Capítulo 19
Os Anjos Vestem Branco -- Capítulo 19
A Noite no Leblon...
-- Não temos mais aonde procurar, pra quem telefonar - Priscila jogou-se no sofá - Estou morta. Quando eu pegar aquela branquela quero... Beijar tanto ela - completou triste.
-- Priscila, você está me escondendo algo? - Débora olhou de maneira desconfiada para a filha.
-- Claro que não mãe - respondeu sem olha-la.
-- A atitude que Bruna teve de fugir para longe de todos, inclusive de você, me surpreendeu.
-- A mim não. Eu confio na Bruninha. Ela deve estar em algum lugar tranquilo, esfriando a cabeça -- buscou acalmar-se, dizendo mais a si mesma, que para a mãe, tentava mudar seus pensamentos, mas não conseguia.
-- Priscila, temos que agir rapidamente. Precisamos convencer a Bruna a unir-se a nós contra o seu pai.
-- E como vamos fazer isso? Para Bruna o papai está muito doente e como ela mesma falou: "Evitem qualquer situação que gere estresse ou pressão desnecessária ao papai".
-- Filha, essa doença do seu pai está me cheirando armação - levantou e foi caminhando calmamente até o bar.
-- É algo tão nojento, que me causa náuseas só de pensar. Diria imperdoável - pensou em mais uma decepção para a irmã - E como descobriremos isso, ou melhor, provaremos isso?
-- Vou fazer uma busca pelos exames recentes do Nestor. Se realmente for armação, com certeza eles já sumiram do arquivo - sentou novamente no sofá com o copo de bebida na mão - Desconfiei porque, pelo nosso protocolo, a permanência na UTI deve se restringir ao período crítico, no mínimo 72 horas, onde a incidência de complicações justifica a monitorização contínua - sacudiu o copo, brincando com as pedrinhas de gelo - Ontem Nestor sequer estava utilizando o monitor cardíaco. Doutor Felipe é o cardiologista mais exigente e chato do hospital. Seus pacientes são monitorados religiosamente.
-- Mãe... - estava receosa em continuar, tinha a dúvida do conto ou não conto.
-- Fala Priscila - Débora incentivou.
-- Ontem conheci a amante do papai - falou meio sem jeito.
-- Finalmente conheceu a Victória então - deu um sorriso, surpreendendo Priscila - Ela é jovem e muito bonita, não é?
-- Muito. Isso não te chateia? - Priscila estava realmente surpresa.
-- Porque chatearia? Seu pai é um homem de bom gosto e, convenhamos minha filha, também não sou nenhuma santa - deu uma gargalhada - Seu pai escondeu essa moça de tal maneira que quando descobri nem sabia que era nossa funcionária. Ela trabalhava no plantão da noite, na UTI neonatal, entrada altamente restrita, pensa.
-- Você não sente raiva dela mãe?
-- Sinto do seu pai. Dela sinto pena, por ter trocado um ótimo e promissor emprego e toda aquela beleza por um traste como o Nestor. Se não fosse a Victória, seria a Veronica, a Valquíria, a Valéria... Ela não foi a primeira e nem será a última.
Priscila estava pasma com as palavras nunca ditas pela mãe. Se Bruna ouvisse isso, morreria de desgosto.
-- Meu pai é assim? Como... - queria ir mais a fundo, mas foi interrompida por uma visita não tão incomum.
-- Boa noite - Sabrina chegou toda sorridente.
-- Boa noite Sabrina. Já está com saudade da Priscila? Não acabou de sair daqui? - Débora riu alto.
Sabrina ficou toda sem jeito e olhou de canto de olho para amiga.
-- É que tenho novidades - falou envergonhada da situação.
-- Não liga para ela Brina. Me conta logo - correu e puxou a garota pela mão até o sofá.
-- A Bruninha esteve lá na base do Samu. Devolveu o uniforme, pegou as coisas dela e a moto.
-- Menos mal. Fico mais tranquila em saber que ela está bem. Obrigada Sabrina - Débora levantou - Vou tentar dormir um pouco. Qualquer novidade, por favor, Priscila me chame. Boa noite.
