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O Nosso Recomeco - 2a Temporada por nath.rodriguess

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Palavras: 7813
Acessos: 515   |  Postado em: 26/10/2025

capitulo trinta: quantas vezes for preciso (FINAL)

CAPÍTULO TRINTA. O NOSSO RECOMEÇO. FINAL.  

 

POV ANNA 

 

Era uma tarde quente e ensolarada no Rio de Janeiro. Marcava 39º no termômetro de rua. Gente apressada correndo fora da faixa de pedestres, outras pra lá e pra cá focadas em seus trabalhos, idosos voltando de consultas médicas, artistas de rua tentando ganhar o pão de cada dia, ambulantes a todo vapor com suas mercadorias — inclusive aquelas de cunho duvidoso —, esse era o caos do Centro do Rio.  

E eu? 

Em uma fila longa no Starbucks. Tudo por um Caramelo Macchiato. 

Pedi o café, paguei rapidamente, entrei na BMW colocando o café no porta copos e fui tomando pelo caminho, seguindo para o Presídio Talavera Bruce, na Zona Oeste do Rio.  

Óculos escuros, salto alto, blazer preto e tranquilidade.  

Essa era a palavra. 

Quando finalmente cheguei ao Presídio, estacionei o carro e fui tirando a sacola transparente com o jumbo de Phetra da mala. Sim, eu fiquei responsável por isso. Ela não tinha mais ninguém. A única pessoa que tinha fé era em mim e na minha defesa. 

Sentei no banco frio, pensando comigo mesma que Phetra já tinha sofrido demais para merecer um jumbo tão ruim da prisão: aquele pacote de biscoito de água e sal quebrado, sabonete fedorento e absorvente. Então fiz questão de comprar coisas de altíssima qualidade para que ela pudesse ter, ao menos, um pouquinho de dignidade. 

Quando a agente me chamou para a revista — que não durou cinco minutos, pois eu já era bem conhecida ali — vi algumas detentas que já eram minhas clientes passando, deram um aceno e eu um pequeno sorriso. Fui direcionada à sala dos advogados e sentei-me na cadeira de metal desconfortável. A mesa fria contrastava com o meu estado de espírito. Por fora, impassível. Por dentro, empática.  

Direciono meu olhar para a porta quando ouço o estalo dela sendo aberta. Phetra tenta disfarçar, mas dá um pequeno sorriso ao me ver. A agente tira as algemas da minha cliente após eu pedir, imediatamente ela se senta de frente para mim e somente quando a agente sai da sala, ela pode finalmente respirar. 

— Bom dia, Doutora.  

— Bom dia, Phetra. Como você está? 

Ela suspira, os olhos enchem d’água.  

— Sobrevivendo… 

— Eu sei — minhas mãos alcançam as dela, que segura firme — Aquela detenta ainda está implicando com você? 

— Todos os dias.  

— Preciso que aguente firme e não se meta em confusão, é de suma importância que você tenha um bom comportamento desde o início. Não inicie e não dê trela para brigas. Não entre em grupos, não se meta com facções. Nada de celulares. Estamos entendidas? 

Ela assente.  

Começamos a falar do caso, iríamos entrar na fase de resposta à acusação, o MP já havia oferecido a denúncia, o Juiz havia aceitado. Como o caso era de grande repercussão, a justiça foi célere, sedenta por uma condenação. Mal eles sabiam que estavam lidando comigo e eu era simplesmente imparável quando acreditava em algo, quando eu tinha um propósito. 

— Eu já estou trabalhando na resposta à acusação, é importante que você não me esconda nada e se você lembrar de qualquer outro detalhe diferente do que já me contou, mesmo que seja mínimo, abra a boca. Não deixe passar, não podemos deixar nada passar nesse caso, ok?  

— Entendido, doutora. — Phetra sussurra, a voz fraca, porém, vi no seu olhar que havia decisão — Eu confio em você. 

Peguei o bloco e comecei a anotar linhas de defesa, perícias a serem questionadas, testemunhas. Quando falo o nome de Gabriela, a postura de Phetra muda.  

— Doutora Florence… eu queria te pedir uma coisa, eu sei que não tenho direito algum de te pedir mais do que você já está me ajudando, mas você pode me ajudar? — Ela parecia aflita  

— O que você está precisando?  

— A Gabi… eu… — os olhos marejam, pareciam perdidos — eu não consegui me despedir. Se eu escrever uma carta, a senhora pode entregar? Aqui demora muito pra chegar, então pensei que… me ajuda, por favor. 

— Olha Phetra, levar correspondências não faz parte do meu trabalho, mas para te ajudar, eu posso fazer sim. Quando eu entrar em contato com ela para falar sobre o processo, entregarei a carta. Você gostaria de escrevê-la agora?  

Ela assentiu rapidamente e entreguei papel e caneta a ela, que escrevia com a voz trêmula e molhava o papel com suas lágrimas. Ao final, ela parecia bem abalada. Coloquei a carta dentro da maleta e ficamos conversando mais um pouco e tirando dúvidas sobre o processo.  

— A senhora é casada? — pergunta, observando minha aliança 

— Sou sim — dou um pequeno sorriso 

— A sua esposa é advogada também? 

— Sim, mas somos de áreas diferentes, escritórios diferentes. Ela é da área cível.  

— E ela não se importa de você defender uma assassina?  

Respiro e tento manter minha expressão impassível. 

— Olha Phetra, ela está mais preocupada com a minha saúde mental nesse caso do que com o fato de eu defender uma ré confessa.  

— Por quê? — pergunta com um fio de voz 

 

A agente dá duas batidas na porta. 

— Doutora, dois minutos! — grita lá de fora com sua arrogância insuportável 

— Temos que deixar esse assunto para outro dia — digo me levantando e recolhendo minhas coisas — Logo eu volto com mais novidades sobre o processo. 

— Tá bem… — ela diz contrariada e triste  

— Eu entreguei o seu jumbo na administração, verifica se vão lhe entregar direitinho, qualquer coisa você me liga. Tem bastante coisa. — pisco 

— Obrigada, Doutora… Nossa. — ela põe o cotovelo apoiado na mesa, enquanto a mão apoia no rosto — Eu não mereço tanto, você é meu anjo. 

— Para com isso — dou um sorriso, mas logo volto para minha postura séria — Você não tá sozinha — digo, firme, apertando a mão dela. — Eu vou até o fim. Mas eu preciso de você inteira lá dentro. Entendeu? Inteira e esperta. 

 

A agente volta a dar duas batidas na porta antes de entrar e dizer: 

— Medeiros, de pé!  

