Capitulo 34
O Bistrô Gastronômico, com suas luzes baixas e a melodia discreta, acolhia a confraternização dos amigos. O aroma convidativo de ervas e azeite pairava no ar, enquanto a grande mesa redonda era ocupada por Lara, Chloe, Sophie, Elisa, Renata, Flávia, Henrique e Matheus. Este último, tinha tirado alguns dias de folga e retornado para a sua casa em São Paulo. A atmosfera vibrava com risadas e conversas animadas, um alívio bem-vindo após a rotina desgastante de Chloe e os dias corridos de Lara.
Chloe estava ao lado de Lara, um sorriso genuíno iluminando seu rosto. A proximidade da médica irradiava uma calma que a contagiava, e ali, Chloe sentia-se estranhamente leve. Bem diferente das outras vezes em que teve que confraternizar com os amigos de Lara e Henrique. A ruiva, igualmente relaxada, ria abertamente das piadas de Sophie e Elisa, que estavam em seu próprio mundo de cumplicidade conjugal.
— Vocês duas estão lindas grávidas! — Renata comentou, lançando um olhar divertido para Sophie e Elisa, que acabavam de simular uma coreografia exagerada, com Sophie equilibrando as mãos na barriga arredondada.
Elisa revirou os olhos com carinho, puxando Sophie para mais perto.
— Obrigada, amiga. Alguém precisa manter o humor da Soph em dia, especialmente agora que os hormônios estão a mil.
Sophie fez um bico.
— Ei! Não é minha culpa se tudo é mais emocionante agora. Vocês deviam me mimar mais!
— E nós não fazemos isso? — Flávia indagou, com um sorriso, deslizando a mão por sobre a coxa de Renata, um toque discreto, mas cheio de afeto. — Mal podemos esperar pela chegada da pequena Elizabeth.
Renata assentiu, o olhar doce em Flávia.
— Vai ser lindo. Espero que ela não seja tão rabugenta quanto a mãe. — Renata sempre gostou de implicar com Sophie. A fotógrafa mostrou a língua para a advogada e todos riram. Flávia beliscou a namorada levemente. Renata fez beicinho e logo Flávia beijou os seus lábios. Sem conseguir resistir a morena sexy e nerd que ela tanto amava.
— Pare de encrencar com a minha mulher, Rê. — Elisa abraçou Sophie. Lara sorriu das palhaçadas das amigas. Ela sempre amou e apoiou os relacionamentos delas.
— Quando sai esse casório? — Lara brincou com Flávia e Renata.
— Por mim, já teríamos casado há muito tempo. — Renata disse. — Mas a Flá, ainda não me pediu em casamento.
— Então é isso que está faltando? — Flávia questionou, num tom sério. Mas seus olhos indicavam que estava entrando na brincadeira. Renata lhe dedicou um lindo sorriso amarelo.
— Depois dessa intimação, eu não esperaria muito se fosse você, Flávia. — Matheus que estava acompanhando a conversa comentou.
— Vamos esperar as cenas dos próximos capítulos. — Flávia beijou a mão da sua namorada. Elas trocaram um sorriso cúmplice, a conexão silenciosa entre elas evidente. E os amigos fizeram um "uuuuuuu" coletivo.
Enquanto a conversa fluía, os amigos não podiam deixar de notar a mudança em Chloe. A mulher, antes tão reservada, agora tinha os olhos fixos em Lara, um brilho de veneração inegável. Ela ria com mais facilidade, participava das brincadeiras com uma desenvoltura nova e, discretamente, estendia a mão para tocar a de Lara sob a mesa, um gesto de carinho que confirmava a percepção de todos. Era como se Chloe não conseguisse ficar com as mãos longe de Lara. Foi Elisa quem falou, com um sorriso travesso:
— Você realmente amoleceu o coração dela, hein Lara? Nunca imaginei que veria a Chloe tão... apaixonada.
Chloe apenas sorriu, sentindo o calor nas bochechas, mas sem negar. Lara apertou sua mão em resposta, o gesto mudo validando as palavras da amiga.
Henrique, porém, observava a cena com uma intensidade diferente. Mais calado que o habitual, sua alegria costumeira dava lugar a uma seriedade contida. Seus olhos seguiam Lara, capturando cada risada, cada interação dela com Chloe. Havia um ciúme velado em seu olhar, uma pontada de algo não resolvido que o impedia de se entregar completamente à descontração da noite.
— Vou ao bar, você quer uma bebida? — Matheus que raramente falava com Henrique perguntou. O designer estranho a gentileza do homem.
— Não, obrigado. — Henrique manteve as voz neutra. Matheus apenas deu de ombros.
Lara levantou-se para ir até o bar pedir mais uma rodada de bebidas. Para o choque de Chloe, Matheus se levantou e a seguiu, posicionando-se ao lado dela na fila. O copo com suco na mão de Chloe pareceu pesar de repente, um frio gelado percorrendo sua espinha. A garganta dela apertou. Nunca tivera a conversa sobre Matheus com Lara, mas desde a despedida de solteira de Elisa e Sophie, ela tinha notado a tensão entre os dois. Seus olhos antes ternos, endureceram, fixos na dupla no balcão, uma tensão quase palpável se desenhando em seu rosto.
No balcão, Matheus puxou assunto, sua voz baixa e sincera.
— Lara... posso te falar uma coisa?
