Capitulo 3 - A irmã fantasma
Clara
Os dias no clube estão cada vez mais movimentados. Com o verão indo embora, resolveram fazer aulas de natação para crianças, pelo que ouvi falar, contrataram uma professora nova, já que o último professor foi odiado pelos alunos.
Passei a manhã toda fazendo cadastros e fichas para os novos alunos, serão o total de 40 crianças, divididas em 4 turmas, e a tarde organizei o pedido dos equipamentos necessários para as aulas, porque já começa na segunda feira e hoje é sexta, então tudo precisa chegar no primeiro horário da manhã.
Pensei em matricular Nico também, o médico recomendou na consulta da semana passada que ele fizesse natação por conta da asma, que vai ajudar muito a fortalecer o pulmão dele, mas só de pensar em meu filho dentro d’agua e que tantas coisas podem acontecer meu corpo gela.
Falando nele, preciso ir buscá-lo na casa de Liz, e confesso que não vejo a hora de chegar na minha casinha e descansar. Semana passada meu filho chegou em casa contando que conheceu a irmã fantasma, que ela voltou para morar na casa da vovó dele.
Nicolas tem mais carinho pelos pais de Liz do que com os meus, não que meus pais não sejam presentes na vida deles, mas são mais rígidos e menos afetuosos, então ele se diverte mais na casa dos avós postiços.
— Oi, gata — Encontro Mateus em cima da sua moto na saída do clube, com o capacete sobre o tanque dela, famosa cena de um bad boy desocupado — Te mandei mensagem, mas você não respondeu.
— Hoje foi um dia bem corrido no trabalho, não consegui olhar o celular — Explico ao me aproximar dele.
— Vim ver se você quer dar uma volta — Fala, demonstrando sua real intenção no tom de voz.
Eu e Mateus ficamos algumas vezes, ele é amigo do noivo de Liz, e nos encontramos em uma saída com o casal, mas tenho que admitir que é algo bem casual, sendo que sei que ele fica com outras garotas e isso também me dá o direito de ficar com outras pessoas.
Para mim, isso está mais do que bom, assim não preciso assumir compromisso nenhum. Ele é um cara bonito e charmoso quando quer, mas babaca na maior parte do tempo, então não seria o tipo de pessoa que eu me interessaria para um relacionamento.
— Não vai dar, preciso ir pegar meu filho e levá-lo para casa.
— Qual é, Clarinha — Revira os olhos e isso me incomoda — Eu vim até aqui para ter um momento legal com você, e você me dispensando para ir buscar seu filho?
Eu avisei que ele é babaca as vezes. Talvez a maioria das vezes.
— Sim, é isso mesmo que estou fazendo.
— E amanhã?
— Amanhã irei viajar com a família da Liz, não estarei na cidade.
— Achei que seria mais fácil ter um momento a sós com você — Ele está irritado.
— Você sempre soube que tenho um filho, isso não é nenhuma novidade para você.
— Mas não pensei que fosse atrapalhar tanto a gente.
— Mateus, por que você não procura uma das outras garotas que você fica? Tenho certeza de que uma estará disponível.
— Porque queria ficar com você hoje, mas vou ver se alguma outra está disponível.
— Isso, faça isso mesmo — E largue do meu pé, por favor.
— Se mudar de ideia me avisa.
— Pode deixar.
Dou um sorriso sem graça e sigo meu caminho, vou a pé mesmo já que fica á uns 15 minutos a pé, o que para mim não é quase nada.
Ao entrar na casa — o que já é comum para mim que tenho livre acesso — chamo pelo meu filho e pela minha amiga, mas nenhum dos dois respondem, o que é bem estranho.
Resolvo ver se estão na parte de trás da casa, talvez estejam brincando no jardim e não me ouviram, e decido ir pela cozinha para não ter que abrir a enorme porta de vidro que dá acesso pela sala.