E a levar de volta pra sua cela algemada. Silenciada.  

Bem longe do caos da opinião pública, bem longe das vozes que a chamam de monstro. Pela primeira vez depois de tudo isso, talvez, perto de alguém a chamasse de humana. 

Assim que entro no carro, uma vontade e curiosidade me consomem. Eu sei que 

não deveria fazer isso e sei que vai contra toda a minha ética, mas abro a maleta e desdobro a carta que Phetra escreveu para a namorada. Leio com atenção e fico um pouco emocionada, pois naquela carta, ela demonstra tudo que sente e, de certa forma, acabo mais conectada com ela do que eu imaginava.  

Ligo o carro, tiro os saltos pra dirigir e assim que dou partida, ligo o rádio na minha playlist do Spotify que hoje consistia no álbum ‘Toxicity’ do Sistem Of a Down. Durante o trajeto, dirijo rápido, tentando fazer com que o GPS cale a boca pois estou acima da velocidade na via.  

É, eu colecionava algumas multas por excesso. 

Ao chegar no escritório, Cibelle já me esperava assim que saí do elevador. 

— Dra Anna, aquela emissora de TV ligou novamente, quer uma entrevista a qualquer custo.  

— Diga que a defesa só irá se pronunciar em juízo. 

— É o que eu digo todos os dias — revira os olhos  

— Seja grosseira — pisco e sorrio de canto — Café.  

Ela sai imediatamente em busca do meu café, enquanto caminho para a minha sala, sinto meu telefone tocar em meu bolso, olho no visor o número e dou um sorriso. 

— Quando minha ex me liga, tem duas possibilidades: ou quer um tbt ou está indo pra cadeia — brinco  

— Cala a boca, Anna. — ela ralha — Traz a Fê pra jantar aqui em casa hoje, eu preciso contar uma coisa. 

— Beatriz, você quer um ménage? Não entendi — continuo brincando  

— Anna, me leva a sério — bufa 

— Ok, estou ouvindo. Só tem um porém, esse jantar é em quarteto ou em trio? 

— Quarteto, por quê? 

— Digamos que sua namorada esteja com ranço da minha mulher e não tem pai de santo que tire isso dela, como faremos? 

— Já conversei com ela, ela vai deixar de implicar com a Fê.  

— Tá ok, que horas é esse jantar ilustre? 

— Às 19h30 esteja aqui, se você chegar aqui depois do horário, farei fígado para o jantar. 

— Eca, Beatriz. Não! — faço cara de nojo pelo telefone e ela ri  

— Então seja pontual. Beijos.  

Ela desliga o telefone e eu mando mensagem pra minha ruiva para confirmar o jantar, mando também uma mensagem pra Cibelle localizar a namorada da Phetra e marcar uma visita ao escritório. 

Depois de almoçar, ainda passo por uma reunião representando a diretoria, pois, por algum motivo, Roberta não estava presente na parte da tarde. Saio do escritório pontualmente às 17h, dando tempo de buscar minha pequena na natação para deixá-la na casa dos avós.  

Fê chegou em casa apressada logo depois, infelizmente tive que expulsá-la e não fazer brincadeiras gostosas no chuveiro, pois o medo de comer fígado era maior. Chegamos na casa da Bia cinco minutos mais cedo por conta disso e uma Fê com cara de poucos amigos. 

Ela nos recebe na porta e dá um abraço apertado em Fê, o que eu estranho. As duas se davam bem, mas não eram tão próximas assim. Ela me dá um beijo no rosto e nos puxa pra dentro do apartamento.  

— Eu juro que o fígado estava temperadinho só te esperando — ela zomba  

— Ah, Beatriz, por causa desse fígado eu fiquei a ver navios — Fernanda diz revirando os olhos  

Beatriz ri e eu balanço a cabeça negativamente  

— E cadê minha irmã? — pergunto  

— No banho, já já ela vem.  

— Eu tenho que estar aqui no horário, mas ela não? — digo fingindo estar brava  

Bruna aparece na hora com um vestido soltinho no corpo e um sorriso largo no rosto. 

— Para de drama, Anna. Foram só dois minutos de atraso. — ela me dá um beijo no rosto e um abraço. 

Bruna se afasta de mim e vai cumprimentar Fernanda. As duas se encaram por um segundo a mais do que o necessário e eu prendo minha respiração. 

Mas Bruna estende a mão pra ela, sorrindo. 

— Trégua? — Fê diz, sorrindo também. 

— Trégua — Bruna concorda, arqueando uma sobrancelha — Mas se você magoar minha irmã de novo, eu vou afogar você no laguinho. 

A gente ri e meus ombros finalmente se livram da tensão, olho para Bruna agradecendo em silêncio e ela balança a cabeça devagar, como quem havia entendido.  

A noite transcorreu agradável, com bastante vinho e massa, graças a Deus sem fígado. No entanto, eu conhecia Beatriz e sabia que ela queria falar alguma coisa, ela estava um tanto inquieta, então ela nos chama para sala e nos sentamos lá, batendo um papo descontraído e animado. 

— Então… eu chamei vocês hoje porque precisava dividir uma coisa muito importante. — ela segura a mão de Bruna e dá aquele olhar de boba apaixonada que eu já vi antes, mas não naquela intensidade.  

Cruzo os braços, desconfiada. 

— Se falar que tá grávida, eu me retiro.  

— Cala a boca, Anna — Bruna ri — É sério. 

Bia respira fundo e olha para Bruna, que dá um suspiro apaixonado também na direção dela. E então, as duas mostram as mãos.  

Um par de alianças brilhando.  

Silêncio. 

Segundos de puro silêncio. 

Até Fernanda soltar um gritinho e levantar da cadeira, indo abraçar as duas. 

— Eu sabia! Eu sabia! — ela ri, emocionada. — Eu prometi que não contaria pra ninguém! 

— Como é que é? — pergunto, arqueando a sobrancelha. 

Fernanda volta pro meu lado, toda eufórica. 

— Eu jurei segredo! — defende-se. — Bia queria fazer surpresa! 

Reviro os olhos, mas não consigo conter o sorriso. 

— E vocês acham mesmo que eu vou reagir como? Jogando Beatriz do quinto andar? 

Elas riem. 

— Bom, você é a Anna, então... — Bruna estira a língua pra mim  

— Idiota. — rimos — Parabéns, irmã. Eu tô tão feliz por você, não acredito que minha baixinha vai dar esse passo tão importante na vida.  

