Capítulo 3 - Sereia
Manuela ergueu-se, saindo da água e parando de maneira intimidadora diante uma Isabela desgrenhada e envergonhada.
-- Então, mocinha. O que procurava ver de cima daquela palmeira? – Disse, arqueando uma sobrancelha.
-- Bem, eu... – Isabela não conseguia tirar os olhos do corpo nu de Manuela. Estava em transe. – “Meu Deus, é uma sereia!” – Delirava em seus pensamentos.
-- Você...?
-- Eu quando criança sempre tive o costume de subir em árvores e aqui na fazenda posso aproveitar para reviver as memórias da infância. – Dizia sem tirar os olhos daquela monumental mulher que a observava de forma enigmática.
-- Sim, claro. – respondeu com um de voz rouca e com uma expressão que aumentava o desejo de Isabela de lhe beijar. – E desde a infância você costuma espionar do alto das árvores as pessoas que nadam no rio? – fez um bico que causou arrepios na loirinha.
-- Não!!! Eu não estava espionando você. – os olhos verdes pareciam ter luz própria – Eu só.... Foi um acidente. É isso. – sorriu causando ruguinhas no nariz - Um acidente. – “Acidentadas são suas curvas, sereia!”
-- Está bem. – “Que ruguinhas são essas?” - Melhor sairmos daqui. – Exigiu, saindo do transe que aquelas esmeraldas lhe causava – Vire-se, pois quero privacidade para secar-me e vestir-me.
-- OK. – Isabela aceitou o que a outra lhe pedira, mas sempre que podia, dava uma espiada naquele corpo escultural. – “Que seios, que pernas, que tudo...”
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-- Ave Maria, Isadora! O que foi isso? – Dalva Perguntou, admirada ao ver a menina desgrenhada e com as roupas molhadas.
-- Foi um bólido caído do céu diretamente no rio enquanto eu tomava banho, Dalva. – Disse Manuela, com uma sobrancelha levantada em sinal de zombaria.
Dalva olhou espantada de uma para a outra e Isadora sorriu sem graça. Foi quando a avó Joana perguntou:
-- O que fazia no rio Isabela?
-- Bem, eu... Eu queria refrescar-me um pouco nas águas e... Estava apenas conferindo se não havia alguém por lá que pudesse ver-me ou até fazer-me algum mal.
Manuela olhou para Dalva e deu meio sorriso. Joana, notando a cumplicidade das duas mulheres, disse:
-- Ah você foi inspecionar se estava tudo tranquilo para que pudesse tomar seu banho e atrapalhou o banho de Manuela? – Disse a avó com dissimulada inocência.
-- Foi sem querer. – Respondeu Isadora, mais vermelha do que um tomate.
Enquanto isso Dalva quase falou o que não deveria:
-- Mas Isabela, quando você saiu daqui eu disse que a Manuela... – A cozinheira calou-se antes de confirmar o que todas ali bem sabiam, que a ida de Isabela ao rio havia tido como claro propósito de espiar Manuela.
Foi quando a morena se aproximou e ao parar diante da menina disse com voz sensual em seu ouvido:
-- Espero que tenha gostado da visão que teve do alto da palmeira e da que teve de dentro do rio. Só peço que tenha cuidado da próxima vez, não se brinca com a natureza selvagem, ela pode ser perigosa. – Ao dizer isso, piscou para Isabela, pediu licença a todas e retirou-se, deixando a loirinha ainda mais entorpecida.
Após Isabela retirar-se, Joana perguntou à Dalva:
-- Você está pensando o mesmo que eu?
-- Não, eu já pensei! No que vai dar é que não sei. – respondeu, voltando aos seus afazeres.
-- Temo pelas duas. Manuela já teve sua cota de sofrimento ultrapassada nesta vida e Isabela pode vir a sofrer em consequência disso. – Refletiu Joana, preocupada com a já evidente paixão da neta pela afilhada.
-- Eu que o diga. Aquela menina é muito fechada, mas comigo ela se abre bastante, sei de coisas, Joana, que vocês nem imaginam. Manuela foi ao inferno e voltou. Mas que seria muito bom para ela voltar a amar, seria. Só não sei se Isabela seria a pessoa ideal, apesar de achar que fazem um casal por demais lindinho. – Completou sorrindo.
-- Ai, Dalva, isso envolveria tantas coisas, seria muito bonito, se fosse possível. Sei que sofrerão se isso for adiante, principalmente Isabela. Mundos diferentes, momentos e histórias de vida opostos.
