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Quando o Tempo Parou por Bastiat

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Palavras: 4761
Acessos: 193   |  Postado em: 09/11/2025

Capitulo 2 - Seria muita coincidência

 

II - Seria muita coincidência

 

 

 

Maria Emília

 

       " - Você precisa crescer, precisa se virar sozinha, sair da minha vida.

 

       - Eu não preciso de você! Nunca precisei! Existe uma grande diferença entre precisar e querer estar aqui. Posso arrumar um emprego a qualquer momento.

 

       - A maior vagabunda que conheço falando que é capaz de arrumar um emprego - riu sarcástica. - Mas por que continuar aqui? Arranja em outro lugar! De preferência um que seja bem longe de mim. Por que essa insistência?

 

       - Porque você é minha irmã! Temos apenas uma à outra no mundo. É a única família que me resta.

 

       - INFELIZMENTE!!! - gritou em plenos pulmões na minha cara antes de retomar sua frieza -  Eu posso muito bem esquecer que você existe. Ou melhor: eu adoraria que você morresse, assim eu teria paz.

 

       - Cala a boca! Olha o que você está falando!

 

       - É a mais pura e simples verdade, Emília.

 

       - Cruel. Você sempre foi cruel.

 

       - Não, você me tornou o que chama de cruel. Eu sou o seu oposto: responsável, trabalhadora, centrada, a que carregou todos os problemas nas costas sem reclamar. Só que eu estou cansada, estou farta de você.

 

       - O que te falta é um pouco de alma, coração, vida. Te falta compreender que viver não significa perder a chama que queima pela ânsia de sonhar, se realizar, respirar, olhar o céu, o mar. Viver é se apaixonar todo dia pelo hoje.

 

       - E ter tudo isso é levar a sua vida? Passo. Será que você não vê como transforma a minha vida em um inferno?

 

       - Quantas e quantas vezes mais eu preciso te pedir perdão?

 

       - Para de insistir, Emília, eu nunca vou te perdoar. Você extrapolou todos os limites aceitáveis. Eu não gosto de você! EU TE ODEIO!

 

       - Você não entende... - minhas forças se foram, já estava sendo vencida pela sua súplica de me ver pelas costas  - Se eu sair por aquela porta é para nunca mais voltar. É isso mesmo que você quer? Tem certeza?

 

       - Eu preciso mesmo ficar repetindo? Que seja a última vez que eu fale, compreenda de uma vez por todas as minhas próximas palavras: para mim é um alívio que você se vá.

 

       - Então adeus, Lia."

 

       Sufocada pela lembrança, o ar preso em meus pulmões saiu aos poucos enquanto eu afundava o meu corpo no confortável sofá bege ridiculamente colocado no centro de uma ampla sala de um luxuoso apartamento de 250 m² localizado na zona sul da capital paulista.

 

       Passei as últimas duas horas olhando para as mudanças feitas desde a última vez que aqui estive. Não sobrou nenhum móvel de 18 anos atrás para contar história. Nenhuma obra de arte da coleção que meu pai herdou. Nenhuma lembrança nos quartos, os banheiros foram reformados, pisos trocados, cozinha modernizada. Nem ao menos um porta-retrato do nosso único vínculo de amor, a mulher que batalhou para nos unir enquanto viveu, nossa amada mãe.

 

       Dizem que irmãs são complementação na vida uma da outra, a primeira melhor amiga. Vovó dizia que há uma ligação forte que mistura, além do laço parental, a amizade e o companheirismo pelo resto da vida.

 

       Há também quem pense em vilania e inocência como em diversas obras retratadas ao longo da história humana.

 

       Nada disso reflete realmente minha relação com a minha única irmã Maria Amélia. Eu não vejo assim. Consigo sorrir ao ouvir minha mãe falando o quanto fiquei feliz quando com apenas 2 anos recebi que notícia de que ganharia uma irmãzinha. Não me lembro, mas acredito ser verdade quando me falavam que eu beijava a barriga da minha mãe dando bom dia para o neném que estava por vir antes de falar qualquer coisa ao amanhecer.

