Capítulo 34
As Cores do Paraíso - Capítulo 34
A polícia, em uma obediência cega e cruel, atirou várias balas de borrachas e bombas de gás. Sem diálogo, os policiais levantaram seus escudos e partiram para cima da imprensa e de quem protestava. Logo, mais bombas de efeito moral e tiros de bala de borracha espalharam os manifestantes pelas ruas estreitas. Um repórter foi atingido na perna por uma bala de borracha e caiu rolando pelo chão.
Gabriela e Laura tentavam proteger as crianças levando-as para um lugar seguro.
Davi assistia a tudo assombrado. Sua neta e sua sobrinha estavam lá no meio de toda aquela confusão. Foi até o governador e lhe deu um leve empurrão.
-- Você está maluco? Não percebe que está manchando a minha imagem perante os eleitores de todo o país? A imprensa vai me destruir - Arrancou o microfone da mão dele e bradou chamando a atenção do comandante do batalhão da polícia.
-- Comandante Felix... comandante Felix... - chamou até que o oficial voltasse a sua atenção para ele - Chame seus homens. Vamos fazer um acordo.
O oficial obedeceu e recuou o seu batalhão.
O governador permaneceu estático. Não concordava com a atitude do senador, mas precisava do poder político dele para a sua reeleição.
Os manifestantes olhavam-se sem entender o que estava acontecendo. Teriam conseguido algo? Ou seria apenas uma estratégia da polícia?
Não comemoraram. Estavam receosos ainda.
Procuravam com os olhos pela loira que de forma tão corajosa havia se juntando a eles naquela luta.
-- Gabi, meu amor, você está bem? - Laura ajudava a prima a levantar-se do chão.
-- Agora eu entendi porque se chama ''bala de borracha'' você toma um tiro na cabeça e apaga - riu da própria desgraça - A minha sorte é que estava com o capacete das domésticas Super Poderosas.
-- Não sei como você consegue brincar com algo tão sério. Isso aqui virou um campo de batalha.
-- Vá se acostumando. Quando estou nervosa só falo merd* - bateu as mãos na calça jeans tentando tirar um pouco da poeira -- Então? Muitas baixas?
-- Alguns machucados pelas balas de borracha, na maioria jornalistas. Nada grave.
-- Menos mal - olhou ao redor e percebeu que todos olhavam para ela.
-- O tio está reunido com os demais políticos. Estão pensando em um acordo amigável com os moradores - Laura olhou para a prima com o semblante preocupado - Gabi, o tio vai matar a gente. Praticamente sabotamos a candidatura dele.
-- Isso é o que menos me preocupa nesse momento - ela deu de ombros.
-- Eles estão esperando por você -- fez um gesto com a cabeça, apontando para as pessoas ao redor - Você é a líder deles.
Gabriela não podia decepciona-los. Já que começou teria que ir até o fim.
-- Vamos ouvir o que eles têm a nos oferecer - Com um gesto de mão chamou todos os manifestantes para mais próximo dos políticos.
O senador Davi tomou a palavra e disse:
-- A Prefeitura nos próximos dias irá convocar todos os moradores do bairro para um cadastramento sócio econômico do programa de regularização fundiária
A parceria entre o governo e a prefeitura prevê a titulação em nome dos moradores de 230 lotes pertencentes ao Estado.
A transferência e os valores a serem pagos terão de levar em consideração critérios de renda, a existência ou não de propriedade de outro imóvel e o uso ou não para fins comerciais.
Gabriela levantou a mão, pedindo a palavra.
-- Fala Gabriela - Davi fez careta.
-- Enquanto a infraestrutura e os valores a serem pagos não forem aprovados, eles continuam em suas casas - falou e foi ovacionada pelos moradores.
Davi cruzou os braços e ficou olhando para a neta.
-- Querem sauna, quadra de tênis, também? - Falou irônico.
-- Que tal um campo de futebol? - Gabriela retrucou.
Todos riram.
-- Criem uma comissão para analisar. Vocês têm a minha palavra de que ninguém sairá daqui sem o novo local estar devidamente aprovado.
Todos comemoraram. O barulho foi imenso, gritos, palmas, assovios.
