CapÃtulo 2 Conhecendo os novos senhores
Passei as horas seguintes na companhia da minha nova senhora, ela era uma pessoa incrível, amável, culta, absolutamente encantadora.
--Então, já falei muito de mim, agora conte-me a sua história...
Estávamos ambas sentadas sobre a cama, nunca tive problemas com a falecida esposa do comendador em relação a isto, não sei se pelo fato de ser uma escrava branca, ou por ter sido "criada" por ela na "casa grande", mas diferente dos outros escravos, ninguém nunca se incomodara com minha presença, nem mesmo o tirano comendador Almeida.
--Minha história é tão comum senhora, como tantas outras, nada em especial como a sua...
Ainda estava tímida com a presença e simpatia dela, não conseguia olhar o verde de seus olhos sem desviar rapidamente, era como se me penetrasse a alma.
--A deixa disso! Aposto que que tens coisas muito interessantes pra contar.
Sorri, arrumávamos as roupas que ela havia trago de Portugal enquanto conversávamos, ela me pareceu tão "boa pessoa", que resolvi contar-lhe um pouco de minha história, talvez ela fosse tão boa quanto minha antiga sinhá, e desse-me a alforria.
--Então...minha mãe se chamava Juliana, era uma escrava mulata de uma fazenda vizinha, soube que fora comprada ainda muito jovem pelo comendador Almeida. Minha mãe encantou-se pelo capataz da fazenda...Miguel...
--Aquele Miguel?
Malvina apontou para um lado qualquer, como se tentasse mostrar para papai que ela havia conhecido a pouco na sala.
--Sim, ele mesmo. Meu pai o capataz Miguel, não teve coragem de castigá-la certo dia, perdoou-a e com isso conquistou seu coração. Sou fruto de um amor puro e verdadeiro, mesmo que clandestino, filha de uma escrava negra e um homem branco.
--Que lindo! Já ouvi falar muito desse tal amor capaz de superar tudo, típico de livros, mas nunca tive o prazer de presenciar de perto um.
Fiquei intrigada com a revelação de minha senhora, isso significava que o que ela vivia com o senhor Leôncio não era um romance, uma história de amor, provavelmente o casamento fora arranjado como quase todos daquela época. Mas o que mais me intrigava, era a vontade de conhecer um amor como o de livros, e não o de vivê-lo.
--Não tens vontade de viver algo assim?
Imediatamente arrependi-me da ousadia, ela era uma mulher casada, e se não vivera aquilo com o esposo, definitivamente não viveria com ninguém, eu a havia desrespeitado, a tratado como uma mulher de vida fácil, dada a amores fugazes.
--Perdoe-me senhora, não queria ofendê-la com minha ousadia.
Levantei-me da cama, recuando dois passos de cabeça baixa para ela, esperando sua reação que não deveria ser boa, estava enganada.
--Venha! Sente-se aqui!
Sua voz continuava suave, pausada, levantei os olhos o suficiente para ver o mesmo sorriso meigo no rosto, enquanto mostrava pra que me sentasse ao seu lado.
Obedecia-lhe, ainda constrangida pela ousadia, sentei-me ao seu lado sentindo suas mãos macias tocando as minhas, tive uma delas envolvida com ternura, enquanto outra de suas mãos tocava meu queixo fazendo encará-la.
--Eu não sei como sua antiga senhora lhe tratava, não imagino como fora sua convivência durante todos esses anos com esta família. Mas garanto que não sou nenhuma tirana, muito pelo contrário, estou encantada com sua educação, sua cultura, sua história, e principalmente com sua beleza. Não seria capaz de maltratar um ser assim tão encantador.
Arrepiei-me mais uma vez, só que dessa vez ela sentiu, pois estava me tocando. Percebi o sorriso no seu rosto aumentar, e o brilho dos seus olhos ofuscarem-se, não sei qual fora o motivo mas preferi não tentar entender.
--Conte-me! Quantos anos tens?
--Vinte e três senhora!
E assim as horas se passaram, continuamos conversando e arrumando suas coisas, até que seu esposo entrou no quarto, e para minha tristeza eu estava sentada em sua cama.
--Mas que diabos é isso?
Levantei-me num sobressalto, não sabia o porque de sua reação explosiva, jamais havia passado por nada do gênero.
--O que houve Leôncio?
--Como o que houve? O que essa escrava faz em minha cama? Ela vem das senzalas Malvina, deve estar cheia de doenças!
