela sua ajuda, mas agora você já pode me soltar.
-- Tudo bem esquentadinha, eu já estou de saída, e a sua vaga vai estar ai livre. E me desculpe ok? Pela vaga e por sua cintura.
Não conseguia vê-las, as vozes vinham da parte de trás de um carro preto, e tudo que eu conseguia era ouvir as vozes. Me aproximei do carro a fim de saber o que estava acontecendo ali.
-- Fernanda? - a chamei.
Nanda olhou pra mim com uma expressão de assustada, ela estava séria, e me olhou como se estivesse acuada.
-- O que está acontecendo aqui? - perguntei olhando pra ela.
-- Nada demais Marina, não foi nada. - disse Nanda baixinho.
-- Já estamos resolvendo aqui, eu já estou indo embora, e queria pedir desculpas pelo ocorrido. - a mulher disse olhando para Nanda.
Só ai olhei para a mulher de voz rouca. Ela era alta, pele alva, cabelos castanhos e curtos. A olhei de uma maneira que poderia parecer que estava fazendo uma análise, e era quase isso mesmo. Ela era bonita, e tinha um charme espontâneo, e um sorriso maroto que brincava em seus lábios sem nenhum motivo aparente. Senti algo estranho, um incômodo desconhecido. Percebi que era ciúmes. Ciúmes de Giulia.
-- Seu nome é Victória? - perguntei esquecendo-me de Nanda.
-- Sim. Mas eu tenho quase certeza de que não nos conhecemos não é mesmo? - perguntou sorrindo.
-- Ah não, não nos conhecemos, mas eu conheço uma pessoa que sempre que pode toca no seu nome! - ter falado isso foi pior do que já ter constatado.
-- Giulia?
-- Sim! Ela mesma.
Victória baixou a cabeça e balançou a cabeça de um lado para o outro em uma negativa. Pude notar que ela sorria, só não entendia o motivo por ela estar sorrindo do que eu falei. Era bom assim saber que Giulia vez ou outra tocava em seu nome, pensava nela? Será isso? Com certeza isso seria muito bom, se a pessoa em que ela pensasse fosse eu. Senti-me frustrada.
-- Não sabia que ela andava falando sobre mim, ainda mais com Marina Amorim. - ela disse mais pra ela do que para Fernanda e eu. - Bom, meu nome é Victória, ou Vick se preferir, sou a amiga, E irmã de Giulia. É um prazer! - ela disse me estendendo a mão.
-- Marina, e o prazer é meu. - eu tinha que admitir que a garota era muito simpática.
-- Bom, agora eu preciso mesmo ir. Já estou atrasada para o trabalho.
Dessa vez ela disse olhando para Nanda, que permanecia ao meu lado com os braços cruzados. Ela olhava para Victoria atentamente, não falava e nem desviava o olhar. Voltou sua atenção para a garota que estava a sua frente quando a mesma estendeu-lhe um pequeno papel em sua direção.
-- O que é isso? - perguntou Nanda.
-- Meus contatos.
-- Pra quê? - perguntou com desdém.
-- Leva o seu carro em alguma autorizada, em uma oficina seu lá. Vê quanto vai ficar o conserto do seu carro, ai você me liga, e eu lhe dou a quantia necessária pra cobrir o estrago.
Nanda estava visivelmente nervosa, pelo menos pra quem a conhecia bem, sabia que aquilo se tratava de nervosismo. Ela estava praticamente dançando. Colocava o peso do corpo em um pé e em menos de dois segundos colocava no outro pé. Tudo ela fazia sem tirar os olhos de Victória, a observava atentamente.
-- Não precisa disso, afinal foi só um arranhão não é mesmo?
-- Pega esquentadinha, digo, Fernanda. Procura saber quanto vai custar ai você me liga, manda um e-mail, um telegrama, um bip, um sinal de fumaça, qualquer coisa. Se quiser pode me ligar sem nenhum motivo também, sem problemas.
-- Não mesmo, obrigada. - ela disse pegando o papel e saindo na direção do elevador a passos largos, sem nem mesmo dar um tchau ou me esperar. Deixando seu carro trancando outros carros.
-- Ela é esquentadinha não é mesmo? - Victória perguntou sem me olhar, acompanhando os passos de Nanda.
-- Normalmente ela não é assim. - constatei.
Victória observava Nanda entrar no elevador, e eu a observava. Depois de um tempo nos demos conta do que fazíamos.
-- Bom, pois eu vou indo lá ou chegarei bastante atrasada no trabalho. - ela disse olhando para mim e sorrindo. - Tchau!
-- Tchau.
-- Foi um prazer te conhecer Marina.
-- O prazer foi meu. - foi só que eu disse.
Victória se despediu sorrindo e se dirigiu ao seu carro, e eu sai na direção do meu carro pra pegar a pasta dos documentos. Não sei se era impressão minha, mas eu pude sentir algo entre elas duas, algo como uma energia que envolvia as duas. Apesar de elas estarem discutindo e Nanda estar exaltada, havia algo alí, pude notar isso. O modo como elas se olhavam de alguma maneira ou de outra as entregava.
Subi até minha sala pensando nisso, em como seria bom se Nanda se envolvesse com alguém. Não me importava se fosse um homem ou uma mulher, mas que a amasse e a respeitasse como ela merecesse. Queria que ela se sentisse da mesma maneira que eu estava me sentindo nesse momento, um boba feliz, apaixonada incurável.
Tentei me organizar, bolar uma estratégia, uma boa ideia para a reunião, para convencer de verdade os nossos prováveis clientes, mas eu simplesmente não parava de pensar em Giulia. A cada segundo que se passava eu tinha o ímpeto de levantar de minha cadeira e ir até a sua mesa. Queria vê-la, queria beijá-la.
Ouvi batidinhas na porta e tremi pensando que poderia ser Verônica que estava do outro lado. Tinha medo do que ela falaria ou faria por causa da cena que ela tinha visto ontem. Giulia e eu naquele estacionamento. Com certeza ela teria presenciado o beijo. E pior ainda, ela estava alí me vigiando. Ela não teria motivos para estar na agência aquela hora. Provavelmente ela estaria de campana, me vigiando, estava curiosa pra saber o que eu estava fazendo para não ter atendido nenhuma de suas ligações durante o dia. Novamente pequenas batidas.
-- Pode entrar!
-- Licença.
-- Entra Nanda.