Ela me abraça, bastante emocionada. E eu retribuo forte, apertado. 

— Ela é o amor da minha vida, Anna. Eu tô tão feliz... eu tô muito feliz.  

— E eu feliz por você — dou um beijo na testa dela — Por vocês, na verdade.  

Me viro pra abraçar Bia também, damos um abraço mais demorado que o normal, pois sabíamos o que estávamos sentindo. Havia respeito, gratidão, admiração mútua. 

— Eu poderia te ameaçar... — começo — Podia te lembrar que se fizer minha irmã sofrer igual você fez comigo, eu acabo com teu CPF.  

Bia dá uma risada de nervoso. 

— Mas... eu confio em você para fazê-la feliz. Pro resto da vida.  

Beatriz segura a emoção e Bruna me abraça novamente, me apertando. Só que eu sou a Anna e afeto demais começa a me dar alergia. 

— Ok, vamos brindar.  

— Meu Deus, eu sou rodeada de drama. — Fernanda suspira, mas sorri. — Rebuceteio, casamento, ameaça, vinho… eu amo essa família disfuncional. 

Bruna ergue a taça. 
— À nossa família disfuncional, mas verdadeira. 

E brindamos. 

O som das taças batendo era como se selasse um novo ciclo. Um ciclo de perdão, recomeço e amor em todas as suas versões. 

Na volta pra casa, enquanto eu dirigia, Fernanda estava com a mão na minha perna, rindo aleatoriamente de algo que lembrou e achou engraçado.  

— O que foi? — pergunto  

— Nossa família disfuncional. Sua ex, a ex namorada da minha ex, que agora é noiva da sua ex — ela ri 

— É, podemos chamar de... rebuceteio disfuncional — rimos — Você já sabia que elas iam casar? Como assim Bia te contou? 

— Quando nos separamos, a Beatriz me ligava todos os dias para perguntar se eu tava bem, se estava precisando de algo e na época ficamos bem mais próximas, conversamos bastante... sobre tudo. A mulher que era minha rival de anos atrás, ficou ao meu lado a todo momento, ela realmente estava preocupada de eu entrar em colapso. — ela dá um suspiro triste — eu não estava bem e ela se fez mais presente do que qualquer outra pessoa. Ela e Camila seguraram a barra junto comigo.  

Assenti e então ela continuou:  

— A Bia queria pedir a Bru em casamento há um tempo, mas ela não sabia se a Bruna queria que a relação avançasse a esse ponto, a Bruna sempre foi meio desapegada depois da Alê, na verdade, ela queria fazer as coisas com calma e não pagar de emocionada, como foi anteriormente. E então, a Bia me pediu ajuda pra organizar isso, de como ia pedir a Bruna em casamento. E aí, depois de muito chorar no meu ombro, insegura... ela tomou coragem e pediu.  

Agradeço mentalmente à Beatriz por ela ter sido o suporte de Fê durante a pior época de nossas vidas. Não digo nada, apenas pego a mão da Fê e dou um beijo suave, seguindo para nossa casa. 

Quando chegamos, Fê me convida para tomar banho com ela e eu vou. No chuveiro, depois de muitas carícias e beijos, ela simplesmente diz:  

— Fui almoçar com Roberta hoje... 

Paro de ensaboar as costas dela e fico perdida nos meus pensamentos. Então Roberta realmente fez a proposta dela trabalhar conosco. 

Ela se vira lentamente para me encarar, sua expressão preocupada. 

— Amor? — ela toca o meu rosto 

— Hum? — a encaro meio confusa ainda 

— Ouviu o que eu disse? 

— S-sim... por que ela te chamou pra almoçar? 

— Queria saber se eu poderia assumir a chefia do setor de Civil e me fez uma proposta por um valor praticamente irrecusável. Além do salário, o cargo de chefia, seria também advogada sênior e teria participação nos lucros.  

Engoli seco. 

Eu estava com medo. Medo do que isso poderia causar na gente. Não que o trabalho de Fernanda não fosse digno do cargo, mas não queria nosso casamento no meio do trabalho novamente. 

— E... você disse o quê? 

— Amanhã ela irá te dizer. 

Meu coração fica aflito. 

— Não faz isso... — suplico 

— Anna, não pira. — ela segurava o riso 

— Não, não tô achando graça. Eu tenho ansiedade, tomo remédio pra isso e você me fala “amanhã você saberá”, isso é maldade comigo. 

Cruzo os braços, desligo o chuveiro e saio do box, já pegando a toalha para me enxugar. 

— Loira, olha pra mim...  

Meus olhos ficam cheio d’água e evito olhá-la. Não é drama, é medo. 

Medo da gente se perder de novo. 

Não que eu duvidasse dela — eu duvidava do que o jogo de poder podia fazer com a gente. Já tínhamos sobrevivido a tanta coisa. Eu não queria ver o trabalho se meter entre nós de novo. 

Ela toca meu rosto com as duas mãos e me beija calmamente, minhas mãos deslizam para sua cintura e eu seguro firme, como tivesse me ancorando nela, naquele beijo e em tudo que nós temos. Ela finaliza o beijo com um selinho e me dá um beijo na testa, percebe que eu quero deixar algumas lágrimas caírem e me abraça. Ela sabe o quanto tô vulnerável nesse momento. 

Ela sabe.  

Ela sempre sabe. 

⚔⚖ 

“Não me dei bem, eu não fui feliz, não me arrependo do que eu fiz, mas não foi nada do jeito que eu quis...” 

Eram apenas 6h30 da manhã e o trânsito na Avenida Brasil estava caótico. A voz de Jimmy London ecoava na minha playlist, eu não sabia se me fazia ficar calma ou se me fazia ficar mais full pistola.  

Só de pensar na possibilidade de ser chefe da minha mulher me dava nervoso. Só de pensar em vê-la todos os dias e não poder beijá-la e sim cobrar resultados me deixava puta. Na minha cabeça, já estava pronta uma fanfic da nossa rotina. Já imagino meu nome nos tablóides: ‘Dona da Florence-Baldez tem um surto psicótico após esposa começar a trabalhar em seu escritório’.  

“Se eu não quero acaba aqui, se eu não choro, só posso rir... eu vou ficar seja aonde for de saco cheio e de mau humor”. 

Quando o trânsito finalmente cooperou, cheguei em um piscar de olhos. Dei bom dia para o porteiro e os demais trabalhadores seguindo para o elevador. Algumas pastas na mão e um propósito: não surtar. 

