Capítulo 4 - Subserviência
13 de fevereiro de 2118
– Já tocou a sirene das seis? – Sam resmungou ao acordar, estava num dos quartos destinado aos casais reconhecidos pelo exército, deitada sobre o peito de Mike, que afagava seu braço.
– Tocou sim, há cinco minutos, e se você continuar nessa preguiça vai nos atrasar, você sabe que temos missão hoje. – Mike respondeu.
– Num lugar longe e frio… – Sam bocejava.
– Vamos, meus soldados contam comigo, preciso dar o exemplo. Saia de cima de mim e se vista. – Mike disse, incisivo.
Sam levantou-se com movimentos lentos, sentando-se na beira da cama e vestindo sua jaqueta verde. Uma vez por semana era permitido que os casais dormissem juntos em quartos reservados no quartel, eles haviam dormido mais tarde que o habitual naquela noite. Seguiriam ainda de manhã para o Alasca numa missão de reconhecimento, Mike havia recrutado Sam para aquela missão, contra a vontade dela.
– Vou para meu alojamento e te vejo no refeitório em meia hora. – Sam disse.
– Não, esteja lá em vinte minutos.
– Ok. – Sam sorriu e entrelaçou seu pescoço, com o intento de beijar seu noivo.
– Sam, não. Não temos tempo para isso, vá se trocar. – Ele disse, tirando os braços dela.
– Como se um minuto fizesse diferença… A missão partirá as oito. – Sam o largou, com desconforto.
– Você não entende as obrigações que um major tem aqui dentro porque você é apenas 1º sargento, não tem as responsabilidades que tenho. Você acha que minhas obrigações começam as oito? Meus deveres comandando o pelotão iniciam mais cedo. – Mike exasperou. – Você entende, não entende?
– Entendo sim. Vejo você no refeitório.
***
No começo daquela tarde gelada no Alasca, o pelotão comandado por Mike caminhava numa floresta aberta, eram árvores com poucas folhas e um chão com uma camada de neve espessa o suficiente para afundarem seus pés, enquanto andavam empunhando suas metralhadoras, distribuídos em grupos.
– Sargento Cooper e cabo Oliver, preciso que vocês duas deem a volta por fora, pela esquerda, e retornem me informando se viram alguma movimentação suspeita. – Mike deu a ordem à Sam e a outra oficial, que foi prontamente atendida.
– Ele nos manda para essas tarefas sem sentido porque acha que mulheres só servem para isso. – Cabo Oliver, que se chamava Maritza, reclamava com Sam, enquanto caminhavam na neve fofa, por fora do espectro de buscas do pelotão.
– Não é verdade, Mike confia em nós do mesmo jeito que confia nos outros soldados. – Sam o defendeu.
– Que missão idiota, uma caminhada no bosque congelado.
– Não nos mandariam para cá se não tivessem indícios de atividade inimiga.
– O que esperam que nós encontremos neste local ermo? – Maritza tremia de frio e olhava ao redor, a passos lentos. Era uma mulher alta, com grandes olhos verdes.
– Sua língua, se você não parar de…
Antes que ela terminasse a frase, uma granada abandonada explodiu sob seu pé, arremessando Sam na direção de sua colega militar.
– Sam! Sam! Meu Deus!
Estilhaços haviam a atingido, um em especial lhe fizera um corte profundo na lateral do pescoço, de onde vertia sangue abundantemente, apavorando Maritza.
– Socorro! Soldado ferido! – Ela gritava, com Sam nos braços.
– Maritza, eu fui atingida, me ajude por favor. Estou perdendo sangue, me ajude. – Sam balbuciava, em pânico, com a mão no pescoço.
– Socorro! Aqui! – Continuava gritando. – Sam, eles virão resgatá-la, acalme-se, vai ficar tudo bem, ok? Vai ficar tudo bem. – Maritza pousava a mão sobre o corte em seu pescoço, mas de nada adiantava.
Em vinte minutos Sam já estava no caminhão do exército, voltando para a base, distante 120 quilômetros dali, sendo amparada por Maritza e Mike, numa maca no chão.
– Você vai ficar bem, vão cuidar de você. – Mike a tranquilizava.
Sam morreu durante a viagem.
Ao chegar no quartel, Mike orientou que levassem a maca ao conjunto médico auxiliar, para onde raramente os soldados feridos seguiam. Mandou chamar o General Jones, um militar de alta patente, que estava em serviço há quatro décadas.
– General! – Bateu continência. – Ela é a candidata ideal para o programa. – Mike se movia de forma afoita.
– É sua noiva?