Mas ao passar pela porta da mesma, trombo com alguém e meu corpo é arremessado ao chão. Senhor, quando colocaram uma parede aqui e eu não percebi?
Quando levanto meus olhos em direção ao que eu bati, encontro dois olhos pretos me encarando, e eles pertence a mulher mais bonita e mais alta que já vi na vida.
Qual seria o espanto dela se eu me fingisse de morta? Acho que seria menos humilhante do que estar aqui caída de bunda no chão. Que vergonha.
A moça me estende a mão para me ajudar a levantar, a vergonha só aumenta e sinto minhas bochechas esquentarem.
Mas paro para reparar um pouco mais nela enquanto me levanto junto com minha dignidade. Alta, poderia dizer que uns 15 a 20 centímetros a mais que eu, olhos pretos, ombros largos, muito largos e definidos, corpo atlético e um sorriso lindo de dar inveja. Na verdade, não sei se ela está rindo de mim ou para mim. Independente de qual for a opção, é constrangedor igual.
— Qual o problema de vocês com essa cozinha? — Diz ainda sorrindo.
— Quê? — Não entendo o que ela quer dizer com isso.
— Você e o seu filho têm o dom de me assustarem nessa cozinha, é algum talento de família?
— Ah, você é a irmã fantasma — Me dou conta de que ela é a mesma pessoa das fotos espalhadas pela casa.
É engraçado como eu frequento essa casa á anos e nunca encontrei ela aqui, nem nas suas férias.
— E você é a autora desse apelido maravilhoso — Revira os olhos, mas não de forma brava, apenas divertida.
— Como sabe que eu sou eu? — Digo intrigada.
— E você não é você?
O sorriso dela é lindo, e acho que estou um pouco perdida nele, sempre foi algo que me chamou atenção quando via as fotos espalhadas pela casa, isso realmente é o diferencial dela.
Por que eu estou reparando tanto nela? Acho que ela ativou meu lado bissexual.
Já fiquei com algumas garotas, foram alguns beijos trocados escondidos, mesmo assim já tive essa experiencia, e confesso que corpos femininos sempre me chamou atenção.
— Claro que eu sou eu.
— E quem é você? — Ela inclina um pouco a cabeça para o lado me analisado de cima a baixo.
— Achei que já soubesse, sendo que já sabe até quem é meu filho — Passo por ela indo em direção ao centro da cozinha, é melhor eu manter uma distância maior.
Ao passar ao seu lado, seu perfume invade minhas narinas, e porr*, além de linda é cheirosa.
— O rapazinho que vive correndo por essa casa é a sua cara e sempre ouço falar da amiga da minha irmã, e sei que é a única pessoa que pode entrar aqui sem ser anunciada, então, se você não é você, precisarei chamar a polícia porque há uma invasora em nossa casa.
— Você tem razão, eu sou eu.
— Isso já concordamos desde o início, mas agora minha dúvida continua sendo, quem é você?
— Eu sou Clara, amiga da sua irmã e mãe do Nicolas — Sano sua dúvida.
— Prazer Clara, eu sou Samanta — Ela estende a mão em minha direção.
— Prazer — Aceito o cumprimento — Mas ainda acho que você combina mais com o nome “Irmã Fantasma”.
Ela solta uma gargalhada, e eu não esperava nenhum pouco isso. Eu a imaginava uma pessoa completamente fechada, bem na sua e amargurada. Liz sempre me falou dela como outra pessoa, estou me surpreendendo com essa nova personalidade em minha frente.
— De onde você tirou esse apelido? — Cruza os braços deixando seus músculos mais evidentes — Esperava mais criatividade de vocês.
— Eu tenho outros ainda mais criativos — Minto, aceitando a provocação dela — Mas vou deixar você curiosa com isso, quanto ao apelido principal, você não imagina nenhum pouco do porquê dele?
— Não — Se defende, como se estivesse ouvindo um absurdo — Liz falou que é porque nunca estou aqui, mas isso é bem obvio, sendo que eu morava em outro país.
