• Home
  • Recentes
  • Finalizadas
  • Cadastro
  • Publicar história
Logo
Login
Cadastrar
  • Home
  • Histórias
    • Recentes
    • Finalizadas
    • Top Listas - Rankings
    • Desafios
    • Degustações
  • Comunidade
    • Autores
    • Membros
  • Promoções
  • Sobre o Lettera
    • Regras do site
    • Ajuda
    • Quem Somos
    • Revista Léssica
    • Wallpapers
    • Notícias
  • Como doar
  • Loja
  • Livros
  • Finalizadas
  • Contato
  • Home
  • Histórias
  • Dois Reinos
  • Capitulo 13

Info

Membros ativos: 9524
Membros inativos: 1634
Histórias: 1969
Capítulos: 20,492
Palavras: 51,967,639
Autores: 780
Comentários: 106,291
Comentaristas: 2559
Membro recente: Thalita31

Saiba como ajudar o Lettera

Ajude o Lettera

Notícias

  • 10 anos de Lettera
    Em 15/09/2025
  • Livro 2121 já à venda
    Em 30/07/2025

Categorias

  • Romances (855)
  • Contos (471)
  • Poemas (236)
  • Cronicas (224)
  • Desafios (182)
  • Degustações (29)
  • Natal (7)
  • Resenhas (1)

Recentes

  • Legado de Metal e Sangue
    Legado de Metal e Sangue
    Por mtttm
  • Entre nos - Sussurros de magia
    Entre nos - Sussurros de magia
    Por anifahell

Redes Sociais

  • Página do Lettera

  • Grupo do Lettera

  • Site Schwinden

Finalizadas

  • Por que demoramos tanto?
    Por que demoramos tanto?
    Por Leticia Petra
  • Shot me Down
    Shot me Down
    Por Mabes Okada

Saiba como ajudar o Lettera

Ajude o Lettera

Categorias

  • Romances (855)
  • Contos (471)
  • Poemas (236)
  • Cronicas (224)
  • Desafios (182)
  • Degustações (29)
  • Natal (7)
  • Resenhas (1)

Dois Reinos por Natalia S Silva

Ver comentários: 0

Ver lista de capítulos

Palavras: 9469
Acessos: 668   |  Postado em: 25/08/2025

Capitulo 13

Maeryn

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os dias passavam em Valmont como um rio lento, cheio de redemoinhos silenciosos. O medo que meu pai me causava não havia sumido, não sumiria tão cedo, eu sabia. Mas havia algo de novo agora, algo que me sustentava em silêncio: meus irmãos. Não todos, claro, mas Alric, Corwin e até mesmo Teyrion, de sua maneira mais contida, estavam ao meu lado. Isso não apagava o temor, mas dava-lhe uma borda menos afiada. Eu já não estava tão sozinha.

 

E havia Varka.

 

Nossas noites eram sussurros e pele, escuridão e calor. Nos encontrávamos como se o mundo nos punisse por sermos quem éramos, escondidas, silenciosas, famintas. Às vezes em um antigo estábulo abandonado, outras sob as ameias, entre sombras e janelas trancadas. Ela vinha com o corpo ainda dolorido das queimaduras, com um cansaço que me cortava, mas os olhos dela... os olhos me buscavam como se só eu pudesse curá-la.

 

Estava apaixonada. Não de forma ingênua ou idealizada, não havia como sê-lo sob aquele teto, naquela família. Mas de uma maneira intensa, clandestina, e ferozmente real. Sentir o toque dela, ouvir sua voz baixa dizendo meu nome como se o mundo terminasse ali… Era tudo.

 

Durante o dia, no entanto, virávamos máscaras. Eu voltava a ser a filha perfeita, compenetrada nas reuniões, obediente, gentil com os nobres, presente nas cerimônias. Ela assumia a postura de guerreira exilada, silenciosa, fria, sempre ao lado de Ragan, longe demais de mim. Mas de vez em quando nossos olhos se encontravam por instantes e era como um rasgo em meio ao véu.

 

Foi num desses dias, numa tarde abafada em que o verão parecia nos observar pela janela, que o silêncio do salão foi quebrado.

 

Estávamos reunidos, os conselheiros, alguns nobres de casas aliadas, meus irmãos, meu pai no trono elevado com sua capa bordada com os símbolos da águia de Valmont. Eu estava à sua esquerda, como era costume, escutando uma discussão sobre os suprimentos para as tropas que seriam enviadas às fronteiras a leste. Varka e Ragan estavam mais afastados, contra a parede de pedra, entre as tapeçarias. Ela mantinha as mãos para trás, as pernas firmes, o rosto impassível, mas eu a via, latente, mesmo a distância.

 

Foi então que a grande porta dupla se abriu com força. Um guarda entrou apressado, com a respiração entrecortada, e parou de súbito ao centro do salão.

 

 

(Guarda) — Majestade — disse, com voz firme apesar da pressa. — Uma comitiva de Skarn acaba de chegar aos portões. E… o rei Korgun está com eles.

 

 

O silêncio que se instalou foi quase insuportável.

 

Meu corpo inteiro congelou. Vi o semblante do meu pai se fechar como uma muralha que se ergue em segundos. Um leve estremecer no maxilar, a respiração presa.

 

 

(Aldren) — Korgun? — ele repetiu, mais baixo, como se quisesse se certificar de que ouvira direito. — Nenhum corvo foi enviado. Nenhum sinal.

 

 

O conselheiro Arveth inclinou-se, murmurando algo que não ouvi, mas o rei o ignorou. Levantou-se devagar do trono, os olhos fixos em algum ponto invisível diante de si.

 

 

(Aldren) — Tragam-no — ordenou, com um timbre de voz que oscilava entre raiva e receio. — Tragam-no até aqui. Com toda a comitiva.

 

 

Meus dedos apertaram o tecido do vestido quase sem perceber. Meus irmãos se entreolharam. Corwin deslizou a mão até o punho da espada, instintivamente. Alric estava impassível, mas seu olhar foi direto para Varka. Ela também havia endurecido. Não com medo, era diferente. Era como se soubesse que esse dia chegaria.

 

As portas se abriram outra vez, minutos depois. A marcha pesada de botas de couro e armaduras tilintando contra o chão ressoou como um trovão dentro do salão. Primeiro vieram os estandartes de Skarn, com seu símbolo negro de três cabeças de lobo entrelaçadas, bordado em prata. Depois os soldados, altos, de mantos escuros, os rostos endurecidos pelo gelo e pela guerra. E, por fim, ele.

 

Korgun.

 

Pai de Varka. O rei dos desertos gelados. O senhor do Norte.

 

Entrou com a imponência de um homem que sabia exatamente o efeito que causava. Seu cabelo grisalho caía sobre os ombros, os olhos eram de um cinza glacial, e a expressão... era de quem carregava séculos nos ombros. Parou ao centro do salão, o silêncio pesando como uma lâmina suspensa sobre todos.

 

 

(Korgun) — Rei Aldren de Valmont — disse ele, sem se curvar, sem gesto de saudação. — Vim buscar o que me pertence.

 

 

O impacto daquelas palavras atravessou o salão como uma lança.

 

Varka não se moveu.

 

Meu pai levou alguns segundos para responder. Quando o fez, a voz dele saiu baixa e calculada.

 

 

(Aldren) — Skarn não enviou corvos. Nem tratados. Nem embaixadores. Isso é uma invasão?

 

 

Korgun deu um passo à frente.

 

 

(Korgun) — É um retorno. Vim por minha filha. Vim por meus filhos. E vim pelo futuro dessa aliança.

 

 

Senti o ar escapar dos meus pulmões.

