E assim começam as confusões...
Capítulo 9
9 Viagem e Confusão
A sala tinha uma concentração nova de pessoas: Carolina conversava com o casal Gustavo e Luciana; Patrícia e Kelly estavam com as amigas Juliana e Luiza arrumando a mesa e providenciando os últimos petiscos; Tatiana e Ricardo estavam sentados próximos a lareira degustando um vinho. Todos se viraram quando rumo a escada onde a mulher de vestido floral, elegantemente descia as escadas. Seus olhos pareciam procurar algo que, em poucos segundos encontrara, olhando fixamente para si. Elas se cumprimentaram através de olhares cumplices. Helena sorriu e seguiu adiante, diminuindo a distancia entre ambas.
Carol estava simplesmente entorpecida com aquela visão. Sua amiga conseguiu ficar ainda mais bela naquele momento. Talvez por estar mais relaxada, ou pelo clima de montanha que nos torna mais felizes e bem dispostos. Helena demorou alguns segundos até se desculpar pela demora e fazer as apresentações. Instantes após, Patrícia chegou com uma garrafa de vinho e todos decidiram apreciar aquele mimo com prazer e a conversa se esticou de forma agradável até a hora do jantar.
A arquiteta estava um pouco introspectiva quando sentou-se a mesa ao lado de Helena, que sussurrou perguntando:
-- Está tudo bem? Aconteceu alguma coisa, Carol?
-- Oh, não, está tudo perfeito, acho que estou um pouco cansada, somente isso.
Helena fez um carinho rápido nas mãos que acabara de segurar um garfo, fazendo Carolina respirar fundo e dar-lhe um sorriso meigo quase forçado, quando tudo parecia tomar proporções além das permitidas em relação a mesma. Ela não conseguia entender como uma coisa tão simples podia afetá-la tanto.
A conversa com todos corria descontraída e cheia que histórias engraçadas. Sem muita escolha, a arquiteta se entregara a Bacco, tentando relaxar suas inquietações e socializar com o ambiente, já Helena, preferiu ficar apenas no primeiro cálice. Nesse tempo, ela passara a observar todos à mesa, como pareciam livres e despreocupados, sem preconceitos, regras e sistema, bem diferente da sua vida, dos seus costumes e protocolos. Reparou que o loiro sentado à frente de Carolina, não tirava os olhos da moça, tentando sempre com algum assunto, alguma observação obter um pouco de sua atenção. Ali teria um admirador ou talvez um futuro pretendente, Helena observara a cena um pouco insegura e não tirava os olhos de ambos.
-- “Será que ele seria realmente uma pessoa boa pra Carol?”
Pensou.
Naquele instante, a advogada estava concentrada demais em Carolina para não perceber os olhos que a sondavam de forma maliciosa. Tatiana, prima de Kelly não tirou os olhos de si desde que havia entrado na sala. Por outro lado, duas pessoas perceberam aqueles olhares, Patrícia e a amiga Carolina.
-- “To vendo que este final de semana vai ser tenso, melhor eu ficar de olho.”
Patrícia pensou com preocupação ao monitorar aquele ambiente de paquera.
Na sala, um jazz tocava suavemente, enquanto todos conversavam já com certo sinal de embriagues. Ricardo permaneceu na cola das amigas, direcionando todo seu charme pra Carolina que sequer havia percebido os galanteios do rapaz, quando estava mais concentrada na figura ao seu lado.
O casal Gustavo e Luciana iniciaram uma dança, arrancando aplausos dos presentes. Logo Patrícia e Kelly se juntaram a eles e os demais meio que se entreolharam. Ricardo tomou a decisão:
-- Você me daria esta honra?
Carolina ficou totalmente sem graça com o convite. Olhou pra Helena que tinha no rosto uma expressão indecifrável. Dentro de si, não estava afim de dançar com ninguém, principalmente naquele momento, mas ficou envergonhada de não aceitar o convite. E assim ela dançou aquele jazz com o rapaz que a conduziu diminuindo qualquer espaço entre ambos. Helena, sorria um pouco sem graça quando a loira aproximou-se de si.
-- Eles formam um bonito casal, não acha?
-- Oi...desculpe! Sim, também acho.
-- Meu primo precisa arrumar uma namorada bacana e pelo visto a Carol parece ser a pessoa ideal.
-- A Carol é uma pessoa muito especial, mesmo.
Helena não tirava o olho do casal que conversava algumas coisas. De repente sentiu aquela insegurança no peito. -- Seria um pressentimento? Enfim, ela já nem notara o que Tatiana conversava, apenas balançava a cabeça concordando com a metade das coisas que a mesma dizia. Pouco tempo depois, ambos retornam para perto das moças. Carolina percebeu a mudança de comportamento de Helena que a olhava com seriedade.