-- Só vim lhe lembrar da reunião daqui a pouco e saber se precisa de algo para ministrá-la.
-- Obrigada Nanda, mas já está tudo certo, estou prontíssima para convencer aqueles presunçosos.
-- Tá certo. Então boa sorte Marina, arrasa com eles! - ela disse já se retirando de minha sala.
-- Fernanda?
-- Sim? - ela perguntou da porta que estava semiaberta.
-- O que foi que aconteceu lá em baixo com aquela garota?
Novamente a vi ficar nervosa. Me olhou com uma expressão de incrédula e tornou a entrar da sala se aproximando de minha mesa.
-- Foi aquilo que você viu, ela estava em minha vaga, eu entrei no estacionamento distraída e quando ela tirava o carro da vaga dando a ré, e eu acabei batendo no carro dela. Foi isso.
-- Não estou falando disso.
-- Do que você está falando então?
-- Daquele nervosismo todo, dos olhares, você estava parecendo acuada. O que foi tudo aquilo?
-- Claro que eu estava nervosa, eu havia acabado de bater o carro. Como queria que eu estivesse?
-- Fernanda eu te conheço! E por qual motivo você está nervosa neste momento? Qual a justificativa que você tem pra me dar dessa vez?
-- Porque me lembrei do ocorrido, apenas isso.
-- E como explica aqueles olhares hein?
-- Não havia olhar nenhum não.
-- Havia sim Fernanda, deixa de enrolar vai. Me conta.
-- Eu estava olhando pra ela porque ela era bem diferente, não sei.
-- Tá vou jogar baixo agora. Se você me contar direitinho o que aconteceu lá embaixo, tim tim por tim tim eu também te conto algo muito sério em troca. E não tente me enrolar porque eu sei muito bem quando você está mentindo.
-- Tá certo, eu conto.- sorriu.
-- Vem, senta aqui. - a chamei sorrindo. - Pode contar agora.
-- Certo. Eu vou ser bem sincera tá? Mas sem indiretas ou piadinhas.
-- Ok! Prometo!
-- Eu sai de casa totalmente desligada, pensando em tudo, menos no que estava a minha frente, eu estava meio atrasada, então vim o mais rápido que eu pude. Entrei assim no estacionamento, na maior pressa e sem prestar atenção. Acostumada com a minha linda e querida vaga no estacionamento entrei sem me importar, e não tive tempo suficiente pra frear e evitar a batida. Não foi muita coisa, o estrago não foi grande. Mas na hora quando vi aquele carro preto na minha vaga e de dentro dele saindo uma mulher que eu nunca vi na vida me irritei de uma forma perigosa, queria partir pra cima dela.
-- Fernanda você nunca foi agressiva assim. O que houve?
-- Resumindo: tive mais uma desgastante conversa com o pai do seu afilhado, e acordei assim.
-- Eu podia adivinhar que tinha dedo dele no meio. Sempre foi o motivo pra você perder a linha. Mas continua.
-- Tá! - suspirou e passou as mãos espalmadas em seu rosto – Eu tive vontade de partir pra cima da mulher sim, mas ai quando ela saiu do carro e veio em minha direção eu quase enfartei Marina!
-- Como assim?
-- Ela é linda Marina, linda! Só uma menina, mas ainda sim linda. Eu senti meu coração dar um solavanco e não sei como mas perdi totalmente a coordenação das pernas, e quase cai. Ela me segurou e eu senti correntes elétricas percorrer o meu corpo.
-- Nossa! Continua. - pedi totalmente empolgada com a conversa.
-- Eu estava nos braços dela quando ela sorriu daquela maneira – disse como se assistisse a cena a sua frente – e eu não conseguia nem parar de olhar pra ela.
-- Isso eu percebi, você não parava mesmo de olhar pra ela.
-- Eu literalmente me derreti nos braços dela Marina. Eu fiquei meio assustada com isso. Bastou um sorriso e pronto! Feito mágica.
-- Ela é linda mesmo Fernanda. Fiquei até com uma pontinha de ciúmes por conta disso. Mas me diga: o que pensa a respeito disso? Do que sentiu diante dela?
-- Ah Marina, eu não sei. Mas foi algo passageiro, nisso eu posso apostar.
Não tinha como saber se seria algo passageiro até Fernanda ver Victória pela segunda vez. Se ela a visse e aquele olhar não surgisse novamente ai sim eu acreditaria que foi apenas um momento. Mas eu não acreditava muito nisso. Fernanda era muito romântica, assim como eu ela idealizada a sua felicidade, uma paixão avassaladora, um amor verdadeiro.
-- Como sabe disso?
-- Sabendo! - desconversou - Agora é a minha vez de fazer perguntas. Pergunta número 1: Por qual motivo ficou com ciúmes? Pergunta número 2: O que você tinha pra me contar em troca de que eu falasse do que aconteceu lá em baixo?
-- Tá. Mas eu vou mudar as ordens das perguntar, vou começar pela ordem cronológica, então vou começar lhe respondendo a pergunta número 2.
-- Não entendi nada. Mas continua assim mesmo.
-- É sobre a nossa nova publicitária, a que estou treinando e supervisionando.
-- A Giulia? O que tem ela?
-- Estou me apaixonando por ela! - disse sorrindo largamente.
-- Você? Mas como? Como? Como isso aconteceu Marina?
-- Aconteceu da forma mais natural do mundo Nanda, veio do nada, foi rápido, mas é isso mesmo, eu estou me apaixonando por ela. E eu estou me sentindo tão bem, tão feliz. Ela está me fazendo um bem danado.
-- Marina você não tem noção de como eu fico feliz por saber disso, por saber que finalmente você está aberta para novas oportunidades, e finalmente está superando esse trauma que a Larissa te causou. Mas espera ai! Como assim ela está te fazendo um bem danado? Não vai me dizer que...
O sorriso já não cabia em meu rosto. Não precisei falar nada, e nem mesmo Fernanda completar a sua pergunta, eu sabia o que ela ia perguntar, e ela soube da minha resposta no momento em que viu o tamanho de meu sorriso. Era notável. Ela levou as mãos aos lábios em expressão de surpresa, depois sorriu.
-- Marina vocês estão ficando? É isso?
-- Você sabe o quanto eu odeio essa expressão. “Ficando”! Não, não estamos ficando, estamos nos conhecendo.
-- Quando isso aconteceu? Desde quando? Eu quero saber de tudo, vamos, não me esconda nada.