 

Meus olhos buscaram Varka, ela permanecia imóvel, como uma estátua talhada em pedra viva. Mas sua mandíbula estava rígida, os olhos cravados no pai. Entre os dois havia um abismo de palavras não ditas, de feridas abertas e pactos quebrados.

 

Ragan finalmente deu um passo à frente, com o semblante mais pálido do que o habitual.

 

 

(Ragan) — Korgun... — disse. — Com todo respeito... não era essa a forma de...

 

 

(Korgun) — Cale-se, menino — respondeu o rei de Skarn. — Ainda está aprendendo a respirar sozinho.

 

 

O clima azedou de vez.

 

Todos no salão estavam tensos. Meus irmãos, os nobres, até os conselheiros. Eu mal sentia minhas pernas. Sabia que qualquer movimento em falso, qualquer palavra torta e aquela sala poderia se tornar um campo de batalha. E ali, no centro de tudo, ela.

 

Varka.

 

Que me fitou por um segundo. Um só. Um olhar que dizia tudo o que ela não poderia dizer em voz alta.

 

 

 

 

O rei de não veio com lanças erguidas, mas seu olhar era tão cortante quanto qualquer espada. Korgun, rei de Skarn, atravessava o salão como se fosse dono de cada pedra das paredes, de cada tapeçaria bordada com a águia de Valmont. Seu manto era de pele grossa, de alguma criatura que talvez só existisse nos desertos gelados do norte, e sua presença era uma sombra densa que se espalhava, sufocante.

 

Meu pai desceu os degraus do trono lentamente, como se cada passo exigisse esforço. Era um homem orgulhoso, temido, e nunca gostei da maneira como fazia as pessoas curvarem a espinha só com o olhar. Mas ali, diante de Korgun, percebi algo diferente. Uma tensão. Uma hesitação disfarçada de ira.

 

 

(Korgun) — Explico minha presença, Aldren — disse o rei de Skarn, com a voz firme, sem tom de súplica ou justificativa. — Palavras escritas em pergaminho não me bastam. Não quando meus filhos atravessaram vales em chamas.

 

 

As palavras pairaram no ar, carregadas de veneno.

 

Ragan baixou os olhos, mas Varka não se moveu. A tensão em seu corpo crescia a cada frase do pai, como se um grito estivesse preso dentro dela, tentando encontrar saída.

 

 

(Aldren) — Vieram como fugitivos — meu pai respondeu, a voz baixa, contida, cada sílaba medindo o orgulho ferido. — Deveria tê-los mandado de volta amarrados, como prisioneiros.

 

 

Korgun soltou uma risada seca, rouca como uma pedra rolando em gelo antigo.

 

 

(Korgun) — Mas não o fez. E sabe por quê? Porque no fundo entende que há coisas maiores do que sua honra pessoal. Entende que, mesmo com todas as suas reservas, a sobrevivência das nossas terras depende da união.

 

 

Meus dedos tremeram sobre o tecido do vestido. Não eram apenas palavras políticas, havia peso real nelas. Feridas ainda abertas entre os reinos, desconfiança latente. E, entre tudo isso, eu.

 

 

(Korgun) — Skarn está segura por ora — continuou Korgun, agora andando lentamente diante dos conselheiros e nobres como se discursasse em seu próprio salão. — Os invasores sumiram por enquanto. Nosso povo começa a reconstruir, pedra por pedra. Mas sabemos que isso não é paz. É apenas o silêncio que antecede a próxima tempestade.

 

 

Os olhos dele, então, pousaram em mim. Frios. Avaliativos.

 

 

(Korgun) — Trouxeram Maeryn de volta viva. Skarn cumpriu sua parte. Agora Valmont deve fazer o mesmo.

 

 

Meu coração acelerou.

 

 

(Korgun) — Vim buscar meus filhos — ele disse, sem desviar o olhar. — E também a filha de Valmont.

 

 

Foi como um trovão, seco e impiedoso. Um murmúrio atravessou os nobres, os conselheiros. Corwin olhou diretamente para mim, em choque. Alric se manteve rígido, mas algo nos olhos dele queimava.

 

Meu pai não respondeu de imediato. Seus olhos se voltaram para mim, não com ternura ou cuidado, mas com aquela análise política fria que ele reservava às decisões difíceis. Eu era mais um pedaço no jogo, uma peça valiosa em tabuleiro instável.

 

 

(Aldren) — Ela não é moeda de troca — disse ele, enfim. — E não estamos em tempos de oferendas matrimoniais.

 

 

Korgun sorriu de canto, mas havia algo de perigoso naquele sorriso.

 

 

(Korgun) — Não vim pedir sua mão para um de meus filhos. Vim pedir sua presença. Skarn honra dívidas com sangue e ação, não com palavras.

 

 

Engoli seco. Sentia os olhares em mim como lâminas. Os da corte, os dos meus irmãos, os de Varka, que finalmente se mexeu, um leve movimento do ombro, como se se preparasse para algo que não queria enfrentar.

 

 

(Korgun) — Meus filhos não ficarão reféns num salão estrangeiro — Korgun continuou. — Eles partirão comigo. E quero que Maeryn vá também. Para ver com os próprios olhos do que a salvamos. Para decidir com clareza a quem oferece sua fidelidade quando a guerra voltar.

 

 

Meu pai se ergueu com a altivez de quem recusa uma afronta.

 

 

(Aldren) — Ela é minha filha. Herdeira de Valmont. E ninguém a tira debaixo deste teto sem minha permissão.

 

 

Os dois reis estavam frente a frente agora. O ar parecia vibrar. Os nobres seguravam a respiração. Eu… eu mal sentia o chão sob meus pés.

 

Korgun não recuou. Apenas assentiu, uma única vez, devagar.

 

 

(Korgun) — Então ficaremos. Por alguns dias. Discutiremos com tempo. Sem aço nas mãos. Mas com clareza.

 

 

Meu pai hesitou. Por um segundo, a sala foi puro silêncio.

 

 

(Aldren) — Que fiquem — disse, enfim, como se engolisse uma lâmina. — Não por imposição. Mas por cortesia. Serão tratados com honra, como exige a tradição.

 

 

E assim foi decidido.

 

Mas todos sabiam, aquela não era uma visita. Era um cerco.

 

 

Naquela noite, o castelo parecia respirar diferente. Mais denso. Mais alerta. Os corredores, sempre tão silenciosos após o cair da noite, agora vibravam com passos apressados e sussurros tensos. Os servos se moviam como sombras inquietas, carregando bandejas, fechando janelas, acendendo tochas demais, como se a luz pudesse proteger Valmont daquilo que se erguia pelas bordas da diplomacia.

 

Os guardas dobraram nos portões, nas torres, até nos salões onde a política costumava ser o único escudo. Todos sabiam: Korgun, o Rei dos desertos de Skarn, não era apenas uma visita inesperada. Era uma ameaça educada, vestida em peles e com palavras afiadas.

 

Varka e eu não nos vimos naquela noite. Não porque não quiséssemos, mas porque o ar entre nós estava pesado demais para ser respirado. Ela desapareceu com Ragan após a ceia, seguindo ordens do pai, ou talvez tentando evitar que qualquer gesto nosso desse à corte motivos para cochichos. Meu pai estava irado. Andava pelos corredores como se o chão não fosse digno de seus passos. Gritava com conselheiros, esmurrava mapas. Sabia que desafiar Korgun era loucura, mas aceitar sua imposição parecia ainda pior.