 

       Diferente da expectativa de muitos, nós nunca nos entendemos como irmãs. Pelo menos da minha parte foi uma sucessão de desentendimento tolos, falta de compreensão, inimizade sem explicação.

 

       Apesar dos primeiros nomes iguais, das quase mesmas roupas e da nossa aparência ser quase como se fôssemos gêmeas, criamos uma individualidade sem encaixe. Nunca gostamos nem de brincar da mesma coisa. A pequena Maria Amélia, ou só Amélia, e para os mais íntimos Lia, gostava de jogos de tabuleiro, enquanto eu preferia criar estórias com bonecas. Na escola sempre fomos de grupos rivais. Na adolescência eu era eclética e dançava, ela só ouvia MPB sentada. Apenas em um momento nós percebemos que tínhamos alguma coisa em comum: somos lésbicas. Mais espalhafatosa, me assumi primeiro aos 15 anos de idade. Tímida, minha irmã foi jogada para fora do armário por mim aos 17 anos. Não me orgulho do feito, mas eu precisava interferir quando a vi quase aceitar o pedido de namoro de um primo nosso para esconder a sexualidade há muito tempo notada por mim.

 

       Apesar de toda divergência, eu sempre coloquei acima de tudo o laço que nos une: Lia é e para sempre será a minha irmã mais nova. Quer ela queira, quer não, temos o mesmo sangue correndo em nossas veias. Eu faria e seguirei fazendo de tudo por ela, mesmo sabendo que ela não faria o mínimo por mim. Já a ajudei inúmeras vezes sem que ela percebesse, não será agora que a abandonarei.

 

       Prestes a reclamar da forma como tudo aconteceu, escuto o barulho de uma chave adentrando a fechadura. Duas voltas e mantenho os olhos fechados. 18 anos e contando o dia para esse reencontro.

 

       O som dos saltos indica os seus passos. É agora, ela se aproxima.

 

       - Não acred... Emília?

 

       Abro os olhos e meu coração vai até a boca quando os nossos olhos se encontraram, surpreendo-me. Tudo pode ter mudado no apartamento que crescemos, mas Amélia não. Sinto como se colocassem um espelho na minha frente, ela não mudou nada e, assim como eu, manteve o mesmo corte de cabelo abaixo do ombro, naturalmente ondulado.

 

       Quando falo que somos extremamente parecidas, não é exagero. As pessoas sempre nos confundiram. Temos apenas uma única e grande diferença, os nossos narizes. Enquanto o da caçula é mais delicado, o meu ganhou um osso levantado que o deixa mais avantajado. Exceto isso, nossos olhos, bocas, orelhas, tamanho e até nossas vozes são parecidas.

 

       Vestida de social como manda o figurino de uma grande advogada que se tornou, o seu terno vermelho sangue dá uma boa combinação com sua camisa social branca. Tudo muito bem alinhado ao seu corpo.

 

       - Olá, Lia - usei o seu apelido na tentativa de erguer uma bandeira branca imaginaria.

 

       Levantei-me com expectativa de abraçá-la após o susto. Ganhei uma olhada de cima a baixo, puro desprezo.

 

       - É sério isso? Por um momento eu pensei estar ficando doida. Como você entrou aqui? Que tipo de pesadelo é esse?

 

       - Bem, não foi muito difícil o porteiro acreditar que eu sou sua irmã e que faria uma surpresa.

 

       - Mas... - minha irmã pareceu confusa - como você entrou aqui, Emília? Eu troquei a fechadura no dia seguinte da sua saída, ninguém desse prédio tem a chave.

 

       - Essa fechadura não é lá muito confiável, um grampo de cabelo resolveu esse pequeno obstáculo.

 

       Amélia largou a sua bolsa no outro sofá,  pareceu-me nervosa. Com passos milimetricamente calculados, chegou perto o suficiente para me fazer ouvir sua voz baixa sair pela sua mandíbula trancada de ódio:

 

       - Não me choca você ter se tornado uma bandidinha de merd*.