Sorri e comecei a relatar tudo o que aconteceu conosco desde o dia anterior, quando a encontrei no estacionamento da empresa tarde da noite. A cada frase contada Fernanda gargalhava, ela compartilhava de minha felicidade, estava feliz por eu estar feliz. Eu a queria feliz também.
-- Bem que eu desconfiei de que isso fosse mesmo paixão. Aquele negócio de estar encantada comigo não colou não. Depois de tudo que você contou me parecia ser bem mais do que você mesma queria ver. Mas eu estava de fora, eu vi tudo. Ai meu Deus eu sabia! - disse voltando a sorrir.
-- Eu estava com medo Nanda, medo de dar tudo errado de novo de sofrer. Acho que nem eu naquele momento sabia o que eu estava sentindo.
-- Os meninos já sabem?
-- Pablo me pegou aos beijos com ela hoje mais cedo aqui na minha sala.
-- Hoje de manhã? Bem que eu estranhei o estado dela quando cheguei aqui em cima hoje. Ela estava parada na frente de sua porta com uma cara de boba. Parecia em outro mundo.
-- Quando vamos contar pro Juliano? Melhor, quando vamos comemorar?
-- Comemorar?
-- Claro Marina! Você pode até levar a Giulia. Eu e os meninos vamos querer conhecê-la. Saber se ela é digna de você entende? - ela perguntou apertando os olhos e me fazendo rir.
-- Tudo bem. Marque essa comemoração ai, e eu a levarei. Vai ser bom pra gente, quer dizer, isso se vocês três prometerem se comportarem na frente dela.
-- Credo Marina! Não vamos fazer ou falar nada demais, só vamos interrogá-la e investigá-la. - fez uma pausa e continuou – Como se sente?
-- Me sinto muito bem, me sinto viva, alegre, feliz! Ela me faz muito bem, e é muito, mas muito bom estar com ela. Ela é incrível, e eu sei que ela é especial, eu sinto que ela é diferente.
-- Até quando vocês vão ficar namorando? E vocês vão namorar depois disso?
-- Pra ser sincera, se depender de mim vamos sim. Mas não sei até quando vamos ficar nos conhecendo, sei que vai ser de forma natural como foi até agora, vai ser um acordo em comum.
-- Eu ainda estou boba com isso, boba como tudo acontece, e boba por ser correspondido a altura. Isso é o melhor de tudo. Estou mesmo muito feliz por você Marina, no caso por vocês duas.
-- Obrigada Nanda. - disse sincera.
-- A conversa estava muito boa, mas infelizmente vou ter que ir para o meu posto, já o deixei abandonado por tempo demais. E ah, mais um pouquinho você vai atrasar-se para a sua reunião. - ela disse olhando para o relógio em seu pulso.
-- Nossa o tempo passou voando. Deixa eu ir! - disse pegando minhas coisas e saindo apressada de minha sala.
Cheguei ao escritório de Alberto, meu advogado quando faltavam escassos minutos para o início da reunião. Isso não era bom, provavelmente eu perderia alguns pontos com o cliente por isso, então teria que dar o máximo de mim nessa reunião para recuperar os pontos perdidos.
Entrei na sala de, e o único lugar que faltava ser ocupado era o meu. A sala estava repleta de homens vestidos em seus ternos caros e exclusivos, no rosto uma expressão de enfado e desdém. Alberto controlou e contornou a situação até a minha chegada. Me odiei por isso, por ter falhado em meu trabalho. Mas lembrei-me que o motivo de meu atraso foi um bom motivo, eu falava e sonhava acordada com Giulia. Na verdade eu não estava de fato atrasada, o relógio ainda não marcava o horário combinado, porém eu, justo eu fui a última a chegar. Todos me olhavam sérios.
-- Licença. - falei ao respirar fundo e entrar na sala - Senhores, me desculpe pela demora, tive um imprevisto. - “Não esperava me apaixonar!” - pensei.
-- Bom, como faltava apenas a parte representante da Agência de Publicidade JUMP, podemos dar início. A reunião será ministrada pela representante Marina Amorim, presidente, e sócia majoritária. E por mim na área jurídica e burocrática.
Alberto abriu a reunião, começaria agora a parte mais chata de meu trabalho. Horas intermináveis na frente de pessoas que precisavam ser convencidas de que eu, de que minha agência poderia representá-los, tinha capacidade e profissionalismo. Tinham aqueles que colocavam mil e um defeitos e imposições. Tudo em troca de um contrato mais barato. Fiz toda a apresentação, respondi milhares de respostas e fiz uma prévia do que podíamos fazer por eles. Até o momento não tinham feito imposições nem colocaram problema em nada do que havia sido falado. Gostavam da ideia, e falavam como se estivéssemos em uma roda de debate. Apenas um homem me olhava sério, o dedo indicador em seu queixo, os olhos petrificados nenhuma palavra pronunciada. Nem mesmo conhecia a voz dele, somente ele permaneceu calado durante todo o tempo.
-- Bom senhores, esse é o contrato. - falou Alberto distribuindo uma cópia do contrato para cada homem àquela mesa – Lhes darei um tempo para analisarem, caso seja necessário voltaremos a discutir em torno dele.
Os homens passaram a ler atentamente e minuciosamente as folhas a sua frente. O silêncio e a espera me deixavam sempre na expectativa de uma resposta positiva. “Contrato fechado!”. Enquanto eles liam e reliam as intermináveis páginas do contrato, Alberto e eu conversávamos, na verdade cochichávamos alguma coisa relevante um para o outro. Ele contou-me que o homem sério que me olhava o tempo todo sem me dirigir uma única pergunta ou palavra era o dono da empresa, o Henrique Meneghetti.
-- Tenho algumas coisas a serem inseridas no contrato. São exigências da empresa. - era Henrique quem falava.
-- Qual seria? - Alberto perguntou.
-- Quero Marina Amorim acompanhado o projeto de perto do início ao fim, e um publicitário que trabalhe durante todo o projeto única e exclusivamente para nós. Não quero a alta direção, quero Marina Amorim. E tanto Marina como o publicitário terão que viajar até as nossas unidades para conhecê-las por dentro, como funcionam até chegar ao produto final.
Alberto abriu a boca para falar algo, tenho certeza que ele iria argumentar dizendo que tal pedido não seria possível principalmente por causa das viagens.