Cibelle apareceu com um bom dia e mil coisas pra resolver, tentei enumerar prioridades, mas tudo parecia ser. Tomei quatro cafés pela manhã e senti que a sala ao lado estava muito... quieta. 

Perguntei a Diana se Roberta estava na sala e ela disse que sim, que eu poderia entrar. Minha sócia estava sentada na poltrona lendo alguns documentos e ergueu o olhar enquanto eu me aproximava. Sentei próximo a ela e decidi puxar assunto. 

— Esse é o contrato da empresa de marketing jurídico? 

— Sim, querem renovar pra ano que vem. Você acha que tem surtido efeito? — ela pergunta  

— Preciso olhar as planilhas, mas creio que ao menos metade dos clientes que temos vem por meio da internet e a outra metade por indicação. Quer que eu cuide disso?  

Ela suspira.  

— Por favor. 

Ela me entrega o contrato e me observa de canto de olho. Pega uma garrafa de whisky e serve a nós duas. 

Legal. Cafeína e whisky.  

Fernanda ia me matar. 

— Por que você chamou Fê pra almoçar ontem? — inicio a conversa 

— Precisava fazer aquela proposta... 

— Você apostou alto — comentei 

— Ela merece, é uma ótima profissional e você sabe que eu valorizo os meus. Eu nunca quis que ela tivesse saído daqui. 

Respiro fundo. 

— Ela te contou da proposta? — ela pergunta, fixando seu olhar no meu e ajeitando os óculos 

— Somente a proposta que você fez... ela disse que a resposta que ela deu eu iria saber por você hoje.  

Ela riu. 

— É, ela me pediu isso. 

— Roberta, não me deixa aflita. Eu tô... com medo. Você não sabe metade do que aconteceu quando nos separamos, eu não te contei o motivo... se não provavelmente você iria querer matá-la e entregá-la aos leões. 

Ela assentiu, tomando mais um gole da bebida. Esfreguei as mãos e as fechei, como em oração. Suspirei fundo, sentindo meu coração se fechar. Aquele aperto no peito que sinto quando tô prestes a perder algo. Roberta percebe a minha inquietação e põe a mão protetoramente nas minhas costas. 

— Anna... ela recusou.  

Arqueio a sobrancelha. 

Quê? 

— Ela me contou tudo. O caso Zhang, o motivo da separação de vocês, o que ela fez pra conseguir o caso da Camila.  

— Então quem recusou foi você? — pergunto, confusa 

— Não... — sorriu — É claro que eu fiquei perplexa com tudo, mas... a ruiva ter feito isso, profissionalmente falando, não é ruim. É o que faríamos. Somos advogados.  

— Eu ainda não entendi...  

— Eu entendo você ter me escondido tudo o que aconteceu. Como sócia, eu deveria te matar, mas falando como sua amiga, Anna... foi a maior prova de amor que você poderia dar para Fernanda. Você não a entregou. Guardou pra si. Se fechou no seu mundo e colocou sua dor no bolso diante de todos. Enquanto ela foi me contando tudo, eu fui entendendo que durante a separação você não estava brava e sim ferida, pois você a ama mais do que qualquer coisa.  

Balancei a cabeça afirmativamente, deixando algumas lágrimas rolarem. Eu não queria saber se estava vulnerável eu não, me permiti chorar. 

— E se me permite dizer... — ela continua, colocando a mão em cima da minha para me passar algum tipo de conforto — A ruiva também te ama mais do que qualquer coisa. E o amor que vocês têm pela Cecília é maior e mais forte do que tudo. Ela disse que se tivesse que escolher entre carreira e família, você e a Cecília sempre viriam primeiro. Pediu que eu não contasse que eu entrei em contato com ela pra não te pressionar. Ela queria que a decisão fosse dela, sem drama. E foi. 

Meu peito queimava de um jeito que eu não sabia nomear. Eu estava... como posso dizer? Emocionada. Grata. Uma coisa que no meu íntimo, só quem amava demais alguém entendia.  

— Você tá bem? — ela perguntou, derramando mais whisky no copo e me oferecendo. 

Peguei o copo e bebi todo o conteúdo. O líquido ardeu na garganta e me deu coragem. 
— Estou — disse, mas a voz saiu arrastada 

— Não se preocupe: se a Fê precisasse de cargo pra se provar, tudo bem... mas ela provou demais quando escolheu ficar. Quando escolheu vocês acima de qualquer coisa.  

Ela se levantou, caminhou até a gaveta e puxou uma pilha de currículos e me estendeu com um brilho no olhar. 

— Então agora o problema é teu. O processo seletivo do próximo sócio sênior de Civil tá nas suas mãos, como você havia me pedido. Quero que escolha com cuidado — e aproveita: vou sumir por um mês. Renata, Lucca e eu vamos viajar. Lembra que te fiz esse pedido?  

Assenti.  

— Você segura o escritório? Agora é a minha vez de priorizar a minha família. 

Respirei fundo. Uma responsabilidade imensa, mas no mesmo ritmo, tinha uma adrenalina que batia forte. Eu era uma das donas do terreno e sabia o que fazer com ele.  

— Tá por minha conta, Robertinha — pisco — Felizmente não sou pão dura que nem você e vou colocar as coisas no eixo.  

— Oh, céus. Anna, controle-se. — me repreende, meio rindo  

— Vai dar tudo certo — levanto-me, já pronta para me despedir  

— Agora vai lá, loira. Vai ver aquela ruiva e vê se faz alguma coisa romântica.  

Sorri.  

Saí correndo, nem respondi Cibelle que me perguntou algo aleatório sobre Gabriela e Phetra, não fazia ideia do que era, só conseguia pensar em um nome: Fernanda.  

Peguei o carro, destravei, saí feito louca dirigindo até Irajá, o trajeto que durava 45 minutos, eu fiz em 20. Parei o carro antes do escritório apenas para comprar um buquê de girassóis que tinha exposto em uma floricultura próxima, depois segui quase voando com a BMW para o escritório dela.  

Parei no estacionamento de frente.  

O carro dela estava lá. Dou um sorriso pra mim mesma. 

Entrei pela porta de correr da Alencar & Vasconcelos. Andressa e o sócio de Fernanda, Henrique, me olharam com um ponto de interrogação na testa, eu deveria estar descabelada e desengonçada, além de um buquê na mão. Perguntei rapidamente sobre Fê, ele disse que estava na sala dela e não estava em atendimento. Respiro de alívio. Graças a Deus. 

Entro sem bater. 

Sem pedir licença. 

Sem pensar. 

Sem respirar. 

Tranco a porta. 