 

       Eu segurei o riso para não a ofender. Com dois passos em sua direção, encarei os seus olhos castanho-claros e abri o meu melhor sorriso para ela.

 

       - Confesso que senti saudade dessa sua falta de bom humor. É claro que não usei a porcaria de um grampo. Por coincidência, o filho do porteiro é chaveiro e eu o convenci da surpresa, tudo limpo.

 

       - Pois saiba que essa sua contínua insensatez vai custar o emprego do porteiro que trabalha há anos aqui.

 

       Minha irmã tem o mesmo olhar de quando praticamente me expulsou de casa. O único brilho que se vê em seus olhos é o da chama do ódio. Não é possível que nada tenha mudado.

 

       - Você não faria isso... - falei temerosa pela sua ameaça.

 

       - Se você ficar mais meio minuto na minha casa é o que eu farei.

 

       Esperta. Minha irmã não perdeu a sua habilidosa mania de trocar favores ao seu interesse.

 

       - Esta casa também é minha!

 

       - Não, não é! Você saiu como uma louca aquele dia, deixando para trás todos os seus documentos. Eu me passei por você e falsifiquei a sua assinatura em um processo que você abria mão de sua herança para mim.

 

       - Você... você não fez...

 

       - Acha mesmo que apareceria 500 mil reais na sua conta em um passe de mágica? Eu ainda fui muito boazinha de comprar a sua parte, mesmo sem você saber.

 

       Eu estava em choque. Minha irmã é pior do que consigo me lembrar. Ela carrega uma raiva que nunca tive e fez disso uma vingança.

 

       - Tinha uma ideia de que o depósito vinha de você, mas pensei que estivesse me ajudando. Além disso, nosso patrimônio valia muito mais. Eu posso entrar com um processo contra você.

 

       - Entra, minha querida - ironizou. - 500 mil não é nada perto da indenização que eu teria direito por tudo que me  fez passar.

 

       Dinheiro, dinheiro, dinheiro e mais dinheiro. É só nisso que a Maria Amélia pensa.

 

       - É triste ver que nada mudou para você.

 

       - Sim, Emília, nada mudou. Eu não quero que nada mude. Por favor, vá embora.

 

       - Eu... Por favor, deixe-me ficar. Eu não tenho para onde ir - apelei para a boa e velha piedade.

 

       - Isso não é problema meu. Aliás, você nunca foi problema meu, mas te suportei até quando deu.

 

       - Nossos pais...

 

       - Não! Não intrometa os nossos pais na conversa para tentar amolecer o meu coração. Eu não caio mais na sua.

 

       - Lia, deixa de bobagem. As coisas que aconteceram e como ocorreram não passaram de mal-entendidos e brincadeiras.

 

       - Você não faz ideia do quanto me machucou, não é?

 

       Minha irmã sofre. Quando adentrei este apartamento e vi todas as mudanças, já tinha imaginado o seu desejo de apagar o meu passado com ela, sei que não foi apenas uma reforma para modernizar um lugar antigo, mas ainda mantive a esperança de que o tempo tivesse curado suas feridas.

 

       - Eu só quero uma chance, uma conversa, uma oportunidade de te mostrar que mudei.

 

       Fechei os meus olhos quando vi de reflexo sua mão direita começar a se levantar. Esperei um tapa no rosto, mas ganhei o meu braço sendo segurado. Com toda sua força vi seus dedos marcando o meu antebraço esquerdo. Quando dei por mim, estava sendo arrastada até a porta.

 

       - Sai da minha casa, agora! Volte a se enfiar no buraco do qual nunca deveria ter saído.

 

       Assim que a porta foi aberta, fui atirada para fora.

 

       Cambaleando para frente, escutei apenas o estrondo que a porta fez pela forma raivosa que foi fechada. Nem nos meus piores pesadelos imaginei que seria triste assim.

 

       Se há 18 anos eu mesma abri a porta, hoje nem tive a oportunidade de dizer adeus. De semelhante, tenho a infeliz coincidência de sair apenas com a roupa do corpo. Tirando a camiseta do David Bowie, visto uma calça jeans escura e um all star vermelho surrado como no fatídico dia. Se antes eu consegui ao menos pegar uma blusa de frio, agora eu estou deixando para trás duas malas prontas.

