Sensações diferentes...
Capítulo 7 - Insight
Capítulo 7 Insight
Carol havia chegado atrasada naquela segunda feira. No semblante abatido, vestígios dos excessos cometidos na noite anterior. Reconhecia para si mesma ter exagerado, mas parecia inconformada, pois estava dirigindo e ainda teria que levar Helena pra casa. Ainda bem que o bom senso da segunda as havia guiado com segurança. Estava envergonhada, e na sua cabeça, algo martelava e tirava o sossego perdido.
-- Hum, pelo visto a ressaca ainda não terminou.
Patrícia sorriu fazendo brincadeira da amiga, que não estava acostumada a exagerar na bebida.
-- Bom dia, Patrícia, aff, minha cabeça está um caos. Uma ressaca terrível.
Ela não escondeu o desânimo explícito até mesmo nos passos lentos que dera até sua mesa.
-- Vou te dar um remedinho porreta que tenho na minha bolsa, moça. É tiro e queda, logo você ficara boa.
Depois de alguns minutos de silêncio, Carolina parecia se restabelecer novamente. Abriu uma planilha e passou a analisar o projeto. Virou aquilo do avesso, mas parecia não encontrar o que procurava, algo interferia na sua concentração. Pegou a caneta, anotou algumas coisas e parou pensativa.
-- To vendo que sua concentração parece ter sido afetada, mas não só pelo álcool. Aconteceu alguma coisa?
A arquiteta parecia insegura, remexeu-se na cadeira e após alguns segundos respondeu a amiga:
-- Então, eu estou meio preocupada com uma coisa, sabe.
-- Você quer falar sobre isso? Se quiser...
Patrícia colocou as mãos sobre o queixo mostrando interesse em ouvir.
-- Na verdade foi sobre o que aconteceu ontem. A Helena é uma pessoa muito séria e eu insisti tanto pra ela sair. Como eu estava dirigindo, de certa forma fui irresponsável com ela, não deveria ter bebido, ainda bem que ela dirigiu. Enfim, estou chateada por ter deixado as coisas fugirem do controle.
Ela colocou as mãos no rosto demonstrando certa frustração. Contou tudo o que aconteceu, inclusive que o motorista de Helena teve que leva-la ao seu apartamento. Parecia bastante envergonhada.
-- Acho que você não deveria pensar dessa maneira, Carol. Com certeza ela não reparou nisso, fica tranquila. Eu mesma observei o quanto ela se divertiu, pense no bem que você fez em leva-la para se distrair um pouco. Não se culpe, essas coisas acontecem.
-- Sim, acontecem, sim, Patrícia, mas com jovens inconsequentes e eu não gostaria que ela pensasse mal de mim. Eu gosto da Helena, temos um envolvimento profissional por causa do projeto do apartamento dela, isso soa muito mal.
Carolina não escondeu a tristeza e a preocupação com a imagem que a amiga teria de si após aquela noite.
-- Não acredito que isso possa acontecer, Carol, isso é coisa dessa sua cabecinha. Relaxa, mulher! Mais tarde liga pra ela, você vai ver que está se preocupando a toa.
Carolina manteve-se pensativa durante o resto da manhã. Alguns flashes da noite passada passavam na sua cabeça e a deixavam ora confusa, ora em estado de graça. Ela se lembrava de que ha muito tempo não se sentia tão bem com um simples passeio no shopping, o quanto lhe parecia agradável à companhia de Helena, a sua sinceridade constante, ponderação, delicadeza e educação, entre tantos adjetivos que a tornavam uma pessoa encantadora. Sentia-se triste por talvez ter passado uma má impressão e a mesma passasse a vê-la com outros olhos. Uma sensação de perda apossara-se até novas imagens serem trazidas por meio de um novo flash. O sorriso de Helena lhe veio a mente, anestesiando aquela sessão de tortura e culpa. E assim, outros pensamentos trouxeram certo contentamento, como o fato de Helena ter se divertido muito durante aquele momento. Ela não evitou o sorriso. Por fim, uma nova lembrança veio para tirar-lhe o mínimo de o conforto e da tranquilidade a pouco desfrutada, fazendo-a corar-se sobremaneira e abrir levemente a boca em sinal de espanto. Lembrou-se do pequeno acidente, de Helena se apoiando em si para não cair. Apesar de alcoolizada, via nitidamente o replay daquela cena. De repente, vira-se perdida naqueles olhos verdes, presa na profundida do brilho daquela íris que espelhava seus próprios olhos. Um calor havia se apossado instantaneamente de si, subindo do estômago ao pescoço, sufocando, alterando sua respiração. De repente, um perfume a fizera relaxar como se respirasse o ar fresco de um campo de girassóis. Tudo parecia muito confuso em sua cabeça. Carol respirou fundo e decidiu não lutar contra si própria, saiu para o almoço, queria esquecer.