Ela estava em pé, parada próxima a impressora tirando xerox de algum documento, paralisou quando me viu. Tomei seus lábios num beijo urgente, faminto, cheio de tudo o que eu não disse por medo e ela, surpresa por um segundo, logo se desfez nele.  

Quando o ar finalmente voltou, encostei a testa na dela e sussurrei: 

— Você recusou. 

Ela riu baixinho. 
— Achei que Roberta não fosse guardar segredo até hoje. 

Fernanda segurou meu rosto entre as mãos, o olhar calmo, firme, cheio de uma verdade. De certeza.  

— Porque já tenho tudo o que eu quero, Anna. — ela diz. — E nada do que esse mundo pode me oferecer vale mais do que o que eu construí com você e com a Cecília. 

Bastou isso para me desmontar inteira. 

Fernanda segura minha cintura e me puxa contra ela. Beijo seus lábios novamente, enquanto a encosto na sua mesa, sem me importar se iria desorganizar sua ‘desordem criativa’.  

Nossas respirações se confundem quando paro um pouco para respirar e olhar para ela, que mantém seus olhos fixos nos meus, mas começa a desabotoar a minha camisa. Minhas mãos deslizam pelas costas dela, sentindo o arrepio de sua pele nua que o vestido não cobre, MaFê responde ao meu beijo na mesma intensidade, que agora é firme, urgente, até ela retirar, por ela mesma, sua calcinha por baixo do vestido.  

— Tranca a porta — murmura, esfregando seu nariz no meu pescoço 

— Já tranquei. — ela sorri, antes de me beijar de novo. 

E o resto... o resto foi silêncio, respiração, gemidos contidos e o tipo de amor que não precisa de palavras. 

Naquele momento, eu entendi. Eu poderia recomeçar sem esquecer o passado, mas escolhendo o amor, apesar dele.  

⏳❤ 

ANOS DEPOIS  

O tempo. 

Ah, o tempo. 

É um filho da puta. 

Anos atrás eu estava capotando em Copacabana por conta de alguém que não me merecia. Hoje, estou com a mulher que eu amo ao meu lado, passando pelo mesmo local, dirigindo a 80km/h ouvindo minha filha reclamar que vai se atrasar para um encontro. 

Ela tem quinze anos. 

Quinze. 

Ela já não era mais uma princesinha, ela estava quase virando uma mulher. E eu morria um pouquinho a cada “mãe, eu já sei me cuidar”. 

— Mãe, vai mais rápido. — ela diz, aflita 

— Cecília, já passei do limite na via, se acalma. Dá tempo.  

Reviro os olhos. 

Estou correndo pra minha filha se encontrar com um fulano chamado “Bernardo”, que na verdade, Cecília chama carinhosamente de “Bê”.  

Se existia amor à primeira vista, existia também ranço à primeira vista, pois foi isso que senti quando chegamos e vi aquele moleque sem graça, cabelo preto moicano e brinco na orelha segurando na cintura da minha filha para abraçá-la na porta do shopping.  

Fernanda segurou minha mão fazendo um carinho na tentativa de me tranquilizar, mas a minha expressão já estava fechada desde o momento que enxerguei aquele ser humano.  

Ela nem se despediu.  

Saiu do carro com um sorriso de orelha a orelha, hipnotizada por um ser inimputável que usava bermuda jeans, brinco na orelha e tênis de mola. 

Tênis de mola. 

Odiava minha filha próxima a esses... seres. 

Quando ela contou da bissexualidade eu fiquei tão feliz, mas ao mesmo tempo triste, pois o único defeito da minha filha era também gostar de homem. 

— Amor... — Fê tenta me trazer para realidade com sua voz calma — Vamos? 

— Não consigo. Não gosto desse menino. — balanço a cabeça negativamente — posso segui-los para ver se ele tem algum desvio de caráter? 

— Anna... — ela revira os olhos, mas posso ver um sorriso de canto em seu rosto — Vamos pra casa. 

— Fernanda, aquele menino parece um nóia.  

— Ele parece adolescente, amor. — suspira. — Respira, vai, loira.  

— Desnecessário. — cruzo os braços, bufando — você tá defendendo ele. 

Fernanda ri, segura meu rosto com a mão e me dá um selinho rápido.  

— Tá tudo bem, mãezona. Ela é esperta. 

Dou partida no carro, mas eu sinceramente, não acho.  

Ela era uma parte de mim e outra da Fê num corpo só.  

E isso me apavora.  

Vejo Fê trocando mensagens com Cecília e me sinto um pouco mais tranquila. Ao menos ela responde a mãe. 

Quando chegamos em casa, subi para o nosso escritório. A vida de CEO me exigia muito, mas eu nunca deixava minha família de lado, eu não queria errar onde Roberta havia errado. Inclusive, ela não era mais a minha sócia. Minha amiga se aposentou e, com isso, eu assumi o controle da Florence-Baldez. Comprei a parte dos sócios, pois não queria Conselho algum mandando no que eu fazia e como fazia, agora eu era dona da porr* toda. 

Confesso: gastei milhões.  

Mas agora, o escritório se chamava “Grupo Florence Advogados”.  

Simples assim. 

Anthony virou meu braço direito, um dos advogados júniores mais promissores do setor de Direito Criminal. Não lembra em nada aquele garotinho assustado. É forte, confiante, astuto e gay. Cibelle entrou na faculdade de Direito, pois segundo ela, se apaixonou pelo trabalho que fazia e queria mais. Muito mais. Agora, ela era minha estagiária. Com inscrição na OAB e tudo, assim como Anthony foi um dia.  

Estávamos firmes no propósito do caso da Phetra, já entrando na segunda fase do Júri, já em julgamento no plenário. Queríamos fazer de tudo para tirá-la de lá o quanto antes.  

Abro o notebook, pego algumas doutrinas na estante e me perco em algumas horas trabalhando. Fê foi para um brunch com um cliente, ela realmente tinha expandido o escritório, ficando pertinho do meu. Além disso, agora era advogada das subcelebridades: influencers, ex BBBs, Fazendas e afins.  

Ela começou com Camila Zhang e agora até ex que queria processar ex por ter virado meme batiam à porta de Fernanda Alencar. 

Eu brincava dizendo que minha mulher tinha um dedo podre pra cliente, mas um talento absurdo pra convencer qualquer Juiz a deferir o drama alheio.  

Ela sempre foi assim. 

Coração demais, intensidade demais. E, de alguma forma, isso ainda me encantava como no primeiro dia. 

