~~ Nos dias atuais. ~~

-- Mãe, você não entende, mas eu tenho os meus motivos para não querer falar com o Robbert. -- A jovem desviou seu olhar da mãe.

-- Querida, seja lá qual foi esse motivo, eu não acredito que seja forte o suficiente para afastá-los tanto. Vocês se apaixonaram pela mesma mulher, eu sei. Mas uma mulher não pode separar dois irmãos. Por favor.

-- Mãe... -- Emily praticamente implorava à ela com seu timbre de voz. -- Tudo que eu te peço é que você não me peça isso.

-- Mas Emily, como eu não vou pedir? Meu coração dói ao ver meus dois filhos assim, ainda mais sabendo que vocês eram tão unidos. -- Katrien segurou o queixo da filha e a fez olhar para ela. -- Pense no assunto, por mim, tudo bem? É só isso que eu te peço.

            Emily permaneceu em silencio e apenas consentiu com a cabeça.

-- A mamãe te ama. -- Katrien beijou a testa de Emily. -- Mas eu preciso ir conversar com o médico, tudo bem?

-- Promete que depois volta? -- Katrien sorriu para a filha e consentiu, ela sabia como a menina odiava hospitais.

            Katrien conversou com os médicos e eles disseram que precisariam de apenas algumas horas a mais de observação para ver como a menina reagiria a nova medicação, e que provavelmente ela teria alta durante a noite. Pediram para que a mãe fosse cuidadosa e que para evitar que esquecimentos como esse ocorressem por parte da filha, ela mesmo ficasse encarregada de checar se a jovem havia tomado a medicação.

-- Katrien, sua filha teve sorte por aquele rapaz estar passando na rua. Um pouco mais tarde e não teríamos como trazê-la de volta. A asma de Emily é muito forte para que abram brechas para esquecimentos. Pedimos que tenha mais atenção para a saúde de sua filha.

-- Eu vou cuidar de tudo pessoalmente José. Obrigada mais uma vez por se encarregar pessoalmente dos cuidados da Emily. -- Katrien e José eram amigos antigos, ele era o médico pessoal de Emily e sempre estava presente quando a jovem apresenta piora nos quadros da asma.

-- Não queremos que nada aconteça com a nossa menina. -- José tinha um carinho especial pela simpática garota.

-- Não mesmo. -- Katrien sorriu.-- Onde está o rapaz que a encontrou? -- Katrien olhou pela sala de espera.

-- Ele não está mais aqui. Soube que a jovem havia melhorado e foi embora.

-- Vocês sabem o nome dele?

-- Ele só se identificou como Corbin. Desculpe.

-- Tudo bem, se um dia eu o encontrar agradecerei muito à ele. Esse tal de Corbin salvou a minha filha hoje. -- Os olhos de Katrien brilharam neste instante.

-- Mãe? -- Robbert aproximou-se de Katrien, e notando a presença do médico ele o cumprimentou. -- Olá José.

-- Robbert. -- José o cumprimentou com um movimentar de cabeça. -- Se me dão licença, tenho alguns pacientes para atender. Te vejo mais tarde Katrien. -- José apenas olhou-a e sorriu antes de se retirar.

-- Como está a Emily? -- Ele virou-se de frente para a mãe e olhou-a atento.

-- Eu falei com ela, se é o que quer saber Robbert. -- Katrien segurou a mão do rapaz e o puxou para um canto. -- Eu não sei o que realmente aconteceu para Emily estar tão cabeça dura sobre essa história de vocês, mas eu acho que a convenci a pensar no assunto pelo menos.

-- Obrigado mãe! Você sabe o quanto a Emily é importante pra mim. -- O rapaz juntou as mãos da mãe e deu um único beijo sobre elas. -- Emily não quer falar comigo agora e eu até acho melhor, não quero correr o risco de ela ter outra crise. Eu vejo vocês em casa, pode ser? -- Robbert olhou-a como se pedisse permissão para ir.

-- Tudo bem meu filho, vá.   

            Robbert se afastou da mãe deixando-lhe um sorriso doce. Ele caminhou para fora do hospital e enquanto passava pelo corredor principal esbarrou em uma menina.