-- Joana, nós bem sabemos que os mundos “estão” opostos. A realidade de Manuela é bem diferente do que hoje podemos ver.
-- Eu sei, Dalva, mas as cicatrizes dela são tão profundas que não sei se voltará um dia a ser o que foi. Lamento muito isso, sabe? Ela é competente em tudo o que faz. É linda, inteligente, de um grande coração. Às vezes me pergunto por que Deus permitiu tanta desgraça com uma pessoa tão especial como Manuela.
-- Tive uma ideia! – Dalva gritou alegremente.
-- O que foi? – perguntou um pouco assustada com a alegria da cozinheira.
-- Vou fazer entrevero de pinhão para o almoço de amanhã e convidar aquela menina para almoçar conosco. Ela adora a minha comida. Aí faço ela desembuchar tudo sobre o que está acontecendo e quais as perspectivas.
-- Dalva, você vai traumatizar Manuela. Essas suas comidinhas especiais quando quer arrancar informações dela já estão manjadas. – Divertiu-se Joana.
-- Vou mandar um “zap” para ela.
-- Dalva e suas tecnologias – Joana riu. – Faça mesmo isso. Pergunte tudo a ela. Estou preocupada com essas duas. – completou pensativa.
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-- Eu vi uma sereia! – Isabela disse ao entrar no quarto, onde já se encontrava Alexandra.
-- O que foi isso, Bela? Enlouqueceu de vez? De onde está vindo molhada e acabada desse jeito e ainda delirando? – Perguntou uma admirada Alex.
-- Ai, Alex, paguei o maior mico. Acho que até posso dizer que paguei o King-Kong, mas nossa... – Derreteu-se.
-- O que você fez, Bela?
Isabela contou à irmã tudo o que aconteceu quando foi ao rio, deixando-a boquiaberta pela sua desfaçatez.
-- Dessa vez você ultrapassou todos os limites do bom senso, da sensatez e da falta de vergonha. O que deu em você, criatura? – estava surpresa com as ações da irmã mais nova.
-- Não sei se isso tem nome, nunca havia sentido antes. – respondeu como se pensasse em alguma coisa - Diria que foi um feitiço emitido por aqueles lindos olhos azuis.
-- Qual impressão você acha que causou em Manuela ao cair de uma palmeira aos pés dela dentro do rio?
-- Acho que ficou evidente os motivos pelos quais eu fui até lá. Ela não é boba, Alex. Olhou-me com aquela sobrancelha levantada e disse umas coisas que deram a entender que sabe muito bem sobre as minhas intenções. Se me perguntar, não negarei.
-- Você pode sair muito ferida disso tudo, Isabela. Eu já avisei. Além do mais, tem vovô, nossos pais... É muita novidade num curto espaço de tempo. E ainda tem o risco que você corre de levar um fora.
-- Tenho consciência de tudo isso, Alex. Mas não paro de pensar nela um só minuto. – fechou os olhos como se tentasse rever a cena da morena saindo da água. – Gente, que visão dos deuses. Quando me dei conta aquela deusa estava nua em pé encarando-me. – Falou sorrindo.
-- Pelo menos seu intento não foi em vão. Viu a sua deusa pelada, sua safada. – declarou, divertindo-se com a irmã. – Pelo que conheço dela, deve ter percebido claramente sua intenção depois do gorila que pagou – Divertiu-se Alex.
-- Pelos olhos dela e o jeito como despediu-se, percebeu sim.
-- Vá com cuidado, maninha. Manuela tem um histórico imenso de desgraças em sua vida para você trazer-lhe mais problemas.
-- Prometo ir com cuidado, mas não irei abrir mão de tentar conquistá-la. Que sereia, Alex! A minha sereia! – Frisou a palavra “minha”.
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Manuela ao chegar em casa refletia sobre o atrevimento daquela loirinha e ao lembrar-se da queda da mesma dentro do rio, foi inevitável gargalhar.
-- “Menina mais doida. Podia ter-se machucado”. – Pensou sorrindo.
O celular emite um som de mensagem do WhatsApp, ao olhar a tela do aparelho, Manuela viu que se trata de Dalva
-- Minha Manuzinha, o que você está fazendo?
-- Deitada, sua velha safada e fofoqueira. – digitou sorrindo.
-- Como pode dizer isso de mim?
-- Quando vem com o “minha Manuzinha” é por que quer saber de algo. Eu te conheço!