– Sim, acidente com granada ou mina terrestre no Alasca.
O general, trajando seu paletó verde repleto de condecorações, deu uma boa olhada na maca onde Sam jazia, e coçou o queixo.
– Há quanto tempo ela morreu?
– Pouco tempo, alguns minutos, coloque ela no programa, ela será uma soldado exemplar, eu garanto. – Mike insistia com fervor.
O general balançou a cabeça lentamente, e bradou para os que estavam ao redor.
– Levem-na para a sala três!
Após quase vinte horas de procedimentos cirúrgicos e implantes, Samantha era mais uma soldado Borg, um experimento secreto do governo europeu, que transformava soldados mortos em super soldados. Ela era agora propriedade do governo, e acordou achando apenas que havia ganhado uma segunda chance.
– Boa noite, sargento Cooper. – O General Jones a saudava em seu quarto, na noite seguinte.
Sam olhava para os lados confusa, havia acabado de acordar e estranhou fios saindo do meio do seu peito.
– O que aconteceu? – Murmurou, sonolenta.
– Não se recorda, minha jovem? – Ele andava pelo quarto, com seu porte exemplar e um sorriso falso nos lábios.
– Acho que pisei numa mina, foi isso? – Sam colocou a mão na cabeça, onde haviam ataduras.
– Pisou numa granada, mas nós já cuidamos muito bem de você, fizemos algumas intervenções cirúrgicas, finalmente você está de volta e logo voltará ao campo.
– Que intervenções? – Ela tocava os fios em seu peito.
– Não se preocupe com isso agora, descanse. Em cinco dias você se apresentará à mim, na minha sala, ok? Teremos missões especiais para uma pessoa especial como você. – Novamente ele lançou um sorriso sem credibilidade.
Sam tinha grande estima por ele, General Jones havia servido com seu pai por anos e frequentava sua casa, era como um pai no exército para ela, alguém em quem ela confiava cegamente.
No dia seguinte, ainda se recuperando das cirurgias, Sam recebeu a visita rápida de Mike, ele tinha outra missão para comandar.
– Você terá alta amanhã, querida. – Mike sorriu, a fitando. – É bom vê-la bem, eu sabia que tudo daria certo, nosso pelotão sente sua falta.
– Sinto tonturas e dores de cabeça, não sei se está tudo certo, tem algo estranho. – Sam disse.
– É normal, General Jones me falou que você teria algum mal estar nos dias seguintes, irá passar, ok? – Mike segurava e acariciava sua mão.
Algo havia mudado, Sam olhava para Mike e não o sentia como uma presença iluminada, como ela costumava enxergá-lo. São os sedativos. Pensou.
De fato algo havia mudado, mas não era apenas a forma como ela enxergava seu relacionamento amoroso de cinco anos, algo havia mudado nela, fisicamente.
Durante as missões em campo, sua visão parecia aguçada e treinada para enxergar o inimigo em situações adversas. Haviam implantado um dispositivo visual em seu cérebro, que implementava sua visão normal com dados adicionais, era como óculos inteligentes, porém dentro de sua cabeça, que lhe davam dados como mapas, pontos de interesse, informações de clima e uma gama de outras funcionalidades que agiam em conjunto com um comunicador. Tinha maior facilidade em ter raciocínios complexos, efetuar cálculos, se sentia com mais energia, e dormia menos.
***
Quase três anos se passaram desde o dia em que havia morrido em nome do exército e do pelotão liderado por seu noivo. Havia galgado a patente de 1ª tenente, era uma oficial agora, e a vida no exército nunca estivera tão prolífera, com desempenhos gloriosos em batalha e condecorações.
– Laurent faleceu esta noite. Voltem para suas tarefas! – Comunicou naquela manhã o comandante de seu pelotão, Major Andrews. Mike havia sido designado para outras funções.
– Como? – Sam ousou perguntar, ainda surpresa com a morte de seu colega.
– Teve um mal súbito enquanto dormia. Dispensados!
– É o quarto soldado que morre de mal súbito este ano, enquanto dormia. – Comentou em voz baixa Maritza, que estava ao lado de Sam.
– O que você quer dizer?
– Nada, só acho estranho.
O corpo do soldado Laurent passou por elas, carregado numa maca, enquanto fechavam o saco plástico que o embalava. Sam o olhou com curiosidade, mas a curiosidade transformou-se em espanto. Ele estava sem camisa, e ela conseguiu enxergar uma cicatriz extensa no meio do seu peito, exatamente igual à dela. A intriga estava plantada em seus pensamentos.
