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Dois Reinos por Natalia S Silva

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Palavras: 6763
Acessos: 684   |  Postado em: 16/08/2025

Capitulo 11

Maeryn 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Chorar daquele jeito… foi como afundar num rio gelado depois de passar dias queimando viva. Eu não queria. Não planejei. Mas meu corpo já não obedecia mais à minha vaidade. Meus ossos tremiam, minha garganta doía e os soluços vinham em ondas, como se a dor, acumulada por dias, semanas, anos, finalmente tivesse decidido que não cabia mais dentro de mim.

 

E ali, na cama da casa de uma estranha, longe de tudo o que conheço, chorei. Por mim. Por ela. Pelo que fomos e pelo que nunca seríamos.

 

A ouvi se mover, hesitante. Passos lentos, arrastados. Sabia que ela estava ferida, o corpo dela falava mesmo quando a boca se calava. O som de sua respiração cortada, o leve ranger da madeira sob suas botas pesadas.

E então, a sombra dela me envolveu. Abri os olhos e lá estava ela. Diante de mim.

 

Varka não dizia nada. Nunca soube usar palavras. E agora, ali, parecia ainda mais deslocada. Como se estivesse diante de algo precioso demais para tocar, mesmo sendo a causa do estrago. A expressão dela era dura, contida, como se estivesse amarrando cada emoção por dentro.

 

Se ajoelhou com dificuldade. Vi o esforço em seus ombros, nos punhos cerrados sobre as coxas. Estava na minha frente, mas ainda parecia longe.

Até que estendeu a mão.

 

Um toque leve. Quase sem contato.

Seus dedos roçaram meu braço, como se pedissem permissão, como se temessem quebrar o pouco que ainda restava de mim.

 

 

(Varka) — Partimos ao amanhecer — ela disse, a voz rouca, sem firmeza. — Para Valmont. Sua casa. Sua família.

 

 

Fechei os olhos. A notícia me atingiu com um calor estranho no peito. Era o que eu queria. Estar segura. Ver meu pai. Voltar ao que me era familiar.

Mas…

Mas eu também sabia que Varka era boa em ir embora. Boa em desaparecer.

 

 

(Maeryn) — E você? — perguntei, sem encará-la. — Vai comigo? Ou vai me deixar com outros, como da última vez?

 

 

Ela respirou fundo. O silêncio que se seguiu foi mais duro do que qualquer resposta. Eu continuei:

 

 

(Maeryn) — Você me entregou como quem se livra de um fardo. Nem olhou pra trás. Eu não suporto a ideia de ser mandada embora por você de novo. Não com outros. Não como uma prisioneira.

 

 

Ela não respondeu de imediato. Só me olhava. Olhava como se me visse pela primeira vez.

 

 

(Varka) — Se perder você for inevitável. Eu prefiro fazer isso pelas minhas mãos do que pelas mãos da guerra.

 

 

Senti meu coração se apertar. Tão covarde. Tão cruel. Mas também tão humano.

 

Levantei o rosto. Nossos olhos se encontraram. Havia tanta coisa ali, no olhar dela. Dor. Vergonha. Culpa. E… outra coisa. Algo que ela nunca dizia, mas que morava no silêncio entre nós.

 

 

(Maeryn) — Você não sabe como usar as palavras.

 

 

(Varka) — Não. — Ela assentiu. 

 

 

Meu peito afundou.

 

A mão dela ainda estava ali, trêmula, esperando. E pela primeira vez desde que tudo começou, não havia ordem, nem guerra, nem orgulho entre nós. Apenas duas mulheres quebradas tentando entender o que fazer com o que ainda restava.

 

Aproximei meu corpo do dela. Devagar. Sentindo a dor recuar só um pouco, só o suficiente. Encostei minha testa na dela, respirando junto, como quem ainda se lembra que está viva.

 

 

(Maeryn) — Se for me deixar, faça de uma vez.

 

 

Ela fechou os olhos.

 

 

 

O silêncio entre nós era como um fio esticado demais, prestes a arrebentar. Sentia sua respiração contra meu rosto, quente e irregular. O cheiro da estrada ainda colava nela, suor, sangue, terra. Mas por baixo disso havia algo inconfundível. A presença dela. O calor bruto. Aquela força selvagem que me fazia odiá-la e desejá-la na mesma medida.

 

Varka não disse mais nada.

 

Apenas se moveu.

 

E mesmo ferida, mesmo mancando, mesmo tremendo... ela me agarrou como sempre fazia. Com aquela urgência que não pedia permissão, que não sabia ser delicada, mas que, dessa vez, tentou. Eu senti nos dedos dela a hesitação. O controle imposto à força. Como se cada gesto dissesse: “eu não quero te machucar”

 

Mas ela me machucava.