 

A noite foi longa. Não dormi. Sentada no peitoril da minha janela, observei as chamas das tochas do pátio piscarem ao vento, como olhos atentos. Pensei em Varka. Em tudo o que havíamos vivido entre sombras. Naquele corpo marcado por dor, na forma como ela tremia de leve quando eu encostava a testa na dela. Pensei na guerra, no norte, no que significava a palavra aliança para homens como os dois reis.

 

E então veio a manhã.

 

E depois dela, a tarde.

 

O grande salão foi preparado às pressas para a reunião. Tapeçarias limpas, velas acesas, tronos polidos, perfumes de ervas jogados sobre os degraus. As famílias reunidas, a corte de Valmont com seus brocados dourados, os filhos e filhas ao lado do trono, e a comitiva de Skarn, em mantos escuros, armaduras de couro manchadas de neve antiga, com olhos frios e firmes.

 

Korgun se sentou sem esperar convite. Meu pai, com as mãos cerradas sobre os braços do trono, parecia um vulcão prestes a romper. Varka e Ragan estavam atrás do pai. Varka evitava me olhar, mas havia um tremor em sua mandíbula que eu reconhecia, ela estava furiosa e impotente.

 

O debate começou calmo, com trocas formais de palavras vazias, honra, proteção mútua, fronteiras, reforços. Mas logo o que precisava ser dito veio à tona.

 

 

(Aldren) — Cada pai deve cuidar de seus filhos — disse meu pai, num tom que soava generoso, mas era pura defesa. — Valmont acolheu os vossos quando mais precisavam. Cuidamos de suas feridas. Agora, cada um volta ao seu lugar e a aliança permanece firme.

 

 

Korgun inclinou-se para a frente, com um sorriso que não tocava os olhos.

 

 

(Korgun) — Skarn não vê assim. Meus filhos não foram hóspedes. Foram sobreviventes. Refugiados. Mandei minha filha ferida trazer a sua em segurança, para manter a aliança em pé. E agora quer devolvê-los como se fossem mercadoria?

 

 

O salão murmurou em desconforto. Meu pai apertou os punhos.

 

 

(Aldren)— Cuidado com suas palavras, rei do norte — disse. — Está em solo de Valmont.

 

 

(Korgun) — Não se trata apenas de filhos. Trata-se de futuro. De confiança. Acha mesmo que o sangue não irá encontrar os seus muros? Acha que pode sobreviver sem nossa ajuda o que está por vir?

 

 

Foi então que ele olhou para mim.

 

E ali estava a questão.

 

 

(Korgun) — Skarn exige mais do que promessas. Exige laços reais.

 

 

O olhar de meu pai vacilou por um instante, mas logo ele se recompôs. Levantou-se.

 

 

(Aldren) — Então que seja — disse, cada palavra um açoite. — Já que a presença de minha filha é o elo que falta nesta corrente, proponho a única coisa que pode apaziguar essa disputa sem mais ofensas.

 

 

Silêncio absoluto.

 

Eu soube antes mesmo que ele completasse.

 

 

(Aldren) — Um casamento.

 

 

Senti o mundo parar.

 

 

(Aldren) — Ofereço Maeryn, filha de Valmont, para se unir a Ragan, filho de Skarn. Sangue de ambos os reinos selará essa aliança. E ela será eterna.

 

 

Não ouvi mais nada por alguns segundos. O som virou um zumbido nos meus ouvidos.

 

Varka se mexeu atrás do pai, como se o corpo dela reagisse antes da mente. Ragan não disfarçou o susto, mas seu rosto se fechou rapidamente em um disfarce de honra fingida. Meus irmãos se viraram para mim com olhos arregalados.

 

Mas eu só conseguia olhar para o rei.

 

Meu pai.

 

Ele me oferecia. Como se eu fosse uma taça a ser passada para selar o vinho. Como se meu nome não fosse mais que um pedaço do tratado.

 

Korgun sorriu. Não de alegria, mas de cálculo.

 

 

(Korgun) — Uma proposta sábia — disse. — Ragan será um bom marido. A filha de Valmont será bem recebida em Skarn.

 

 

Varka... ela se afastou. Um passo só. Mas para mim foi como um grito.

 

Ela não disse nada. Apenas virou o rosto. E, naquele gesto, havia mais dor do que em qualquer palavra dita naquela sala.

 

Meu pai se virou para mim.

 

 

(Aldren) — Aceita? — perguntou, como se tivesse opção.

 

 

Todos os olhos estavam sobre mim. Os dos nobres, dos soldados, dos meus irmãos, dos conselheiros. De Korgun. De Ragan quase chorosos.

 

Mas os únicos que importavam eram os dela.

 

Varka não me olhava mais.

 

 

 

 

 

 

Antes que eu pudesse sequer abrir a boca, antes que as palavras, que eu nem sabia ainda quais seriam, saíssem de mim, Korgun soltou uma gargalhada. Não uma risada leve ou educada, mas uma daquelas que preenchem a sala como trovão, como deboche puro e cru.

 

Ele se recostou na cadeira de madeira escura como se estivesse em sua própria sala de banquetes, diante de súditos amedrontados e não de reis, conselheiros e nobres estrangeiros.

 

 

(Korgun) — Maeryn? — disse, ainda rindo. — Ora, Aldren… eu não disse que queria essa filha sua.

 

 

O silêncio que veio depois foi quase doloroso.

 

O rosto do meu pai se contraiu, vermelho como ferro em brasa.

 

 

(Aldren) — Está debochando da minha casa?

 

 

Korgun ergueu uma sobrancelha, com aquele ar de superioridade gélida que ele vestia como uma segunda pele.

 

 

(Korgun) — Estou apenas rindo da pressa com que oferece sua filha como moeda. Uma filha que, aliás, eu duvido que deseje meu pobre filho, Ragan.

 

 

E então, os olhos dele, olhos de um lobo envelhecido, mas ainda cruel encontraram os meus. Havia malícia neles, mas também precisão. Ele sabia. Sabia de tudo.

 

 

(Korgun) — Não seria mais lógico que ela preferisse outra filha minha? — disse, como se soltasse a frase ao acaso, como quem diz que o dia está nublado. — Mas, enfim...

 

 

Ele se virou para meu pai, o sorriso se mantendo.

 

 

(Korgun) — Já que Aldren, o cauteloso, propôs uma união para selar a paz, então que aceitemos. Mas com sua filha Elsera.

 

 

O impacto foi imediato.

 

Meu pai se ergueu com a fúria viva nos olhos. Seus dedos se fecharam em punhos sobre os braços do trono, os anéis cravando a carne de seus dedos, os olhos faiscando como se pudessem queimar o próprio chão.

 

 

(Aldren) — Isso é provocação.

 

 

As palavras saíram como um rosnado contido, misto de orgulho ferido e incredulidade.

 

Korgun, sentado com a calma de quem sabe exatamente onde acertou o golpe, cruzou os braços sobre o peito largo, coberto por um manto de pele espessa. Seu sorriso era uma lâmina disfarçada de cortesia.

 

 

(Korgun) — É resposta — disse ele, sem pressa. — Resposta à sua ousadia de oferecer uma filha como moeda, sem sequer se certificar de que ela deseja o jogo.

 

 

Eu me mantive imóvel, entre meus irmãos, com a alma latejando. Não era mais sobre mim. Não exatamente.

 

Korgun voltou-se para mim por um instante, os olhos cinzentos, cruéis em sua lucidez.

 

 

(Korgun) — Maeryn não quer Ragan — disse, como se estivesse comentando o tempo. — A mim não me escapa o modo como ela olha outra filha minha.

 

 

A sala foi engolida por um silêncio espesso. Um silêncio que pesava sobre ombros, que tirava o ar dos pulmões. O nome de Varka não foi dito. Não precisava. Estava em cada par de olhos que se voltava para ela, ainda imóvel ao lado do pai.