-- Boa noite mãe.
Acompanharam a doutora com os olhos até ela desaparecer do campo visual.
-- Ela parece bem né Pri?
-- Ela está aliviada. Agora que a Bruna já sabe de tudo, não existe mais um segredo a ser escondido - bufou - Não sabe ela que mal um segredo foi revelado e já começamos com outro.
-- Quando seu pai e a sua mãe souberem de Victória e Bruna... O bicho vai pegar.
Enquanto isso no Hospital Sontag...
-- Te chamei aqui Borges, porque quero que você faça um serviço secreto para mim - Nestor conversava com o homem no quarto em que estava internado.
-- Pode falar patrão. Sou todo ouvidos.
Borges é um funcionário de confiança de Nestor, trabalha como segurança há muitos anos no hospital.
-- Você conhece a Victória, não é mesmo?
O segurança fez que sim com a cabeça.
-- Pois bem. Quero que você fique de olho nela 24 horas por dia. Quero saber de todos os passos dela, inclusive... - olhou a paisagem pela janela - Se ela está se encontrando com minha filha, a Bruninha - virou para o homem -- Entendeu?
-- Entendi patrão. Ela ainda mora na Tijuca?
-- Mora. Converse discretamente com o porteiro e tente arrancar alguma informação sobre ela, mas tenha muito cuidado para ninguém desconfiar de você.
-- Pode ficar tranquilo doutor. Ficarei atento.
-- Pode ir agora - mandou.
Depois que Borges saiu, Nestor voltou a olhar pela janela. O destino havia sido cruel com ele e a filha. Passou a mão pelos cabelos em desespero. Estavam apaixonados pela mesma mulher.
Lembrou-se de quando Bruna era criança. Ele colocava uma capa ridícula e saia com ela no colo, fingindo voar, imitando o super homem.
Seria o momento certo de tomar uma atitude de super homem e sair do caminho da filha. Deixar que ela e Victória fossem felizes juntas.
Mas, sabia que não conseguiria fazer isso. Na verdade, esse super homem nunca existiu. Era qualquer coisa: Super egoísta, super mentiroso, super demagogo. Menos o super homem que Bruna idealizou.
Na Barra.
-- Estou indo na clínica para a entrevista de emprego - Victória ajeitava-se à frente do espelho.
-- Que bom gaúcha. Vejo que está mais disposta hoje - Thiago observava a morena terminar de se arrumar.
-- Na verdade busco minhas forças no amor que sinto pela Bruna. Sei que só terei ela de volta a partir do momento que conseguir a minha vida de volta e, voltar a trabalhar é o primeiro passo - sorriu animada.
-- É isso aí. Boa sorte então - foi para a sala e falou de lá - Falei com o Ric. Tenho novidades.
Victória correu do quarto.
-- E aí? - perguntou em desespero.
-- Ela ainda não apareceu em casa. A família e os amigos estão muito preocupados - falou sério.
-- Meu Deus Thiago - sentou nervosa - Aonde será que ela está?
-- Provavelmente ela queira estar sozinha para poder pensar com mais calma Vic. Vamos deixar ela em paz - Thiago deslizou a mão pelo rosto da morena - Vai lá e vem com esse emprego garantido, pra gente poder comemorar a sua primeira vitória nessa nova vida.
-- Victória - a morena pronunciou o próprio nome - Com esse nome como posso me sentir derrotada? - sorriu feliz - Vou indo e quando voltar, iremos comemorar.
A moto seguiu por um bom tempo pela larga estrada de chão empoeirada até chegar ao seu destino.
Um toque no freio e a moto vai parando suavemente. Largou a potente em um lugar que achou seguro e prosseguiu caminhando por uma trilha no meio do mato.
Após alguns minutos a pé, Bruna chegava em um lugarzinho incrível chamado Secreto que é uma piscina natural com água clarinha, cercada por pedras e um visual maravilhoso!
A praia do Secreto, como o próprio nome diz é um lugar escondido, fica entre as praias da Macumba e Prainha.