-- Vamos embora Gabriela - Davi saiu pisando pesado.
Gabriela abraçou a líder comunitária.
-- Hoje eu vou apanhar em casa - falou fazendo bico.
-- Não entendi - A mulher a olhou confusa.
-- Ele é o meu avô.
Em Recife.
-- A Gabriela é maluca Luiza. Como posso ficar tranquila? - Samanta andava de um lado para outro. Levantava o braço fazendo gestos nervosos.
-- Estou tentando ligar para ela, mas só cai na caixa postal - jogou o celular sobre o sofá e foi até a porta tomar um ar.
-- Segundo um repórter que estava cobrindo a manifestação ela levou um tiro de bala de borracha.
-- Mas segundo o mesmo repórter, ela está bem - Luíza fechou a porta e entrou - Calma meu amor. É bem capaz do velho despachar ela para casa no primeiro avião com destino a Recife.
-- Tomara, porque se algo acontecer com minha filha a culpa será toda dele.
No apartamento de Larissa a conversa era a mesma. Ela e as amigas assistiam ao noticiário na televisão
-- Só olha o absurdo da coisa, gente. Minha preocupação é que a Gabi com essas atitudes impulsivas, ainda entre em alguma confusão.
-- Ela sempre foi assim Lari, ninguém vai conseguir mudar esse jeito revolucionário dela.
-- Ainda acho que ela deveria estar cuidando da carreira de pintora ao invés de estar fazendo campanha política com o avô. Esse velho é insuportável, não merece a neta que tem.
-- Não esqueça que se o senador não a tivesse ameaçado, ela não estaria com ele -- Talita falou séria e Larissa a olhou atentamente.
-- É... -- soltou um suspiro -- Talvez você tenha razão.
A campainha tocou neste instante, fazendo todas olharem para a porta. Como Mauricio não apareceu, Larissa levantou e foi atender.
Fernanda entrou no apartamento como se houvesse acontecido uma tragédia.
-- Como elas estão? Perguntou esbaforida e preocupada.
O cérebro de Larissa levou alguns segundos até processar a pergunta.
-- Estão bem. A Gabi levou uma bala de borracha na cabeça - Larissa falou abraçando a amiga - Fora o fato de ter ficado um pouquinho mais piradinha, de resto tudo bem.
-- E a Laura? - Fernanda perguntou em meio ao abraço.
-- Tudo o que sabemos é através dos noticiários. Ainda não conseguimos falar com a Gabi. O celular dela chama, chama e cai na caixa de mensagem -- Talita apressou-se em dizer.
-- Larissa faz um favor para mim? -- Ela coçou a nuca - Quando falar com a Gabi, pede o número do celular da Laura? - falou timidamente.
Talita puxou Fernanda até o sofá.
-- Pode deixar. Se a Lari esquecer, eu mesma pergunto - ela disse imediatamente, estendendo a mão, que rapidamente fora apertada por Fernanda, fazendo Alice soltar um sorriso.
Em um hotel de Blumenau.
-- Mas vô, pensa no lado positivo de tudo isso... - Gabriela tentava argumentar com Davi.
-- Não adianta Gabi. Você vai voltar amanhã mesmo para Recife -- ele fez cara feia para ela - A sua atitude pode ter-me feito perder a eleição.
-- Vô, pensa. Você pode até perder a eleição, mas ganhou o respeito e a gratidão de 2.600 famílias...
O senador arqueou a sobrancelha.
-- E de sua neta também - Gabriela completou baixinho.
Davi ficou em silêncio.
-- Senador.... Com licença - Djalma interrompeu a conversa.
Davi fez uma careta e virou-se para Djalma.
-- O senhor precisa ver isso - colocou o notebook diante do político - Todos os sites e jornais estão elogiando a sua atitude. Veja essa manchete que interessante:
" Senador Davi, enfim um político que mostrou respeito pelo povo", e esse comentário:
" Ele mostrou uma capacidade incrível de apaziguar uma situação que tinha tudo para acabar em tragédia"
Davi teve vontade de rir, porém não o fez, diante da expressão de sapeca da neta.
-- Meu vô é lindo! -- ela disse sorrindo, fazendo o homem apenas menear a cabeça.