— Existe pessoas que moram na China que são mais presentes do que você era nessa família, a distância é apenas uma desculpa.
— Minha vida realmente era muito corrida — Tenta se justificar.
— Não digo que não era — Suspiro ao pensar no que falar — Mas nem quando você vinha de férias tinha tempo para aproveitar, estava sempre treinando ou ausente, então cada um tem o apelido que merece.
Ela me lança um olhar afiado, sei que deve ser difícil para ela aceitar que fez falta nessa família, que a prioridade dela sempre foi outra, mas cada escolha exige uma renúncia, a dela talvez tenha tido um preço alto demais, porém tem que arcar com as consequências.
— Você é bem honesta com o que fala — Sua voz não é áspera, apenas melancólica.
— Se você é daquelas pessoas que preferem que passem a mão na sua cabeça, sinto muito em informar que não sou assim, mas se quiser alguém verdadeiro ao seu lado, essa amizade pode dar certo.
— E o que te faz pensar que quero novas amizades?
A encaro sem entender qual é a dessa mulher, sei que já tem idade suficiente para parar de agir como uma criança mimada. Mas o que eu esperava de alguém que é fria com a própria família?
— Nada me faz pensar — A respondo — Isso foi apenas eu tentando ser educada, mas já entendi o recado.
— Aí está você — Minha amiga entra na cozinha — Sai com seu filho por 10 minutos e você chega, se eu soubesse teria te esperado para ir com a gente.
Meu olhar não desgruda do de Samanta, acho que estamos em uma batalha para ver quem terá a iniciativa de desviar o olhar, mas se ela acha que me intimida, está bem enganada.
— Interrompi algo?
Infelizmente perco a batalha, desvio o olhar em direção a minha amiga, mas noto a ausência do meu pequeno.
— Você não interrompeu nada — A respondo — Aonde vocês foram?
— Fomos comprar sorvete, Nico queria e não tinha mais em casa — Explica.
— Liz — Suspiro — Já te falei que você não pode fazer todas as vontades dele, Nicolas se aproveita disso e depois tenho trabalho de colocar ele na linha.
Ouvimos uma risada sarcástica vindo da terceira pessoa presente na cozinha, foi instantâneo o meu virar de rosto acompanhado do da minha melhor amiga em direção a ela.
— O que foi? — Liz questiona antes de mim.
— Nada — Dá de ombros.
— Agora fala — Minha melhor amiga insiste.
— Não tenho nada a dizer, apenas que falar para você não mimar o garoto não vai resolver nada, vai entrar por um ouvido e sairá pelo outro.
— Você não tem que falar nada, sendo que eu vi essa semana você trazendo bolo de chocolate para ele depois que saiu só porque ele disse que estava com muita vontade.
— Vocês estão estragando meu filho e depois o trabalho sobra todo para mim — Ralho com as duas.
— Mas eu cheguei agora, então posso mimar ele um pouquinho, já minha irmã deveria te ouvir.
— As duas deveriam me ouvir, eu sou a mãe e sei o quanto isso é ruim para a educação dele — Digo um pouco mais brava — E isso serve para você também Liz, semana passada ele fez birra no mercado só porque eu não quis comprar tudo que ele queria, isso realmente está atrapalhando na criação dele.
— Você que lute — Minha amiga diz tirando sarro com minha cara — É minha função como madrinha estragar ele.
— Ok, a partir de segunda feira vou matricular ele em outras atividades e avisar que será eu que passarei a buscá-lo na escola.
— Não se atreva — Liz bufa.
— É minha função como mãe educá-lo, então preciso fazer o que é melhor para ele e para minha paz.
— Você não vai fazer nada disso, o menino precisa de afeto e não passar o dia todo dentro de uma sala de aula.
— Então pare de mimá-lo.
— Ok, ok — Se rende — Farei o meu melhor.