Ao fim de mais um dia de trabalho, quando tudo parecia em ordem.
-- E ai, já ligou pra ela?
Patrícia parecia se divertir de alguma maneira com aquela situação.
-- Ainda, não.
-- O que você está esperando?
-- Acho que vou fazer isso mais tarde.
-- Que drama, Carol. Essa mulher não é de vidro, larga de ser boba, todo mundo já bebeu um dia além da conta.
-- Todo mundo, nós, né amiga. Helena não se encaixa ao todo mundo, definitivamente.
-- Bom, aparentemente devo confessar que ela tem cara de ser certinha e no máximo fazer um papai e mamãe na hora H, mas isso não quer dizer nada. To indo pra casa, larga de ser infantil e liga pra ela. Se cuida!
Patrícia torceu os lábios antes de sair. Ela que não era boba nem nada e também sabia que macaco velho não colocava a mão em cumbuca, preferiu não se manifestar sobre algo diferente que pode observar ao longo de toda aquela situação. Na sua cabeça, a amizade de Carol e Helena parecia se estender a algo mais especial. Poderia estar enganada, mas sentiu uma intimidade e uma afinidade entre elas que íam além dos olhares, da admiração reciproca demonstrada a cada momento, daquela sintonia toda. Em todo caso, iria aguarda a amiga procura-la para conversar sobre isso.
Algum tempo depois, já com os dedos indo contra os pensamentos, Carol realizou a chamada.
-- “Pronto, já não tenho mais como correr.”
Pensou aflita quando o terceiro toque trouxe a voz aveludada e excessivamente feminina ao seu ouvido. Instantaneamente tremeu, um frio na barriga apossou-se de si.
-- B-boa noite, Helena, como vai?
-- Oi Carol, vou bem, obrigada. Sabe que eu já estava quase ligando pra saber ...
Helena também parecia insegura com as palavras e isso fez com que Carolina se atrapalhasse novamente e também apresentasse certo desanimo como se sentisse mal pela saia justa.
-- Me desculpe, por ontem, estou tão envergonhada. Fiquei o dia inteiro preocupada pelo que aconteceu e pelo quanto fui irresponsável com você. Realmente eu não tenho esta postura e eu só te devo desculpas por isso.
Carol não parecia acreditar em como conseguiu forças para dizer tudo de uma vez, mas agradeceu aos céus por manter-se firme ao assumir a culpa de forma digna.
-- Imagine, Carol, por favor, não pense dessa maneira, eu adorei o passeio de ontem e não vejo qualquer problema diante deste fato. Pelo contrário, fazia tempo que eu não me divertia tanto, você bebeu um pouco a mais e nós chegamos em segurança, não foi? Então, problema resolvido.
Helena percebeu a angustia na voz da amiga e assim tentou acalma-la. Sentia-se no dever de agradecer Carol pela noite maravilhosa e o quanto precisava daqueles momentos de alegria e descontração. Por outro lado, estava um pouco tensa por alguns pensamentos que povoaram sua mente durante parte do dia, não pelos excessos com a bebida. Na verdade, ambas tiveram a sensação de algo diferente naquele momento único do dia anterior e, também, preferiram refrear os pensamentos que assumiam proporções maiores que os limites aos quais se permitiam. A situação pareceu ser resolvida de uma forma tranquila.
-- Tem certeza que está tudo bem, Helena? Eu não gostaria que você pensasse que eu sou irresponsável...
-- Carol, por favor, não fale assim. Eu me sinto tão feliz por ter encontrado uma amiga de verdade nessa cidade. Você só tem feito coisas boas pra mim. Vamos esquecer o que houve, melhor ainda, pra resolver de vez essa situação tive uma ideia perfeita. Que tal a gente fazer um happy hour, mas, dessa vez, o Adão nos leva e a gente pode se divertir o quanto quiser, o que acha?
-- Oh, você não sabe o quanto estou aliviada, Helena, tirou um peso da minha consciência.
-- Então, isso é um sim?
-- Claro, é só marcar?
-- Perfeito, se quiser convide sua amiga Patrícia, ou quem você desejar?
-- Irei convidar. Então, eu sugiro a Sexta feira. Estarei livre no sábado e podemos ficar mais tranquilas.
-- Combinado. Passo para te buscar no seu apartamento.
