Capítulo 24
Os Anjos Vestem Branco - Capítulo 24
No Leblon...
Sabrina e Priscila estavam do lado de fora do escritório com os ouvidos grudados na porta.
-- Não estou conseguindo ouvir nada Priscila.
-- Nem eu Brina.
-- Quando a doutora Débora fala, ainda consigo ouvir alguma coisa, mas quando a Bruna fala, meu Deus, ela parece a Maria do Bairro.
-- Pára de falar assim da mana.
-- Ela é muito tansinha Pri. Acredita em tudo o que falam para ela.
-- Que coisa mais feia. Ouvindo atrás da porta - Marga chegou falando por trás das duas.
-- Que susto mulher - Priscila colocou a mão sobre o peito -- Parece um fantasma.
-- Marga. Vai lá na cozinha buscar um copo.
-- Com água ou suco?
-- Vazio Marga - Sabrina revirou os olhos - Você não sabia que encostando um copo de vidro na parede se escuta melhor?
-- Pensei que fosse besteira.
-- Pois não é. Busca logo, Marga.
A empregada saiu correndo buscar o copo de vidro.
Do lado de dentro...
-- Débora, essa mulher enfeitiçou a nossa filha da mesma maneira que enfeitiçou a mim.
Débora estava de cabeça baixa. Quando Nestor contou que a filha estava namorando Victória, a princípio achou que fosse mais uma de suas mentiras, mas agora, estava ouvindo da própria Bruna.
-- Me perdoa mãe. Eu imagino como deve estar sendo difícil para você - Bruna sentia como se também houvesse traído a mãe.
-- Bruna, você tem que se afastar dela. Ela vai te usar, te enganar e fazer a mesma coisa que fez comigo.
-- Ela me ama pai.
-- Bruna, minha filha. Ela falava a mesma coisa para mim e olhe como estou agora - abriu os braços mostrando a sua volta - Ela me abandonou, perdi o respeito de minha família e principalmente o seu.
-- Ela sempre foi honesta comigo. Me contou tudo desde o início.
-- Quando ela se aproximou de você, com certeza já sabia que era a minha filha. Provavelmente foi tudo planejado.
-- Com que intensão pai? Isso não tem lógica.
-- Você é muito ingênua Bruninha. Qual a intensão? Você é herdeira de uma fortuna incalculável e com um futuro brilhante como médica. Deve haver muita gente de olho em tudo isso. Gente interesseira, falsa e mentirosa tem de monte por aí.
-- A Victória não é esse tipo de pessoa que você está falando - olhou no fundo dos olhos do pai - Você que fez de tudo para que ela se transformasse em uma mulher aprisionada em casa, submissa a você, boba e sem opinião.
-- Eu dei uma vida de rainha a ela. Nunca mais precisou se preocupar com questões de dinheiro do dia a dia. Nunca mais precisou trabalhar, andava bem arrumada, perfumada, vestia-se bem.
-- Pai, a pessoa que tem caráter e é honesta não se sujeita a viver assim. Ela cansou e resolveu ir atrás do que ela quer, de seus sonhos, é uma mulher ousada, elegante e de fibra. Tem um caráter forte, sua inteligência se destaca, por isso mesmo estando tanto tempo fora do mercado de trabalho, rapidamente conseguiu um ótimo emprego como enfermeira.
-- Há Há Há - riu debochado - Você está completamente obcecada por esta mentirosa, envolvida em suas chantagens emocionais e manipulações. Victória sempre gostou de homem, porque de uma hora para outra iria se apaixonar por uma mulher? Pensa bem Bruna. Quando ela teve certeza que eu não deixaria a minha família para viver com ela, resolveu investir em você.
Bruna cansou de discutir e apontar o seu ponto de vista. Estava claro que o pai não aceitava o fato de Victória tê-lo trocado por uma mulher.
-- O senhor está descontrolado... - Bruna não reconhecia aquele homem que estava a sua frente.
-- Não estou descontrolado, estou...
-- CHEGA... Débora que estava calada até aquele momento, não suportou mais e berrou alto - Calem a boca. Os dois - levantou e foi até o bar pegar uma bebida.