Sei que ela está falando da boca para fora, porque já tive essa mesma conversa com ela tantas vezes que já perdi as contas e nunca teve efeito por mais de duas semanas, depois ela começa a fazer tudo o que ele quer novamente.
Graças a Deus, meu filho não é uma criança completamente sem limites, mas nas últimas semanas ele está reinando muito quando não ganha o que quer e se eu permitir que isso aconteça, terei grandes problemas futuramente, e já tenho problemas demais para ter mais esse.
— Falando nele, onde ele está?
— Estou aqui, mamãe — Entra na cozinha com a boca toda lambuzada de sorvete e com um boneco em mãos — Olha meu boneco novo.
Olho para minha amiga e ela faz cara de culpada, é inacreditável como ele sempre aparece com algo novo.
— Você e eu teremos uma conversa em casa, rapazinho — O aviso.
— Mas eu não fiz nada — Arregala os olhinhos.
— Em casa conversamos.
— Tudo bem — Concorda desanimado — Mas amanhã eu vou poder levar meus brinquedos para a casa de campo da vovó?
Por um momento já tinha até me esquecido que amanhã vamos viajar com eles. Nicolas é apaixonado na casa de campo da família Vasconcelos, e sempre que temos a oportunidade, aceitamos o convite deles para irmos junto.
— Pode, meu amor — Passo a mão pelos seus cabelos que estão um pouco grandes, fazendo uma anotação mental de que preciso levá-lo para cortar — Quando chegarmos em casa vamos arrumar suas coisas e você escolhe quais os brinquedos que quer levar.
— Falando nisso, temos que ver sobre a divisão dos carros, porque o carro do Marcos e o meu vão estar na revisão.
— Mas então não terá lugar para nós dois e não queremos atrapalhar — Digo já sabendo que meu filho ficará triste.
— Vocês podem ir no carro comigo.
O silêncio se instalou na cozinha, todos nós a encarávamos.
— Ótima ideia — Minha amiga resolve responder por mim.
— Não quero atrapalhar — É a única coisa que consigo responder.
— Não irá atrapalhar, a Sam vai ir sozinha mesmo, assim o Marcos não precisa pegar o carro do pai dele.
— Só me diga onde preciso ir buscar vocês — Volta a falar.
— Não precisa se incomodar com isso, a gente pode vir até aqui.
— Você não vai querer vir até aqui com uma criança e as malas, vai? — Me encara com aqueles olhos pretos intensos.
— Não vejo problemas — Dou de ombros.
— Mas eu sim — Insiste — Caso você não queira me passar, a Liz vai, então a escolha é sua.
— Você é sempre assim?
— Assim, como?
—Mandona.
— Só quando a pessoa é irritante.
— Não sou irritante — Me defendo.
— Está sendo, não custa nada me passar seu endereço e eu ir buscar vocês amanhã cedo.
— Você acha que isso vai dar certo? — Me viro para minha amiga — Eu e ela dentro de um carro por quase três horas?
— Vocês vão sobreviver — Faz pouco caso.
— Não tenho tanta certeza — Digo ainda irritada.
— Você vai amar passar essas horas sozinha comigo — Me provoca.
— Não estaremos sozinhas, meu filho estará junto — a corto — E mesmo que estivéssemos, o máximo que poderia acontecer é eu te jogar do carro em movimento.
— Não com esse tamanho todo — Ri da minha cara sendo acompanhada pela irmã.
— Quer saber, eu vou para minha casa que ganho mais do que ficar aqui de papo furado com vocês duas — Aviso — Se despeça, filho.
— Tchau, madrinha — Ele vai até Liz e a abraça, depois segue até a outra e repete o ato — Tchau, tia Sam.
— Tchau, Nico.
As duas respondem para ele enquanto eu vou em busca das suas coisas para irmos para casa.
Fim do capítulo
Oiiiii....
O que acharam desse primeiro encontro?
Espero que a leitura tenha te feito uma boa companhia. Até breve.
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