Bruna foi sentar numa pedra que ficava bem próxima a água. Estava precisando molhar os pés e sentir o vento soprando no seu rosto suavemente, trazendo o cheiro gostoso de maresia.
Juntou as mãos em concha, jogou um pouco de água no rosto, tentando espantar o sono, seus olhos estavam ardidos. Desde a fatídica noite na Barra, não havia conseguido dormir direito. Tinha pesadelos e acordava com um enorme mal-estar.
Já haviam se passado cinco dias do ocorrido, mas mesmo assim, quando pensava que já tinha chorado todas as lágrimas possíveis, do nada, lembrava de Victória e começava a chorar novamente.
Naquele dia, depois que deixou o hospital, saiu sem rumo caminhando pela praia. Caminhou por horas, até não aguentar mais o cansaço e o incomodo de ainda estar vestida com o uniforme do Samu. Retornou a base, pegou as suas coisas, montou em sua moto e partiu pra um destino desconhecido.
Precisava ficar longe, precisava ficar sozinha por algum tempo, precisava pensar em uma maneira de colocar a sua vida em ordem novamente. Pensou muito em Victória e em seu pai. Como estariam? Como ficariam? Conversaria com o pai ou faria de conta que nada aconteceu? Escutava o que Vic teria para lhe falar? Tinha dezenas de dúvidas e somente duas certezas: Não disputaria mulher com o pai e não iria para longe, não adianta fugir do amor se o coração vai junto. Lembrou de uma música e diante daquela maravilha da natureza, cantou baixinho:
E cada vez que eu fujo, eu me aproximo mais
E te perder de vista assim é ruim demais
E é por isso que atravesso o teu futuro
E faço das lembranças um lugar seguro
Não é que eu queira reviver nenhum passado
Nem revirar um sentimento revirado
Mas toda vez que eu procuro uma saída
Acabo entrando sem querer na tua vida
Quem de Nós Dois
Ana Carolina
Era hora de voltar...
No Leblon...
Nestor, Débora e Priscila, jantavam juntos pela primeira vez desde o flagra da caçula no pai.
-- Bruna não mandou mais nenhuma mensagem Priscila? - Nestor começava a ficar impaciente com a ausência da filha.
-- Não pai. Já mandei um milhão de watsapp e nada. Nem uma carinha como resposta.
-- Vou contratar um detetive para traze-la de volta - limpou a boca com o guardanapo e levantou.
-- Você só pode estar brincando Nestor, isso é ridículo - Debora fez o mesmo e também levantou.
-- É ridículo querer minha filha de volta ao lar?
-- Ui, isso foi profundo doutor - ironizou.
-- Vou acha-la mesmo que para isso seja preciso contratar uns cinco detetives...
-- Não será preciso papai - Bruna entrou com uma mochila nas costas e o capacete na mão.
-- Mana... - Priscila correu e pulou no pescoço da irmã, a enchendo de beijos.
-- Calma mana. Assim você me enforca - retribuiu os beijos com carinho.
-- Como você está maninha? - afastou-se um pouco e deu uma olhada - Você está muito magrinha. Tem se alimentado direito? Está com olheiras. Tem dormido? - passou a mão pelo rosto de Bruna.
Bruna sorriu e deu um beijo demorado no rosto de Priscila.
-- Estou bem mana. Não se preocupe - olhou para os pais que estavam estáticos olhando para ela.
-- Bruna precisamos conversar... - Nestor deu um passo à frente.
-- Agora não pai. Estou cansada, preciso de um banho e uma boa noite de sono - foi até os pais, deu um beijo no rosto de cada um e subiu a escada com Priscila a seguindo.
Já no quarto Priscila jogou-se na cama da irmã.
-- Bru, como você está? Estou falando do seu coração.
-- Péssima mana. Sabe essas criaturas dos filmes de zumbi, que tanto gostamos de assistir? Pois é, eu me sinto assim. Vivendo por viver.
-- Fiquei com uma peninha de você maninha. Quase meti a mão na cara daquela...