Silêncio.
No lado de fora.
-- Até agora eu só ouvi o chega da doutora Débora - Sabrina estava decepcionada.
-- Rico é assim mesmo dona Sabrina. Até na hora de fazer barraco, é chique. Se fosse lá em casa, os vizinhos já tinham chamado a polícia, de tanto que tinham se tapeado.
-- Marga já terminou de preparar a janta? - Priscila arrancou o copo da mão de Sabrina.
-- Meu Deus esqueci da janta!!! - Saiu correndo para a cozinha.
-- Coloca o copo aqui, é o melhor lugar para ouvir - Sabrina aproveitou para abraçar Priscila pela cintura.
-- E precisa ficar agarrada desse jeito?
-- Melhora o acústico. Não sabia?
-- Não - encostou o ouvido no copo.
Dentro do escritório era a vez de Débora se pronunciar.
-- Em algum momento vocês pensaram em como eu estou me sentindo? - Fez a pergunta e não esperou por resposta - Não né.
Débora sentou no sofá com o copo na mão.
-- Quando Descobri a traição doeu muito e fez aflorar em mim sentimentos como: Raiva, mágoa, culpa - suspirou como que lembrando do dia.
-- Busquei entender os motivos da infidelidade. Em princípio, procurei estabelecer um diálogo comigo mesma para repensar a relação. Após refletir sozinha, tentei ouvir as suas explicações Nestor, o que o levou a ser infiel. O que me falava não me convencia, mas afinal como, nem sempre uma traição significa que o amor, o desejo e a parceria entre o casal acabaram, resolvi nos dar mais uma chance.
Virou a bebida que restava no copo.
-- E assim o tempo foi passando e eu dando uma chance, mais uma e mais uma. No começo por mim, depois por você e a Priscila - falou diretamente para Bruna.
-- Então um belo dia. Cansei de ser traída. Decidi investir na minha felicidade. Para tanto, foquei em minha vida. Não gastei mais tempo e energia pensando em uma forma de salvar o nosso casamento. Talvez com isso tenha me tornado uma mãe ausente, mas, eu tinha que lutar por mim.
Aproximou-se de Bruna e a olhou nos olhos.
-- Não fale de caráter, honestidade, fibra e amor com seu pai. Ele não sabe o que significa isso.
-- Para com isso Débora. Não venha querer colocar a Bruna contra mim. Eu sei muito bem que você está odiando essa aproximação dela com a Victória.
-- Claro que estou. Seria uma grande hipocrisia se dissesse que não - foi até o bar e encheu o copo novamente - Mas me diga, com quantas Victória você ficou?
Bruna olhou para o pai esperando pela resposta que não veio da boca dele e sim da boca da mãe.
-- Várias. Não é Nestor? A Victória foi só mais uma, Bruna - sorriu tranquila - Mas não se preocupe, perdoar o ex-parceiro é a melhor forma de superar, de fato, a mágoa pela traição. Mas preste atenção: desculpar não significa esquecer, e sim não guardar ressentimentos. Portanto em nome da nossa amizade e por ser o pai de minhas filhas - fez uma careta azeda - Vou lhe propor duas coisas: A separação e a presidência do Sontag.
Nestor jogou-se na poltrona. Bruna arregalou seus olhos em total espanto.
-- Você está louca. Só pode - ele estava pálido e sacudia nervosamente a cabeça, como se acabasse de escutar algo absurdo e impossível.
-- Nesses últimos dias eu e a Priscila trabalhamos duro. Reviramos todas as contas do Sontag. Talvez você não saiba, mas tenho uma equipe dentro do Sontag, muito fiel a mim, que estão trabalhando 24 horas por dia. Essas planilhas foram entregues a mim, hoje à tarde - jogou várias pastas sobre a mesa.
-- NUNCA - jogou as pastas no chão - Você sabe muito bem que tenho 40% das ações. Se quiser a separação, sem problemas. Mas, a presidência do Sontag. JAMAIS.
Bruna observava a discursão atônita. Tudo isso acontecia dentro de sua casa e ela não percebeu. Como pôde ser tão cega, tão ingênua?