 

       Voltei para a porta, quero ao menos pedir as minhas coisas, mas pensei melhor e desisti ao concluir que será uma desculpa perfeita para voltar amanhã e esperar que Lia esteja mais calma.

 

       Com a cabeça cheia de suas palavras, toquei a porta com pesar e mesmo relutante caminhei até o elevador.

 

       Olhei para o pequeno painel e sua luz vermelha me indicou que está subindo e vai parar no vigésimo andar, exatamente onde estou.

 

       Aguardei com paciência a porta se abrir quando deu o sinal da sua chegada. Dei um passo para o lado ao perceber que uma pessoa sairia.

 

       - Lia, meu amor...

 

       Testemunhei os olhos apagados da mulher e seu andar vacilante para o meu lado. A acolhi em meus braços quando se jogou neles.

 

       Seu esforço para se manter acordada é nítida. O que há de errado? Ela está pálida, seus lábios perdem a cor e seu olhar é de apreensão.

 

       - Eu não...

 

       ‘Sou a Lia' morreu na minha garganta, pois o pequeno corpo da mulher desfaleceu nos meus braços e meus olhos que antes me olhavam com carinho se fecharam.

 

       Segurei firme em sua cintura para depois pegá-la no colo.

 

       Ajeitei o seu leve corpo em meus braços como se carregasse uma noiva para as noites de núpcias. Me senti hipnotizada pelo seu rosto, parece que a conheço de algum lugar, mas meu cérebro logo me desprendeu da cena e raciocinei para buscar ajuda. Voltei até a porta do apartamento da minha irmã e chutei a sua porta.

 

       - MARIA AMÉLIA! AMÉLIA, SOCORRO! ABRA A PORTA.

 

       Silêncio absoluto.

 

       - AMÉLIAAAAA!!! EU ESTOU FALANDO SÉRIO.

 

       - Vai embora, Emília. Chega de escândalo, por favor.

 

       Eu sabia que a minha irmã está perto da porta pela pouca distância de sua voz.

 

        Olhei para a mulher em meus braços e aproximei o meu rosto no seu nariz para sentir a sua respiração. Respirei aliviada pelo ventinho fraco que fez na minha bochecha. Pelo menos ela está viva. Meus olhos então se voltaram para reparar os seus detalhes sem que me afastasse de seu rosto.

 

       - Lia, me escuta. Uma mulher confundiu a gente e está desmaiada em meus braços. Ela é bem pequena se comparada a nós, tem um corpo magro, grandes e lindos olhos, lábios finos, cabelos castanhos...

 

       A porta foi aberta, mas não olhei para a minha irmã. Eu estava hipnotizada pela...

 

       - Vivian!

 

       Vivian... é o nome dela. Deixei que escapasse pelos meus lábios como um chamado:

 

       - Vivian.

 

       Arrepiei-me enquanto ela se mexeu levemente ao ouvir minha voz.

 

       - O que aconteceu? O que você fez? Como...

 

       A voz desesperada da Amélia despertou-me para a gravidade da situação.

 

       - Eu não fiz nada - olhei para a caçula e a interrompi para me defender de imediato. - Ela saiu do elevador e se jogou nos meus braços pensando que eu fosse você. Ela precisa se deitar...

 

       Maria Amélia imediatamente saiu da minha frente para que eu pudesse voltar à, agora apenas, sua casa.

 

       Com delicadeza, coloquei a tal de Vivian no sofá.

 

       Será? Não é possível.

 

       Sentei-me ao seu lado desejando que ela acordasse para eu ver seus olhos vivos. Quando peguei a sua mão direita caída para ajeitá-la sobre sua barriga, reparei uma grossa aliança de ouro em seu dedo anelar. Noiva.

 

       Uma mão menos delicada pegou em meu braço e me fez levantar. Minha irmã ocupou o lugar em que eu estava e colocou sua mão direita por cima da que eu tinha acabado de ajeitar.