-- “Será que ela ficou chateada de eu ter ido dançar com o Ricardo e tê-la deixado com essa dai que tá quase comendo ela com os olhos? “
Carolina fechara a cara para Tatiana, que parecia ainda não ter percebido o que se passava. Patrícia, de longe viu a cena e foi para junto do grupo, a fim de distrair todos até que fossem dormir. Previa uma catástrofe, mas faria de tudo para evita-la. Alguns minutos depois Carolina ria e falava bobagens. Olhava de forma tão carinhosa pra Helena, elogiava e tinha todos os seus olhares pra ela. E todos agora riam das piadas sem graça que a arquiteta começou a contar dando sinais claros do seu pilequinho.
-- Eu preciso ir tomar uma água.
Carolina soluçou e todos riram.
-- Pode deixar que eu te a acompanho, Carol.
-- Você é bastante prestativo, Ricardo. Adorei você!
Ela falou pastosamente e deu um tapinha delicado nos ombros do rapaz que vira ali uma oportunidade para colocar em pratica seus planos de conquista. Helena não olhava aquilo com bons olhos, ela deixou de sorrir quando eles se afastaram em direção cozinha. Alguns minutos se passaram e nada de Carolina voltar. Helena se via ansiosa e sem entender o que se passava dentro de si quando pediu licença e resolveu ir em direção à cozinha. Patrícia observava tudo confirmando todas as suas suspeitas, mas preferiu não se intrometer naquele momento.
-- Não dá Ricardo, eu gosto de outra pessoa, alias, estou apaixonada por outra pessoa!
Carolina ria e empurrava o rapaz que insistia por um beijo inconveniente. Ambos estavam bastante alcoolizados.
-- Como assim, Carol, me dá uma chance! Cadê esse cara irresponsável que não tá aqui com você?
Ele se aproximou da arquiteta segurando seu rosto, mas parou imediatamente quando ouviu a voz de Helena que presenciara todo o ocorrido e parecia extremamente nervosa com o que via.
--Tudo bem por aqui?
-- Oi amigaaa...
Carolina se desvencilhou dos braços do rapaz que ficara imóvel de repente e foi até a advogada abraçando-a pela cintura.
-- Acho que eu não tô bem, Helena. Me leva pro quarto?
Ela soluçou e sentiu o braço da loira rodear sua cintura da mesma maneira.
-- Boa noite, Ricardo, irei leva-la pro quarto, agora.
Helena despediu-se com o semblante fechado, seguindo com Carolina até a sala. Patrícia veio ao encontro percebendo que algo havia ocorrido, todavia, Helena não deu detalhes, só avisou que estaria subindo pro quarto com a arquiteta que ria e soluçava simultaneamente. Helena travou a porta assim que entrou e foi até o frigobar pegar uma água.
-- Ele queria me beijar, Helena.
Carolina ria enquanto ela lhe entregava o copo cheio de água. Helena estava séria e foi procurar algo na mala.
-- Sim, eu sei, agora vista essa camisola que eu encontrei pra gente se deitar.
-- Tá bom!
A arquiteta tirou toda a roupa de uma forma desengonçada e rápida, sendo acompanhada pela amiga que observava com admiração a beleza daquele corpo malhado e cheio de curvas. Helena parecia constrangida ao estendeu a camisola até a moça que a vestiu em seguida.
-- Pronto, agora podemos dormir. Aff, eu tô meio mole, Helena.
A advogada a segurou pela cintura novamente e a conduziu até a cama.
-- Você não quis beijar o rapaz porque está apaixonada, foi isso mesmo que eu entendi?
Helena não conteve a curiosidade, mil coisas se passavam em sua cabeça e um incômodo estranho tomara conta de si durante aquele momento. Apenas sentia uma necessidade imensa de saber mais sobre aquela historia.
-- Ah, Helena, eu não posso te contar isso, melhor não! Acho que você vai deixar de ser minha amiga...
-- Como assim, menina, deite-se e não fale bobagens! Eu não irei deixar de ser sua amiga assim tão facilmente.
Carolina se deixou largar em cima da cama, parecia extremamente sonolenta. Disse quase sussurrando e com os olhos fechados:
-- Acho que eu morreria de tristeza se você deixasse de ser minha amiga por eu ter me apaixonado por você. Mas eu juro, que estou fazendo o possível para que esse sentimento nunca atrapalhe a nossa amizade, viu, então, não se preocupe, vai ficar tudo bem...