-- Gabriela vai dormir - falou de forma mais terna - Amanhã conversamos.
Ela beijou a bochecha do vô, soltou um sorriso e saiu da sala.
O velho senador ficou olhando para a neta que caminhava em direção ao quarto. Passou a mão no local em que ela havia beijado e soltou um de seus sorrisos de canto de lábios.
-- Ela é doida, mas às vezes faz coisas certas - murmurou.
-- O senhor deveria tomar uma providência senador. É óbvio que ela não quer se curar dessa doença.
-- Por favor. Não se meta nos meus problemas familiares Djalma - esbravejou fazendo o assessor dar alguns passos para trás - Ela vai ser curada. Assim que voltarmos a Recife a levarei até o Tadeu.
O assessor pediu licença e saiu da sala. Não estava convencido.
Djalma se dizia um ex gay. Contava que havia deixado a prática pela força de vontade e pela fé. Para ele pessoas como Gabriela, que não queriam ser tratadas, deveriam ser banidas.
Gabriela finalmente atendeu a ligação de Larissa.
-- Desculpa, miau. Não foi possível atender as suas ligações -- ela disse baixinho doce e pesarosa.
Larissa: -- Você deve estar muito ocupada levando balas de borracha na cabeça - falou de forma sarcástica.
Gabriela sorriu com os lábios apertados. Sua ruiva estava bravinha e sabia que ela tinha razão.
Gabriela: -- Amor, me dá mais uma semana? - Pediu com jeitinho.
Larissa: -- Mais uma semana Gabi? - Reclamou manhosa.
Gabriela: -- É o tempo que vai levar para encerrar os compromissos do vô aqui no Sul do país.
Larissa permaneceu em silêncio, com os olhos presos no teto branco do quarto e o celular junto ao ouvido. Tinha vontade de pedir para ela voltar naquele momento. Mas não podia fazer isso. Não podia pressiona-la a deixar de fazer algo que entendia ser a sua missão. Então concordou, mesmo que angustiada.
Desde que Gabriela passou o número da prima para Larissa, Laura vivia pelos cantos com o celular na mão. Era watsapp a todo momento.
-- Laura, sabe aquela vontade de acordar cedo e correr no parque?
-- Humm.
-- Nunca tive!
Laura continuava distraída digitando com um sorriso bobo nos lábios.
-- Não basta perder tempo no WhatsApp, tem que escutar os próprios áudios para dobrar a perda de tempo.
Gabriela tentava chamar a atenção da prima, mas não tinha jeito.
-- Tem remédio para tudo nesse mundo, menos para uma doença chamada WhatsApp.
Laura irritou-se.
-- Gabriela será que não percebeu que estou ocupada? Vai lá para o quarto assistir os Minions, vai.
-- É a cebola mutante? - Tentou olhar para a tela do celular, mas Laura escondeu.
-- Se você está se referindo a Fernanda... é ela mesmo.
-- Engraçado né Laura.... Você fala que nasceu no Nordeste e as pessoas já imaginam você no meio da seca, ouvindo Luiz Gonzaga e comendo rapadura.
A garota jogou uma revista em cima dela demonstrando toda a irritação que sentia.
-- Vai para o quarto Gabi, antes que eu perca a paciência.
-- Que medo! - Provocou - Deixa o vô perceber que você não está curada, irmã Laura.
-- Gabi, não brinca com isso -- ela levantou a cabeça e lançou um olhar sinistro para a loira - Sabe o Djalma? Ele é um ex gay.
Gabriela deu uma gargalhada.
-- Não existe nem ex-gay, nem ex-heterossexual, na verdade o que acontece é que a pessoa oprime a sua sexualidade por causa do preconceito, mas ele não deixa de ter sua orientação sexual, seus desejos, seus afetos. Ele pode oprimir, mas mudar ele não consegue. Nenhum estudo aponta que é possível mudar sua orientação sexual. Ao invés do vô estar discutindo a questão da cura homossexual, ele devia estar discutindo a cura da homofobia, que é o mal da sociedade.
