Capítulo 4 – Intimidade e apoio
Izzy e eu acabamos ficando amigas muito íntimas, até demais se eu parar para pensar, mas na época era tudo normal pra mim. Até que um dia, ela teve uma luta; era uma luta importante, uma oponente forte e ela perdeu. Eu até tentei ajudar dando força e incentivo, mas Izzy ficou desolada. Saiu da arena onde havia acontecido a luta e me despistou correndo por ruas transversais. Não atendia o telefone e não me dava notícias. Isso era no fim da primavera e eu passei a noite de domingo para segunda acordada, com o celular na mão e encarando a porta do apartamento (eu tinha deixado o plantão de domingo à noite para ir vê-la lutar).
Eram 4:30 da manhã de segunda quando alguém bateu na porta e eu abri sabendo que era ela. Izzy estava em pé se apoiando no batente da porta com uma mão. Sua roupa suja, com manchas de água, lágrimas e bebida por todos os lados. Ela cheirava a álcool até os cabelos. Ainda haviam lágrimas umedecendo as bochechas dela. Minha raiva sumiu ao vê-la com aquela expressão de tristeza, a Izzy que eu conhecia nunca tinha aqueles olhos verdes tão opacos e sem brilho.
Ignorei tudo e a abracei trazendo-a para dentro de casa e fechando a porta, trancando-a logo em seguida. Ela chorou de novo com o rosto no meu peito perto do meu pescoço enquanto seus braços me apertavam pela cintura. Eu ignorei o cheiro dela e a peguei no colo como se erguesse uma criança pequena. Ela circundou minha cintura com as pernas e eu segui para dentro do apartamento deixando-a chorar o quanto quisesse. A levei para o meu banheiro que era maior e tinha uma banheira grande que eu praticamente nunca usava. Me sentei na beirada dela com Izzy no colo e os pés dentro da banheira enquanto as torneiras abertas enchiam aquilo com água quente. Logo antes de encher tudo coloquei Izzy lá dentro, ela se agarrou a mim sem quere soltar, mas eu a acalmei com sussurros e afagos jurando que não ficaria 10cm longe e que só a estava soltando para que ela tirasse aquela roupa suja.
Tirei a roupa dela, deixando-a apenas com o top preto e a calcinha boxer azul; joguei aquele moletom e a camisa perto do lixo. Então tirei minha roupa ficando apenas com meu conjunto de lingerie azul claro simples e liso. Não foi um banho propriamente dito, apenas ficamos dentro da água quente com ela entre as minhas pernas agarrada a mim chorando enquanto eu a abraçava e a mantinha quente dentro daquela água. Quando a exaustão a fez dormir eu alcancei uma toalha grande, esvaziei a banheira, a envolvi na toalha para que não sentisse tanto frio, a ergui nos braços e levei nós duas para a minha cama colocando-nos debaixo do meu edredom verde musgo e me deitando ao lado dela sem soltá-la sequer uma vez.
Eu nunca havia feito o tipo carinhosa ou cuidadosa dessa forma. Claro que com meus pacientes, que eram na sua maioria crianças, eu agia com certo toque de gentileza, compreensão e carinho, mas mesmo com eles sempre havia aquele muro me afastando de ser realmente carinhosa. Ali esse muro parecia ter se dissolvido. O corpo de Izzy estava completamente colado ao meu, mesmo dormindo ela havia se movido de forma a estar com o rosto enterrado entre meu pescoço e peito, suas mãos estavam contraídas me segurando e sua respiração era irregular e entrecortada. Mesmo dormindo ela sofria.
Eu a entendia. Na hora ela não demonstrou sinal nenhum de choro ou tristeza fora seus olhos verdes sem brilho, mas foi só sair das vistas das outras pessoas para ela desabar. Aquela luta era o passaporte dela para as ligas profissionais, as lutas realmente importantes, e ela havia perdido. Era como se o sonho dela tivesse sido arrancado por entre seus dedos e levado para longe de novo. E eu entendia isso. Talvez por esse motivo eu tenha deixado ela se agarrar a mim daquele jeito e tenha ficado ali calmamente acariciando os cabelos dela com uma mão e as costas dela com outra.
Nunca tinha pensado em dividir a cama com alguém, apesar de ter uma cama de casal, Izzy era a primeira pessoa que eu deixava deitar ali. Mesmo assim não tive problemas em me sentir confortável naquela posição. Meu sono demorou a vir simplesmente por conta da minha preocupação com ela. Mas até eu me canso e quando a exaustão me venceu só me lembro de mergulhar meu rosto nos cabelos castanhos claros antes de tudo se perder na minha memória.
Pensando depois, eu achei que deveria ter sentido algo diferente; não sei bem, mas......alguma sensação estranha por estar acordando com alguém abraçado a mim eu deveria ter sentido. Mas não senti, na verdade, não senti nada estranho. Acordei como quase todos os dias, sem me mover praticamente nada, e a primeira coisa que registrei foi o calor do corpo da Izzy. Isso não me causou desconforto nem estranheza, foi....até bom, confortável. Acordar do lado dela me fez acordar com uma calma que eu nunca tinha sentido antes.
Lembro desse dia como poucos antes dele. Nunca fui boa em lembrar coisas importantes....em compensação as coisas insignificantes sempre ficaram presas na minha mente. Como a forma com que os lábios dela estavam levemente abertos perto de encostarem no meu peito; como a respiração dela deixava quente a minha pele onde cada expiração dela batia de leve; como a pele dela era macia sob meus dedos; como os fios castanhos claros e curtos se espalhavam pelo meu braço onde a cabeça dela estava apoiada.
Se eu soubesse tudo o que aconteceria depois......eu iria querer parar o tempo nesse momento. O momento em que tudo estava completamente bem pra nós duas. Em que não éramos nada uma para outra, mas ao mesmo tempo éramos tudo. Se eu pudesse escolher escolheria esse momento.
Fim do capítulo
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