Helena estava indo ao banheiro quando escutou o desabafo de Carolina. Ela não teve coragem de voltar-se para a voz que soava fraca atrás de si. Fechou os olhos e após um silêncio sepulcral, apenas continuou seu trajeto até o banheiro onde fez sua higienização pensativa, quase transtornada. A loira não queria voltar ao quarto, uma insegurança forte rondava sua mente perturbada. Não queria acreditar que aquela menina doce e tão amável tinha sentimentos diferentes em relação a ela, uma mulher casada e ainda por cima, não queria acreditar na possibilidade de um possível envolvimento com uma mulher, ainda mais com sua querida amiga Carolina. Mesmo assim, lutando contra si mesma voltou até o quarto, onde a imagem que vira deixou-a imersa numa meditação profunda. A arquiteta ressonava tranquilamente, ela era tão bonita, tão cheia de vida. Aquela figura despretensiosa que a conquistara de tantas maneiras não representava qualquer perigo para si e seu coração se aquecera de repente quando percebeu que a amiga era um muito mais especial do que imaginara. Deitou-se ao seu lado, observando sua face tranquila. Ficara contemplando aquela moça por algum tempo até que o sono foi mais forte.
Na manhã de sábado, Helena acordara cedo. Eram aproximadamente 7:00 horas, quando ela se levantou e se trocou silenciosamente. Antes de descer, observava o semblante da morena que dormia pesadamente. Sabia que aquele dia seria complicado, e principalmente, que Carolina acordaria tarde e com uma ressaca considerável. Encontrou Patrícia e Kelly que iniciavam o desjejum. Sentou-se junto delas e durante aproximadamente meia hora comeram e conversaram sobre a noite anterior, sobre o episodio de Ricardo e Carolina, a bebedeira e a ressaca que a maioria teria que enfrentar naquele dia.
-- Helena, acho melhor deixarmos algo no quarto pra Carol comer antes de irmos cavalgar. Tem uns comprimidos também, com certeza ela vai amanhecer péssima.
-- Pode deixar que eu mesma levo, Paty. Eu já havia pensando nisso.
-- Perfeito, vamos te esperar.
Patrícia observou a preocupação na face da loira e, também, algo a mais que não saberia descrever naquele instante.
Pouco tempo depois, Helena deixava a bandeja com pães, suco, café e comprimidos sobre o criado mudo ao lado da cama. Olhou pela ultima vez aquele rosto plácido e tranquilo, deixou-se apreciar cada detalhe da moça que dormia, imaginando e questionando tudo o que se passara na noite passada, sorriu, e depois saiu em direção a porta.
Carolina acordou as 10;00 da manhã com uma dor de cabeça horrível. Observou a bandeja com o café da manha e agradeceu a Deus pela alma boa que havia intercedido em sua causa. Tomou um banho demorado, comeu e tomou a medicação. Às onze horas, em fim, conseguiu descer as escadas.
Primeiramente, ela avistou Ricardo conversando algo com Gustavo na sala. Fez o cumprimento aos dois, notando a falta de jeito do primeiro, certamente envergonhado pelo que havia acontecido. Alguns flashes a levaram para a noite anterior onde se lembrou de ter sido cortejada insistentemente pelo rapaz, a dança, o quase beijo, enfim. Preferiu seguir adiante e esquecer aquele episódio. Encontrou Tatiana na companhia do grupo de mulheres sentadas a mesa na varanda. Conversavam algo relacionado à noite passada.
-- Apareceu a margarida!
Tatiana cumprimentou com certo sarcasmo na voz.
-- Conseguiu se recuperar, Carol?
Luciana puxou a cadeira pra arquiteta sentar.
-- Ao menos a dor de cabeça desapareceu Lu, tomei uns remédios que estão fazendo efeito. Eu só queria ter acordado mais cedo pra aproveitar melhor o dia.
-- Todo mundo acordou tarde por causa de ontem, com exceção das nossas amigas Paty e Kelly. Bom, acho que a sua amiga também levantou cedo.
Juliana comentou desanimada, enquanto acendia o cigarro.
-- Vocês sabem delas? Aliás, cadê as meninas?
Carolina voltou-se para Luciana buscando uma resposta.
-- Acordaram cedo, pelo que fiquei sabendo. Parece que estavam cavalgando e depois foram à cidade buscar alguma coisa.
-- Ah, tá...
A arquiteta sentiu algo estranho dentro de si. Parecia que algo havia acontecido, mas, em sua mente, só via alguns flashes não muito nítidos. Não se lembrava de muita coisa, o baque com o álcool fora muito forte.
--“Tomara que eu não tenha feito nenhuma bobagem.”
Ela pensou antes de ir a cozinha tomar um copo de água.
Como o caseiro fora dispensado no seu dia de folga, Luciana havia convidado as moças para ajudarem na escolha do prato para o almoço. Decidiram por assar o quarto de carneiro temperado que encontraram na geladeira. Cada uma das mulheres faria um acompanhamento, cabendo a Carolina se responsabilizar pela salada, sua especialidade.