-- Concordo com você, Gabi. Mas toma cuidado. Ele é um fanático religioso. Possui uma crença exagerada, uma adesão cega a tudo que o vô prega, ele identifica essa crença como se fosse a verdade absoluta e se sente como o dono da verdade. Pior, considera seu inimigo todos aqueles que não compartilham da sua fé.
-- Eles devem ter embutido essa ideia em milhares de cabeças. Não é mesmo?
-- Com certeza. Portanto, tome cuidado. Ele é intolerante.
A semana foi repleta de compromissos. Gabriela ficou tão popular depois do ocorrido em Blumenau, que, o senador se viu obrigado a leva-la junto em todos os seus encontros políticos.
Por onde passavam eram ovacionados pelo povo.
Em um desses encontros ela ouviu uma sugestão inusitada. Um deputado federal disse que iria sugerir um projeto de lei para a criação de uma "bolsa ex-gay", destinada a homossexuais que afirmam terem voltado a ser heterossexuais.
Ela olhava para Laura com uma expressão de lamento. Buscou manter-se calma, embora fosse difícil ouvir tanta besteira sem falar uma carrada de desaforos.
Foi dormir desanimada. Por mais que tentasse mudar o vô ele parecia continuar a ser o mesmo homofóbico de sempre.
"As pessoas são diferentes não adianta esperar que elas procedam como imaginamos." Zíbia Gasparetto.
Naquela noite Munique lhe falou em sonhou. Ela estava em um lugar muito bonito, cheio de flores e as nuvens pareciam nubladas e o vento era muito forte, viu uma cama e nessa cama havia uma garota deitada. Aproximou-se e notou que aquela garota era ela. Munique pegou na sua mão e falou:
-- O problema que te preocupa talvez te pareça excessivamente amargo ao coração. E tão amargo que talvez não possas comentá-lo, de pronto.
Às vezes, a sombra interior é tamanha que tens a ideia de haver perdido o próprio rumo. Entretanto, não esmoreças.
Abraça o dever que a vida te assinala. Serve e ora. A prece te renovará energias.
O trabalho te auxiliará. Deus não nos abandonará. Fazê silêncio e não te queixes.
Alegra-te e espera porque o Céu te socorrerá. Por meios que desconheces, Deus permanece agindo.
Emmanuel.
Na chegada em Recife, tanto Gabriela quanto Laura estavam eufóricas.
-- Vou ligar para a Larissa -- seus olhos se iluminaram - Quero me encontrar com ela ainda hoje.
-- Marca o encontro lá na praia do Encanto. Quero me encontrar com a Fernanda também -- falou com uma empolgação e com um contentamento irresistível, cheia de felicidade.
Gabriela foi contagiada pelo entusiasmo de Laura. A Betty Boop Cearense parecia ter conquistado o coração da prima. A loira jurou para si que não sairia daquela casa sem levar Laura consigo. Faria de tudo para liberta-la daquele bando de doentes que se achavam os donos da verdade e que cada vez mais aumentavam o número de seguidores. Eles arrastavam multidões com atitudes de cordeiros, mas eram verdadeiros lobos disfarçados.
Pegou o celular e ligou para Larissa.
As garotas não perceberam, mas havia alguém ouvindo a conversa delas.
O Teatro Dos Vampiros -- Legião Urbana
Sempre precisei de um pouco de atenção
Acho que não sei quem sou
Só sei do que não gosto
E destes dias tão estranhos
Fica a poeira se escondendo pelos cantos
Esse é o nosso mundo
O que é demais nunca é o bastante
E a primeira vez é sempre a última chance
Ninguém vê onde chegamos:
Os assassinos estão livres, nós não estamos...
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
lucy
Em: 22/01/2016
Será que é o mala ex gay ? Já cola das meninas .....ele quer
tombar com a Gaby deu pra perceber...talvez por medo.do velho
Simão cair.nos.encantos.da.neta e mudar seu modo.homofóbico
Se tem ex gay tem que existir ex homofóbico..... Que. Sabe essa cura
Acontece na vida.do Senador ....e.esse puxa saco talvez tenha medo
de perder a atenção do Senador......ah apresenta o Maurício pra ele
Que a certeza dele vai.por água abaixo.....vai irradiar purpurina rs rs ...
Bjs e.nota.mil
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