-- Essas planilhas juridicamente não provam nada.
-- Juridicamente talvez não, mas moralmente sim - olhou para Bruna.
Nestor entendeu a jogada de Débora. Ela usaria os balanços e planilhas para fazer Bruna ficar do lado dela e juntar os seus 20% com os 40% dela e da Priscila. Somariam 60% e tomariam a presidência dele.
Conhecendo a filha como conhecia. Não estranharia se ela fizesse isso.
-- BRUNA O HOSPITAL É A MINHA VIDA - berrou desesperado.
No lado de fora.
-- O que ele falou Brina?
-- Que a marginal é muito linda - olhou séria para Priscila - Será que a marginal é a Victória?
-- Tem alguma coisa errada. A pouco ele disse que gostava de comer mortadela. Mamãe adora jogar sinuca, a Bruna disse que o papai está colado. Que papo particular é esse?
-- Sei lá vai se entender. Coisa de maluco - olhou para o copo - Ou será que o meu copo está com defeito?
-- Sei lá. Cansei. Vou roubar algo para comer. Estou morta da fome.
-- Vou junto. Essa conversa está muito chata - jogou o copo para cima e aparou antes que fosse ao chão - Te enganei - apontou para Priscila.
-- Palhaça.
As duas estavam caminhando rumo a cozinha. Quando ouviram um grito vindo de dentro do escritório.
Imediatamente deram meia-volta e correram em direção ao escritório. Abriram a porta e entraram afoitamente.
-- Sabrina me ajuda. Papai está tendo um enfarto.
Nestor estava sentado no sofá com a mão sobre o peito e com aparente falta de ar. Bruna ajoelhada na frente dele afrouxando a sua gravata.
-- Priscila chama a ambulância e pede para deixarem o doutor Felipe de prontidão.
-- Estou com formigamento e dor nos braços e nos ombros - Nestor mostrava o braço esquerdo.
-- Corre Priscila. O que está esperando?
Bruna estava desesperada, mas tentava manter-se tranquila para não deixar o pai nervoso.
-- PRISCILA - berrou para a irmã que estava parada, perplexa diante da cena - Vai logo chamar a droga da ambulância.
-- Bruna - Sabrina se aproximou - Seu pai não tem nenhum problema no coração -- Ela falou tão baixo que quase só ela mesma pode ouvir o que foi dito.
-- O que você disse? -- Foi tão baixinho que Bruna pensou não ter ouvido direito - Você está maluca? Como pode falar uma coisa dessas?
Levantou a roupa e tirou a pequena pasta que estava guardada junto ao seu corpo.
-- Esses são os exames do seu pai. Ele não tem problema algum no coração e pelo jeito nunca teve. Eu e o Ric analisamos todos: O eletrocardiograma, o teste ergométrico, o ecocardiograma e os exames de sangue de rotina. Olhamos todos minunciosamente para tentarmos encontrar um indicio qualquer que fosse. Mas não encontramos nada.
Bruna levantou do chão lentamente e não tirou os olhos do pai. Ela ficou tão chocada considerando-se uma idiota.
-- Chama a ambulância mana - falou no automático.
-- Mas Bruna... se ele não tem nada mana. Para que chamar?
-- Por favor mana, chama. Faço questão de fazer um atendimento de emergência - continuou encarando o pai - Não precisa avisar o doutor Felipe. Eu mesma vou me encarregar de tudo.
Priscila entendeu o recado e saiu correndo ligar para o Sontag.
-- Filha não acredita neles. Estão todos querendo te jogar contra mim.
-- Quem disse que eu acreditei neles papai? - Pegou a pasta e jogou longe - Só quero eu mesma fazer o atendimento.
Nestor estava assustado com o olhar da filha sobre ele.
Débora passou por eles e falou sorrindo:
-- Mais tarde conversamos - olhou para a filha - Boa sorte com o seu enfarto - saiu fazendo cara de deboche para o marido.
-- Não precisa filha. Estou mais calmo - tentou levantar, mas Bruna o impediu.