Algum tempo depois, o barulho do carro se aproximando deixara a arquiteta ansiosa e preocupada. O almoço já estava quase pronto, e todos estavam reunidos na varanda, conversando, jogando cartas e bozó.
-- Bom dia meu povo!
Kelly entrava com algumas sacolas, seguidas por Patrícia e Helena que parecia ansiosa e cansada. Os olhos se cruzaram pela primeira vez naquele dia, mas nada disseram. Sorriram entre si e o rubor da face das duas foi notado por ambas. --“Algo estaria diferente?” pensou Carol. --“Será que ela vai conversar comigo sobre a noite passada?” Helena se interrogava internamente.
-- Fomos à cidade dar umas voltas, enquanto os digníssimos descansavam da noitada, ou melhor, da ressaca, né!
Todos riram e começou o deboche e a tiração de sarro entre todos. Carolina estava inquieta, percebeu que o assunto “Ricardo e ela” poderia ser abordado a qualquer instante. Levantou-se, rapidamente, indo em direção a cozinha. Passou por Helena sem cumprimenta-la.
Aquela atitude deixou a loira confusa e triste. Algo dentro dela pedia para que desse o tempo que Carolina precisava, que deveria se deixar afastar um pouco, embora os conflitos fossem muitos. Também ficara duvidosa sobre a veracidade do que havia sido falado pela arquiteta, afinal de contas, ela estava sob efeito do álcool e isso poderia ser um delírio de sua parte. Não aguentando tantas interrogações preferiu ir atrás da moça.
Ela virava o segundo copo de água quando se deparou com a loira, cujos olhos verdes a encaravam de forma intensa.
-- Bom dia. Você está melhor?
Helena perguntou de uma só vez, disfarçando a naturalidade que já não existia.
-- Ah, s-sim, eu estou muito melhor agora.
A arquiteta gaguejou, se mostrando mais tímida do que nunca para a loira que observava seus atos com curiosidade.
-- Mas... você tomou os remédios que deixei no criado?
-- Ah, então foi você... que bom, Helena, muito obrigada, aquilo foi minha salvação para não perder o dia de hoje.
-- Eu imaginei que você fosse precisar. Bom, vamos tomar um ar lá fora, o dia está lindo e podemos descansar e curtir essa natureza toda.
Ambas pareciam acalmar-se em face daquele diálogo sem pretensões.
-- Sim, com certeza, afinal de contas, para isso viemos!
E assim, saíram juntas de encontro a turma que permanecia na varanda conversando e se divertindo.
A conversa fluía descontraidamente. Helena se sentara do outro lado da mesa e Carolina em direção oposta. O loiro que já observava a arquiteta do outro lado, aproveitou para sentar-se na cadeira ao lado dela.
-- Tudo bem com a dor de cabeça?
-- Oi, Ricardo. Então, tudo bem sim, já está tudo em ordem.
Ela não conseguia disfarçar a falta de jeito. Olhou em direção de Helena e ela desviou o olhar, iniciando um assunto qualquer com Luciana.
-- Bem... na verdade eu queria me desculpar por ontem, Carol. Eu forcei a barra e tals... foi mal, viu!
O rapaz baixou a cabeça timidamente. Carolina compadeceu-se daquela cena, observando realmente sinceridade naquelas palavras.
-- Não se preocupe, isso acontece e, afinal de contas estávamos todos alterados mesmo.
Ela sorriu e inocentemente e tirou parte da franja que caia sobre os olhos do loiro que parecia ter gostado muito daquele toque.
Patrícia acompanhou toda aquela cena e se surpreendeu com a modificação no rosto de Helena que tinha presenciado tudo, mas que desviara, rapidamente, seus olhos noutra direção.
-- Você gosta de cavalgar?
--Adoro! Hoje as meninas foram mais cedo, uma pena que eu estava dormindo.
-- Por isso não! Se você quiser me acompanhar irei fazer um passeio no fim da tarde, quando o sol tiver baixado um pouco. Prometo que irei me comportar dessa vez, tá!
Ele cruzou os dedos fazendo uma cara divertida. Carolina não conseguiu deixar de rir daquele rapaz. Em sua cabeça, pensou que ao menos se distanciando um pouco poderia os pensamento que lhe afligiam a cabeça.
-- Ok, combinado. Assim que você for é só me chamar.
-- Tá bom!
Ricardo era só sorriso e seu bom humor agora parecia ser observado por todos ao seu redor, principalmente, pela prima Tatiana que observara o brilho nos olhos do rapaz e via ali uma mudança total no cenário daquela história.
Helena subiu ao quarto depois de algum tempo. Ela preferiu ficar por lá descansando, mas só conseguiu pensar em tudo aquilo que Carolina dissera no outro dia. Ficou incomodada, também com o fato da amiga ter dado tanta atenção ao rapaz que praticamente estava se excedendo com ela e o que poderia ter acontecido se a advogada não estivesse ali.