-- São as nossas exigências para fechar o contrato. Quero que estudem a ideia, o conceito e a marca a fundo, não quero que sejamos representados por um projeto de publicidade superficial.
-- Senhor Henrique eu entendo, compreendo perfeitamente mas...
-- Exigências aceitas Senhor Henrique! Todas serão atendidas, eu participarei ativamente do projeto do início ao fim pessoalmente, e deixarei um publicitário a disposição exclusivamente do projeto de sua empresa. Quantas filiais precisamos visitar?
Interrompi Alberto, ele tentaria fazer o melhor para a empresa, mas eu não queria que fosse feito apenas o melhor para empresa, eu queria aquele desafio, eu queria voltar ativamente para o que eu mais gostava de fazer. Seria maravilhoso participar de projetos diretamente, sem ter que ordenar ou nomear alguém para que fizesse isso por mim simplesmente por falta de tempo, por não poder me ausentar por muito da empresa ou porque me aconselhavam dizendo que aquilo era o melhor. Desde que tornei a presidente sai da parte de criação, e eu sentia falta daquilo. Eu iria colocar a “mão na massa” novamente, e isso estava me empolgando. E claro que não perderia um contrato somente por causa de exigências não aceitas, ainda mais quando elas fossem fáceis de serem atendidas.
-- Temos quatro filiais aqui no país: Rio de Janeiro, Paraná, Goiás e Bahia. E uma única filial fora do país: Argentina. São cinco filiais e uma matriz, que fica aqui em São Paulo mesmo. Algumas fazem apenas a parte de produção, outras de vendas e outras as duas partes, porém são dirigidas de maneiras diferentes.
-- Certo! E qual o prazo que temos para visitar todas elas?
-- Preciso da campanha pronta o quanto antes, então o mais indicado seriam que começassem com as visitas em duas semanas. A primeira a ser a visitada seria a matriz por estar no mesmo estado, e em seguida você poderia traçar um roteiro como bem entendesse e lhe fosse possível.
-- Então senhor Henrique, creio que se as exigências forem somente estas podemos redigir e fechar contrato agora mesmo.
-- Essas são as únicas exigências que tenho a fazer, concordo com todo o resto do contrato, e por mim fechamos agora mesmo.
Alberto redigiu o contrato, e Henrique assinou. Se dizia feliz por conhecer meu trabalho e o profissionalismo de minha agência. “Sei que ter contratado a sua agência foi uma das melhores coisas que eu poderia fazer!” Fiquei feliz pelo comentário, era bom saber que meu trabalho era reconhecido.
Contrato assinado voltei para a JUMP. Cheguei já estava quase no horário do almoço. Fui para minha sala com algumas ideias na cabeça, não sabia como iria concretizá-las e não sabia como falar sobre isso. Talvez aceitassem, era uma empreitada, e no final viria o reconhecimento, mas eu tinha consciência de que poderia receber um não como resposta.
Na hora do almoço conversei com Nanda sobre minhas ideias, e ela me encorajou a seguir com elas. Eu torcia pra que desse certo, mas eu tinha certeza de que se tudo acontecesse da maneira que eu esperava se eu ainda não estava perdida, eu voltaria totalmente perdida.
Não parava de pensar em Giulia um segundo se quer. Me pegava sorrindo ao me lembrar de seu sorriso ou de seu beijo. Nanda sorria e dizia que era impagável a minha cara de apaixonada. Durante ao almoço o assunto foi Giulia e eu e nada mais. Quanto mais eu tentava fugir do assunto mais perguntas e conselhos ela me dava. Pedi para que Fernanda ficasse responsável por organizar o tour que faríamos pelo país e Argentina. Passagens, passaporte, hotéis, restaurantes, ela ficaria responsável por fazer um cronograma completo.
De volta a minha sala, as ideias que fervilhavam em minha cabeça ficaram mais fortes. Eu já sabia quem levaria comigo, quem deixaria como responsável pela campanha de lingerie. Desde o primeiro momento eu soube, eu enxerguei o talento. Sabia que era apenas um diamante bruto, que quando lapidado brilharia de forma inigualável. A pessoa que eu chamaria era Giulia, ela tinha talento, e eu sabia que ela era a melhor para aquele trabalho. Seria uma ótima oportunidade para treiná-la e prepará-la. Tinha convicção de que minha escolha não poderia ser melhor. Ela não me decepcionaria. Não estava pensando em levá-la comigo apenas por necessidade de tê-la perto e por achar que essa talvez fosse uma ótima oportunidade para nós duas, eu queria levá-la justamente pra explorar esse lado criativo dela. Eu queria fazê-la exibir todo aquele talento que eu sabia que ela guardava.
Estava decidido, eu faria o convite a Giulia. Daria a ela a opção de não aceitar, afinal viajaríamos por muito tempo e por muitos lugares, e ao final disso ela ainda teria que dar exclusividade a campanha de Henrique. Teria que saber dela a respeito de seu passaporte, se ela tinha ou se teríamos que providenciar. Juro que estava pensando com meu lado profissional, mas ao mesmo tempo eu não conseguia evitar que meu lado sentimental quase gritasse. Seria maravilhoso passar no mínimo um mês em meio a muitas viagens com Giulia. Seríamos só nós duas o tempo todo. Assustador pensar assim, eu sei! Nos conhecíamos a tão pouco tempo e eu já a sentia uma certa necessidade de sua presença. Ela me acharia um louca se soubesse de todos os meus pensamentos. Com certeza!
Passei o resto do dia resolvendo alguns problemas, vendo um “roteiro” de viagem com Nanda – passagens, hotéis e a ordem de que estados visitaríamos primeiro -, também calculei com ela aproximadamente em quanto tempo terminaríamos essa parte do trabalho. Resultado: passaríamos no mínimo uma semana em cada estado, visitaríamos 4 estados, somando isso a viagem a Argentina na qual levaríamos uma semana e meia. Daria quase um mês e meio. Muito tempo pra ficar longe de casa, andarilhando por ai. Se nos sobrasse tempo eu queria conhecer pelo menos uma parte de estados que eu ainda não conhecia como Bahia por exemplo.
Já sabia o que tinha que fazer. Primeiro de tudo convidaria Giulia para um jantar, um passeio. Seria lá que eu contaria sobre campanha e lhe faria o convite. O final do expediente chegou, então mandei-lhe um e-mail – modo como começamos a nos comunicar.