 

       "Lia, meu amor", a voz fraca de Vivian ecoou na minha cabeça quando vi a mesma aliança no dedo da minha irmã.

 

       - Amor, acorda. Por que você saiu do hospital? Como você veio parar aqui?

 

       Despertei do estranhamento que senti ao fazer a ligação de que elas são noivas quando ouvi a palavra hospital.

 

       - Como assim hospital? - Perguntei à Lia.

 

       - Vivi tem insuficiência cardíaca grave e está internada há quase um mês... tem se agravado cada vez mais no último ano, não sei mais o que fazer ou pensar - desabafou.

 

       Mesmo com o seu rosto de lado, consegui ver dor nos olhos da minha irmã e uma tentativa de segurar suas lágrimas. Ela olhava para a noiva com preocupação ao mesmo tempo que fazia carinho em suas mãos.

 

       - Eu sinto muito, Lia.

 

       Não sabia o que dizer. Estou chocada demais para elaborar qualquer frase que amenize a dor que vejo na minha irmã.

 

       Ainda segurando o seu choro, Amélia olhou para mim apertando o seu lábio inferior entre os dentes.

 

       - Faça alguma coisa de útil, chame uma ambulância.

 

       É o seu jeito duro falando. Minha irmã jamais desaba e usa o ataque como sua defesa.

 

       Com certa lentidão incompreensiva até por mim, alcancei o telefone fixo posicionado no centro da mesa de canto ao lado do sofá. Meu polegar deslizou pelas teclas sem saber o que fazer. Será que o mesmo número de 18 anos atrás? Sem controle, ao invés de perguntar como ligar para a emergência, disse o que minha cabeça está pensando:

 

       - Amélia, deve ter algum motivo para essa fuga do hospital...

 

       Não consegui continuar o meu raciocínio pois com uma certa razão fui repreendida pelo olhar indignado da minha quase cópia.

 

        - Não... quero...  voltar... amor... por... favor.

 

       A voz cansada veio de Vivian. Seus olhos permaneceram fechados e seu esforço é concentrado em apertar a mão da noiva.

 

       - Oi, meu amor.

 

       Vi a minha irmã aproximar-se o seu rosto do dela e seus dedos  passarem a contornar o delicado rosto da mulher. Nunca tinha visto uma Amélia tão doce, delicada, deixando-se mostrar vulnerável. Nunca a tinha visto... amando.

 

       - Eu... estou.... bem.

 

       Sem fôlego. Vivian me parece extremamente cansada e ao mesmo tempo lutando pelo seu objetivo que, provavelmente, é se mostrar bem para não voltar ao hospital.

 

       - Meu amor, o que você fez? Como você veio parar aqui?

 

       Os olhos grandes se abriram e encararam Amélia apenas por alguns segundos, provavelmente efeito de algum remédio.

 

       Eu estou sobrando. Perdi tantas coisas na vida da minha irmã que me sinto uma intrusa em um momento tão íntimo de um casal apaixonado.

 

       Elas precisam conversar. Lia precisa entender o que aconteceu com sua noiva. Eu posso acabar atrapalhando se ela me ver plantada no meio da sala e levar um susto.

 

       Sem ser percebida, comecei a sair de fininho na direção da cozinha. A todo momento olhei para trás. Curiosa para saber se a dona da bela voz vai conseguir relatar o que a fez fugir da sua internação.

 

       "Eu estou bem. É só... o cansaço pelo esforço... e esses remédios que me dão... sono..."

 

       Respirei mais aliviada por saber que a mulher ao menos consegue falar mesmo que tomando o fôlego necessário para tal ato simples de dizer uma ou duas.

 

       A última vez que vi Maria Amélia tão frágil foi na morte da nossa mãe. Eu, mais sentimental, desabei enquanto ela segurava todas as pontas durante um doloroso tratamento de câncer. Mal superei a morte do meu pai aos 10 anos de idade, então perder a dona Marta ao completar 18 anos foi um duro golpe que a vida me deu.