Não consegui evitar, meus olhos marejaram tamanha humilhação que passei, jamais havia tido nenhuma restrição dentro da casa grande, nem mesmo por parte do comendador. Vi o nojo e desprezo nas feições do rosto do meu senhor, o odiei perante aquela atitude, mas tive que concordar com ele, aquele não era o meu lugar.
--Leôncio! Ela vive na casa grande desde que nascera, você deveria saber disso! Afinal foi sua mãe quem a criou!
--Não deixa de ser imunda! Minha mãe sempre foi uma louca, demente. Jamais aceitei o fato de ter me imposto a presença de um ser como esse.
--Leôncio!
--Cale-se Malvina! Eu sou o homem aqui!
--Pois então aja como um. E outra Leôncio, se queria uma esposa submissa, deveria ter se casado com uma escrava, não comigo!
Até aquele momento acreditei que Malvina tentasse me defender, mas diante daquele comentário essa possibilidade dissipou-se. Senti-me ainda mais humilhada diante do seu comentário, do que das ofensas de Leôncio. Minha mãe havia sofrido muito nas mãos do seu antigo senhor, antes de ser comprada pelo comendador, e este não ficara pra trás, violentando minha mãe diversas vezes, até que papai a tomou para si. O que mais me doia, era que minha mãe faleceu assim que deu-me a luz, não pode sequer ver o fruto do seu único e verdadeiro amor.
Assim que percebeu a frase que saíra de seus lábios, Malvina olhou-me intensamente, como quem se arrepende de algo que diz, no entanto, nada fez para concertar suas palavras, deixando evidente que toda sua educação não passara apenas disso: educação.
--Vamos! Saia do meu quarto agora, e mande que uma das arrumadeiras venha imediatamente trocar a roupa de cama.
Engolindo todo meu orgulho, coloquei-me no meu lugar, acatando suas ordens.
--Sim senhor! Com licença.
Deixei o quarto, assim como deixei as lágrimas rolarem pelo rosto, jamais havia sido humilhada de tal forma, aliás, jamais havia sido humilhada. Entrei na cozinha apressada, ali estavam Ana, Inácia, Jurema, Rosa e Belchior.
--O que houve menina?
--Nada Ana!...Inácia, o senhor Leôncio quer que troque as roupas de cama do seu quarto imediatamente.
--Mas eu troquei hoje pela manhã! Não foram usadas por ninguém...
--Não questione Inácia! Vá e não deixe seu senhor esperando!
Obedecendo a ordem de Ana, a arrumadeira rumou para o quarto do casal, deixando-me com os demais empregados. A essa altura já havia parado de chorar, enxugava as lágrimas com as mangas do vestido que usava. Belchior, o jardineiro de aproximadamente 30 anos, simpático, mas desprovido de beleza, aproximou-se de mim.
--O que houve minha flor?
--Nada Belchior! Estou bem, apenas um cisco!
--Nos dois olhos meu bem?
--Sim Belchior! Nos dois.
Dei as costas a eles, deixando a cozinha rumo ao quartinho nos fundos da casa grande, onde vivi a vida toda. Joguei-me sobre a cama, deixando que o choro lavasse a alma, chorei por quase uma hora a fio, chorei por tudo que ficara entalado na garganta, por tudo que vivi a vida toda, por tudo que almejava viver e jamais poderia.
Exausta, me permite cair num sono profundo, acordando algumas horas depois, quando a noite já se fazia alta. Senti um leve afago nos cabelos, estava de olhos fechados e assim continuei, crente que se tratava de Ana, ela era a pessoa que mais se preocupava comigo ali, além do meu pai.
A mão desceu para meu ombro numa leve carícia, se manteve ali por alguns instantes, sem fazer nenhum movimento apenas me tocando. Apanhei a mão de "Ana" entre a minha, apertando levemente como quem agradece o carinho e cuidado, levei sua mão até os lábios, depositando um beijo terno de agradecimento, quando inesperadamente senti o tremor na mão de "Ana".
Abri os olhos para certificar-me de que tudo estava bem com ela, quando supreendentemente me deparo com olhos verdes, donos de um brilho único. Seu rosto lindo estava parcialmente iluminado pela vela que provavelmente ela trouxera consigo até ali. Sobressaltei-me soltando sua mão imediatamente, sentando na cama temendo uma reação negativa dela, reação essa que não veio.
Fim do capítulo
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Comentários para 2 - CapÃtulo 2 Conhecendo os novos senhores:
Resposta do autor em 02/12/2015: Muito obrigada amiga kkkkkkk
DaenerysTargaryen
Em: 17/11/2015
Besha, poste mais , demore não tá muito boa fic ' parabéns
Resposta do autor em 02/12/2015: Muito obrigada amiga kkkkkkk
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