Nos dias que se seguiram, Sam dividia seu tempo livre entre dar atenção para Mike e pesquisar de forma discreta sobre os outros soldados que haviam morrido desta forma.
Todos eles haviam passado por situação de fatalidade, seguida por cirurgias significativas. E todos haviam morrido exatamente três anos após o ocorrido. Exatamente no último minuto do dia em que completariam três anos de cirurgia.
Pesquisou outros cinco casos. Todos tiveram o mesmo triste fim, a sobrevida deles durara três anos, descobriu que ela e estes soldados haviam feito parte de um projeto chamado Borg, e ela seria a próxima a morrer, seu aniversário de três anos de morte se daria em três meses.
Aquele assunto à atormentava dia e noite, atrapalhando as funções dentro do quartel, até mesmo durante suas orações se dispersava, seu comportamento acabou chamando a atenção de Mike.
– O que está acontecendo com você? – Mike perguntou, após terem feito sex* e Sam ter ficado mais distante do que nunca durante o ato.
– Nada. – Ela deitou, virando para o outro lado, na cama.
– Seu superior reclamou de você para mim, seu rendimento caiu, tem algo a incomodando? – Mike perguntou, pousando a mão em seu ombro.
– Reclamou? Como?
– Sam, você parece estar no mundo da lua.
Ela virou-se, ficando frente a frente com ele.
– Mike, fizeram algo comigo.
– O que?
– Depois daquele dia no Alasca, quando fui atingida pela bomba, fizeram algum experimento no meu corpo, algumas coisas mudaram, e pelo que tudo indica, eu não tenho muito tempo de vida, meu coração vai parar logo.
– Que sandice! De onde tirou isso?
– Eu pesquisei, outros soldados também passaram por isso, e todos morrem exatamente três anos após a cirurgia. Acho que transplantaram meu coração, e ele vai parar.
Mike suspirou de forma pesada e irritada, virando-se para cima.
– A parte do coração é verdade, eles transplantaram o seu por um artificial, porque você morreu com aquela bomba, morreu com uma grande hemorragia, e te trouxeram de volta, eles te salvaram.
– Você sempre soube disso? – Sam ergueu-se, cobrindo-se com o lençol e apoiando-se com o cotovelo.
– Sim, mas nunca vi necessidade em te contar, bastava te ver recuperada para saber que foi a decisão correta.
– Então por que estes soldados, que também fizeram parte do experimento Borg, morreram nesta data específica?
Mike trincou a mandíbula, não tinha uma resposta para ela.
– Coincidência talvez.
– O que você sabe sobre isso?
– Eu ouvi algo sobre esse projeto, e quando você morreu a caminho do quartel fiquei desesperado, isso seria a única chance de te trazer de volta. Fizeram algumas intervenções cirúrgicas, mas você apenas ficou com alguns sentidos aguçados, não sei nada sobre morrer três anos depois, General Jones nunca mencionou nada disso.
– O general sabe? – Sam perguntou, perplexa.
– Sim, ele é o responsável por esse projeto.
Sam assimilava as informações, Mike nunca havia comentando absolutamente nada sobre esse assunto até então.
– O que eu devo fazer? – Sam perguntou.
– Nada, aproveite o fato de ser um super soldado.
– Mike, meu coração vai parar dentro de três meses.
– Besteira! O general teria me contado se isso fosse verdade. Nada vai te acontecer, ok? Você está sob a proteção da nossa grande nação, nossa pátria nunca faria mal a você.
– E se for verdade? Se estiver com meus dias contados?
– Alguém está enchendo sua cabeça com essas besteiras? Me diga, tem algum cara conversando com você?
– Não, eu estou pesquisando por conta própria.
– Pois pare de pesquisar, apenas agradeça à Deus por ele ser bondoso e te dar esta segunda chance.
Sam demorou para dormir naquela noite, assim como nas noites seguintes.
Durante o mês que se seguiu, Sam invadiu algumas vezes escritórios e salas de tecnologia, e cada vez mais se convencia que sua vida corria sério risco se nada fizesse. Planejou uma fuga, e chegara o dia de conversar sobre isto com Mike.
– Amor, eu preciso sair daqui. – Ela disse, deitada sobre seu peito, ele havia adormecido sem que ela percebesse.
– Mike?
– Ãhn?
– Eu preciso sair daqui.
– Desta cama? Vá para sua cama então.
– Não, preciso sair do quartel, eu descobri que meu coração vai se desligar no dia 13 de fevereiro, preciso fazer algo.
– Eu já falei para você parar com essas bobagens, nada vai se desligar.
– Mike. – Sam ergueu-se, o fitando. – Vem comigo.