De: Marina Amorim
Para: Giulia Monteiro
“Bom, queria começar dizendo que isso é apenas um convite, mas ao contrário do que sempre dizem nos filmes eu também posso aceitar um “Não” como resposta. Como eu lhe disse hoje mais cedo em nosso café da manhã, eu quero muito lhe conhecer, dividir momentos com você, e eles nem precisam ser bons, afinal a vida não é feita apenas de bons momentos. Então que venham os ruins também se isso contribuir pra te conhecer um pouquinho melhor. Hoje podemos fazer algo que eu escolher, amanhã algo que você escolher, pode ser vice-versa também, tenho certeza de que qualquer lugar em que você estiver presente será o melhor lugar do mundo. Podemos conversar, ou apenas jantar, podemos dançar ou apenas passear, podemos assistir a um filme ou apenas não fazer nada. Então, o contive é esse: Aceita sair comigo essa noite? Se a resposta for sim, basta responder este e-mail e me passar seu endereço. Lhe buscarei às 19hs. Lembrando que posso me contentar com um “não”, embora não seja a resposta que eu esperava, irei entender sem perguntar motivos.
Um beijo Giulia
Espero sua resposta.”
Mandei o e-mail e sai de minha sala em direção ao estacionamento. Esperava não vê-la naquele momento ou eu faria tudo de uma maneira diferente de como eu havia planejado e levaria dali no mesmo instante. Queria beijá-la novamente. Eu não me reconhecia mais.
Cheguei em casa ansiosa. Giulia ainda não havia respondido meu e-mail. Ainda não tinha nenhuma resposta sua, e isso estava me deixando nervosa. Será que ela tinha compromisso, algo muito mais importante pra fazer do que sair comigo? Aprontei-me toda. Vesti uma roupa confortável que pudesse ser usada para um outro lugar caso Giulia me desse um bolo. Não ia querer ficar em casa, convidaria Nanda para me acompanhar, e aproveitaria ao máximo meu afilhado, João Pedro. Sentei na sala com o celular na mão enquanto batia insistentemente o pé. Meu celular avisou a chegada de um novo e-mail.
De: Giulia Monteiro
Para: Marina Amorim
“Desculpe-me pela demora. Espero que o convite ainda esteja de pé e que ainda dê tempo, porque a minha resposta é “SIM”. Eu aceito sair com você, seja pra fazer o que for, aposto que qualquer lugar com você ficará perfeito. E aliás, será você quem decidirá para onde vamos. Estou em dúvida sobre o que vestir. O que seria mais adequado? Estou te esperando, e estou ansiosa. O endereço é este (…).
Beijo Marina”
Respondi sorrindo que ela deveria usar algo confortável. Desci até o estacionamento quase saltitando, estava parecendo uma adolescente. Entrei no carro, digitei o endereço dela no GPS e coloquei o celular no banco do passageiro. Só foi preciso sair do condomínio para meu celular tocar. Olhei o visor e não acreditei, só podia ter um sensor. Era Verônica que me ligava. Deixei chamar. Ele não parou de tocar, chamava até cair e depois começava a tocar novamente. Estava me aproximando do endereço que Giulia me passou e o celular havia parado de tocar. Senti um alívio e logo depois senti meu coração acelerar ao estacionar o carro. Desci do carro e interfonei.
-- Oi?
-- Sou eu Giulia, Marina. Estou te esperando aqui em baixo.
-- Certo! Estou descendo. - “Respira ou você vai enfartar!” - ouvi alguém próximo a ela falar.
Sorri com o que ouvi e voltei para meu carro. Encostei-me na lateral do carro. Estava de cabeça brincando com as chaves do carro em meus dedos quando senti um perfume que eu seria capaz de reconhecer até no meio da multidão. Levantei a cabeça e me deparei com um belo par de olhos castanhos. Eles brilhavam intensamente e ela estava maravilhosa em um vestido floral soltinho. Foi inevitável, acabei ficando com a boca aberta e ela sorrindo. Com certeza de minha cara.
-- Boa noite Marina!
-- Boa noite Giulia.
-- Estou vestida adequadamente? - ela me perguntou dando uma volta a minha frente.
-- Você está linda Giulia!
-- Obrigada. - ela agradeceu com as bochechas coradas.
-- Podemos ir? - perguntei.
-- Claro, podemos sim.
Abri a porta do carro para que ela entrasse, e quando ela passou por mim senti seu perfume invadir-me. Fechei os olhos por alguns segundos e aspirei. Queria sentia aquele doce aroma sempre, ele me inebriava, sentia arrepios ao sentí-lo porque ele me lembrava da pele em que ele estava impregnado. Aquela mulher era perfeita, estava tudo perfeito demais. Tudo estava “caminhando” bem e eu estava cada vez mais me apaixonando por ela.
Dei a volta no carro e “assumi” o volante. Fomos conversando trivialidades, assuntos a cerca do trabalho, do nosso dia e quase nem percebi o trajeto. Já havíamos chegado. Havia feito uma reserva para nós em um restaurante próximo ao Parque do Ibirapuera – meu lugar preferido – assim, quem sabe, se ela aceitasse quando saíssemos do restaurante pudéssemos dar uma volta no parque. Uma conversa em meio ao parque seria perfeita, tranquila, além de poder “dividir” com ela aquele lugar que eu tanto gostava e me acalmava.
Entramos no restaurante e escolhemos uma mesa que tinha vista para a rua, era no piso superior então a vista das luzes era linda vista de cima. Fizemos nossos pedidos. Eu sorria olhando para ela. Ela falava e eu ficava parada a olhando com fascínio, quase nem piscava. Ela sorria sempre que percebia o modo como eu a olhava, e eu não estava mais nem me importando em ser pega no ato, em flagrante ao olhá-la daquela maneira insistente. Meu Deus como ela é linda!
Logo o gentil e sorridente garçom trouxe nossos pedidos. Eu pedi uma massa italiana, ela pediu algo mais leve, porém tudo combinava com um bom vinho, e eu acho que precisaria de uma bebida pra relaxar um pouco ou explodiria de ansiedade. Com a carta de vinhos na mão a perguntei qual ela preferia, porém tudo o que ela me disse é que não podia beber, não tinha permissão. Estranhei, mas não me atrevi a perguntar, saberia desse motivo com o tempo. Que tipo de permissão seria essa?