E assim, o clima pareceu ter se amenizado e Carolina, enfim, pode descansar os pensamentos e trabalhar tranquilamente o resto da semana. Acabou comentando com Patrícia sobre o ocorrido e que havia se precipitado quanto a opinião de Helena. O happy hour de sexta feira foi estendido a amiga que aceitou prontamente, mas antes, perguntou se poderia levar a atual dona do seu coração. Carolina ficou um pouco insegura, mas preferiu dar uma chance e acabou concordando, uma vez que deveria, sim, apoia-la a mudar de vida e se fixar numa única mulher.
Sexta feira chegou cheia de calor em Ribeirão Preto. Carolina estava alegre e de muito bom humor, deixando a amiga intrigada.
-- A senhorita está sorridente hoje. O bom humor de hoje se deve a cachacinha de mais tarde?
-- Também, Paty, mas graças a Deus essa semana passou rápido. Quero relaxar e descansar bastante no fim de semana.
-- Isso aí chefinha, tem que estar contente mesmo. Eu é que tô meio ansiosa, já que vou apresentar a gata pras amigas.
-- Então trate de se comportar bastante, viu.
-- Isso com certeza, sou uma lady, quase uma Helena.
-- Sei disso...
Ambas riram e comentaram sobre Kelly, a nova namorada de Patrícia que, segundo descrições, seria uma moça muito bonita e educada, assim como, realmente estaria disposta a ter um relacionamento sério.
Na hora combinada Carolina descia pelas escadas do edifício indo de encontro ao carro que a aguardava. Ela usava um vestido floral comprido que delineava suas curvas de uma forma sensual e elegante. Helena não estava diferente, também escolhera um vestido, mas preferiu um tubinho verde azul, onde suas pernas longas e bem delineadas ficaram a mostra. Elas se cumprimentaram no banco de trás do carro com um abraço carinhoso e se olharam com admiração, mas evitaram comentar a respeito.
“Como ela consegue ser tão bonita e elegante.”
Carol não pode deixar de pensar e se encantar no visual da amiga que parecia um pouco aérea, mas que sorria o tempo inteiro distribuindo simpatia.
O bar escolhido era muito agradável, tinha uma boa música ao vivo e um cardápio atrativo. Pouco tempo se passou até Patrícia surgir com uma loira bonita e elegante, como se tivesse exibindo um troféu e, assim, toda sorrisos, fez sua apresentação, sob o olhar de aprovação de Helena e Carolina que pareceu apreciar a nova companhia da arquiteta. Kelly de fato era uma moça séria, diferente de Patrícia que fazia todos rirem com seus comentários e histórias hilárias. O clima descontraído seguiu por diversas horas. A cerveja era o aperitivo da noite. Depois de alguns copos e todas já se sentiam mais soltas. Helena foi a primeira a demonstrar fraqueza. Quando sorria suas bochechas ficavam levemente rosadas e os olhos pareciam diminuir, o que a deixava de certa forma com um leve tom de sensualidade. Carolina tinha seus olhos presos na amiga, achava linda a forma com a qual ela falava e gesticulava, pensava que nunca conhecera mulher tão elegante na vida. Lado a lado sentadas, volta e meia os braços se resvalavam e uma sensação boa de proximidade e conforto as atingia. Helena também retribuía o olhar de admiração aquela mulher firme, decidida e livre, enfim, Carolina de fato era uma mulher muito interessante. Em determinado momento, quando a conversa fluía descontraidamente, Helena, totalmente a vontade, colocou uma de suas mãos sobre a de Carolina e ali permaneceu, vez ou outra fazendo um leve carinho. No começo, aquilo começou de forma inocente para Carolina, todavia, pouco tempo depois parecia tortura-la quando um calor inesperado percorreu suas mãos à medida que Helena se descontraia e agora contornava a dimensão de seus dedos. De repente o calor no baixo ventre se evidencia e Carolina praticamente saltou da cadeira assustando as demais.
-- Aconteceu alguma coisa? Tá tudo bem?
Todas pareciam se preocupar com a face pálida da arquiteta que simplesmente se desculpou alegando que chegara ao seu limite na bebida e que iria ao banheiro. Enfim, parece que ninguém havia percebido a situação, nem mesmo Helena que agora sorria mais que todas, visivelmente embriagada.
-- Melhor irmos que já está tarde, meninas.
Carolina falou assim que retornou do banheiro. Estava séria e mais concentrada que nunca.
-- Não tem a saideira?
Helena falou com a voz alta e pastosa fazendo todas rirem, menos Carolina que se conteve, mas disfarçou o seu incomodo.
-- E por que não, a saideira? Por favor!
Referiu-se ao garçon, tentando descontrair as presentes que a aplaudiram com alegria. Disfarçou o quanto pode e agradeceu aos céus pelas amigas estarem alteradas. Dentro de si um turbilhão a atormentara naquele instante. Como pode sentir aquilo? Ela se perguntava e uma culpa crescente passou a incomoda-la segundo a segundo.
