Capitulo 7
A espera foi tensa. Doze longas horas se passaram enquanto o Queen Seas navegava em um padrão circular, mantendo-se a uma distância segura da fileira de covos. A tripulação, exausta, descansava em suas cabines, mas o sono era leve, carregado pela ansiedade do que estaria por vir.
Mei, em particular, não conseguia dormir. Em sua mente, o cenário da pescaria se misturava com o som das piadas de Igor e Boris, e com o olhar de Heather, firme, frio, mas que às vezes deixava escapar fagulhas de algo mais humano.
Quando a manhã cinzenta finalmente chegou, com o sol ainda escondido por trás das nuvens pesadas, Heather deu a ordem para se prepararem. A tripulação, com a energia renovada pela expectativa, se reuniu no convés. As boias coloridas, que marcavam a localização dos covos, eram pequenos pontos de esperança no vasto e impiedoso Mar de Bering.
- Boris, Victor! Vão pegar a primeira boia! - Heather gritou, sua voz firme e cheia de determinação, ressoando pelo intercomunicador.
A tripulação sabia que a primeira gaiola era o verdadeiro teste da temporada. Igor, Victor e Hans se posicionaram perto do quincho, enquanto Mei se preparava para o trabalho na mesa de classificação.
Boris, com sua força imensa, fisgou a corda da boia com o gancho e a enroscou no quicho hidráulico. O motor rugiu, vibrando pelo convés, e o cabo começou a se mover, trazendo o covo lentamente das profundezas gélidas. Todos os olhares estavam fixos na água escura, e o ar parecia pesado de expectativa.
Mei sentiu um frio na barriga. Ela sabia que aquele era o momento de verdade.
Então, com um estalo úmido e pesado, o covo emergiu. O que se revelou fez a tripulação explodir em gritos de alegria: a gaiola estava cheia. Repleta de caranguejos-reais, enormes, com as carapaças vermelhas e espinhosas, agitando-se em frenesi dentro das grades.
Heather, na casa do leme, soltou um suspiro contido. O risco da escolha havia valido a pena. Boris prendeu o cabo do guindaste no covo e Heather manobrou a gaiolha pesada até o covés. Os homens abriram a tampa. Os caranguejos se espalharam sobre a mesa de classificação, as patas batendo e raspando com força metálica. Mei, ainda admirada com o tamanho das criaturas, colocou as luvas e se juntou a Hans.
- Cuidado com as patas, novata. Eles são rápidos - alertou ele, sem tirar os olhos dos bichos.
A classificação foi rápida e eficiente. Cerca de cinquenta caranguejos: quase todos machos, no tamanho ideal. As fêmeas e os pequenos foram devolvidos ao mar. A média era perfeita, dois caranguejos por hora de imersão. O som deles caindo no tanque de água era música para qualquer tripulação: o som do lucro.
- Eu não disse que a capitã era a melhor? - Boris comemorou, com um sorriso de orelha a orelha.
- É hora de encher os bolsos! - Hans vibrou, empolgado.
Mas a euforia foi interrompida. O som grave de motores cortou o vento, vindo de estibordo. O Killer Crab se aproximava. Connor estava ali, no encalço.
Mei congelou. Heather olhou para o radar e sentiu a fúria crescer. Connor havia lançado sua fileira de covos por cima da do Queen Seas. Um ato sujo, calculado para enredar as cordas e tornar impossível a recuperação. Cada covo custava mil e quinhentos dólares, perder aquela fileira seria uma catástrofe.
Heather apertou o rádio.
- Connor! Você está na minha linha! Seus covos estão em cima dos meus!
A resposta veio carregada de riso.
- Oh, minha querida Heather... o mar é grande. Estamos apenas pescando.
- Não seja cínico! Você sabe exatamente o que fez! Vou reportar isso à Guarda Costeira!
- Fique à vontade. Mas eu não fiz nada de errado. E não se esqueça... não sou o único por perto. Isso é uma competição.
O silêncio que se seguiu foi mais pesado que o próprio mar. O Killer Crab começou a recolher seus covos, deixando atrás apenas hostilidade.
A tripulação do Queen Seas ficou imóvel por um instante, com a alegria transformada em raiva. Mei podia sentir a tensão no ar, como se todos estivessem prontos para explodir. Era a segunda vez que ela se encontrava com Connor, mas já podia sentir uma antipatia se formar dentro de si.
Heather quebrou o clima pelo intercomunicador.
- Pessoal, precisamos trabalhar rápido e com cuidado. Não deixem as cordas se enlaçarem. Vamos recolher os covos e sair daqui.
O trabalho continuou, mas o brilho da primeira puxada já estava manchado. A cada gaiola, a média caía. A tripulação trabalhou em silêncio, apenas o som dos cabos e do motor preenchendo o ar. Heather, firme no manete do leme, sentia a frustração como uma pedra no estômago, mas não deixava transparecer.
No convés, os homens olhavam de relance para o Killer Crab, a raiva ardendo nos olhos. Mei, mesmo cansada, não conseguia deixar de admirar Heather. A capitã não pensava em vingança; pensava em manter todos seguros. Essa calma em meio à fúria a deixava ainda mais fascinada. Ela ficava pensando o que poderia tirar o controle de Heather, já que a trapaça de Connor nem fez cócegas na sua seriedade e liderança.
Mais tarde, quando recolheram a fileira e a tripulação pôde enfim respirar, a tensão escorreu do convés para a cozinha. O cheiro de café forte preenchia o espaço, mas não havia leveza ali. Boris falava baixo com Igor, a voz carregada de ódio:
- Esse desgraçado devia pagar. Heather devia meter o barco por cima do dele.
- Se fosse eu no comando, já tinha feito - Igor concordou, cuspindo as palavras.
Victor, mais calado, apenas balançava a cabeça, mas o olhar duro deixava claro que também queria retaliação.
Mei, sentada a um canto com as mãos envoltas numa caneca quente, ouvia em silêncio. Cada frase a fazia entender melhor o peso que recaía sobre Heather. A tripulação queria sangue. Queriam resposta. Mas Heather tinha que ser mais do que isso - tinha que ser capitã.
A porta rangeu, e todos se calaram de imediato. Heather entrou. Os homens endireitaram as costas, a conversa morrendo na garganta.
- Vão descansar. Todos vocês. - A voz da capitã cortou o ar como aço. - Amanhã teremos uma nova fileira.
Ninguém ousou contrariar. Um a um, os homens se levantaram e deixaram a cozinha. Heather permaneceu por um instante, observando Mei, que não desviou o olhar.
A novata quis dizer algo, qualquer coisa, mas não encontrou palavras. Apenas segurou a caneca com força. Heather, séria, ergueu o queixo e saiu sem falar mais nada.
O silêncio voltou a reinar, mas para Mei não era vazio. Ela sentia que cada decisão de Heather carregava um fardo invisível. E esse fardo, de alguma forma, só aumentava sua admiração.
O Queen Seas navegava em direção a uma nova região, afastando-se do campo de Connor. A temporada tinha acabado de começar, mas já estava claro: não seria apenas uma luta contra o mar.
Fim do capítulo
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