 

 

(Korgun) — Então se quer casamento, terá um casamento — continuou Korgun, erguendo o queixo. — Elsera é jovem, bem-nascida, forte, e tem sangue do seu reino. E Ragan será honrado de unir-se a ela.

 

 

Meu pai se contorceu. Era como assistir a um predador encurralado.

 

 

(Aldren) — Elsera é minha filha mais jovem.

 

 

(Korgun) — Justamente — respondeu Korgun com ironia. — O elo mais forte. Unir os dois reinos pelo sangue mais nobre de ambos. E veja, não a estou tirando de você à força. Foi você quem trouxe a ideia do casamento. Estou apenas… ajustando a peça correta.

 

 

E então, por fim, Korgun cravou o punhal no ponto exato.

 

 

(Korgun) — Ou não é verdade que Maeryn prefere Varka?

 

 

O salão inteiro pareceu encolher. Os nobres, os conselheiros, meus irmãos, todos pareciam presos entre o escândalo e o pavor. Corwin desviou os olhos, Teyrion cerrou os punhos. Alric encarava Korgun como se estivesse pronto para atravessar a sala com a lâmina.

 

E eu…

Eu não desviei.

 

Não me escondi.

Não neguei.

Nem sequer corei.

 

Eu só olhei para Varka.

 

E ela… ela finalmente me olhou de volta.

 

Não havia surpresa em seus olhos. Nem medo. Apenas uma dor antiga, cansada, o tipo de dor que já se tornou parte do corpo. Mas também havia um pedido mudo ali, uma chama tênue, não me abandone.

 

 

Meu pai se voltou com fúria para Korgun, mas estava encurralado. Oferecera um casamento como solução, e agora, diante da proposta do rei do norte, não podia recuar sem parecer fraco.

 

Foi Ragan quem falou, então. Sua voz soou inesperadamente firme, mesmo contida.

 

 

(Ragan) — Aceito, se Elsera aceitar.

 

 

Era isso. Uma vitória estratégica. Ele sabia. E parecia satisfeito. Talvez preferisse não ter que esfregar os sentimentos de Varka no chão, daqui até o norte. Talvez visse em Elsera uma aliada mais fácil, mais… previsível.

 

Mas Elsera não respondeu de imediato.

 

A jovem estava sentada entre nós, os cabelos presos com simplicidade, as mãos cruzadas sobre o colo. Tinha os olhos do nosso pai, mas em sua expressão havia algo mais suave, quase tímido.

 

Korgun a fitou de esguelha.

 

 

(Korgun) — Fale, filha do Sul.

 

 

Ela ergueu o rosto lentamente. Olhou para mim por um instante e foi como se me atravessasse. Havia algo nos olhos dela que me causou arrepio. Um entendimento silencioso. Uma aceitação do lugar que lhe cabia, mas não sem consciência do que aquilo custaria. E havia mais, havia um brilho, um sorriso contido, uma alegria disfarçada.

 

Depois, ela voltou-se para nosso pai, e enfim para Ragan.

 

 

(Elsera) — Se é isso que mantém a paz entre os reinos, aceito.

 

 

Sua voz era baixa, mas firme. Um aço calmo.

 

Meu pai se virou em direção à lareira acesa atrás do trono. Silencioso. Imóvel. A cabeça baixa. E quando finalmente falou, a voz parecia sair de dentro de um túmulo.

 

 

(Aldren) — Que seja.

 

 

A decisão estava feita.

 

O tratado selado. O casamento acordado.

 

E o nó apertado ao redor do meu peito parecia impossível de afrouxar.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mais tarde, naquela noite, fui ao terraço oeste. O céu estava coberto de nuvens densas, como se o próprio céu se recusasse a testemunhar o que se passava entre essas pedras.

 

Varka estava lá, de pé, encostada na mureta de pedra, os cabelos presos com descuido, o vento gelado bagunçando os fios soltos. Não se virou ao ouvir meus passos. Mas soube que era eu. Sempre soube.

 

Me aproximei devagar, sentindo o coração bater num ritmo estranho, como se algo antigo e novo, ao mesmo tempo, estivesse prestes a se revelar entre nós.

 

 

(Maeryn) — Falei com Elsera — murmurei, depois de um instante, a voz baixa, tentando não romper o frágil tecido que nos unia naquela escuridão. — Ela parece… feliz.

 

 

Varka arqueou uma sobrancelha, ainda olhando para o horizonte.

 

 

(Varka) — Ninguém fica feliz sendo oferecida como tributo de paz.

 

 

(Maeryn) — Ela não vê assim. — Me aproximei mais, encostando ao lado dela. — Disse que gosta de Ragan. Que já tinham se aproximado antes. Ele parece respeitá-la. E ela não é frágil, Varka. Não como pensam.

 

 

Ela soltou um suspiro. O ar frio formava névoa diante dos nossos rostos.

 

 

(Varka) — Eu sei — disse por fim. — Ragan é um bom garoto.

 

 

Ficamos em silêncio por um momento. O vento nos envolvia como um manto invisível. Meus olhos encontraram os dela, tão cansados e intensos, como se toda a dor do mundo coubesse ali.

 

 

(Maeryn) — Não achei que, depois de tudo… depois da humilhação nos salões diante dos homens…eu sentiria isso — sussurrei. — Gratidão.

 

 

Ela me olhou, surpresa.

 

 

(Varka)— Gratidão?

 

 

(Maeryn) — A Korgun. Pela ousadia. — Ri sem humor. — Por me tirar do altar que meu pai me preparava. Ele me expôs, me ridicularizou, sim, mas no fim… me libertou.

 

 

Ela me encarou com mais intensidade, os olhos semicerrados como se quisesse entender algo que eu mesma mal compreendia.

 

 

(Maeryn) — Eu o odiei por isso — murmurei. — Mas agora… agora estou quase agradecida.

 

 

Nos olhamos por um tempo que pareceu mais longo do que deveria. Ela não disse nada, apenas deixou a mão deslizar delicadamente pelo meu ombro.

 

Estávamos ali, juntas, abertas, quando ouvimos passos pesados ecoando pelo corredor de pedra. Passos decididos.

 

E então ele surgiu.

 

Korgun.

 

Imenso como uma tempestade, envolto em peles grossas, o rosto marcado pelo tempo e pela guerra. Trazia aquele sorriso que não era bem um sorriso, mas uma curva carregada de ironia e ameaça. Parou diante de nós, erguendo uma sobrancelha como se estivéssemos em pleno palco e ele fosse o espectador entediado da última cena.

 

 

(Korgun) — Ah, as sombras da noite revelam mais do que os salões iluminados — disse com um tom arrastado, debochado. — Não é uma surpresa encontrar vocês assim. A verdade mora nos cantos escuros, não é?

 

 

Meu rosto ardeu, mas não desviei o olhar.

 

Varka, por sua vez, ergueu o queixo. O corpo ainda doía, eu sabia, ela ainda carregava feridas escondidas sob os tecidos escuros, mas ali estava firme, como sempre.

 

 

(Varka) — Está aqui para rir de novo, pai? — ela perguntou, sem disfarçar o desdém.

 

 

(Korgun) — Eu nunca rio à toa — respondeu ele. — E hoje, mais do que nunca, estou em posição de rir com liberdade.

 

 

Ele se aproximou alguns passos. Eu o encarei com firmeza, tentando manter o orgulho intacto, mas havia algo de sufocante na presença dele. Korgun parecia carregar o próprio peso do mundo nos ombros e o impunha aos outros com prazer.