-- Há. Mais não mesmo. Nunca deixaria um paciente meu nesse estado sem fazer todos os exames de praxe. Imagina meu pai?
-- Bruninha a ambulância chegou - Marga foi avisar.
-- Vamos comigo Brina? Assim você me ajuda.
-- Claro. Vamos.
Algum tempo depois no Hospital Sontag.
-- Quero todos os exames possíveis - Bruna conversava com a enfermeira chefe - Até o teste de pezinho - sorriu e entregou a requisição para a bela mulher.
-- Vou providenciar doutora Bruna - e saiu.
-- Caramba - Sabrina ficou olhando para a bunda da mulher - Se eu trabalhasse aqui teria um enfarto todo dia.
-- Sabrina, você é um mal exemplo sabia? - Bruna sentou em uma cadeira e pegou o celular do bolso - Vou ligar para a Vic.
Na Barra.
-- Tudo bem Brú, combinamos para outro dia então. Beijo amor - deligou o celular e ficou pensando por um tempo.
-- O que aconteceu Vic? - Thiago se aproximou de Victória a fitando com seus olhos curiosos.
-- Nestor teve mais um piti -- ela sorriu debochada e Thiago suspirou com raiva.
-- Será que a sua loirinha caiu como uma sapinha de novo?
-- Não sei. Ela está lá no Sontag com ele. Disse que vai demorar, pois vai esperar os exames ficarem prontos.
-- Então caiu. Você tem que ensinar essa menina a ser um pouquinho mais esperta Vic. Estou começando a acreditar nesse negócio de... - colocou a mão sobre a boca - loira burra.
-- Eu vou contar para ela. Me aguarde -- falou brincando e Thiago levou a sério.
-- Não faz isso gaúcha. Não queira arrumar intrigas.
-- Vamos aguardar. Sabrina está com os resultados dos exames na mão. Eles devem saber o que fazer - sentou no sofá, cruzou as pernas e os braços - Só nos resta aguardar. Não tem outro jeito.
No Leblon.
-- O que você acha dessa atitude da Bruna, mamãe?
-- Ela é esperta Priscila. Se for para tomar uma atitude contra o pai. Irá fazê-lo sem risco de ser injusta. Estou começando a achar que essa garota, a Victória, está fazendo bem a sua irmã - ficou pensativa olhando para o teto da sala.
-- Você engoliu essa história assim de boa? - Não podia acreditar que a mãe aceitaria tão fácil assim.
-- Não. Mas pense comigo -- curvou-se um pouco para frente e fitou Priscila - Eu não aceito o relacionamento das duas. O que você acha que a Bruna fará?
Priscila ficou pensando na pergunta da mãe.
Com certeza a irmã escolheria ficar do lado de Victória. Pensando por esse lado, a mãe estava agindo corretamente. O importante seria manter a Bruna por perto. Seria mais fácil de protege-la.
-- Então? - Débora queria saber a resposta.
-- A senhora tem razão mamãe.
-- Que bom que concordou. Agora liga para a Sabrina. Quero notícias daquele traste - virou-se lembrando de algo - Por falar nisso. Essa menina, a Sabrina, gostei muito dela. Esperta, inteligente, corajosa. Ela merece uma chance lá no Sontag. Você não concorda comigo?
-- Concordo. Sempre achei isso dela - sorriu orgulhosa da amiga.
-- Me lembre disso quando assumir a presidência - deu uma gargalhada -- Ai como eu estou bandida e maléfica!!!
No Hospital Sontag.
-- Os exames estão prontos doutora - a enfermeira estendeu a pequena pilha de papeis para a loira.
-- Ótimo. Ele reclamou muito?
-- O tempo inteiro - ela sorriu.
-- É um velho ranzinza mesmo - sentou em sua cadeira - Vou te pedir um grande favor.
-- Pode falar doutora.
-- Quero que você chame um de cada vez, todos os cardiologistas que estão de plantão hoje, inclusive o doutor Felipe. Diga que a doutora Bruna Sontag está chamando e deixe bem claro que estou com pressa e sem a menor paciência.
-- Pode deixar comigo doutora - a enfermeira saiu realizar a sua missão.
Fim do capítulo
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