 

       Diferente da morte tão repentina do meu pai, não fui socorrida por um psicólogo para me recuperar do trauma. Amarguei o dia a dia da sua perda sem ajuda. Hoje sei que foi uma péssima decisão. Talvez eu não tivesse feito o que fiz.

 

       Cada um reage da forma que dá em situações sombrias das quais a nossa caminhada nos reserva nessa viagem louca que é viver. Enquanto um faz da dor a força necessária, outros padecem diante dela. Amélia foi fazer faculdade de direito com a poupança justamente deixada para isso pela minha mãe e eu gastei cada centavo em festas na ânsia de esquecer ou procurando me encontrar, saber quem sou e o que quero.

 

       Foram 5 anos apenas eu e ela na mesma casa. Eu assistia de camarote a minha irmã se tornar responsável, mas infeliz. Hoje me pergunto: quem no final era infeliz? Somente eu sei o que passei nos últimos anos.

 

       Minha irmã, definitivamente, não merecia estar nesta situação depois de tantas perdas.

 

       Antes de toda confusão, explorei a cozinha e preparei um jantar de recepção para a minha irmã. Eu sabia que não seria fácil, mas a minha esperança era maior do que o medo da sua reação. Já se passaram tantos anos, chega a ser inacreditável carregar tanta mágoa.

 

       Abri o forno para sentir a temperatura do peixe com alecrim e alho, o cheiro saboroso ganhou o ar enquanto o meu dedo toca os filés. Frios como imaginei. Acendi o fogo para aquecer a proteína. Quem sabe eu comece por ganhar a confiança da minha irmã pelo seu estômago?

 

       Dei risada pelo meu pensamento que geralmente é usado para conquistas amorosas. Descobri que é errado quando me apaixonei pelo o que sou hoje: cozinheira. Alimentar outras pessoas foi a forma que encontrei para me conectar com a felicidade.

 

       Insistindo no jantar, comecei a temperar a salada de vegetais que fiz de acompanhamento. Peguei um punhado generoso de sal, mas voltei com ele para o saleiro. Se a noiva da minha irmã tem um problema cardíaco, sinal de que deve ter uma dieta restrita.

 

       Vivian. Será? Não. Definitivamente não deve ser a mesma. Se bem que... não, é loucura isso.

 

       Distraída entre o cuidado que passei a ter na esperança de que Vivian se alimente a tentar ignorar a coincidência, não percebi que ao meu lado está Amélia e seu semblante sério.

 

       - O que está fazendo? - Perguntou-me olhando para os vegetais.

 

       - Eu... - temi por uma bronca, mas decidi por encará-la de frente. - Eu fiz um jantar mais cedo e estou esquentando. Você deve ter fome depois de um dia tão pesado.

 

       - Não, não tenho. Mas, minha noiva tem. O cheiro de peixe chegou lá na sala e ela me disse que desde a semana passada o seu desejo é comer um.

 

       - Ela está bem?

 

       - O médico acabou de ligar para comunicar o seu desaparecimento, depois acabou me tranquilizando quando disse que minha noiva receberia alta em três a cinco dias e que o risco de agravar a situação existe, mas está sob controle. Não sei, ela me parece tão fraca - confessou a sua angústia.

 

       - Calma, Lia, ela vai ficar bem - disse me aproximando dela e tocando o seu braço como quem pede tranquilidade. - Acredito que a fraqueza venha também de não estar se alimentando bem. Parece que eu estava adivinhando porque o peixe só leva tempero e a salada está com pouquíssimo sal. Vou preparar um prato para ela.

 

       Em silêncio, retirei a bandeja com os filés de peixe no forno. Peguei o prato branco já separado que encontrei ao fuçar o armário mais cedo e comecei a servir com metade do filé. Acrescentei um pouco de salada e sorrindo entreguei a refeição para a minha irmã.

 

       - O quanto você sabe da minha vida, Emília?

 

       Não entendi aonde ela quer chegar com a pergunta.

 

       - O quê? Eu não sei nada.

 

       - É estranho que você tenha adivinhado e feito justamente algo dentro do que uma pessoa doente pode comer. Essa fuga dela do hospital deve ter tido a ajuda de alguém. O que pretende?