            Alice andava em passos apressados pelo hospital, estava procurando a ala onde Emily se encontrava, esbarrou em um rapaz e só teve tempo de olhar rapidamente para trás e resmungar alguma coisa baixa de mais para que alguém pudesse ouvir. Quando se deu conta da semelhança que o rapaz em quem havia esbarrado tinha com alguém que ela conhecia, ela virou-se para trás de novo, tentando localizá-lo, mas não viu muito mais do que alguns médicos passando pelo corredor. Virou-se para frente e deu de cara com Katrien recostada em uma parede.

-- Katrien, aquele era quem eu achei que fosse? -- Alice falou com um ar de suspense que fez a mãe de sua amiga soltar uma risada baixa.

-- Sim Alice, aquele era o Robbert. -- Katrien abraçou a jovem. -- Como está?

-- Em outro planeta provavelmente. -- Alice falou seriamente, mas Katrien não pode segurar outra risada. -- O que ele está fazendo aqui? -- Alice arqueou as sobrancelhas.

-- Essa é uma longa história. -- Katrien evitou detalhes, queria deixar que a filha contasse tudo a ela. -- Não quer ver a Emily?

-- Emily? -- Alice voltou do transe que estava ao pensar em milhões de possibilidades pelas quais Robbert estava aqui. -- É claro que quero vê-la.

-- Ela está no quarto 501, você só precisa pegar o crachá com a mulher que está naquele balcão e pode entrar. -- Katrien apontou a direção.

-- Obrigada por me telefonar Katrien. Eu sei que não precisava, mas fico contente por tê-lo feito.

-- Emily te adora. Vai fazer bem a ela te ver. -- Katrien sorriu para a jovem. -- Agora vá, porque eu tenho que ir ao banheiro. -- Ela deu alguns leves tapinhas no ombro de Alice, como se a empurrasse em direção ao balcão.

            Alice riu da atitude de Katrien e logo se apressou para ver a amiga. Ela abriu uma pequena porção da porta e chamou por Emily, buscando ter certeza de que esse era o quarto.

-- Emily? -- Alice enfiou a cabeça pelo espaço da porta e olhou para os lados, avistando a amiga logo em seguida.

-- Al? -- Emily levantou a parte superior da cama, ficando em uma posição mais confortável para conversar. -- O que está fazendo aqui? -- Ela olhou a amiga com felicidade em seus olhos, um sorriso bobo se formou em sua boca.

-- Minha melhor amiga tem uma crise de asma e vem parar em um hospital, e a primeira coisa que ela diz é o que estou fazendo aqui? Sério isso Emily? -- Os olhos de Alice encontram-se com os de Emily e ela logo retribuiu o sorriso.

-- Você está certa. -- Emily fez algumas caretas e fingiu estar recapitulando a fita. Assim que entendeu Alice também retornou até a porta e repetiu o que havia feito antes.

-- Emily?

-- Oh minha queria e doce amiga. -- Emily cobriu a boca com as mãos fingindo-se surpresa, aproveitou e segurou o riso. -- Que surpresa incrível ter você aqui. -- Emily fez uma cara meiga e colocou a mão sobre o coração.

-- Ahhh Emily, você tem que estragar tudo com essa sua fofura? -- Alice riu e correu até a amiga, dando-lhe em abraço forte. -- Dar um susto desses não é coisa que se faça, senhorita. -- Alice apertou as bochechas da amiga e a balançou de um lado para o outro, mas logo parou com a brincadeira e olhou-a sério. Deu um beijo na ponta do seu nariz e afastou-se devagar, tendo assim a oportunidade de olhar em seus olhos de novo, mas dessa vez mais de perto. -- Como você está se sentindo?

-- Viva. -- Emily sorriu. -- Acima de tudo, viva. Pronta para recomeçar.

-- Deixe-me adivinhar, esse seu recomeçar tem sobrenome Calliari? -- Alice sentou-se na borda da cama e depositou a mão em sua barriga.

-- Eu soube de algumas coisas esses dias e... Bom, eu acho que finalmente estou pronta para deixar toda essa história para trás.

-- Então eles finalmente te contaram? -- Emily olhou-a, intrigada. Estreitou os olhos e questionou-a em seguida.

-- Espera ai. Você sabia? -- Emily forçou seu corpo contra a cama, tentando afastar-se de Alice.

-- Todo mundo sabia Emily. -- Alice falou diretamente, não dando muita importância para a atitude da amiga. Achou que era relevante saber disso ou não.

-- Menos eu, você quer dizer. -- Emily olhou-a incrédula. -- Alice, você deveria ter me contado.