 

 

(Korgun) — Varek ofereceu sua filha como moeda. A errada, claro. Mas foi um bom erro. Me permitiu ver com clareza o que já suspeitava.

 

 

Seus olhos caíram sobre mim.

 

 

(Korgun) — Você pertence à minha casa mais do que à dele.

 

 

Não entendi de imediato. O coração bateu mais forte.

 

 

(Maeryn) — O que está sugerindo?

 

 

(Korgun) — Sugerindo não — ele disse, sorrindo de lado. — Oferecendo. Está convidada a seguir conosco para Skarn.

 

 

A forma como ele disse aquilo parecia casual, quase preguiçosa, mas o impacto foi brutal. Meu coração deu um salto no peito, como se tivesse escutado algo impossível. Varka, parada ao meu lado, prendeu a respiração. Eu soube. Senti o corpo dela endurecer, o ar entre nós pesar de um jeito estranho. Um rei não faz ofertas à toa, muito menos aquele rei.

 

Korgun deu um passo à frente, os olhos fixos nos meus, carregados com aquela mistura de sarcasmo e brutal sinceridade que só ele sabia dosar. Cada palavra dele era como uma pedra lançada no lago calmo da minha razão.

 

 

(Korgun) — Lá, em Skarn, não seria problema — ele disse, como quem fala sobre o clima. — A sua… afeição por minha filha. Ninguém se importa. Não como aqui. Lá não é pecado, não é ameaça, não é fraqueza. É apenas verdade.

 

 

Varka não disse nada. Continuava imóvel, como se as palavras estivessem cortando mais fundo nela do que em mim.

 

 

(Korgun) — Aqui, você é prisioneira das expectativas do seu pai. — Korgun ergueu o queixo na direção do castelo atrás de nós, como se o próprio prédio fosse um símbolo da prisão. — Em Skarn, você é livre. Pode ser o que quiser. Amar quem quiser. Ficar com ela.

 

 

Meus olhos se voltaram para Varka. E ela finalmente olhou para mim. Foi como ser atingida por um raio silencioso. Aquele olhar... havia dor ali, e surpresa, e uma esperança que ela lutava para sufocar.

 

 

(Korgun) — Pense bem — disse Korgun por fim, já se virando. — Nem todos têm a chance de escolher onde recomeçar.

 

 

E com isso, foi embora.

 

Não olhou para trás. Deixou apenas o eco de seus passos e o caos dentro de mim.

 

Eu me apoiei na pedra fria da mureta, tentando respirar. O céu acima de nós parecia mais pesado do que nunca, como se as nuvens pressionassem meu peito junto com todas as decisões que eu não estava pronta para tomar.

 

Skarn.

 

A palavra ficou pulsando na minha mente. Ficar com Varka era tudo que eu queria. Ela era o único lugar onde o mundo fazia sentido. Ela era o abrigo em meio ao fogo, à guerra, à traição. O único espaço onde eu não precisava fingir ser outra. E agora… agora havia um caminho. Uma escolha real.

 

Mas Skarn também era gelo, era sangue nas pedras, era o trono de um rei cruel e imprevisível, era o berço de um povo que aprendi a temer desde pequena. Era a terra onde minha língua era estrangeira e meu nome valia pouco. Seria eu bem-vinda, além da proteção de Varka e da promessa de Korgun?

 

 

(Maeryn) — Não é simples — murmurei, mais para mim do que para ela.

 

 

Varka ainda estava em silêncio, mas agora seus olhos me acompanhavam com atenção. O vento bagunçava os cabelos dela de novo, e por um instante desejei que tudo fosse tão simples quanto o toque da pele dela na minha.

 

 

(Varka) — Eu não vou pedir — ela disse, baixo, firme. — Não quero que vá por mim.

 

 

(Maeryn) — Mas você quer — rebati, encarando-a. — Está na sua cara.

 

 

Ela baixou os olhos por um instante. E quando voltou a me encarar, havia algo de resignado ali, algo que me doeu ver.

 

 

(Varka) — Eu quero que escolha por você. E se escolher Skarn... eu vou lutar pra que tenha paz lá. Por você. Mas se ficar aqui… — respirou fundo — …vou entender. Mesmo que doa.

 

 

Fechei os olhos, tentando conter o tumulto dentro do peito. Minha cabeça dizia que aquilo era loucura. Que eu era filha de Valmont. Que aqui era minha terra, minha casa, minha língua. Que ali estavam meus irmãos, meu sangue, minha história.

 

Mas o coração... O coração já estava em Skarn há muito tempo. Desde a primeira vez que ela segurou minha mão como se eu fosse o único fio que a prendia ao mundo.

 

Naquela noite, não decidi nada. Apenas fiquei ali, ao lado dela, em silêncio, sentindo o peso da escolha crescer como uma tempestade anunciada. O que viria depois, não importava. Por um momento, tudo que existia era ela, e a possibilidade do impossível.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Varka

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Meu coração era uma loucura. Um caos inquieto que me mantinha de pé e, ao mesmo tempo, me puxava para o abismo. Eu queria que Maeryn viesse comigo, cada parte de mim gritava por isso. Sonhava com ela cavalgando ao meu lado rumo ao norte, sentada à minha mesa, caminhando pelas fortalezas de Skarn como se já tivesse nascido ali. Queria que ela dormisse ao meu lado sem medo, risse entre os meus e chamasse aquele lugar de lar. Mas queria mais do que isso… queria que ela quisesse. Que fosse escolha dela. Vontade, não sacrifício.

 

E isso me partia em dois.

 

Porque havia uma parte de mim que era egoísta, faminta, disposta a puxá-la comigo, com unhas e dentes se fosse preciso. Mas havia também a outra parte, a que a amava. E essa parte sabia que não se arranca alguém da terra onde criou raízes sem ferir. Não se pede para deixar tudo sem que alguma coisa morra no processo.

 

Agradecia meu pai por ter enxergado, ainda que torto. Ele não era gentil com as palavras, nunca foi. Mas às vezes, entre um sarcasmo e uma risada de desprezo, ele acertava. E, naquela noite, ele acertou por mim. Não era apenas sobre levar Maeryn para Skarn. Era sobre dizer ao mundo que ela podia me amar. Que podia estar comigo e continuar inteira. Sem medo. Sem vergonha.

 

E, ali no terraço, eu senti que, por um instante, nada mais importava.

 

O vento estava frio, cortante, mas o calor da presença dela ao meu lado era suficiente. Ficamos em silêncio por um tempo que não sei medir. O tipo de silêncio que não pesa. Que acalma. Um silêncio confortável como um cobertor velho, como uma promessa não dita, mas compreendida. Nossos ombros quase se tocando. O mundo à nossa volta parecia menor, mais lento.

 

As luzes do castelo oscilavam distantes, como se o restante da fortaleza estivesse adormecido, ou vigiando à espreita. Não me importava. Aquele instante era só nosso.

 

Olhei para ela em algum momento. Seus olhos estavam no céu, nas nuvens densas que ainda escondiam as estrelas. Mas o rosto sereno, os lábios entreabertos, revelavam que a batalha dentro dela era tão grande quanto a minha.

 

 

(Maeryn) — Eu não sei o que vai acontecer — disse ela, de repente, sem me encarar.

 

 

(Varka) — Ninguém sabe — respondi. — Mas você não precisa decidir agora.

 

 

Ela respirou fundo. O som foi quase um soluço contido, e meu peito apertou.

 

 

(Maeryn) — E se eu não conseguir? — ela murmurou. — E se for tarde demais quando eu souber?

 

 

Toquei sua mão, com a ponta dos dedos. Como quem oferece abrigo sem exigir entrada.