Às vezes eu a observava, sentada no sofá do nosso escritório em casa, cercada de papéis, cabelo preso com coque frouxo e uma taça de vinho ao lado. E pensava: “Como pode alguém me dar tanta paz e tanto fogo ao mesmo tempo?” 

Eu nasci pra amar essa mulher até o fim dos tempos. 

Mesmo quando ela me irrita quando me obriga a não comer pizza de garfo e faca, quando me dá o melhor beijo do mundo para não quebrar o nariz alheio de quem dá em cima dela, quando tenta encobrir as besteiras de Cecília ou quando tem surto de ciúme do nada.  

Por falar em ciúmes, meu celular sobe uma notificação de Amanda. Era um print de paletas de cores para pintar o consultório dela.  

‘Qual você acha que combina mais aqui?’  

Dou um sorriso, balançando a cabeça negativamente. Indecisa, como sempre. 

Ela se formou em psicologia, seu propósito era atender jovens LGBTQIAPN+ em situação de vulnerabilidade. Eu apoiei 100% essa decisão.  

Ela largou a carreira, o futebol. Agora, jogávamos somente aos finais de semana quando tínhamos tempo. Eu era uma madrinha muito orgulhosa, e Amanda conseguiu o que parecia impossível: superar, se perdoar e colocar a vida nos trilhos. 

Já Adriana e Paola, bem... as duas abriram uma galeria de artes juntas com o dinheiro de Amanda.  

A galeria faliu em seis meses. 

A ironia? Tiveram que pedir consultoria para Fernanda e Andressa. 

Dizem por aí que o ego delas nunca mais se recuperou.  

Às vezes, as encontro por aí. Mas obviamente viro a cara, finjo que nem conheço.  

A melhor vingança é o sucesso. 

E, graças a Deus, eu sou muito bem-sucedida. 

 

 

 

Horas depois, Cecília me liga. A voz embargada.   

— Mãe... você pode vir me buscar? 

— Aconteceu alguma coisa? 

— Só... vem, por favor. — a voz tremia. 

Em menos de dez minutos, eu estava dentro do carro.  

Em menos de quinze, eu estava na porta do shopping. 

Quando cheguei, ela estava sentada em um dos bancos, com a cabeça baixa e o olhar entristecido. 

Eu desci, me ajoelhei na frente dela e perguntei: 

— Você tá bem? 

Ela assentiu, os olhos marejados. 

— Me leva pra casa, mãe? 

— Vamos. 

Peguei na mão dela e o caminho todo fomos em silêncio. Quando cheguei, Fê já estava em casa e quando passamos pela porta, as duas se olharam e Cecília foi com urgência abraçá-la.  

Senti uma dor.  

Ela não conversava mais comigo.  

E eu sempre temi que isso acontecesse, mas o fato dela conversar com a Fê já me fazia ficar aliviada. 

Tá, 10% aliviada. 

Fui para o escritório novamente, deitei na poltrona pra ler um livro, mas não conseguia me concentrar nele. Só conseguia pensar se a minha princesinha estava bem. Apesar dela se achar autossuficiente como eu, eu sabia que ela era frágil como a Fê. 

Ela bateu na porta três vezes e colocou a cabeça pra dentro, hesitante.  

— Mãe, posso entrar?  

— Pode, senta aqui... 

Ela se senta ao meu lado, eu via bastante medo no olhar dela, mas também via que ela queria que eu a acolhesse. 

Ela começou a estalar os dedos, fazia isso quando estava nervosa. 

— Eu... — começou, com a voz trêmula. — Eu não queria te preocupar. 

— Bom, meio tarde pra isso, né? — brinco — Você me deixou preocupada. Me conta o que houve? 

— Eu terminei com o Bê. 

Quase comemorei. 

Quase. 

— Entendo. — respondi, o mais neutra possível. — E ele fez alguma coisa? 

— Não... — ela dá uma risada de nervoso — eu só vi que não era isso exatamente que eu queria quando ele me beijou hoje. 

— E por que você me ligou chorando?  

— Por quê foi uma decisão difícil. 

Arqueio a sobrancelha. 

— Mãe... quero te contar uma coisa.  

— Pode me falar, eu estou aqui — digo, suave  

— Eu... não sou mais virgem. 

Meu mundo parou. 

Silêncio. 

E eu quis matar aquele garoto que parece um nóia.  

E ressuscitar ele pra matar de novo. 

Fiquei zonza. 

Mais um pouco de silêncio.  

— Mãe, fala alguma coisa — ela está com os olhos marejados, visivelmente nervosa 

— Quando? — digo, com um fio de voz 

— Semana passada...  

Respiro fundo, ponho as mãos no rosto 

— Onde? 

— Mãe... 

— Cecília. 

Respiro. 

— Eu sabia que você não ia entender — ela diz, já se levantando  

— Quem disse que eu não entendo? — seguro no pulso dela, a impedindo de ir embora — Por que não me contou antes? 

— Eu contei pra mainha...  

— O quê? — quase grito 

— Mãe, não surta! — ela senta de novo — Eu contei pra mainha primeiro porque eu fiquei com muito medo... medo de te contar. Medo de você surtar, dar um tiro no Bernardo ou simplesmente ameaçá-lo para o resto da vida. Ou então me colocar de castigo. Eu não sei!  

— Sabe do que eu tenho medo? — digo com uma voz baixa, trêmula — Eu tenho medo de que você não confie em mim para contar coisas importantes da sua vida...  

— A mainha disse que ia guardar segredo, mas eu tinha que conversar com você, pediu pra eu não demorar a contar, se não ela contaria... e hoje, quando nós terminamos, eu... só queria o colo dela pra saber o que fazer.  

— Eu sei, meu amor. É óbvio que você pode contar as coisas pra sua mãe Fê, mas eu gostaria de ser incluída. Sabe do que eu tenho medo também?  

— Do que?  

— De você não confiar em nenhuma de nós duas pra contar e comece a ouvir outras pessoas não tão legais assim e a gente acabar perdendo a família que construímos. Eu não quero te perder, Ceci — digo com os olhos cheio d’água  

— Mãe... isso nunca vai acontecer — ela me abraça — Vocês sempre priorizaram conversar sobre tudo comigo. Eu me senti segura pra contar da minha sexualidade. Eu me senti segura de contar tantas coisas... mas isso, eu realmente achei que você fosse surtar, mas eu sei que devo retribuir da mesma forma, eu não quero esconder nada de vocês duas.  

Ela se endireita no sofá, limpa as lágrimas e respira fundo. 

— Mãe… posso te contar uma coisa sem você surtar? 