-- Eu? Jamais! Só queria te avisar que ainda tenho um bolinho extra guardado para você. Aproveite e venha comer essa delícia feita por mim e já retribua o meu afago contando-me os detalhes sórdidos daquela infâmia que ocorreu hoje no rio.
-- Está bem, fofoqueira. Você sabe mesmo como arrancar-me confissões. Por seu bolinho me rendo. Em alguns minutos chego aí.
-- Ebaaaaaa. – a velha senhora digitou várias carinhas sorrindo, o que fez a morena sorrir, também.
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Ao chegar na cozinha, Manuela é prontamente recebida por Dalva com o bolo já servido.
-- Mas é muito sem vergonha e fofoqueira mesmo... Até com mordomias ela me espera em troca de saber as novidades. – Falou com zombaria, arqueando a sobrancelha e fazendo o seu famoso bico sedutor.
-- Conte-me tudo, não me esconda nada! – pediu ansiosa. – Anda, Manuzinha, desembucha!
-- Dalva você não existe... - Divertiu-se e iniciou a narrativa.
Dalva então concluiu:
-- Manu, pelo que soube, essa menina acabou de terminar com o noivo, de quem todo mundo sempre soube que ela nunca gostou. Vai ver descobriu seu outro lado e aí se apaixonou por você... Seu lado B. – concluiu como se descobrisse um tesouro perdido.
-- Dalva, que sandice você está dizendo. Você sabe muito bem que apaixonar-se por mim é a maior burrada que essa menina ou qualquer outra mulher pode cometer.
-- Ah, Manu, deixa disso, vai. Já está na hora de recomeçar a sua vida. Tenho certeza de que Andressa de onde estiver iria ficar feliz em saber que você deixou a solidão. Vive sozinha naquela cabana, trabalha o dia inteiro... Precisa de algo certo, estável. Hoje mesmo sua madrinha ainda comentava sobre o desperdício que é a vida que você leva. Por mais que você queira representar ser “uma simples capataz”, isso é impossível, basta conversar um pouco com você que todo o teatro vem à tona logo ali.
-- Já tive uma estabilidade, minha querida Dalva, e perdi tudo, como você bem sabe. Minhas feridas estão fechadas com uma fina camada de pele, que logo ali pode voltar a se abrir. Não quero sangrar novamente. Por isso, nada de aventuras.
-- Eu não falei em aventuras. Se bem que não deixaria de ser... Até acho que é o que está faltando para tirar você da mesmice. Ou você acha que vou acreditar que a mulherada do Camafeu dá futuro para alguém?
-- Ali é apenas sex*. Sem cobranças, sem sentimentos, sem dores. Apenas um meio de sentir o calor de alguém quando estou muito carente.
-- Mas e o que achou da loirinha? – Dalva Perguntou, fazendo um gesto divertido com as sobrancelhas.
-- Ela é maravilhosa, Dalva. Mas é apenas um sonho, neta do padrinho, vive na cidade, dez anos mais nova que eu... Deixa a menina viver com alguém que a mereça, que não tenha traumas, que seja “limpa” de dores, culpas ou sofrimentos.
-- Mas e se Deus estiver te dando um presente, Manu? E se a missão dessa menina é resgatar você dessa escuridão em que vive? Já pensou nisso?
-- Não pensei. Só espero que Ele não seja tão cruel com ela, dando-lhe tal missão, e nem comigo, fazendo-me arriscar a morrer em vida mais uma vez.
-- Entendo, minha menina, mas prometa que vai deixar as coisas seguirem o seu curso. Não corte a menina, ela está indo tão bem. – Dalva conclui com zombaria, rindo muito, emitindo um som que fez Manuela rir junto e dizer:
-- Está bem, sua “Mutley”, agora para de rir, que o negócio é sério.
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Quando Manuela já ia embarcar na caminhonete de volta à sua cabana, Isabela a chamou.
-- Manuela. – Gritou enquanto se aproximava.
-- Oi. Deseja algo?
-- Sim, em primeiro lugar desculpar-me por tudo o que aconteceu lá no rio.
-- Não tem problema, Isabela, tudo certo.
-- Queria pedir-lhe algo. – Disse nervosa.
-- Pois peça. Sou toda ouvidos. – Seus olhos emitiram um brilho que fez Isabela treme antes de falar.
-- Quero que sejamos amigas e que... bem... deixe-me conhece-la melhor. – Pediu ainda intimidada com aqueles olhos azuis.
-- Melhor? O que seria “melhor” para você? – Perguntou aproximando-se mais.
