Divagações
São Paulo, 04 de dezembro de 2015. 17h30min
“Você não se valoriza.”
Assim mesmo: uma afirmação.
Ricardo sabia que não precisava fazer essa pergunta. É nítido.
“Você é questionadora. Você não se submete. E agora está aí, submetida a algo que nem sabe o que é...”
Apesar de me conhecer há pouco tempo, posso dizer que ele é uma das poucas pessoas que me entende. Pudera... É a profissão dele!
Fica sentado ali me olhando. Eu olho de volta para ele. O tempo passa.
É o ritual semanal.
Ele é bem paciente.
Às vezes eu não vou. Acordo e decido que não vou sair da cama. Ponto final. Eu não saio.
Rebeca, minha companheira, está viajando.
Tenho certeza de que quando ela voltar para casa vai se separar de mim.
O que ela tem a perder com isso, afinal?
Uma mulher louca e um cachorro. Ela consegue coisa melhor.
Está sempre me mostrando que merece e consegue mais. E o que eu posso fazer?
É verdade. Ela consegue.
Houve a época em que eu achava que era linda e inteligente e que o mundo inteiro estava sob os meus pés.
Mas me disseram que isso é um sintoma de um dos meus transtornos e agora sempre que eu me sinto minimamente atraente isso se vira contra mim, gigante e imponente: você acredita que está bonita porque é louca.
Agora tenho consciência de quem eu sou, da minha pequenez.
E é isso que o Ricardo chama de “desvalorização”.
“E como é a sua relação com a sua mãe? E a da sua mãe com a mãe dela, a sua avó?”
Acho que, no fundo, ele acredita que sou lésbica por alguma carência afetiva, algo relacionado a minha infância.
E eu acredito que o Ricardo é um idiota. (Mas é um bom idiota, não me leve a mal! Um idiota fundamental.)
O meu cachorro se chama Odin.
É um poodle, apesar do nome grandioso, e deve pesar uns dois quilos.
Está sempre deitado perto dos meus pés e faz questão de me acordar com beijos e mordidas no rosto, pescoço e orelha. Às vezes, quando olho para ele, sinto que meu coração pode explodir de tanto amor.
Ele me ama e eu o amo.
Acredito que ele continuaria me amando, independentemente de qualquer situação.
Olho para ele. E só aí eu me sinto útil. Só aí eu me sinto importante.
É complicado quando a gente não se sente útil.
Será que você me entende?
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Marianna P
Em: 24/02/2016
Odin = Charlotte na minha vida, minha Lhasa Apso. Sem palavras. Já senti exatamente isso.
Resposta do autor em 12/03/2016:
Animais sempre são um conforto pros nossos corações, né?
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