— Cecília, depois do que você acabou de me dizer, acho que meu estoque de surtos acabou. Pode falar. — cruzo os braços, me preparando psicologicamente. 

Ela dá uma risadinha tímida. 
— É que... eu meio que... não foi horrível, sabe? Foi até bom. 

— Cecília Alencar Florence! — apoio a testa nas mãos, fechando os olhos, tentando manter o mínimo de controle — Eu não precisava dessa informação. 

— Eu achei que mães quisessem saber dessas coisas. A mainha quis — dá de ombros  

— Meu coração acabou de envelhecer dez anos. 

Cecília ri, encostando a cabeça no encosto do sofá. 

— Você é tão dramática, mãe. 

— Dramática, não — olho para ela séria — Eu estou traumatizada. 

— Mãe! — ela ri mais alto. — Você precisa relaxar. 

— Acha que isso é fácil pra mim? Eu troquei suas fraldas, Ceci. Te ensinei a andar de bicicleta, fomos pra Disney e agora... — sinto a voz faltar — Agora minha princesinha me diz que perdeu a virgindade, que já é quase uma mulher. 

Ela me olha com os olhos marejados, mas ainda sim travessos.  

 — Mãe… tem mais uma coisa.  

— Não tem não, chega. — balanço a cabeça negativamente, tampando os ouvidos também  

— Mãe... — ela ri  

— Cecília, eu não vou ser avó não, né? — digo, já desesperada  

— Quê?! Mãe! Claro que não! — ela faz uma careta, rindo. — Eu sou responsável, tá? 

— Ah, bom. — suspiro, levando a mão ao peito. — Então fala, mas sem traumatizar mais sua mãe, por favor. 

Ela hesita. Estala os dedos de novo. 

— Eu acho... acho que tô gostando de alguém. 

— Já começou a gostar dele de novo? — arqueio uma sobrancelha. — Foi rápido. 

— Mãe, não é o “Bê”. — ela revira os olhos. — É a Marina. 

Minha pressão caiu. 

Silêncio. 

Eu pisquei uma vez. Duas. 

— Marina... — repito devagar. — A Marina sua amiga da escola, que vem aqui em casa? 

Ela assente, meio sem jeito. 

— É. Aquela mesma. 

— Ela é sapatão demais pra você — arqueio a sobrancelha  

— Mãe! — ela ri alto, mas o rosto cora. — Você fala como se fosse uma coisa ruim, ela só é desfem! 

— Não é ruim. Claro que não. — dou um pequeno sorriso. — É só... genético. A mãe Fê e você tem os mesmos, hmm... gostos. A fruta não cai longe do pé, né? 

— Para, mãe. A mainha só tem um tipo e o tipo dela é você — sorriu  

— Acho que vou acreditar nisso. 

Ela ri, mas os olhos marejam de novo, e quando vejo, ela já está aninhada no meu colo. 

— Mãe... — sussurra, a voz miúda. — Eu posso ficar aqui um pouquinho? Só pra aliviar a tensão? 

— Claro, meu amor. — passo a mão em seus cabelos, sentindo meu coração desmontar 

Ela se acomoda, e eu começo a cantar baixinho, sem nem perceber: 

“Se essa rua, se essa rua, fosse minha...”  

Ela ri e chora ao mesmo tempo. 

— Para, mamãe. — pede, a voz falhando — você sabe que eu não aguento essa música. 

Sorrio, sentindo o nó na garganta. 

“Mamãe”.  

Sempre que ela me chamava de “mamãe”, era como se o tempo voltasse. 

— Eu também não. Mas é a nossa música. Desde o dia que eu te vi nascer. 

Ela me olha como se eu fosse o centro do mundo dela. 
— Eu te amo, mamãe Anna.  

— Eu também, minha menina. — beijo sua testa  

Ela sorri, emocionada. Fechou os olhos e ficamos ali durante um bom tempo.  

Eu era rica de uma coisa que o dinheiro jamais poderia comprar: o amor.  

O amor da minha filha. E isso era tudo. 

🌙  

Estava sentada no deck, o mesmo onde tantas vezes pensei em desistir, em fugir, em recomeçar. Agora, só observava o reflexo da lua sobre a água, com um copo de whisky em uma mão e um charuto apagado na outra. 

— Pra variar, continuo tentando entender a vida — murmuro, soltando um riso leve. 

Eu já recomecei tantas vezes que já perdi as contas. Eu recomecei quando a vida me deu uma rasteira, quando Bia foi embora, quando Fê vacilou, quando precisei ser mãe e profissional ao mesmo tempo, quando precisei perdoar, ser perdoada.  

Qunado precisei reaprender a ser feliz.  

Da pior maneira possível, a vida me ensinou que a gente só sobrevive porque a gente recomeça.  

E nossa, eu estava ficando muito boa nisso. 

Amém, Psi Marcela. 

Brincadeira.  

O mérito era dela, mas muito mais meu.  

Bebo mais um gole do whisky, o sabor é amargo, mas desce absolutamente confortável. Eu estava na minha melhor fase.  

Penso em tudo que construí — o império jurídico, os prêmios, as manchetes, as conquistas. Tudo isso tem peso. Mas nada, absolutamente nada, se compara à Fernanda e à Cecília. 

Elas são o meu milagre.  

Ouço passos atrás de mim. Nem preciso olhar. O som do andar e o perfume doce denunciam. 

— Posso sentar aqui? — diz Fernanda, com aquele sorriso que há anos ainda me desarma. 

— O deck é seu também — respondo. 

Ela se aproxima, senta no meu colo e ajeita os cabelos, me dando um beijo calmo. 

— A conversa com a Ceci foi difícil? — pergunta, encostando a testa na minha. 

Solto um suspiro. 

— Um tiro doeria menos. — sorrio de canto — Mas eu sou mãe. Tenho que me virar. 

Ela ri baixinho. 

— Ela puxou você. 

— Não. — digo, olhando para a cascata da piscina — Ela é um pouco de mim, mas é muito de você. Tem o meu gênio e o seu coração. Uma combinação perigosa. 

Fê faz um carinho no meu rosto, mas dá uma risada em seguida. 

— Achei que fosse matar o menino. 

— Ainda posso mudar de ideia. 

Fernanda gargalha, joga a cabeça pra trás e encosta a testa na minha. 
— Você é impossível. 

— Eu só a amo demais. Vocês duas. E tenho medo de perder. 

Ela segura meu rosto com as duas mãos e fala com aquela voz doce que só ela tem: 

— Você nunca vai perder o que construiu com amor, Anna. Nem a gente, nem ela. 