-- Oi.
Carolina abriu a porta e se deparou com a moça de olhar indecifrável olhando seriamente pra si como fosse despi-la.
-- Oi, Carol.
Helena respondeu sem dar o sorriso costumeiro, fazendo a arquiteta levantar a sobrancelha e gelar o estômago por um mau pressentimento.
--T-tá tudo bem...?
-- Sim, está.
-- Eu vim convidá-la para o almoço, é que já esta pronto...
-- Vou descer, obrigada.
-- Você quer que eu a espere?
--Não precisa...só se você quiser.
A advogada falou com uma voz meio triste. Fazendo Carolina ir ao seu encontro como se um magnetismo tomasse conta dos seus movimentos.
-- Está preocupada com algo, eu posso sentir...
-- Bem, você se lembra do que aconteceu ontem?
Helena olhou profundamente nos olhos da arquiteta que quase teve um coronário e a certeza absoluta de que havia ficado em cor escarlata.
-- B-Bem, talvez,...alguns flashes..
-- Então você se lembra do que aquele rapaz tentava fazer com você quando eu entrei na cozinha?
-- S-sim, quer dizer, mais ou menos...ele parecia estar afim de mim...queria me beijar, acho.
-- Não Carol, ele estava te imprensando na parede para forçar um beijo e eu vi.
-- Ah.
A morena ficou constrangida com as palavras da amiga e nada conseguiu dizer após isso.
-- Eu não o conheço direito, mas não concordo com o que ele fez.
-- Realmente não foi certo, Helena.
Ela continuava envergonhada por aquela conversa.
-- Se você não concorda com isso porque razão estaria paquerando com ele agora mesmo lá embaixo? Não acha perigoso dar muita moral pra alguém que mal conhece e que praticamente te forçou a uma situação no mínimo constrangedora?
-- É...na verdade ele veio se desculpar e...
-- E você aceitou facilmente como se isso não tivesse sido nada e agora está respondendo abertamente a paquera dele sem ressalvas?
Helena falou com certa agressividade.
-- Na verdade eu não vejo dessa maneira. Primeiramente, sei que o fato de estarmos alcoolizados não representa nenhuma desculpa ao que aconteceu e, segundo, eu não estou aceitando a paquera dele, mas acredito que esteja sendo sincero em querer minha amizade.
Carolina devolveu da mesma maneira e se arrependeu quando notou os olhos da amiga baixarem. Helena se levantou da cama de repente, parecia um pouco nervosa.
-- Me desculpa, que cabeça a minha. Eu não tenho nada a ver com isso. A vida é sua e é você quem deve decidir com quem ficar....eu...
-- Calma, Helena, para com isso! Claro que a sua opinião é importante pra mim...em todos os sentidos!
A distância entre elas diminuiu. Estavam tão próximas que sentiam e ouviam a respiração uma da outra. Olhos nos olhos que se mediam de uma forma indecifrável. No peito de Carolina, o coração acelerava diferente, doía com a ansiedade e o medo. Helena apenas olhava intensamente para aquela moça que deixava todo seu nervosismo transparecer como água cristalina. Carolina se aproximou um pouco mais, sem perceber. Ela subiu as mãos e tocou os braços da advogada que arrepiou e fechou os olhos por alguns segundos, mas logo depois. Abrira-os novamente assustada e tirou as mãos de Carolina de uma forma quase grosseira de seus braços, olhando-a com um misto de indignação, quase de raiva.
-- Não vamos mais falar nisso. Esquece, Carol, acho que eu me enganei completamente. Realmente você deveria dar uma chance ao rapaz, tomara que de certo. Vamos almoçar, então, eu já estou com muita fome!
Helena até tentou, mas acabou não esperando a morena que ficara paralisada, sem entender aquela cena, ou seja, sem entender o que quase havia feito e as atitudes de sua amiga. Ficara desolada completamente. Seu peito encheu-se de uma dor desconhecida, a angústia tomara conta de si e os olhos se encheram de lágrimas. Foi até o banheiro e chorou toda sua dor. Vinte minutos depois uma batida na porta.
-- Amiga, você tá bem?
Patrícia subira assim que perguntou a Helena a causa de Carol não ter decido junto. A mesma preferiu desfazer o interrogatório, falando que não sabia, demonstrando até mesmo que nem se importava. Ela continuou passou a conversar com Tatiana como se nada tivesse acontecido.
-- “Essa não é a Helena que eu conheço. Tá acontecendo alguma coisa”.
Pensou antes de se apressar e subir as escadas. Chegando ao quarto não achou ninguém, mas viu que a porta do banheiro estava fechada e foi até lá.