 

 

(Varka) — Eu espero — disse com toda a verdade que tinha.

 

 

Maeryn virou o rosto para mim, e por um instante, a dor e a ternura se misturaram em seus olhos. Ela não disse nada. Nem precisava. O olhar dela carregava tudo. Medo. Desejo. Gratidão. Amor.

 

Ela se aproximou, devagar, e encostou a testa no meu peito. E ali ficamos. Respirando a mesma dor, o mesmo anseio. O

O dia seguinte nasceu com um céu límpido, quase cínico de tão sereno, como se ignorasse a tensão que pairava sobre Valmont. O castelo fervilhava de preparações desde as primeiras horas, criados indo e vindo com tecidos, taças, flores e mantos, enquanto os salões se enchiam de perfumes doces e vozes nervosas. O casamento de Ragan e Elsera seria celebrado ali, naquela terra fria e esculpida em pedra, mas com todo o brilho que se espera de uma união real. E, estranhamente, meu irmão estava mesmo feliz. Mais leve do que há tempos.

 

Eu o encontrei nos corredores antes da cerimônia. Estava sorrindo de canto, de maneira discreta, mas verdadeira. Trocamos poucas palavras. Ele agradeceu, com o olhar mais do que com a boca, e aquilo bastou. Depois disso, ele sumiu na avalanche de preparações, enquanto nosso pai perambulava pelos salões como se tivesse nascido ali, testando vinhos, provocando nobres, brincando com criadas e agindo como o rei da ocasião, o rei que se sentia em casa em qualquer território, como se nenhum trono fosse maior que o seu próprio ego.

 

E então veio o momento.

 

O salão principal fora transformado. Cortinas longas de tecido cru e vinho pendiam dos arcos, flores selvagens misturadas a rosas domésticas adornavam as colunas e o altar. As luzes das tochas e dos candelabros douravam tudo, lançando sombras suaves pelas paredes. Nobres se apertavam em seus melhores trajes, perfumes caros flutuavam no ar, os músicos afinavam instrumentos de corda do lado esquerdo da escadaria central.

 

Nós, os bárbaros, usávamos vestes de gala. As túnicas eram pesadas, feitas de couro tingido, peles bordadas à mão com fios dourados e azuis, faixas cruzando o peito com brasões de Skarn. Eu mesma vesti algo que nunca pensei que usaria, uma capa comprida, de lã escura com forro de lobo branco, e uma túnica justa por baixo, de azul profundo, presa com broches de prata nos ombros, sobre a calça. Me sentia deslocada, apertada.

 

Então as portas se abriram. E ela entrou.

 

Maeryn.

 

Todo o salão se calou, como se o ar tivesse sido engolido de uma vez só.

 

Ela caminhava com uma postura ereta, mas leve. A cabeça erguida, como quem sabe que será olhada, julgada, desejada e não se importa. Não desafiava, mas também não recuava. Havia nela um ar quase cruel de tão sereno. O tipo de beleza que não se oferece, apenas se impõe.

 

Vestia um traje de cerimônia em tons de âmbar e ouro velho, com mangas longas e fluidas que pareciam arrastar luz com elas a cada passo. O tecido bordado era tão fino que parecia ter sido tecido com vento e calor de lareira. Sobre o peito, uma joia ancestral repousava, o colar da casa de Valmont, dizem, passado de mãe para filha. Seus cabelos estavam presos no alto, mas soltos o bastante para emoldurar o rosto com fios ondulados e sutis, como se o próprio vento tivesse tocado. E os olhos… seus olhos buscavam algo, alguém.

 

E encontraram os meus.

 

Por um instante, me esqueci de tudo. Da cerimônia. Dos hinos. Da multidão. Vi apenas ela, olhando para mim, não com vergonha, nem medo. Mas com aquele olhar que só ela tinha. Que me desarmava, que me fazia sentir que eu era sua casa, mesmo longe de Skarn. Mesmo longe de tudo.

 

Ela se posicionou ao lado de Elsera, e os olhares voltaram aos noivos. Mas ninguém esqueceu. Todos sabiam. Que naquele salão, tão cheio de pompa, a alma da cerimônia não era o noivo ou a noiva. Era ela.

 

Maeryn, filha do rei.

A herdeira que ousava amar alguém como eu.

E que, naquele instante, parecia mais rainha do que qualquer outra.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O casamento de Ragan e Elsera foi, como dizem os poetas, um espetáculo digno de lenda, não por sua beleza, mas por tudo o que se escondia sob ela.

Valmont sabia montar festas. Os bardos enchiam o salão com melodias suaves e triunfais, misturando canções antigas do sul com harmonias rebuscadas da corte. O altar foi montado no centro, com um arco de flores e brasões fundidos em prata que representavam a união dos dois reinos. Tudo parecia bonito demais para ser verdade, e era.

 

Ragan, com sua capa de lobo negro e o cabelo preso com argolas de bronze, estava mais bonito do que eu lembrava vê-lo. Elsera, vestida com camadas em tons de marfim e cinza, segurava as mãos dele com firmeza, os olhos brilhando com algo que parecia real. Eu não duvidava que ela o queria, ou que Ragan, do seu modo contido, começava a desejá-la também. Aquilo, ao menos, era sincero.

 

Mas o mundo ao redor não era.

 

A cerimônia seguiu com as palavras ritualísticas, juramentos de lealdade, de aliança, de união dos sangues. O padre da casa de Valmont recitou versos ancestrais enquanto o conselheiro de Skarn pronunciava as bênçãos do norte, com voz gutural, como quem fala com os deuses das montanhas. Mas meu coração não estava ali.

 

Estava a poucos passos de mim.

 

Maeryn não desviava os olhos.

Talvez nem percebesse, mas me olhava com uma intensidade que quase me queimava.

E quando nossos olhares se cruzavam, era como se todo aquele teatro desaparecesse. Como se o casamento diante de nós fosse só o prólogo de outra história, a nossa.

 

Ela me devorava em silêncio, e eu a ela.

 

Cada movimento seu, o modo como tocava o colar com a ponta dos dedos, como inclinava a cabeça para ouvir uma das damas e logo voltava os olhos para mim, me fazia desejar coisas que não cabiam naquele lugar. E tudo nela gritava pertencimento. Aquela roupa dourada como o fim do verão, os ombros descobertos, a curva elegante do pescoço, Maeryn parecia feita para reinos, mas seus olhos diziam que me queria agora, ali, contra alguma parede escondida atrás de tapeçarias ancestrais.

 

Eu também a queria.

 

A tensão entre nós era insuportável. Meus dedos coçavam com o desejo de tocá-la, de tomá-la dali. De arrancar cada camada de tecido e orgulho que ela vestia. A cerimônia toda pareceu se arrastar por horas, cada palavra dos votos me levando mais perto da ruína. Era como assistir um espetáculo cujo final a gente conhece, mas ainda assim, tudo doía.

 

Quando Ragan e Elsera se beijaram, o salão explodiu em aplausos. Taças foram erguidas, sinos tilintaram ao longe, e o vinho começou a correr pelas mesas.

Mas eu não comemorei.

 

Porque naquele instante, o que eu sentia não era alegria.

 

Era fome.

 

A fome de tê-la.

A fome de uma liberdade que talvez nunca nos fosse dada.

 

Depois da cerimônia, as longas mesas foram postas. Frutas e carnes suculentas, queijos temperados e vinhos envelhecidos mais do que a maioria dos convidados. Todos brindavam, cantavam, alguns falsos, outros bêbados de verdade. Conselheiros brindavam alianças que não compreendiam. Nobres riam alto demais para esconder o desconforto de dividir o salão com bárbaros. Korgun gargalhava mais do que devia, como um urso satisfeito entre caçadores domésticos.