 

       - Sempre desconfiada - desacreditei. - Foi apenas um acaso, eu nem sabia da existência da sua noiva. Além disso, algo leve no jantar é algo que faz parte da minha vida. Você não muda?

 

       - E você? Mudou? Mudou para melhor? Algo me diz que não e eu confio na minha intuição.

 

       - Dei-me uma chance para te provar que mudei.

 

       Sem que me olhasse direito, Maria Amélia deu-me as costas e caminhou na direção dos talheres que estão na mesa. Fechei os olhos e suspirei frustrada.

 

       - Não faz sentido a sua chegada, Emília. Eu sinto muito, mas os melhores momentos da minha vida só aconteceram porque você não estava aqui. Eu não quero mudar isso. Te agradeço pela comida e minha generosidade pede para que eu te deixe comer antes de partir. Depois, por favor, vá embora.

 

       Ainda tive tempo de acompanhar os seus passos firmes até a sua completa saída  da cozinha. Nada mudou. Absolutamente nada.

 

       Rapidamente, coloquei o peixe de volta no forno e deixei a salada para trás. Não tenho fome. Não tenho vontade de insistir em uma conversa com a Amélia.

 

       Receosa, diminuí os meus passos ao chegar na sala. Deveria ter ficado um pouco mais na cozinha, provavelmente Vivian deve estar jantando no sofá.

 

       ‘Vivian. Será?' é a dúvida que me acompanha.

 

       Chegando na sala, para o meu alívio, não há ninguém. Não pensei duas vezes ao ir na direção do quarto de hóspedes que um dia foi o meu quarto. Feliz com a possibilidade de ficar com ele após uma emocionante conversa em que nos perdoaríamos, apostei que ficaria nele por essa e outras noites para recuperar o tempo perdido com a minha irmã e cumprir o que vim fazer.

 

       Algumas lágrimas brotaram quando pisei no corredor.

 

       "Hum... mas isso está uma delícia."

 

       Um sorriso se formou em meu rosto freando por um momento a minha tristeza. É a voz da Vivian que possivelmente está experimentando o peixe que fiz.

 

       Não resisti a minha curiosidade e caminhei até a porta entre aberta do quarto, agora, ocupado pela minha irmã, mas que foi dos meus pais.

 

       É apenas uma fresta, mas o suficiente para enxergar Vivian mastigar e ao mesmo tempo segurar um sorriso. Encantei-me pelo brilho em seus olhos. Posso não ter conseguido encantar a minha irmã com a comida, mas ganhei muito mais ao dar prazer para essa mulher que me intriga.

 

       Ao engolir, Vivian fechou os olhos e finalmente escancarou o sorriso que implorava para ser dado em seu belo rosto.

 

       - Está delicioso, meu amor. Seja lá o que aconteça comigo, já valeu a pena fugir por essa comida tão divina.

 

       A sua voz não soou firme como eu torci que fosse. Um nó se formou na minha garganta e não pensei duas vezes para deixar o local. Minha mão direita foi parar no coração, implorei para que não aconteça nada com a... minha cunhada. Não tinha parado para entender o nosso parentesco.

 

       Cheguei no quarto de hóspedes e imediatamente alcancei uma das minhas malas.

 

       Parei.

 

       A mesma mão que estava a ponto de puxar a mala, usei para girar a chave do quarto e trancar a porta.

 

       Com a roupa do corpo, deitei-me na confortável cama de casal. Preciso encontrar um jeito de me aproximar da minha irmã sem que isso atinja o coração de Vivian. Posso até mesmo usá-la para me reaproximar da Amélia e assim fazer o que tenho que fazer aqui.

 

       Vivian.

 

       - É apenas uma coincidência - frisei a mim mesma.

 

 

Fim do capítulo

Notas finais:

Sim, eu voltei.

Tenham paciência pois era para ter adicionar esse capítulo ontem, achei que tivesse enviado, mas vi agora que não hehehehe. Estou me adaptando novamente.


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