-- Significa que quero conhecê-la, saber tudo sobre você, sobre o que pensa, sobre o que deseja, sobre sua vida, passado, presente e planos para o futuro, além de...
-- ... de?... – interrompeu mais uma vez. Estava tão próxima que Isabela podia sentir seu perfume.
-- De ter... de ter... – gaguejou, sentindo-se intimidada por aqueles lindos olhos. – De ter a chance de ser sua namorada. Pronto, falei! – Manuela a olhou de forma avaliadora, enquanto ela segurava a ansiedade.
-- Você realmente é muito direta. Conseguiu surpreender-me.
-- Sério? Que bom. – Sorriu, aliviada.
-- Só quero que saiba de uma coisa, Isabela. Meu passado é sombrio, meu presente é estanque e futuro não sei se tenho. Acho que você não iria querer uma coisa dessas para sua vida, tampouco acho que mereça algo assim.
-- Isso sou eu quem decido. Só quero que me permita tentar. – Respondeu decidida, encarando-a.
-- Minha amizade você já tem. – Permanecia encarando os lindos olhos verdes – Quanto ao resto não posso te prometer nada.
-- Não pode prometer, mas também não vai descartar... – aproximou-se mais, estava linda – Ou vai?
-- Você é mesmo muito ousada. – Respondeu quase prendendo a respiração. Precisava segurar seus instintos. – Acredite, meu medo é que você sofra. Recue enquanto há tempo, garota. Ainda há tempo.
-- Ainda? – Perguntou com um misto de surpresa e alegria.
-- Sim, ainda, pois se você insistir não responderei por mim – falava baixo. – Mas não quero ser culpada das dores que poderei causar a você. Juro que se não soubesse do que estou falando já teria te convidado agora para sair por aí para conversarmos e quem sabe até...
-- Até...?
--Vamos ficar por aqui, sim? Acho que por hoje já tivemos doses muitíssimo elevadas de emoção.
-- Ok, Manu. Mas que bom que podemos ser amigas e que minhas chances não são nulas. – Falou sorrindo, enrugando o nariz, o que fez com que Manuela tivesse uma reação inesperada.
-- Tchau, Bela. Até amanhã. – Ao despedir-se, sorriu e beijou o rosto de Isabela, o que deixou a menina em êxtase.
-- Tchau, Manuela. – Puxou-a pela mão e retribuiu o beijo, no canto da boca. Sorriu e completou. – Sonhe comigo. – Respondeu exultante.
Manuela sacudiu a cabeça e embarcou na caminhonete, mas dessa vez seu rumo não era a cabana e sim o famoso Camafeu. Necessitava dos braços de uma mulher para aplacar o que aquela menina a estava fazendo sentir.
-- Que diaba loira! Eu não posso ceder... De novo não. Amar não é para mim. – Dizia para si mesma enquanto dirigia sua camionete pela estrada, levantando poeira. Manuela sabia muito bem os riscos que corria ao deixar-se amar novamente.
Fim do capítulo
Meninas, aqui estou, depois de muitos dias. Algumas atribulações e um pequeno bloqueio criativo impediram-me de retornar mais cedo. Mas aqui estou com nossa dupla explosiva. Peço-lhes sugestões, observações, críticas, tudo é bem vindo. Beijos a todas.
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lia-andrade
Em: 02/02/2016
Kkkkkk Bela é uma figura.. muito decidida, sempre indo atrás do quer... esta deixando Manu doidinha.. kkk adorando..já estou louca pelo primeiro beijo.
Beijos..até o próximo.
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Ana_Clara
Em: 28/01/2016
Essa Isabella é um furacão, eita menina explosiva e safadinha! Kkkkkkkk E já estou muitíssimo curiosa para o dia em que a Bella vai desestruturar totalmente a Manu. Aliás, apenas questão de alguns capítulos para este acontecimento. kkkkkk
Resposta do autor em 28/01/2016:
Com certeza. Aguarde e verá! kkkkk. Obrigada pela leitura e pelos comentários, querida. Beijos.
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Mille
Em: 28/01/2016
Essa Bella e direta e não gosta se levar um não. Está deixando a Manu doidinha e pra não fazer bobagens se entregando a lourinha vai atrás de algo para acalmar os ânimos na hora.
Bjus e até o próximo
Resposta do autor em 28/01/2016:
É verdade, Mille. Ela é danada e Manu está fugindo de problemas.
Beijos e obrigada mais uma vez pela leitura e, principalmente, pelo comentário, pois são eles de grande incentivo.
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