-- Não fala assim Pri. Ela foi sincera comigo, não mentiu quanto a ter um namorado. O erro foi ter omitido, isso sim. Ter omitido que esse namorado era casado, ou melhor, era um amante.
-- Eu não acredito que estou ouvindo isso. Você está defendendo essa mulher? Bru, ela é a amante do nosso pai.
-- E como ela iria adivinhar que ele era o meu pai? - começou a chorar - E EU A AMO, DROGA! - jogou a mochila no chão e foi para o banheiro.
Priscila não entendia. O amor deixa a gente tão idiota assim? Deitou na cama e ficou esperando a irmã terminar o banho.
Na Barra.
-- Estou morta Thiago - Victória esparramou-se no sofá - Estou fora de forma. Caramba esse cirurgião trabalha por produção. Corta daqui, corta de lá. Parece um filme de terror.
Thiago sorriu e sentou-se em um sofá menor a frente de Victória.
-- Estou preparando um jantar bem gostoso para nós.
-- O cheiro está muito bom. Espero que o sabor também - sentou e encarou o amigo - Alguma notícia da Bruna? - Fazia essa pergunta para Thiago, várias vezes ao dia.
-- Nenhuma gaúcha. Ric está desconfiado que estão escondendo informações dele. Do jeito que Priscila é com a irmã se não soubesse de nada, já teria enviado o exército atrás dela.
-- Também acho - esfregou as mãos nervosa - Não aguento mais essa angustia Thiaguinho, ficar... - o celular a interrompeu.
O aparelhou chamou, chamou... E Victória só olhava de cara feia para a tela que piscava.
-- Quem é Vic? - Thiago arregalou os olhos morrendo de curiosidade.
-- Adivinha - desligou o celular e jogou em cima da mesinha - Deve ter sido a décima ligação hoje.
-- Não acredito - espalhou os cabelos com as mãos - Esse cara não desiste?
-- Pelo jeito não - bufou de raiva.
-- Chama ele e termina novamente. Quem sabe agora ele tenha um fulminante.
-- Thiago não. Ninguém merece isso - chamou a atenção do rapaz.
-- Só tenho pena das filhas, porque dele. Neca de petiriba.
-- Vou tomar um banho. Já volto para jantar.
-- Vai, vai, Nossa Senhora da Piedade - falou alto para ela escutar lá do banheiro.
No Leblon.
-- Não vai dormir hoje mana? - Bruna saiu do banheiro já de pijama.
-- Vou dormir aqui com você.
-- Sonha - Bruna ajeitou a cama para deitar.
-- Porque não? Tem medo de sonhar com a Vic e me agarrar?
-- Idiota - deu um tapa na cabeça da irmã.
Priscila puxou Bruna para deitar em seu ombro.
-- Estava com tanta saudade de você Bru - fazia carinho nos cabelos loiros da irmã.
-- Eu também estava mana - aconchegou-se nos braços de Priscila - Tomei uma decisão muito importante para a minha vida Pri.
-- Vai para o Tibete e se tornar uma monja budista tibetana?
-- Não, bobinha. O tema da minha festa de aniversário vai ser a Galinha Pintadinha. Os meninos vão de Galo Carijó e as meninas lógico, de Galinha Pintadinha.
-- Que criativo - risos - Amei.
-- Mas falando sério. Vou comprar um apartamento e sair daqui.
Priscila fez cara de tristeza.
-- Vai me deixar Bru?
-- Vai comigo mana - virou-se para ficar de frente para a irmã - A gente vai ser feliz morando juntas.
-- Não posso deixar a mamãe - sorriu embora estivesse com vontade de chorar.
-- Não sei se vou conseguir ficar longe de você mana? - voltou a deitar a cabeça sobre o ombro da irmã.
-- Claro que vai sua banana. Afinal de contas, você vai comprar esse apartamento aqui no Rio ou no Japão?
-- Gostei da ideia de me tornar uma monja budista tibetana - risos.
Priscila acabou dormindo no quarto de Bruna.
Fim do capítulo
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