Lara virou-se, um pouco surpresa, mas com um sorriso educado.
— Claro, Matheus.
— Fico feliz em te ver tão bem, e tão feliz com a Chloe. Ela parece ser incrível com você. — Ele hesitou, olhando para as próprias mãos, como se as palavras custassem a sair. — E eu queria pedir desculpas. Desculpas por como as coisas terminaram entre a gente. Eu fui um covarde.
Lara o olhou, a memória daquele dia e da dor da rejeição voltando por um instante, um breve flash de vulnerabilidade que ela rapidamente conteve.
— Matheus, não precisava...
— Precisava sim. — Ele a interrompeu, levantando o olhar para encontrar o dela com sinceridade, os olhos fixos nos dela. — Eu sei que te magoei, e sinto muito por não ter te procurado antes para conversar de verdade. Eu fui um idiota. Fiquei assustado e fugir foi a minha forma de lidar com algo que eu não estava pronto para assumir. Usei o trabalho como desculpa, mas a verdade é que não foi culpa sua. Você é uma mulher incrível, Lara, e eu não estava pronto para um relacionamento sério, com você, com ninguém. Mas você merece alguém que esteja. E parece que encontrou.
Lara sentiu um nó na garganta se desfazer, como se uma velha ferida estivesse finalmente cicatrizando. Aquele pedido de desculpas, vindo anos depois, era um alívio que ela nem sabia que precisava.
— Eu te perdoo, Matheus. E fico feliz que esteja bem também.
Um sorriso aliviado surgiu no rosto dele.
— Amigos? — Ele estendeu a mão.
Lara apertou-a, a paz selada em um aperto firme.
— Amigos.
À distância, Chloe não conseguia ouvir as palavras, mas viu a mão de Matheus estendida para Lara, a expressão séria dele seguida por um sorriso e um aceno de cabeça. A pontada de ciúmes inicial transformou-se em uma fisgada de insegurança. O que eles estavam falando? Por que a Lara parecia tão aliviada? A comandante respirou fundo, tentando se acalmar, mas a semente da dúvida já havia sido plantada. Lara não lhe devia explicações, mas Chloe sentiu um desejo avassalador de entender cada nuance do passado da mulher que amava.
Alguns minutos depois, Lara voltou para a mesa, com as bebidas em mãos, um sorriso sereno no rosto. Ela notou o olhar de Chloe, ligeiramente inquisitivo.
— Tudo bem? — Chloe perguntou, sua voz mais controlada do que seu turbilhão interno.
Lara inclinou a cabeça, a voz suave.
— Matheus estava pedindo desculpas por umas atitudes do passado. Coisas de gente jovem e drama em excesso. Não se preocupe.
Chloe apertou a mão de Lara sob a mesa, a dúvida ainda persistindo.
— Tem mais alguém com quem devo me preocupar?
Lara sorriu, um calor imenso nos olhos enquanto fixava o olhar em Chloe.
— Não tem nada com que se preocupar, meu amor. Só tenho olhos para você. Se quiser, depois explico tudo para você. — Ela piscou, garantindo com o olhar que estava tudo bem. A postura relaxada de Lara e a facilidade com que se comunicava com Chloe mostravam o quanto a relação das duas havia evoluído para algo profundamente real, mas a pontada de ciúme de Chloe ainda estava lá.
Enquanto a noite avançava, os amigos conversavam mais. Henrique, que havia evitado Chloe durante grande parte da noite, finalmente a interceptou enquanto ela se dirigia ao banheiro. Seu rosto, geralmente alegre, estava sério, marcado por uma angústia visível.
— Chloe, a gente precisa conversar. — A voz dele era grave, sem o humor habitual.
Chloe suspirou, o corpo tencionando.
— É assim que vocês fala com a sua irmã que não vê há meses?
— Desculpa. Só não quero mais adiar esse assunto e sei que você já imagina o que seja.
— Sobre o quê você quer conversar, Rick?
Ele a encarou, os olhos marejados de uma dor que ela reconheceu, um reflexo de seu próprio sofrimento, mas com uma intensidade diferente. Ele tentava controlar a voz, as mãos apertando os punhos ao lado do corpo, visivelmente nervoso.
— Sobre você e a Lara. Eu vejo como você a olha. E vejo como ela te olha. Você está apaixonada por ela, não está?
Chloe endureceu a postura, um escudo se erguendo em torno de si.
— Isso é um assunto meu, Henrique.
— Não é só seu, Chloe! — Ele elevou um pouco a voz, depois a baixou novamente, percebendo que estavam em um lugar público. Sua frustração era palpável. — Eu a conheço há anos. Ela é... Lara é uma pessoa incrível. E eu... — Ele hesitou, o rosto se contorcendo em uma expressão de dor genuína. — Eu tenho sentimentos por ela.
Chloe o observou, uma pontada de surpresa, quase de pena, atravessou seu peito. Nunca imaginara a profundidade da dor de Henrique.
— Você está com ciúmes, Henrique?
Ele desviou o olhar, um aceno quase imperceptível.
— Me desculpa, sei que ela é a sua namorada. — Ele respirou fundo, a decisão pesando em cada palavra. — E eu preciso te contar uma coisa, Chloe. Sobre mim e a Lara. Há alguns anos, bem antes de vocês se conhecerem, em um momento de vulnerabilidade... a gente... a gente dormiu junto.
Fim do capítulo
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