O vinho chegou e a nossa conversa continuou. Já estava preparada para assim que saíssemos do restaurante leva-la para o parque. seria lá! Faria o convite lá, perguntaria se por um acaso ela aceitaria deixar muita coisa de lado por algum tempo, viajando de estado em estado.
Justamente nesse dia me permiti andar sem minha bolsa, então eu andava com o celular e chaves em minhas mãos. Assim que sentei-me o coloquei na mesa com as chaves do carro ao lado, quase no meio da mesa, a uma distância que ficava alcançável tanto pra mim como para Giulia. Foi um erro! O celular começou a tocar, vibrando e “dançando” que nem louco em cima da mesa de madeira com o nome “Verônica” estampado no visor. Olhei para o celular nervosa, com um olhar assustado, como se tivesse feito ou fazendo algo errado. Uma confissão de culpa! Giulia olhou para o celular e ficou séria, nada falou, mas pude ver que ela pressionava o maxilar. Ela suspirou fundo, colocou o guardanapo que antes estava em seu colo em cima da mesa e falou.
-- Não vai atender? - ela perguntou séria.
-- Não é ninguém importante. - respondi com a voz falha, nervosa.
-- Será que podemos ir?
Ela perguntou e eu senti pedras de gelo passearem em meu estômago. O modo como ela falou parecia que ela estava se entregando a algo, desistindo de medir forças com algo que eu nem podia imaginar o que era. Sem sombra de dúvidas ela havia percebido algo, somente isso explicava ela ter mudado de tal maneira ao ver aquela ligação. Fiquei sem saber como agir, eu a olhava e não conseguia dizer nada, apenas a olhava.
-- Licença! As senhoritas desejam mais alguma coisa? - o garçom veio até nossa mesa.
-- A conta, por favor. - Giulia disse em um tom que eu desconheci.
Sai de minha letargia quando a vi levantar o olhar e pude ver em seus olhos a formação de algumas lágrimas. Seus olhos brilhavam por causa delas, e dessa vez não eram de surpresa ou felicidade. Me martirizei por isso.
-- Giulia eu... - no momento em que fui falar algo o celular voltou a vibrar em cima da mesa, era Verônica novamente.
-- Pode atender. - ela disse.
-- Não vou atender.
O sorriso que veio a seguir não foi e nem chegou perto de ser um daqueles que me deixavam hipnotizadas ou faziam meu corpo vibrar. Foi irônico, incrédulo. Ela balançou a cabeça em uma pequena negativa. O celular que havia parado de vibrar a um segundo atrás voltou a tocar.
-- Atende! - ela disse mais uma vez.
Cometi outro erro na noite. Percebi que Verônica não ia desistir, ia me ligar até que eu atendesse. Eu podia ter simplesmente desligado o celular – mas ai provavelmente ao olhar para a porta do restaurante algum tempo depois me depararia com a figura dela à porta – mas não, eu atendi a droga do celular.
-- Oi? - atendi incerta.
-- Vou ao banheiro. - ela disse.
Com o celular na mão e um olhar temeroso vi Giulia pegar sua bolsa e levantar-se saindo da mesa a passos largos. Me inquietei e me odiei por ter feito o que eu fiz, não devia ter atendido aquela droga de ligação.
-- Marina?!
-- Oi Verônica.
-- Onde você está? Sei que não está em casa, então onde você está uma hora dessas na rua? Com que você está Marina?
-- Realmente não estou em casa, mas eu não lhe devo nenhuma explicação Verônica, coloca de uma vez por todas isso na sua cabeça, não temos nada uma com a outra, então não tenho que lhe informar de nada sobre a minha vida. Pensei que a última conversa, se é que pode se chamar assim tinha adiantado de alguma coisa.
-- Não tivemos conversa nenhuma, e não tente me enrolar. Diga logo onde está e com quem está.
-- Verônica... - suspirei – vou ter que desligar.
-- Como assim desligar? O que está fazendo que não pode me atender hein? Quem é a biscate Marina? Fala logo!
-- Não tem nenhuma biscate e de verdade vou ter que desligar. Tchau.
Ignorante e estúpido, pode ser que pareça isso mesmo, mas eu precisava desligar, encerrar de uma vez aquela ligação. Dessa vez eu desliguei o aparelho celular. Tolice! Por qual motivo eu não o tinha desligado antes? Quando Verônica começou a importunar?
-- Licença. Aqui está a conta senhorita. - disse o gentil garçom me estendendo a nota.
-- Obrigada.
Paguei a conta, o agradeci, e sai na direção do banheiro. Precisava vê-la, me desculpar e dar algum tipo de explicação. Precisava esclarecer tudo. Entrei no banheiro e não difícil encontrá-la. Ela estava diante de uma das pias, com a cabeça baixa apoiando-se com as mãos espalmadas nas laterais da mesa de mármore.
-- Giulia?
Ela não me olhou em minha direção, mas levantou o rosto e eu vi seu rosto pelo reflexo do espelho. Seus olhos estavam levemente avermelhados e seu nariz estava com a pontinha vermelha.
-- Será que podemos conversar? - perguntei.
-- Não precisa dizer nada Marina, eu já entendi, eu sei como funciona, e sei o que vai acontecer depois, então não precisa dizer. Sou apenas uma boba que se iludiu e talvez viu um futuro onde não existia e jamais existirá. Era impossível, sempre me disseram isso. Nossos mundos são distantes e jamais se misturariam.
-- Não é nada disso!
-- Eu só quero ir pra casa, dormir o maior tempo que conseguir e esquecer certas coisas.
-- Mas você entendeu as coisas de maneira errada.
-- Tenho quase certeza de que não. - ela disse dessa vez olhando pra mim.
-- Vamos conversar, me deixa te contar algumas coisas e ai se você ainda achar que entendeu tudo eu não vou insistir mais, eu te levo pra casa e se preferir não me aproximo novamente de você.
Vi uma lágrima rolar em seu rosto, e senti que algo perfurava meu coração. Era doído vê-la daquela maneira, triste e chorando. Não queria isso, e exatamente por este motivo que eu precisava colocar tudo em pratos limpos.
-- Isso era exatamente o que eu não queria: você longe de mim. Mas eu vi que...
-- Me deixa falar? – quase supliquei.
-- Tudo bem. Pode falar.
-- Não aqui. Você me acompanha a um lugar especial?
A resposta foi apenas um manear de cabeça positivo. Fui até a porta e a abri para que ela passasse. Ela passou por mim e deu um pequeno sorriso. Isso era um bom sinal, talvez fosse, talvez dissesse que o dano não era tão grande assim. Me apeguei a isso!