 

Meu pai era um espetáculo à parte, provocando o rei Aldren sem nem disfarçar. E Aldren… se segurava por um fio. Havia tensão em seus olhos, nos punhos apertados, no sorriso que tremia.

 

E em meio a tudo isso… ela.

 

Maeryn dançava com a irmã e outras damas, girava leve, como se aquele ouro que vestia flutuasse em volta do corpo. Mas sempre que podia, seus olhos voltavam pra mim.

Olhos de desejo.

De ausência de medo.

De promessas sussurradas que eu ouviria mais tarde. 

 

 

 

Ela dançava como se o mundo fosse dela.

 

Como se o salão, as colunas douradas, as tapeçarias antigas, os músicos cansados e os copos cheios tivessem sido criados apenas para servi-la. Maeryn girava ao som da música com uma graça que era só dela, os cabelos loiros presos com fios de prata, a pele reluzente sob a luz quente das tochas, e aquele maldito vestido dourado que grudava no corpo como pecado disfarçado.

 

Ela não me olhava sempre. Só quando sabia que eu estava olhando.

E eu sempre estava.

 

Quando nossos olhos se encontravam, o mundo sumia por um segundo. Os risos, os brindes, os passos de dança, até mesmo a dor que insistia em me lembrar que eu ainda estava viva, tudo se apagava.

 

Ficava só ela.

E a promessa nos olhos.

Não havia medo neles.

Havia convite.

 

Tomei mais um gole de vinho só para disfarçar o calor. Ela sabia o que estava fazendo. Dançava demais, ria alto demais, e deixava o corpo inclinar sutilmente na direção errada toda vez que girava. Era como se dançasse comigo e com o salão ao mesmo tempo. Mas era para mim que ela sorria no fim de cada volta. Como se dissesse: “Espere.”

 

E eu esperei.

 

Esperei até vê-la deslizar para longe, sorrateira, fingindo que ia só respirar. Fingindo que era apenas uma dama fugindo do calor e da falsidade.

 

Eu fui atrás.

 

As sombras do corredor lateral nos envolveram com gosto. O som abafado da festa ainda podia ser ouvido, mas ali não havia ninguém. Só nós. As paredes cobertas de tapeçaria abafavam as vozes, mas não o sangue correndo veloz nas veias.

 

Ela se virou para mim com aquele olhar que dizia tudo sem precisar abrir a boca.

Queria ser pega.

Dominada.

Provada.

 

Não hesitei.

 

Acertei as costas dela contra a parede com um baque surdo, e ela arfou, mas não protestou. Muito pelo contrário: os olhos dela ardiam em desafio e desejo.

 

Minha mão subiu pela curva do seu corpo, agarrou sua cintura, depois seu pescoço, e a puxei mais para mim. Meus lábios tomaram os dela com urgência, com fúria, com a sede de quem passou tempo demais se contendo. Ela gem*u contra minha boca e se agarrou aos meus ombros como se me quisesse dentro dela naquele instante.

 

O vestido de ouro chiava sob minhas mãos, como se soubesse que eu ia rasgá-lo.

 

E eu ia.

 

Queria despir cada camada daquele tecido maldito, morder cada centímetro de pele que ele escondia, deixar nela as marcas que só nós entenderíamos. Minhas mãos desceram com voracidade, e ela arqueou o corpo contra o meu, o pescoço exposto, os lábios entreabertos, os olhos fechados como se estivesse rezando.

 

Ou pecando.

 

 

(Maeryn) — Faz… — ela murmurou, entre um suspiro e um riso. — Faz o que veio fazer, Varka.

 

 

E eu fiz.

 

A boca colada ao pescoço dela, a mordida certeira, os dedos enfiando-se por entre os tecidos, o corpo dela se rendendo, as pernas entreabertas e o som abafado dos nossos movimentos. Eu não me importava se alguém passasse por ali. Queria que ouvissem. Que soubessem.

 

Ela era minha.

 

A respiração dela era quente contra meu ouvido, e cada vez que Maeryn mordia meu lóbulo ou me sussurrava obscenidades, era como se ateasse fogo ao meu sangue. Estávamos num dos corredores do palácio, atrás de uma tapeçaria espessa que balançava levemente com a corrente de ar, se alguém passasse a poucos passos, ouviria. Veria, até. Mas ela não parecia se importar. E eu… eu queria que vissem.

 

Ela me puxou pela gola, me jogando contra a parede com uma força inesperada. O olhar carregado de luxúria, a boca vermelha entreaberta, e aquele sorriso, aquele maldito sorriso de quem sabia exatamente o que fazia comigo.

 

As mãos dela invadiram minhas roupas, como se rasgassem caminho até minha pele. Minhas próprias mãos apertavam suas coxas, puxando-a para cima, encaixando-a contra mim com desespero. O vestido subia com facilidade, as pernas nuas me enlaçando, e ela se esfregava contra minha coxa, ofegante, o rosto enterrado no meu pescoço.

 

 

(Maeryn) — Vai me foder aqui mesmo? — ela rosnou entre os dentes. — Diante dos conselheiros? Dos criados? Como uma puta?

 

 

Eu quase gemi. Quase. Em vez disso, a ergui com mais força e a empurrei contra a pedra fria da parede. Ela arqueou o corpo, jogando a cabeça para trás, e aproveitei para morder sua garganta. Forte. O gosto dela era salgado e quente e feroz.

 

A tapeçaria atrás de nós balançava, como se tremesse junto com nossos movimentos. O som abafado dos quadris se chocando, da respiração entrecortada, dos gemidos que ela tentava, e falhava em conter, tornavam tudo mais insano. Meus dedos enfiav*m-se com brutalidade entre as pernas dela, sentindo o calor escorrer, e ela me arranhava as costas, me marcava, me cravava com unhas e palavras sujas.

 

 

(Maeryn) — Mais forte, Varka. É só isso que você sabe fazer direito, não é? Me faz esquecer sou uma princesa.

 

 

Ela ria, gemia, e me batia no ombro quando eu diminuía o ritmo, só para me provocar mais. Eu a queria submissa, mas ela me instigava a cada segundo a ser ainda mais selvagem, mais rápida, mais dela.

 

Ali, com o risco nos rondando, com o mundo girando além daquela parede fina, eu a possuí como se fosse a última vez. Como se o palácio fosse ruir a qualquer instante. Como se nossos corpos tivessem nascido pra aquilo, pra colisão, pra fúria, pro prazer que quase doía de tão urgente.

 

Quando ela gozou, foi me mordendo, sufocando o grito no meu ombro. E quando eu a segui, tremendo, com as pernas dela ainda prendendo meu corpo, entendi, ela podia fingir que era princesa, que era dama, que era feita de ouro e promessas. Mas ali, comigo, era só minha mulher.

 

Minha Maeryn.

 

Meu caos.

 

Meu vício.

 

 

 

 

 

 

Maeryn desmontou de mim com um suspiro vitorioso e aquele maldito sorriso maldoso nos lábios, os cabelos desgrenhados, a pele vermelha nas bochechas e no pescoço, as marcas dos meus dentes visíveis como troféus. Ela puxou o vestido pra baixo com um movimento displicente, tentou recompor a aparência com as mãos ainda trêmulas e passou por mim como se nada tivesse acontecido.

 

Como se não tivesse acabado de me deixar ali, encostada contra a parede de pedra, ofegante, com o gosto dela nos dedos e o cheiro de nós duas impregnado na roupa.