Helena levantou-se meio cambaleante para seguir até o carro. Carolina estava ao seu encalço, preocupada. A advogada não demonstrava segurança nas passadas quando ela resolveu fazer o inevitável, segura-la pela cintura.
-- Vou te ajudar a chegar com segurança, minha amiga.
-- Eu estou mole, Carol.
Depois de algumas rizadas abraçaram-se para seguirem. A proximidade do corpo trouxe o calor conhecido e Carolina agora rezava para chegar o mais rápido possível no carro.
-- “Meu Deus o que está acontecendo comigo? Deve ser a bebida, só pode! Vou parar beber pelos próximos seis meses!”
Ela se agonizava em pensamentos durante o trajeto lento e quase desajeitado feito por elas. Enfim, entraram no carro. Carolina percebeu o sorriso disfarçado do motorista que parecia se divertir pela situação, mas sem maldade. Helena a surpreendeu novamente quando deitou a cabeça em seu ombro. Carolina revirou os olhos, mas manteve-se concentrada. O pior veio depois, quando Helena rodeou seus braços ao redor da sua cintura e se aconchegou quase cochilando. Um calor ressurgiu forte e quase sufocante.
-- Adão você poderia aumentar o ar-condicionado, por favor?
O motorista aumentou ao máximo e mesmo assim Carolina parecia procurar o ar escasso que lhe faltava. Um sussurro quase que inaudível foi ouvido.
-- Como é bom estar perto de você.
Helena disse antes de adormecer agarrada ao corpo de Carolina. Percebendo a situação, o motorista optou por levar a patroa pra casa. Carolina acordou-a com paciência tocando-lhe a face suavemente e chamando seu nome. Quando os olhos se encontraram, aquela chuva de sensações estranhas aconteceu e elas se perderam novamente por alguns segundos eternos. Helena abriu um sorriso. Contra si e contra todos os pensamentos que a rodeavam naquele momento, Carolina obrigou-se a se desvencilhar daquele olhar perturbador e se forçou a conduzir Helena pela cintura até o apartamento. A advogada estava quase dormindo quando Carolina a deitou sobre a imensa cama vendo-a se entregar definitivamente ao sono. Antes de ir, ela parou por alguns segundos. Não evitou o olhar terno e se censurou pesadamente sobre os pensamentos que a atormentaram no decorrer da noite. Assumiu que ficara atraída pela amiga de uma forma diferente e isso era inadmissível, uma total falta de respeito para com uma pessoa que confiava e a tratava com tanto carinho. Decidiu naquele momento lutar para proteger e respeitar aquela amizade tão bonita, Helena não merecia que deixasse sua carência atrapalhar sua vida, uma vez que acreditava que esses pensamentos e sensações estavam ligados ao fato de estar a tanto tempo sozinha, afinal de contas nunca teve qualquer tendência ao homossexualismo. Prometeu que iria se esforçar pra tentar arrumar um namorado ou quem sabe um caso, como Patrícia sugeriu, pois ela realmente estaria precisando, urgenteee!!!
Fim do capítulo
...beijos...bom fim de semana!
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Ana_Clara
Em: 18/10/2015
Os sintomas já começam a aflorar! Meu único receio é elas se afastarem totalmente, já que vão ficar com medo do que possa vir acontecer. Até o momento são totalmente heteros. Bom, agora é só aguardar!
Resposta do autor:
Ola Ana Clara
o desconhecido pode até mudar as pessoas, isso é um fato e a certeza desses novos sentimentos serão sentidas de maneira diferente por ambas...como são totalmente heteros as coisas podem sim tornar-se muito complicadas...beijos querida
Silvia Moura
Em: 18/10/2015
Lindo!!! Esse capítulo é o divisor de águas, agora o desejo se manifesta a um simples olhar, tocar, gesto casual, tudo se confunde dentro dos corações dessas moças lindas... acho que esse desabrochar de amor será u pouco dolorido,mas quem tem que dizer é você...risos, quem dita e manda é você autora...desejo um domingo harmônico e que você venha logo...beijão linda....
Resposta do autor:
Nem sempre a autora manda, gosto de ouvir opiniões...mas confesso que estou gostando de ir aos poucos, antes de chegar aos finalmentes...beijos silvia
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Maria Flor
Em: 18/10/2015
Adorei esse capítulo, Veruska!
Esperando ansiosamente pelo próximo 😁😁
Resposta do autor:
Maria Flor,
Obrigada por acompanhar... tentarei ser rapida, bjos
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