Pegamos o meu carro e partimos para o “lugar especial”. O restaurante ficava a menos de 10 minutos do Parque Ibirapuera de carro. No pequeno trajeto eu tentava concatenar as ideias, pensar em tudo o que deveria dizer, e se deveria dizer tudo. Claro, claro que eu deveria dizer tudo, não ia valer a pena esconder algo. Se iria começar a contar, contaria tudo. Giulia ficou o tempo todo calada, apenas olhava para frente. Isso me entristeceu um pouco, mas eu esperava que depois que eu contasse tudo e estivesse tudo esclarecido ela pudesse entender e ficasse tudo bem.
-- Chegamos! - disse estacionando.
-- Parque Ibirapuera?
-- Unhum. - disse desafivelando o cinto de segurança e descendo para abrir a porta do carro pra ela.
Novamente ela sorriu com meu ato, e dessa vez o sorriso foi um pouco maior do que o anterior.
-- Se incomoda de andar um pouquinho?
-- Não!
-- São uns 10 minutinhos só, não é muito longe, mas é bem revigorante. - disse sorrindo.
Compramos um sorvete e caminhamos em silêncio. Era um tanto quanto incômodo esse silêncio, mas eu podia imaginar como ela estava se sentindo. Não ousava quebrar esse silêncio, corria o risco de ser ignorada, além do mais eu queria respeitar o desejo dela.
-- É aqui!
Chegamos onde eu queria. Estávamos debaixo de uma grande árvore, uma das mais antigas e frondosas. Debaixo da árvore havia um banco de madeira. Era lá que eu sempre sentava para observar o movimento ou a lagoa, que nesse momento estava linda e mais brilhosa do que eu me lembrava. Ela iluminava o Parque e refletia na lagoa. Estava tudo lindo!
-- Senta aqui comigo só um instantinho.
Eu disse esperando que ela fizesse o mesmo, porém ela ficou alguns segundos de costas pra mim, na direção da lagoa.
-- Giulia?
-- Eu nunca tinha vindo aqui a noite. A lua está tão linda.
Sorri quando ela disse a mesma coisa que eu pensava. Era bom saber que ela compartilhava disso comigo.
-- Vem, senta!
Ela sentou totalmente virada pra mim, me dando total atenção. Tremi nas bases, fiquei com medo. Medo de falar, medo de calar, medo dela ir embora, e medo dela me rejeitar por não entender tal situação. Se eu me colocasse no lugar dela provavelmente só aceitaria me envolver de verdade quando o passado dela estivesse totalmente resolvido. Eu torcia pra que ela pensasse diferente, pelos menos essa vez.
-- Eu não sei por onde começar, mas eu sei que tenho muita coisa pra te falar e explicar. Também tenho um convite muito importante pra te fazer. Não sei em qual ordem cronológica eu começo a falar.
-- Olha só Marina, eu sei que não temos nada demais uma com a outra, como você disse estamos nos conhecendo, e eu não tenho direito a nada, mas de verdade tem algumas coisas que eu preciso entender antes de acabar entrando nessa de cabeça. E eu te peço, por favor, seja sincera comigo.- ela falou com a voz fraca.
-- Eu serei! Então eu vou começar te contando uma estória um pouco longa e depois te farei o convite. Mas quero que saiba que como tudo até agora, você também pode dizer “não”.
-- Ok.
-- Não sei se você sabe, mas eu já fui noiva.
Notei ela remexer-se no banco, ficou inquieta, suspirou e falou.
-- Não sabia.
-- Eu fui! O nome dela é Larissa, namoramos por um bom tempo, e logo depois noivamos. Éramos noivas quando sem mais nem menos tudo acabou, aliás, ainda não tinha acabado, ela me trocou por um cara com mais dinheiro do que eu, filho de um bancário. Eu era completamente apaixonada por ela, e sofri como nunca sofri na minha vida, nem mesmo quando meus pais me rejeitaram e expulsaram de casa. Cheguei ao fundo do poço, definhava cada vez mais, eu não vinha sentido algum na minha vida. A única coisa que eu fazia era trabalhar, e foi lá que um pequeno desastre começou a acontecer. Você lembra da Verônica, a minha coordenadora não lembra?
-- Infelizmente lembro sim! Desculpa falar assim dela mas eu tenho os meus motivos pra não gostar dela, e aliás, são bons motivos. E em primeiro lugar foi ela que não gostou de mim primeiro, e eu tenho a leve impressão de que vou saber o motivo nessa conversa. - ela disse séria.
Cocei a nuca em sinal de nervosismo. Não imaginava que Giulia e Verônica já tivessem algum tipo de problema uma com a outra. Quer dizer, eu imaginava que talvez elas tivessem algum tipo de atrito, Verônica não é fácil e toda e qualquer mulher que se aproxima de mim ela fantasia que eu tenho ou terei um caso com ela e surta.
-- Será que depois eu posso saber o que aconteceu? - perguntei.
-- Pode ser, tudo vai depender do que vai me contar agora.
Senti como se espinhos descessem por minha garganta enquanto pedras de gelo voltavam a congelar meu estômago.
-- Certo. Vou continuar então. - ela me olhou como se pedisse para que eu continuasse – A Verônica entrou na minha vida em um momento muito delicado e frágil, me ofereceu atenção carinho e amizade quando precisei. Acabei permitindo a sua aproximação, e com o tempo ela mostrou o que realmente queria, ela me beijou e eu burra retribui. A partir disso começamos a sair com frequência, nos envolvemos mesmo que eu ainda não tivesse esquecido Larissa. Eu contei isso a ela e ela aceitou, isso acabou gerando um relacionamento aberto, eu não pertencia a ela e nem ela a mim, mas mesmo assim nunca fiquei com outra mulher. Levamos esse relacionamento maluco por quase três anos. Foi egoísmo meu, eu tinha medo de ficar sozinha, de talvez ao ver Larissa a minha frente desabar e tudo o que eu sentia por ela voltar, e medo de me apaixonar novamente por outra pessoa e sofrer igualmente ou pior. Mas ai comecei a notar as mudanças em Verônica, ela passou a sentir ciúmes sem motivos e de maneira desmedida, me ligava a todo tempo e sempre me perguntava onde eu estava e com que estava. Tudo acabou se transformando em possessividade, obsessão. Eu acabei terminando o que na verdade nunca tivemos, coloquei um ponto final naquela loucura, e mesmo com o fim as coisas pioraram, ela ficou mais possessiva do que antes. E ainda hoje atormenta a minha vida, ela simplesmente não aceita.