-- Amiga, você tá ai? Aconteceu alguma coisa? Helena desceu e...vou ser bem sincera com ela estava muito diferente. Se não quiser falar sobre isso irei respeitar, mas saiba que sou sua amiga para o que der e vier. Só quero saber se você está bem?
A porta se abriu e Carolina ainda tinha parte das lágrimas circulando pelo rosto. Ela não disse nada, mas sabia que a arquiteta havia entendido. Patrícia apenas entrou, trancou a porta e a abraçou demoradamente.
Depois de relatar parte do ocorrido, Carolina, enfim se abriu e revelou suas duvidas e o sentimento que parecia estar tomando conta de si.
-- Eu já suspeitava, Carol. Essa sua ligação com Helena estava demais de intensa, uma sintonia diferente da que os amigos têm, sabe.
-- Eu só quero esquecer tudo isso. Estou perdendo meu rumo e posso perder até a amizade dela.
-- Você não está perdendo ninguém, só não está sabendo administrar o que quer. Se você quiser ficar com Helena, lute, senão, tem um monte de homem dando sopa por aí e mulher também se for o caso. Pare de sofrer por alguém que não vai te dar o que você merece, Helena é problemática demais, amiga, tenha cuidado. Ao que me consta ela nem sabe desse seu sentimento e já está se metendo em sua vida mais do que devia. Vamos, limpe esse rosto, passe uma maquiagem e desça. Não vai passar o fim de semana nesse recalque todo de jeito nenhum. Tem o Ricardo que tá super afim de você, é só ir devagar e ver no que dá, mas por favor, não sofra mais dessa maneira!
-- Você está certa, viu. Eu preciso me valorizar e buscar o que é melhor pra mim. Eu não sei se tenho forças para encarar tudo isso e uma rejeição seria o fim. Não quero problemas na minha vida.
-- Isso mesmo, vá se divertir e deixe os problemas pra depois.
Carolina se arrumara rapidamente, levantou a cabeça e se deixou levar pela amiga que sorria e falava algo engraçado, tirando alguns sorrisos daquele rosto um pouco marcado pelo choro.
A arquiteta não olhou nos olhos da advogada quando chegou, cumprimentou a todos como se nada tivesse acontecido e sentou de frente para Ricardo que a olhou cheio de sorrisos. Ela apenas retribuiu com um sorriso breve. Ao menos ele realmente queria estar perto dela. Olhou de lado e vira Helena olhar para si com um semblante questionador, mas que desviara sua atenção para Gustavo que agora explicava o tempero do cordeiro.
-- O cordeiro está tudo de bom, mas a salada...minha nossa, está magnifica!
Tatiana falou quando repetia o prato vegetariano.
-- Devo concordar, uma das melhores que já comi.
Helena falou observando melhor os ingredientes que a envolviam.
-- Carol é a expert. Muito boa mesmo!
Luciana revelara.
-- Uau, até nisso você arrasa!
Ricardo elogiou e todos se olharam com um meio sorriso malicioso.
-- Não é porque ela é minha amiga, mas a Carol, atualmente, é um dos melhores partidos que eu conheço, além de ser uma expert na cozinha, digo isso com propriedade, pois ela cozinha divinamente muitos pratos da culinária brasileira e internacionais também, além de ser uma profissional maravilhosa, linda, inteligente, bem humorada, tudo o que procuramos numa pessoa interessante para dividir bons momento.
Patrícia piscou pra amiga que riu da cara maliciosa que ela fizera, lógico, na brincadeira.
-- Nossa, Carol, assim até eu fico com ciúmes, viu!
Kelly continuou a brincadeira fazendo todos riem, menos Helena, que demonstrava certa impaciência e ansiedade toda vez que observava Carol ser paquerada por aquele homem de caráter duvidoso. Ela definitivamente não havia gostado dele. Mesmo que em nenhuma hipótese a mesma correspondesse aos sentimentos revelados pela amiga, não queria vê-la se envolvendo com aquele abusado. Seu humor piorou ainda mais quando o rapaz revelou, ainda degustando a salada, como se fosse a melhor comida do mundo:
-- E aí, já está pronta pro nosso passeio?
-- Que passeio?
Tatiana perguntou interessada, querendo saber um pouco mais sobre aquela historia.
-- Vamos andar a cavalo mais tarde.
Carolina respondeu um pouco envergonhada.
-- Vão mesmo? Quem sabe amanhã também não saímos de manhã, o que acha amor?
Gustavo perguntou à esposa que respondeu positivamente.
Parte dos convidados decidira ir a cidade fazer um passeio, logo após o café, e a outra optou por descansar um pouco, dentre estes últimos, Carolina e Helena que subiram para o quarto em sequência.
Carolina estava deitada na cama lendo o livro quando a loira entrou e seus olhos instintivamente se cruzaram. Apesar da insegurança de ambas, o carinho que tinham uma pela outra gritava mais alto e um meio sorriso se fez antes que a mais velha se pronunciasse:
-- Acho que vou descansar um pouco, o almoço estava perfeito.
-- Que bom que gostou, Helena. Estou aproveitando um pouco pra ler o livro, ainda nem terminei de ler o primeiro capítulo, sabe. Venha, deite-se, prometo que irei ficar bem quietinha.
Carol falou de uma forma tão doce e despretensiosa que Helena apenas tirou os sapatos e deitou-se ao seu lado de barriga pra cima.
-- Onde você parou a leitura?
A loira deitou-se de lado, de encontro a amiga que estava um pouco afastada de si.
-- Estou na página seis, ainda. Você disse que tinha lido um pouco ontem...
-- Então, eu havia lido até a quatro.
-- Hum...então, se você quiser eu posso voltar e dai podemos ler juntas, o que acha?
-- Não precisa, Carol, não quero te interromper..
Ela falou, demonstrando o contrário do que sentia e isso foi sentido pela morena que apenas insistiu um pouco mais:
-- Por isso não, Helena, são só duas páginas. Venha, vamos ler juntas!
De repente, a loira sentiu algo dentro de si, diferente do que havia sentido desde o dia anterior. Uma sensação de segurança e bem estar a conduzira para o lado da amiga. Simplesmente se deixou levar por uma força que a empurrara para a menina de olhos cor de mel, que a fitava com meiguice e um sorriso lindo no rosto.
-- Encosta aqui.
A loira se permitiu esquecer de todos os seus anseios quando se deitou próxima ao ombro da arquiteta que começou a folhear o livro até acertar na página onde iniciariam a leitura.
--Pode ser desta?
Carol perguntou concentrada na página do livro.
-- Sim, foi ai mesmo que parei.
Helena olhou rapidamente pra menina que tinha um charme diferente ao fechar o cenho, concentrada na leitura, não evitou sorrir de canto, depois, também se concentrou para iniciar sua leitura. A loira ainda sentia certa distancia incomoda-la quando decidiu encostar ainda mais, e praticamente deitou sobre os ombros macios da morena, deixando parte da franja cair sobre o pescoço daquela moça de perfume doce e suave. Carolina sentiu aquela aproximação de forma natural, ou seja, estranhamente não tivera qualquer dos outros sintomas que vinha se revelando nos últimos dias, ao contrário, o calor era de conforto, paz e tranquilidade. O perfume das madeixas que caíram sobre si, agora a deixavam mais calma.
Em pouco tempo elas já teriam lido umas vinte páginas. Carolina iria virar folhear a próxima quando sentiu aquele respirar pesado. Ela movimentou de encontro ao rosto quase encostado ao seu e observou a moça que dormira ao seu lado. Aquilo foi um estímulo poderoso para seus olhos, que estavam pesados naquele instante. Assim, a arquiteta não resistiu mais, colocando o livro sob a barriga, entregando-se aquele sono gostoso junto da amiga.
Quando Carolina acordou tinha o corpo circundado por braços ao redor de sua cintura. De longe ouvira uma voz ou alguma coisa vindo do lado de fora do quarto, mas estava muito sonolenta para entender qualquer coisa. Ela deixou-se adormecer novamente quando as batidas se intensificaram, acordando Helena que lentamente se espreguiçou e fungou manhosa antes de se deparar com a nossa cena. A loira ficou completamente sem graça quando se viu abraçando a morena, com o corpo quase que totalmente colado ao dela. Apenas ficou ali, imóvel, sem dizer uma palavra. A arquiteta também não disse nada e nem queria, afinal de contas, aquela proximidade toda era tão gostosa, tão indescritivelmente boa que Carol preferia ficar silenciosa a ter que acabar com aquele contato.
-- Carolina?
A voz masculina insistiu ao mesmo tempo em que batera na porta.
-- Acho que tem alguém te chamando...
A voz rouca pelo sono e por alguma razão desconhecida quase sussurrava.
-- Sim, acho que tem alguém na porta, mas eu estou com tanto sono...
Carolina respondeu da mesma maneira, relutando para sair daquela posição.
--Você não vai atender?
Helena fechou os olhos e suspirou como se tivesse embriagada e, realmente, estava completamente entregue aquela proximidade.
-- Depois eu... vejo isso....
Carolina respondeu antes de se entregar ao sono novamente.
Uma hora depois Carolina acorda e percebe a loira deitada sobre o seu peito confortavelmente, como se ela fosse o melhor travesseiro do mundo. A loira abraçava sua cintura com um dos braços. O livro já não estava mais na barriga e sim ao seu lado. Helena se moveu e abriu os olhos, agora consciente de estar naquele contato. Ela se ergueu lentamente sobre os olhares de Carol que mordera os lábios inferiores como se tentasse não reclamar aquela ausência corporal que se fizera de repente.