– Você está ficando louca? Você quer que eu largue minha carreira no exército para te acompanhar numa fuga, de algo que você está especulando e tirando conclusões absurdas?
– Não é absurdo, os outros já morreram, todos eles eram Borgs como eu, meu tempo está se esgotando também. – Sam diminuiu o tom da voz. – Eu soube de um laboratório clandestino na costa leste onde eu posso conseguir um novo coração artificial.
– Onde você ouviu isso?
– Lembra do cabo Kampman?
– Eu sabia que você estava de conversinha com aquele alemão folgado!
– Não, não é nada disso, lembra do incidente com uma granada que matou quatro soldados no início do ano? Ele foi a quinta vítima. Assim como eu, ele se tornou um Borg também.
– E vocês dois estão planejando fugir juntos? – Mike falou jocosamente.
– Não, ele ainda tem tempo, vai investigar mais antes de planejar a fuga, mas ele também vai procurar esse laboratório que ouviu falar.
Mike levantou-se, vestiu sua calça e fitou Sam, com as mãos na cintura.
– Você quer desertar, é isso? – Ele falou, com ares de impaciência.
– Sim, eu não quero esperar para ver se eu estava certa ou não, eu quero correr atrás de um novo coração. Mas não sei se consigo sozinha, fuja comigo.
– Isso é loucura, esse alemão está enfiando estas ideias de merd* na sua cabeça.
– Eu investiguei sozinha! – Sam exaltou-se, sentando-se na cama.
– Por Cristo, Sam! Cubra-se logo, se dê ao respeito! – Mike disse, virando o rosto.
Sam cobriu-se, e ergueu o lençol, segurando-o abaixo do queixo.
– Achei que você ficaria do meu lado. – Sam falou, cabisbaixa.
– Estarei te apoiando e ao seu lado para sempre, você será minha esposa em breve e é meu dever te proteger. Mas se você insistir nisso, não conte comigo. – Mike jogou as roupas para ela. – Não vou embarcar nesse devaneio seu e jogar no lixo tudo que já conquistei aqui, você não está enxergando o meu lado.
– Não posso ficar de braços cruzados…
– Você já parou para pensar em seu pai? O que o Tenente-General Cooper acharia de uma filha desertora? Ele morreria de vergonha. – Mike dirigiu-se ao banheiro.
Sam vestia-se enquanto Mike estava no banheiro. Silenciosamente tomava a decisão: fugiria no dia seguinte, durante a missa dominical, tudo já estava arquitetado e planejado há alguns dias. Mas iria sozinha.
– Vamos dormir, amanhã tenho que ir mais cedo para a capela, farei uma das leituras do evangelho. – Mike falou, orgulhoso.
***
Na manhã seguinte, despediu-se de Mike, tentando não transparecer que aquele último beijo era uma despedida. Durante a missa, ele estava tão envolvido com sua função ecumênica que não percebeu quando Sam abandonou a capela.
Antes de fugir pelo ponto cego que encontrara na fortaleza, Sam resolveu ir em busca da confirmação do seu pouco tempo de vida. Invadiu o quarto do General Jones.
– Jovem, você sabe que esta invasão aos meus aposentos pode lhe render um mês de reclusão? – O General bradava, trajando apenas a calça verde oliva e uma camiseta branca, estava surpreso com a presença de Samantha.
– General, o senhor sabe do meu apreço e respeito por sua pessoa, o tenho como um pai dentro de nossa corporação, mas eu vim em busca de respostas e não encontrei outra forma de fazer tais inquisições.
– Quanta petulância de uma simples 1ª tenente! Saia do meu quarto!
– Por favor, apenas me responda sobre o projeto Borg.
O general mudou de feições, parecia agora preocupado, endireitou sua postura e falou de forma incisiva.
– Vou chamar a segurança militar para levá-la para a reclusão. – Ele disse, sua mão foi na direção do seu comunicador, mas foi interrompida pela mão de Sam, que rapidamente lhe apontou uma arma.
– Vamos manter esta conversa entre nós dois. É verdade que meu coração vai se desligar em breve?
– Não sei do que você está falando, e seu pai saberá sobre essa insubordinação. – Ele voltou a fitá-la de forma ereta.
– Você é o responsável pelo projeto Borg, que tipo de coisas fizeram comigo? Que coração é este que carrego? – Sam segurava a arma com as duas mãos, nervosamente.
Agora o general relaxava a postura, um quase sorriso irônico surgiu, irritando Sam.
– Responda minha pergunta! – Sam vociferou.