Contei tudo sem dar pausa. Acho que não queria dar pausa por medo dela levantar e ir embora sem querer ouvir o resto. Ela tinha o direito. Como eu queria saber o que se passava na cabeça dela.
-- Deixa eu ver se eu entendi. - ela disse encarando o chão – Você e a Verônica tiveram um caso, é isso mesmo?
-- Sim. - foi só o que eu disse.
-- E ela não aceita o fim não é isso?
-- Sim.
-- Eu não queria fazer esse pergunta, pode ser que eu não goste nem um pouquinho da resposta, que ela me magoe ou que me marque de alguma maneira, mas eu preciso fazer. - ela ainda não me olhava, suspirava enquanto brincava com os próprios dedos – Depois desse fim, quando você terminou com ela, é...digamos que...nossa! Já aconteceu alguma recaída? - ela perguntou e olhou em meus olhos.
Eu prometi ser sincera com ela, mesmo não querendo ter que responder essa pergunta. Eu prometi! Tinha que ser sincera, tinha que ganhar a confiança dela. Mas essa resposta talvez tivesse o objetivo contrário, e ela não confiasse mais em mim.
-- Algumas vezes. - suspirei e tomei coragem pra continuar – Infelizmente aconteceram algumas vezes. Não me orgulho disso, pelo contrário. Só que faz muito tempo desde que a última vez aconteceu.
Ela olhava fixamente em meus olhos, não conseguia captar nenhum sinal do que ela estava sentindo, e isso estava me angustiando. Esperei alguns minutos para que ela processasse a informação que havia acabado de receber. Os minutos me parecem longo demais. Enquanto ela pensava eu a observava. Como seria injusto se essa mulher linda e maravilhosa saísse de minha vida assim tão rápido. Como eu ficaria se isso acontecesse? - eu pensava.
-- Eu...eu não sei mais o que dizer...é que isso é tudo muito complicado...eu não sei.
Me aproximei mais dela no banco, mas sentando-me totalmente voltada para a lagoa iluminada pela lua.
-- Como você disse, não temos nada uma com a outra, estamos nos conhecendo, mas eu sinto que te devo explicações, não é por obrigação ou nada parecido, apenas necessidade. Sei que deveríamos ter tido essa conversa antes de tudo o que aconteceu, mas as coisas aconteceram sem controle. E eu gostei disso. Tudo o que eu falei hoje e que estou falando agora são palavras sinceras, são verdadeiras. Então eu vou entender se quiser distância de mim, vou entender se quiser parar por aqui, porque eu sei o quanto é complicado o que eu vivo e eu sei que eu não deveria ter te metido nisso, deveria ter me resolvido antes de qualquer coisa. Também sei o quanto é difícil aceitar esse tipo de situação, pode parecer instável. Mas quero que saiba que eu tentei, e que não estou conformada com essa situação, ela incômoda, é inadequada, e é errada. Não sei definir em que tempo ou exatamente como isso aconteceu, mas eu me apaixonei por você Giulia, mesmo com medo de sofrer eu me apaixonei. Talvez eu sofra novamente, mas são coisas que acontecem, e eu vou ter que me erguer novamente, por isso eu quero te pedir um favor. Caso desista de querer tentar, por favor, me diz o que eu tenho que fazer ou como eu tenho que agir pra te esquecer ou pra esquecer tudo o que podíamos ter vivido. - eu disse com os olhos marejados, sentindo um leve aperto no peito e um grande nó em minha garganta.
Segundos depois senti um grande aperto em minha cintura, algo molhava meu pescoço, e de repente ouvi soluços. Giulia abraçava apertado a minha cintura. Não sei o que senti com a via agarrada a mim daquela maneira. Virei para a sua direção e também a abracei, permitindo que algumas lágrimas rolassem por meu rosto.
-- Não chora Giulia! Por favor.
-- Eu não quero Marina, não quero! - ela disse com a voz embargada.
-- O que você não quer?
-- Não quero te dizer o que você tem que fazer pra me esquecer, não quero que me esqueça. Também não quero distância de você, e muito menos quero desistir de tentar. Nunca senti nada parecido com o que você está me fazendo sentir em tão pouco tempo, é tudo tão diferente e tão novo. É algo que me deixa estasiada e boba 24h por dia. Você não sabe a dor, o aperto que senti em meu peito quando vi o nome daquela mulher no seu celular e o estado como ficou, eu juntei tudo, todas as pontas soltas e deduzi que eu era a boba da estória. Eu imaginei que estivesse brincando comigo, que estivesse me usando, ou qualquer outra coisa do tipo quando na verdade a sua namorada era ela, era a Verônica. Doeu, doeu imaginar tudo isso, doeu imaginar todas as vezes que ela te beijou ou tocou a sua pele, e doeu ainda mais imaginar que foi a boca dela que você beijou logo depois do nosso primeiro beijo. Eu tive um grande esforço pra entender e aceitar o que eu sentia, precisei de ajuda pra saber o que exatamente eu sentia, e eu consegui, eu consegui entender. Foi por isso que aceitei o seu convite, porque eu precisava disso. É muito importante. Eu precisava te dizer tudo.
Ela disse tudo sem me deixar falar nada. Ainda estava agarrada a mim, e eu a abraçava ainda mais forte. Foi muito bom ouvir tudo aquilo, tirando algumas partes. Deve ter sido duro pra ela imaginar que talvez eu estivesse brincando com ela, mentindo e a iludindo. Mal sabia ela que eu jamais faria isso com ela, que eu sai de um mundinho só meu, onde me sentia protegida justamente por ela. Tenho certeza que meus olhos brilharam ao ouví-la dizer que precisava me dizer algo importante. Na hora cogitei que talvez ela pudesse dizer que sentia o mesmo que eu sinto por ela. Não queria cogitar, eu precisava da certeza.
-- O que você precisava me dizer Giulia?
Ela fungou uma última vez e saiu de meus braços. O choro parou. Limpou os resquícios e rastros das lágrimas. Afastou-se um pouco de mim, respirou fundo e soltou.
-- Eu também estou apaixonada por você Marina! – disse olhando em meus olhos.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Sem comentários
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook: