Acordos são firmados e o jogo se inicia...
Capítulo 4
4 Um começo
Na espreita, era realmente dessa forma que Lorena Mansur havia permanecido, enquanto via aquela mulher concentrada, de olhar indecifrável, embora aparentasse certo deslocamento, até mesmo um descontentamento por estar ali. Sorrateira ela decidiu se aproximar a passos curtos, sem pressa. Com a sorte a seu lado, observou quando Ana Paula se levantou e se dirigiu a mesa coberta por uma grande variedade de entradas. Saiu ao seu encalço, sem ser percebida no salão lotado. Pouco tempo depois, a abordagem não poderia ter sido diferente, totalmente discreta ela havia conseguido, definitivamente, sua atenção.
-- Oh, desculpa...
Lorena havia se esbarrado propositalmente em Ana Paula, enquanto fingia pegar alguma coisa pra comer.
-- Não foi nada.
Ana Paula respondeu com educação e, por um momento, sua atenção ficara presa na mulher sorridente, de olhar imperscrutável que tentava se desculpar.
-- Acho que já nos conhecemos, estou certa?
Lorena iniciou seu ataque à empresária, que mesmo discreta não conseguia esconder certa admiração, um tanto impressionada com a beleza daquela mulher. Através da olhada discreta que fizera da figura próxima, pode identificar os cabelos dourados compridos, levemente ondulados nas pontas, a maquiagem perfeita que realçavam os olhos azuis brilhantes e semi serrados, a boca pintada de vermelho sangue, que lhe doava parte da sensualidade e elegância. A voz rouca e aveludada de uma mulher decidida e bem humorada que parecia saber muito bem o que queria.
-- Realmente, você não me parece estranha.
Sorriu de volta, educadamente, demonstrando parte da timidez e insegurança que tinha dentro de si.
Lorena Mansur deu seu olhar mais encantador em contrapartida ao sorriso irônico que conseguira esconder antes de pensar maliciosamente, deixando escapar o olhar vitorioso sobre a vítima que não conseguia enxergar um palmo da maldade a sua frente.
--“Acho que a gata gostou do que viu. Eu nunca me engano quando sou apreciada. Pra mim, essa brincadeira será muito mais divertida e prazerosa do que imaginava!”
Ela continuou de forma cínica:
-- Você por um acaso é parenta daquela moça, que chegou da Grécia? Como é mesmo o nome...?
A loira fingia pensar como se realmente buscasse uma resposta e Ana Paula atropelou seus pensamentos respondendo-a, todavia, deixando um lastro de desânimo ao diminuir parcialmente o sorriso exibido anteriormente. Entregou seu descontentamento sem querer.
-- Você deve estar falando da Charllote...
--“Uhuuu, na mosca!!! Como eu já suspeitava, ela não gosta da prima!”
Lorena quase deu voz ao grito de satisfação que soltara dentro de si, se deixando levar sobre os pensamentos perniciosos que redesenhavam seu novo estratagema.
-- É essa moça. Bem, agora mesmo me ocorreu de onde nos encontramos. Acho que foi em uma festa de aniversario na boate a alguns dias atrás. Talvez você nem se lembre, mas eu me lembro bem de você e que estava vestindo um vestido branco muito bonito, alias, você estava linda, diga-se de passagem.
Manipulou um falso olhar tímido e um sorriso tão meigo que acabou desarmando a morena.
-- Ah sim, agora estou me lembrando da ocasião.
Ana Paula respondeu um pouco tímida, mas sorriu feliz pelo elogio, afinal de contas, ter sido percebida daquela maneira por uma mulher tão deslumbrante e aparentemente tão simples seria um motivo de orgulho. Relaxou os ombros por alguns segundos, esquecendo-se de Charllote, apenas deixou a conversa fluir normalmente.
-- Obrigada, você também estava, aliás, está muito bonita. Lindo vestido esse seu...?
Ana Paula deixou transparecer sua timidez novamente por não saber do nome da moça a sua frente.
-- Bom, deixa eu me reapresentar novamente. Sou Lorena Mansur.
De forma imprevisível, a loira resolveu quebrar o gelo entre elas, assumindo todos os riscos daquela impulsividade. Do nada, sua autoestima lhe permitira depositar um beijo na face de Ana Paula e receber a resposta que precisava através do belo rosto surpreso. A empresária sorriu daquela voluntariedade toda, reapresentando-se de forma educada.
-- Prazer, Lorena, sou Ana Paula Caniggia.
Ela acabou deixando a loira contente por saber ter vencido mais essa distância. Estava tão flutuante de satisfação, quanto impressionada com a mulher de traços encantadores a sua frente. Resolveu insistir naquele momento.
-- Está um pouco quente por aqui, vamos tomar um pouco de ar lá fora?
“—Aceite, gata... vamos nos divertir, vai ser bom pra você... prometo que não vai doer nada, vaii..!”
Lorena recitava internamente o mantra que faria seduzir aquela mulher tão diferente e imprevisível.
E assim, a bioquimica cedeu parte da sua insegurança em relação aquela moça tão educada. Olhou para os lados e viu o marido longe de si, distribuindo atenção entre homens e mulheres sorridentes. Do outro lado da pista, Charllote, que da mesma maneira, ria e se divertia com todos a sua volta. Olhou para si mesma e seu olhar tornou-se turvo em menos de um segundo. A sua realidade contrária ía de encontro ao total isolamento naquele lugar, enquanto os outros se divertiam. – “Que mal faria a companhia de uma moça bonita e educada, de olhar intenso e sorriso terno, querendo fazer amizade?” E assim, pensando, decidiu:
_”Porque não?”
-- Vamos sim, estou precisando de um pouco de ar.
Seguiram juntas até o deck, misturando-se entre a multidão. De longe, alguém parecia não perder um flash na direção de ambas.
“-- Que boa surpresa, Lorena Mansur! Estou começando a acreditar que você fará um ótimo trabalho. Enfim, que os jogos se iniciem.”
Deixou-se sorrir ainda mais diante dos amigos que mal imaginavam o que estava se passando pela cabeça manipuladora e cheia de más intenções que estava a sua frente.
La fora, no deck decorado por plantas verdes e bem dispostas, duas mulheres se posicionavam lado a lado em direção ao horizonte formado pelos pontos de luze distribuídos na cidade iluminada. Um vento gostoso tocava-lhes a face de forma suave fazendo os cabelos se misturarem discretamente. A sensação de harmonia e equilíbrio que reinava naquele lugar foi capaz de neutralizar parte da ganancia ansiosa, escondida nas intenções de Lorena e, também, acalmar a timidez e a desilusão de Ana Paula, ambas perdidas em si mesmas, degustando a bebida soerguida em suas mãos. A loira não perdeu tempo, somente suspirou antes de recomeçar um novo ataque.
-- Deliciosa noite...apesar dos pesares.
Baixou a cabeça confirmando o desânimo anterior. Uma risada triste e fingida foi ouvida pela empresária que passara a dar atenção ao olhar triste e vago rigorosamente ensaiado.
-- Sim, a noite realmente está linda, mesmo...bem, será que eu entendi direito ou parece que você não está muito bem?
Ela demonstrou interesse pela moça que levantou o olhar em sua direção, encarando aqueles olhos cor de ébano que a fitavam com certa curiosidade. Decidiu ser firme e convincente quando a fitou antes de responder.
-- Sabe de uma coisa, Ana? A verdade é que eu nunca vou conseguir me acostumar com essa vida noturna movimentada, essa badalação toda não é pra mim, sabe. Ter que ficar ligada a círculos sociais de interesse, vivendo uma vida pra agradar os outros, tem sido um sofrimento e eu... Ai, desculpe, você não precisava estar ouvindo isso!
Ela baixou novamente a cabeça demonstrando uma desolação que amoleceu o olhar da empresária. Ana Paula estava se identificando com cada palavra antes dita pela loira. Mesmo tentando se conter, aquele clima e aquela moça foram um incentivo para que também lançasse mão do seu próprio desabafo, coincidentemente parecido com o dela.
-- Então acho que temos a infeliz coincidência de vivemos sob o mesmo problema, Lorena.
A loira, na sua performance perfeita revelou-se surpresa com a confissão de Ana Paula.
-- Sim, é muito triste admitir que a sua família e seus amigos fazem parte de um circulo de interesse e vaidade sem limites, onde aquele que não se encaixa aos padrões tende a ser excluído gradativamente. Enfim, eu também não queria estar aqui, mas tive que comparecer pelo meu marido e, também, pela prima dele, Charllote, que você já conheceu.
A empresária continuou agora estampando toda sua frustração em cada gesto do corpo delicado que parecia ter se encolhido de repente. Lorena preferiu dar um tempo e durante quase um minuto ficaram caladas e pensativas, entre suspiros e olhares perdidos em lugar algum.
-- Se me permite dizer, eu achei a sua prima Charllote um pouco superficial. A minha prima fez questão que eu a conhece-se, pensa que a influência dela poderia me ajudar a ter algumas aberturas profissionais, sou recém formada e...bem, você não precisa ouvir isso...desculpe!
-- Não se preocupe, fale o que tiver vontade. Entendo que as dificuldades no mercado de trabalho não são fáceis. Sua prima teve boas intenções, acontece que apenas procurou as pessoas erradas. Sinceramente, duvido que Charllote poderá abrir portas profissionais pra você assim do nada, ela não é do tipo que faz algo sem pedir uma troca igual ou simplesmente superior a sua disposição, tenha cuidado.
A outra agradeceu com os olhos cinicamente.
-- Eu notei isso, Ana, mas não quis falar pra minha prima, elas são amigas...seria chato.
-- Melhor assim, não diga nada a ela, outras oportunidades virão, tenho certeza, tenha um pouco de paciência.
Ela tentou ser agradável e mostrou-se bem disposta a ouvir Lorena que mais que depressa inventou a personagem perfeita, contando parte de sua história, omitindo e inventando outras partes, enfim, para empresária e bioquímica, a loira era uma moça batalhadora que pretendia sair da dependência da família de forma digna. Ela se convenceu disso.
-- Imagino que pra alguém com o seu padrão de vida seja muito difícil sair de casa e morar sozinha, mas por outro lado, se isso for realmente necessário talvez seja melhor você abandonar certas situações supérfluas e buscar uma vida mais simples temporariamente, até você alcançar seus objetivos. Pense que ao menos assim a sua felicidade pode ser encontrada e isso não tem preço!
-- Eu também acredito nessa possibilidade, ultimamente estive pensando da mesma maneira. Que bom que existe alguém nesse mar de hipocrisia, que ainda tem lucidez e um bom coração pra partilhar. Obrigada, Ana!
Lorena agradeceu como se tivesse ganhado o melhor conselho de sua vida, olhando intensamente para Ana Paula que sorriu e pareceu gostar muito daquela conversa. Depois, foi ela quem se agradeceu internamente por ter conseguido não perder totalmente sua noite naquele lugar. Conversaram mais um pouco, trocaram telefones e Ana Paula ouviu seu nome ser chamado de longe. Era o marido que, enfim, parecia ter dado sinal de vida e possivelmente a chamaria para ir embora. Sua alegria pela constatação daquilo deixara seus olhos brilhando e Lorena se encantou ainda mais pelo grande sorriso de satisfação que pousara na face da morena. Despediram-se, rapidamente, com Ana indo em direção a porta depois de trocarem dois beijos, sendo observada por uma loira que passaria a deseja-la ardentemente a cada passo que se distanciava de si.
-- Eu quero essa mulher pra mim, de qualquer maneira.
Falou baixinho e mordeu os lábios com desejo, antes de fechar os olhos e sentir o resto do perfume que ficara no ambiente e na pele do seu rosto que agora queimava, pelo perfume doce daquela mulher linda, elegante, meiga, sincera, pura e inteligente que iria descobrir cada vez mais e tomar para si de todas as formas.
Fim do capítulo
MInhas querida, desculpe a demora enfim, retornamos. Beijos no coração..
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