Dou um suspiro trêmulo, a abraçando forte. Fê apoia o queixo no meu ombro.  
— Você tá bem? 

— Tô. — respondo, e pela primeira vez na vida, percebo que é verdade. — Eu tenho tudo o que sempre quis. Uma família imperfeita, mas nossa. Uma mulher que me salva de mim mesma todos os dias. Uma filha que me ensina o que é amor puro. E uma vida que eu mesma reconstruí. 

Ela segura meu rosto com as duas mãos e me beija de novo. Lento, com carinho. 

Quando o beijo termina, encosto minha cabeça em seu ombro. 

— Sabe o que eu percebi hoje? — ela pergunta. 

— Que whisky é melhor do que terapia? 

— Que o tempo fez bem pra gente. — Ela sorri. — Olha pra nós: duas mulheres teimosas que acharam o caminho de casa uma na outra. Você é o meu lar, amor. 

— É. — eu digo, quase num sussurro. — E que casa, hein? 

Ela ri, me beija. Quando se afasta, ainda encostada em mim, ela pergunta: 

 — E agora, doutora Florence? Qual é o próximo passo? 

Dou um sorriso de canto, olhando pro céu. 

— Recomeçar, como sempre. 

— Quantas vezes for preciso? — ela provoca. 

— Quantas vezes for preciso. 

Ela levanta o copo de whisky que ainda estava em minha mão, e eu acompanho o gesto. 

— Então brinda comigo, amor. — ela diz, firme e serena. — Ao nosso recomeço. Ao que fomos, ao que somos e ao que ainda seremos. 

Tocamos os copos. 

Bebemos.  

Respiro fundo e encosto minha testa na dela.  

— Obrigada, meu amor. Por não desistir de mim. Por me dar uma família. Por me ensinar que o amor também pode ser isso aqui... — olho ao redor — paz. 

— Obrigada você. — ela sussurra. — Por ter me dado a chance de viver essa vida ao seu lado, por ter se entregado pra mim, por ser a minha Anna. 

Sorrimos e eu só consegui abraçá-la o mais apertado que pude.  

Ficamos ali, em silêncio, enquanto a cascata da piscina fazia barulho e o tempo seguia seu curso. 

Tempo.  

O tempo. 

Ah, o tempo. 

Filho da puta, sim. 

Mas dessa vez, ele foi generoso. 

FIM.  

Fim do capítulo

Notas finais:

Eu tô tremendo enquanto escrevo isso. De verdade.

“O Nosso Recomeço” não é só uma história, ela é uma parte da minha vida. Como eu já disse inúmeras vezes, muitas coisas são baseadas em fatos reais. Escrever ONR foi como se eu estivesse me encarando de frente para um espelho, foi ali que eu vi meus medos, minhas dores e principalmente o quanto recomecei pra chegar até aqui. 

Fechar esse ciclo dó, mas é preciso... pois toda história que termina abre espaço para uma outra nascer.

 E sim... 

Uma personagem de ONR vai ganhar um spin-off. 

Mas vocês só vão descobrir quem é no epílogo, que será postado amanhã (porque eu sou cruel mesmo).

Sou grata a vocês de corpo, alma e coração.

Cada uma que acreditou na Anna quando ela nem mesma acreditava. 

Cada uma que torceu pela Fê e passou pano (eu sei que vocês são Fêlovers). 

Obrigada por acompanharem essa jornada desde a primeira temporada, por vibrarem, chorarem, surtarem, criarem teorias da conspiração, e principalmente, por não desistirem dessa mulher caótica, intensa e apaixonante.

Vocês foram, e sempre serão, parte desse recomeço.

 

Com amor,
Náthally 

Eu vou ali chorar de novo, mas é só de gratidão, juro! 

Amo vocês! 

Até o epílogo! 


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Comentários para 31 - capitulo trinta: quantas vezes for preciso (FINAL):
Lea
Lea

Em: 28/10/2025

Li ontem 27/10/25,respirei, segurei o choro e agora estou aqui para comentar!

Está sendo difícil digerir o fim. Já estou com saudades.

Gostei do avanço de tempo. A Anna surtando por causa da Cecília,foi o auge. Fiquei triste por,esse "afastamento" da Ceci com a mãe. Que no que,no final a conversa foi boa.

A vida da Phetra ficou incerto! ?????

Até breve,Nathy!


nath.rodriguess

nath.rodriguess Em: 29/10/2025 Autora da história
AAAAAA lê o epílogo que você vai entender pq a vida da Phetra ficou incerta hahaha surpresa

Ela não se afastou da Anna, ela só não quer decepcionar a mamãe dela, aí fica com receio de contar as coisas, mas elas são melhores amigas. Ela é uma mini versão da Anna >


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HelOliveira
HelOliveira

Em: 27/10/2025

Sabe quando vc vai lendo, parando e pensando tomara que não acabe agora....foi assim comigo...

Anna sendo Anna como nós aprendemos a amar e surtando com a Ceci mocinha e aprontando...a Fê perfeita mesmo nas suas imperfeições....tá eu sou apaixonada por ela...

Mas foi uma aventura gostosa acompanhar a história dessas meninas, e vão ficar no meu coração...

Obrigada por compartilhar..e vamos para epílogo 


nath.rodriguess

nath.rodriguess Em: 29/10/2025 Autora da história
Eu sei que vcs são apaixonados pela Fê hahahaha obrigada pelo carinho com a história, sou muito grata por você ter acompanhado desde o início


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Carolzit
Carolzit

Em: 27/10/2025

Bom dia Nath!!! Amei o final... E se me permite dar um palpite, um casal que já seria foda e merecia uma história só delas é da Cibele e da Ceci.. acho que dariam um belo casal. A Cibele é uma personagem muito interessante e misteriosa até pela forma que surgiu. Enfim .... Acho que seria demais. Amei demais toda a história. Obrigada!!! Bjs e parabéns mais uma vez 


nath.rodriguess

nath.rodriguess Em: 27/10/2025 Autora da história
Ai, meu coraçãooooo, não aguento com vcs
meu coração ainda tá todo embaralhado por conta do fim do ONR e ler seu comentário deixoiu ele tremendo de novo
A Cibelle e Cecília? Hahahahaha
Mas vou me controlar pra não soltar spoiler, porque o epílogo vem aí amanhã
Obrigada por ter vivido essa história comigo até o fim, de verdade.
Escrevê-la me fez crescer e saber que ela te tocou dessa forma faz tudo valer a pena ^^


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