 

Fiquei um instante sozinha, ouvindo os sons distantes da cerimônia, o riso alto vindo do salão principal, o tilintar de taças e os passos apressados de criados tentando manter o caos disfarçado de festa.

 

Levei os dedos à boca e provei seu gosto, lenta, saboreando como quem conhece um segredo perigoso. Um segredo doce e sujo. Sorri. Quase ri.

 

Quando voltei ao salão, a cerimônia já estava praticamente encerrada. Os noivos tinham sumido, consumar, fingir amor ou se odiarem em silêncio, tanto fazia. Os convidados estavam espalhados, muitos embriagados demais para notar qualquer coisa além de suas próprias taças. O trono do rei parecia mais um posto de observação para um velho cansado e irritadiço. Aldren, meio largado sobre os apoios, segurava uma caneca como se ela fosse o único motivo para ele ainda estar ali. As vestes desalinhadas, os olhos vermelhos e os dentes à mostra entre uma risada bêbada e uma maldição.

 

Meu pai estava de pé perto dele, rindo alto das próprias piadas, zombando de algum duque suado que mal conseguia manter os olhos abertos. Os nobres ao redor gargalhavam, bajuladores e patéticos, fingindo camaradagem enquanto mediam uns aos outros com olhos de espada embainhada.

 

Eu passei por entre eles como um fantasma. Ninguém me deteve. Apenas apanhei uma taça da mesa, vinho forte, quase azedo e me encostei a uma das colunas do salão, de onde podia observar tudo sem ser puxada para dentro daquele teatro de cortesia.

 

Foi então que senti a presença antes mesmo de vê-lo.

 

Corwin.

 

Ele surgiu ao meu lado como sempre fazia, sorrindo demais. Um lobo entediado, cheio de charme venenoso e olhos aguçados.

 

 

(Corwin) — Sujou-se, Varka — comentou, a voz baixa, divertida, quase íntima. — Ou sujaram você? — Seus olhos pousaram na lateral do meu pescoço, onde o sangue seco marcava minha pele como um selo. — Hm... minha irmã tem unhas afiadas, não?

 

 

Não respondi. Apenas bebi. Mas ele se aproximou mais, inclinando-se como se fosse me contar um segredo.

 

 

(Corwin) — Espero que tenha aproveitado. — Ele sorriu, um sorriso com um pouco afeto. — Fiz de tudo para o papai não perceber a ausência da princesinha dele…

 

 

Deu dois tapinhas no meu ombro, um pouco de camaradagem, e se afastou rindo sozinho. Aquela risada me acompanhou enquanto ele sumia entre os outros nobres. 

 

 

Fiquei ali, bebendo, ainda com os dedos dormentes, o cheiro de Maeryn na pele, e o gosto do perigo no ar.

 

 

 

 

 

 

 

A noite caiu com peso. Não aquela calmaria morna de um fim de dia qualquer, mas a escuridão densa que chega depois de muitas máscaras, risos falsos e taças demais. O cansaço bateu de uma vez quando cruzei as portas dos meus aposentos. O corpo doía, não só dos últimos dias, mas da tensão constante, da necessidade de estar alerta mesmo enquanto me despia.

 

A festa deixara os salões num estado de delírio, música alta demais, risos gritados, servos tropeçando em restos de banquete. Mas aqui, no meu quarto, o silêncio era espesso. Quase confortável.

 

Deixei as armas no aparador, tirei as roupas com vagar e me afundei na banheira quente. A água queimava a pele marcada, mas era uma dor boa, que puxava pra longe o resto do mundo. Fechei os olhos por longos minutos, tentando desacelerar.

 

Depois, uma túnica leve, qualquer uma. O cabelo ainda úmido solto nas costas. Deitei de lado, pronta pra dormir como uma pedra. E foi só então que a porta se abriu.

 

O som do trinco girando me fez erguer o tronco de imediato, instintivamente pronta para reagir. Mas foi a silhueta familiar que cruzou o quarto com passos rápidos, decididos, que me tirou o fôlego mais do que qualquer ameaça.

 

Maeryn.

 

Camisola fina, quase transparente com a luz do luar atravessando o tecido, e uma capa sobre os ombros, que ela jogou no chão sem cerimônia assim que fechou a porta atrás de si. Trancou, com o cuidado de quem sabia o que fazia. Os cabelos molhados colavam-se à pele do pescoço, escorrendo gotas que brilhavam sob a luz. Ela atravessou o quarto como se tivesse sido chamada, como se pertencesse àquele espaço.

 

E antes que eu dissesse uma palavra, já estava em cima de mim.

 

Como uma gata faminta. Ronronando e provocando. As mãos deslizando pela minha túnica, os lábios encontrando os meus com uma urgência que já me era conhecida. Fiquei ali, sob o peso do corpo dela, tentando encontrar ar, tentando recuperar algum controle que ela arrancava toda vez que aparecia.

 

 

(Varka) — Você ficou louca? — murmurei, entre beijos, entre mordidas. — Isso é perigoso, Maeryn.

 

 

Ela riu contra a minha boca. Um riso abafado, carregado de desejo e ironia.

 

 

(Maeryn) — E você ainda se importa com isso?

 

 

Sua voz era mel e veneno. Suas mãos me rasgavam a calma, me puxavam de volta pra tempestade. Ela empurrou minha túnica pra cima com os joelhos, encaixando o corpo entre minhas coxas, me prendendo com o quadril e os olhos.

 

 

(Maeryn) — Ainda tem meu gosto na boca, Varka? — sussurrou, mordendo meu queixo. — Porque eu quero sentir o seu de novo. Agora.

 

 

Não era mais um jogo. Não era só prazer.

 

Ela me queria como se quisesse se destruir. Como se estivesse em chamas por dentro e só meu corpo fosse capaz de apagá-la. Ou alimentá-la ainda mais.

 

Me rendi.

 

Puxei-a pelos quadris, beijei seu pescoço com fúria e deixei que ela me devorasse ali, como quem sabe que a manhã trará consequências. Mas que, por enquanto, só importa o calor. O cheiro. O gosto.

 

Ela me comeu com os olhos, com a boca, com os dedos, sem medo, sem pausa, sem piedade. E eu a recebi com a mesma fome que ela tinha, com o mesmo desesper

o de quem sabe que está perdendo o controle. De novo.

 

Mas não conseguia parar.

 

Não queria parar.

 

Porque mesmo com todos os riscos, todas as juras de que isso devia acabar… ela estava ali.

 

Na minha cama.

 

Na minha pele.

 

E eu era completamente dela.

 

 

mesmo amor nascido em terreno de guerra.

 

Talvez o amanhã trouxesse escolhas difíceis. Talvez ela não viesse comigo. Talvez Skarn fosse longe demais. Mas, naquela noite, ela estava ali. E isso era tudo. Tudo que eu precisava para continuar lutando.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fim do capítulo


Comentar este capítulo:
[Faça o login para poder comentar]
  • Capítulo anterior
  • Próximo capítulo

Comentários para 13 - Capitulo 13:

Sem comentários

Informar violação das regras

Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:

Logo

Lettera é um projeto de Cristiane Schwinden

E-mail: contato@projetolettera.com.br

Todas as histórias deste site e os comentários dos leitores sao de inteira responsabilidade de seus autores.

Sua conta

  • Login
  • Esqueci a senha
  • Cadastre-se
  • Logout

Navegue

  • Home
  • Recentes
  • Finalizadas
  • Ranking
  • Autores
  • Membros
  • Promoções
  • Regras
  • Ajuda
  • Quem Somos
  • Como doar
  • Loja / Livros
  • Notícias
  • Fale Conosco
© Desenvolvido por Cristiane Schwinden - Porttal Web