– O que você pretende fazer com a verdade, minha criança? Você é propriedade do exército agora, é nosso rato de laboratório, um pequeno rato confuso com os dias contados.
Finalmente ela havia conseguido a confirmação de seu infeliz destino, a verdade lhe trouxe um arrepio forte e ruim, as pernas fraquejaram. Sam corria os olhos pelo chão, assimilando a informação.
– Por que três anos?
– Você não entende o que é uma cobaia? Você já viu cobaias sendo devolvidas para uma vida normal? Elas precisam ser eliminadas. No caso dos Borgs, julgamos três anos de serviços prestados suficiente para nosso intento, depois disso fica arriscado. Um Borg pode se achar no direito de saber o que fizeram com ele, ter a audácia de questionar as práticas da nossa nação. E pior: pode desenvolver novos sentimentos e todas essas besteiras pessoais que você não tem mais direito. – Ele começou a andar pelo quarto. – Sempre fui contra colocar mulheres nestes experimentos…
– Novos sentimentos? – Sam já estava com a arma abaixada.
– Vai dizer que não percebeu?
– Vocês me desprogramaram?
– Completamente. Removemos toda a programação neuroquímica que você havia feito com seu noivo. Como chamam mesmo? A programação do amor eterno. Desfizemos a sua.
– Pois saiba que eu ainda amo Mike, com ou sem a programação química que nós dois fizemos.
– Do que adianta? Daqui dois meses você deixará de existir, e removeremos a programação dele também. Se bem que… Com essa sua atitude impensada e irresponsável, você decretou seu fim para antes.
Sam voltou a erguer a arma, tinha agora uma expressão de raiva, deixaria para assimilar aquilo tudo depois.
– Talvez eu realmente morra em dois meses, mas não será aqui dentro, será lá fora, lutando para sobreviver. – Sam tirou uma pistola paralisadora do coldre em sua perna. – Nunca tive o intento de atirar contra o senhor nem em nenhum de meus companheiros militares, mas não posso correr o risco de ser impedida de alguma forma.
– Você se arrependerá amargamente se fizer isto, sua cobaia estúpida.
Sam ergueu a arma, e fez o disparo, um raio que causava uma dor intensa no local atingido, e paralisava a musculatura dos membros da vítima por algumas horas.
A missa terminaria em dez minutos, este era o tempo que ela tinha para pegar suas coisas que já estavam separadas e escondidas, e continuar com seu plano de fuga. Quase todos os militares estavam nas capelas de seus batalhões naquele horário, era o momento em que a fortaleza ficava desprotegida.
Além de coisas de uso pessoal, Sam carregava alguns equipamentos militares, que venderia no mercado negro para bancar sua viagem em busca do novo coração, e uma pequena quantia em dinheiro, que guardara nos últimos meses.
***
A vida fora da corporação corria mais difícil do que o imaginado, aprendeu na prática que não poderia confiar nas pessoas ali fora, levando alguns golpes e roubos. Dormia em lugares abandonados, fugia da polícia e dos sentinelas robóticos, que a esta altura tinham seu nome como procurado, bastaria um simples escaneamento visual e ela seria descoberta e presa. Após vender tudo, conseguiu comprar um velho carro, que serviria para deslocar-se até a costa leste, em busca do laboratório.
O homem que lhe vendeu o carro indicou um rapaz que poderia servir de guia na costa leste, a ajudando a encontrar o laboratório clandestino, em troca de uma pequena quantia. Era um jovem de poucas palavras e baixa estatura, com uma deficiência no braço, por conta da radioatividade. Na primeira noite da viagem, pararam para dormir num galpão industrial abandonado, ela num colchão ao lado do carro, ele dentro.
Sam acordou de madrugada com o rapaz dando partida em seu carro, intentando fugir com seus pertences. Com o carro já em movimento, Sam o alcançou e conseguiu retirá-lo de dentro, através da janela, iniciando uma luta.
Naquela noite Sam descobriu que teria que matar para sobreviver.
Subserviência: s.f. Qualidade ou estado da pessoa que cumpre regras ou ordens de modo humilhante; característica de quem se dispõe a atender as vontades de outrem.
Fim do capítulo
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Ana_Clara
Em: 28/11/2015
Grande parte das minhas indagações foras resolvidas neste capítulo... Agora entendo um pouco o pq da Sam ser uma mulher preconceituosa e machista. Imagino o quão difícil deve ter sido conviver no meio de pessoas tão horrorosas e mesquinhas com esse tal de Mike. Aliás, o cara por causa da carreira deixou a noiva partir sozinha para o desconhecido. Enfim, a Theo chegou num momento perfeito!!!
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