-- Desculpe, eu acabei dormindo...
A loira não conteve o leve rubor nas bochechas. Carolina tinha os olhos brilhando e o coração aos pulos por constatar tudo o que aquela mulher a fazia sentir, à todo momento, ou seja, uma mistura de desejo, amizade, alegria, calor, conforto e paz. Seus olhos não conseguiam esconder o que a boca era impedida de falar.
-- Não se preocupe eu também adormeci...
Um silêncio se fez e Helena se levantara indo em direção ao banheiro, dando a impressão que parecia estar incomodada com algo. Carolina suspirou observando aquele conflito na amiga, não sabia o que a outra sentia, mas naquele momento teve quase certeza de que a loira entendia o que estava acontecendo e que parecia não querer deixar isso a mostra. Helena estaria fugindo...
-- Estou descendo.
Carolina preferiu deixar a amiga na sua introspeção ao descera rapidamente a fim de evitar maior constrangimento.
-- Carol!
-- Ahn, oi Ricardo!
-- Desculpe, eu fui ao seu quarto mais cedo. E o passeio, o sol tá baixo, a gente poderia ir agora o que acha?
--Bem, eu...
A arquiteta parecia sem graça ao tentar negar o pedido do rapaz insistente, entretanto, algo a fizera mudar de ideia na mesma hora. Helena descera as escadas e presenciara toda a cena. Aparentemente séria, apenas cumprimentou ambos e seguiu adiante.
-- Vou sim, vamos lá!
-- Maravilha!
E assim Carolina seguiu com o rapaz até a porta onde conversavam parte dos presentes para depois partirem em direção ao estábulo. Como previsto, apesar das indiretas, Ricardo fora bastante educado e, assim ambos aproveitaram bastante o passeio que durara mais ou menos uma hora e meia.
Fim do capítulo
Meus amores, mais um capitulo ...aff..tive que dividi-lo pois estava enorme. O próximo vai ser do jeito que todos esperam, acho. Espero a grandiosa contribuição de vocês com muitas criticas e comentários. Beijos no coração
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Angeloliveira
Em: 02/11/2015
...e que comecem ass confusões...mais, confusões de sentimentos, descobertas de novas emoções...
Helena não compreende o que sente por Carol..ou ja descobreiu?
bem, acho que elas sabe que não é só uma amizade, que existe algo mais profundo...ciumes ja comecou a sentir por causa do loiro atirado kkk...mais, em seu mundo, não pode existir ou viver o que ela sente por carol...mais aos poucos ela verá que não terá como fugir...foi até bom aparecer alguem a fim da carol para que ela possa ver que o que ela senti não é ciumes de amiga...e sim de algo mais, AMOR,...que o "seu mundo"foi projetado por uma sociedade preconceituosa, e que existe mais do que as pessoas mediucres ditam...ela conseguirá enchergar ecompreender o que existe de mais belo no mundo......este passeio para a serra foi assim, determinante para o sentimento das duas.
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patty-321
Em: 02/11/2015
Foi ótimo o cap. Era esperado toda essa emoção transbordante. E a dualidade de sentimentos. Nao é fácil p nenhuma das duas ainda mais da Helena q e casada e pertence a um mundo cheio de falsidades. Quebra de paradigmas. E isso q a helena terá q realizar. Bjs veru. Valeu
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patty-321
Em: 02/11/2015
Foi ótimo o cap. Era esperado toda essa emoção transbordante. E a dualidade de sentimentos. Nao é fácil p nenhuma das duas ainda mais da Helena q e casada e pertence a um mundo cheio de falsidades. Quebra de paradigmas. E isso q a helena terá q realizar. Bjs veru. Valeu
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Silvia Moura
Em: 02/11/2015
Ai dio mio... tudo a flor da pele... o sentimento todo tão palpável, falta somente os olhos vêem o verdadeiro amor, assim, estampado na faca de cada uma, e é claro essa confusão toda dando combustão para mais confusão... autora, tira da reta esse loiro feio, risos, ô negócio chato são esses seres desprovidos de sensibilidade e tantas coisas que fazem parte do universo feminino de que tanto amo... enfim, desejando que os rumos se acertem e elas se vejam como amor.... eu gosto muito desse conto... fica em paz e que o restinho do feriado seja tranquilo...bjs...
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Miss_Belle
Em: 02/11/2015
Amei o capitulo... gosto do jeito gradual e inconciente das duas se aproximarem...Mais confesso que tenho medo da Helena magoar a Carol, ela não merece. Parabéns linda, escreves muito bem!!
Uma perguntinha...e o proximo capitulo sai quando???
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