-- Não me olha com essa cara Emily, nem adianta pensar em ficar brava comigo. Você sabe que depois daquela conversa que tivemos há anos atrás eu jurei nunca mais me meter entre você e ela.

-- Mas como minha amiga você podia ao menos ter me alertado. -- Emily sentiu-se angustiada novamente.

-- Emily, nunca mais. Eu não vou me meter para depois vocês se acertarem e eu sair como errada de novo. Sem chances. -- Alice levantou e caminhou até o outro lado do quarto. -- Se você quiser ficar brava comigo, sinta-se a vontade. Mas eu não errei dessa vez, então não seja tão cabeça dura comigo.

            Emily olhava-a da cama, viu a amiga murchar com suas próprias palavras e sentiu-se culpada. Alice estava certa, ela já tinha se magoado muito por ficar se metendo nos assuntos entre Emily e Anne e sua amiga entendeu-a neste momento. Emily não sabia se podia levantar da cama ainda, mas o fez mesmo assim. Puxou os tubos do seu nariz, e aquilo realmente a trouxe um desconforto muito grande. Tirou o medidor cardíaco do seu dedo indicador e levantou-se da cama. Alice ouviu a cama rangendo e virou-se em direção a Emily, tomando um susto ao vê-la de pé e já tão perto dela. Emily respirou fundo como se estivesse tomando coragem para dizer algo, mas na verdade, a única coisa que Emily estava tentando fazer era engolir seu orgulho próprio. Antes que Alice pudesse dizer alguma coisa ela foi envolvida pelos braços calorosos de Emily, em um abraço apertado. Emily estava com saudades de Alice, e magoá-la justamente hoje não estava na lista de afazeres dela.

-- Me desculpa. -- Emily sussurrou enquanto ainda estava no abraço. Afastou-se devagar e encostou a testa na de Alice, ela a olhou nos olhos e continuou os sussurros. -- Você está certa. Eu não tenho o direito de te cobrar algo referente a esse assunto.

            Mais uma vez ali estava Alice, frente a frente com Emily, tão perto que podia sentir o seu hálito quente tocar seu rosto enquanto sussurrava. Seus olhos encontraram os dela e bastou essa junção de proximidade, confiança e troca de olhares para que o coração da jovem batesse em um ritmo acelerado. Mal haviam se dado conta de que o monitor cardíaco fazia um som quase que ensurdecedor.

-- Emily, eu... -- Os olhos de Alice percorreram cada centímetro do rosto de Emily, retornando ao ponto de partida logo em seguida. Alice sentiu um frio na barriga, após notar o sorriso de canto de boca que Emily carregava nos lábios.

            Alice queria beijá-la, mas essa com certeza não seria a melhor hora para isso. Emily havia acabado de passar por momentos intensos, não só referente a Anne e Robbert, mas também a sua saúde. Ela respirou fundo e pensou em se afastar, mas que mal a faria se manter tão próxima de Emily? Alice continuou lá, parada.

            Emily olhava-a com ternura, seus pensamentos não chegaram nem perto da possibilidade de beijá-la. Na verdade, aquilo seria estranho para ela. Emily amava Alice, mas era um amor diferente, um amor sem segundas intenções, era o que ela achava e dizia para si mesma toda vez que estava ao lado de Alice.

            A porta do quarto abriu-se rapidamente e por lá entraram alguns médicos em passos urgentes, eles traziam consigo uma mesa hospitalar com um desfibrilador e alguns medicamentos. As jovens se afastaram com o susto, cada uma para um lado. Emily olhou-os e assustada com a presença de tantos médicos não conseguiu esconder sua cara de culpada.

-- O que a senhorita está fazendo de pé? -- Um dos médicos olhou-a seriamente, mas Emily se manteve calada. Não sabia como se explicar. -- Alarme falso pessoal. Podem levar toda essa tralha para lá. -- O médico aparentava estar irritado. -- Deite-se aqui. Vou chamar as enfermeiras para refazermos o procedimento da intubação. -- Ele saiu da sala em passos fortes.

-- Ops. -- Emily olhou para a amiga com uma expressão engraçada, fazendo-a rir.

-- Vamos Emily, deite-se lá, antes que ele volte com um bisturi. -- Alice usou de um tom sério, mas ao mesmo tempo irônico.

            Emily sorriu e obedeceu. 

Fim do capítulo