 

Não com as mãos, com a lembrança.

Com tudo o que não disse.

Com tudo o que foi embora.

 

Tentei resistir. Por orgulho. Por raiva. Por memória.

Por Rinna.

 

A imagem das duas voltou como veneno. A forma como ela falava com ela. Como a olhava. O que fizeram. O que dividiram. Uma raiva surda me subiu como ferro quente no estômago.

 

Você se entregou a ela… e me mandou embora como um peso.

Eu queria dizer isso.

Queria cuspir.

 

Mas Varka estava ali. Os olhos colados nos meus. O corpo, mesmo ferido, pressionando o meu com precisão, firmeza, calor.

E, de novo, eu me desfazia.

 

Não consegui manter a barreira. Minha raiva virou desejo em segundos. Desejo contido, que doía. Que ardia. Que me fazia querer devolver nela cada pedaço do que senti. Não de forma doce. De forma crua. Real.

 

 

(Maeryn) — Você não tem o direito — murmurei contra a boca dela, com os dentes à mostra. — Não depois do que fez.

 

 

Ela encostou a testa na minha, ofegante.

 

 

(Varka) — Não tenho. Mas mesmo assim… estou aqui.

 

 

E então me puxou.

 

A respiração dela se misturou à minha. Os lábios não eram suaves. Eram tensos, quentes, e tinham gosto de estrada e desespero. Os dedos dela passaram pela minha cintura como se procurassem algo conhecido. Cada parte de mim que ela tocava reacendia memórias que eu tentei enterrar.

 

Ela sabia me possuir. Mesmo sem prometer nada. Mesmo errando.

 

E eu a desejei com raiva. Com raiva de mim. Dela. De tudo.

 

Quando minhas mãos se moveram por baixo da camisa dela, senti a faixa apertada no abdômen. O calor do ferimento latej*v* ali. O corpo dela pulsava como algo prestes a se romper. Ela estremeceu ao meu toque, mas não recuou. Quis protegê-la, e quis machucá-la também, como ela havia feito comigo.

 

 

Parei. Olhei nos olhos dela.

 

 

(Maeryn) — Você pensa nela ainda? — soltei. — Rinna?

 

 

A mandíbula dela se travou.

 

 

(Varka) — Não.

 

 

(Maeryn) — Mente pior do que ama.

 

 

Ela não respondeu.

 

Mas me puxou com mais força, um gesto bruto, desesperado, como quem tenta calar com o corpo aquilo que não consegue justificar com a boca. Eu senti quando ela prendeu a respiração. O leve gemido que escapou da garganta dela quando nossos corpos se encontraram novamente foi mais agudo dessa vez, não só pelo desejo, mas pela dor. A ferida reaberta. A carne protestando. Mas ela não parou.

 

E eu… eu também não.

 

Por um segundo, pensei em recuar. Pensei em deixar que a dor dela falasse mais alto, que a raiva me afastasse, que o nome Rinna nos separasse como uma lâmina invisível entre nós.

 

Mas não consegui.

 

O calor de Varka era como fogo demais em noite fria. Como água depois de uma longa marcha no deserto. E mesmo ferida, mesmo tremendo, mesmo me confundindo com suas ausências e silêncios, era nela que eu me encontrava. Era ali que eu me perdia.

 

As mãos dela me agarraram como se o mundo fosse desabar naquela mesma hora. Desajeitada, hesitante, mas ainda assim intensa. Seus dedos passaram pelas minhas costas, pela base da minha nuca, e pararam ali, apertando, puxando, tentando dizer sem dizer: "me perdoa, me esquece, me toma."

 

Ela respirava entrecortado, arfando contra minha pele, e havia algo desesperado naquele toque. Algo que misturava necessidade e culpa. Eu sabia que ela sentia. Sabia que aquilo, por mais que tentasse esconder, era tudo pra ela também. Mas não era justo. Não depois de tudo.

 

E foi aí que a raiva voltou.

 

 

(Maeryn) — Você quis ela. Você a tocou. — minha voz saiu entre os dentes, dura, baixa, ácida.

 

 

Ela parou. Os olhos encontraram os meus, escuros, confusos, cravados como se pudessem pedir perdão sem usar som algum.

 

 

(Maeryn) — Mas é a mim que volta, não é? — continuei, minha boca quase colada na dela. — É a mim que procura quando está quebrada.

 

 

Ela apertou os olhos. Não suportava ouvir.

 

 

(Maeryn) — Porque você me quer mais do que sabe lidar. E isso te assusta, Varka.

 

 

A mão dela me segurou mais forte, e dessa vez foi ela quem falou.

 

 

(Varka) — Sim. — Um sussurro. Um soco no estômago.

 

 

E então ela me beijou.

Sem sutileza. Sem controle.

Com gosto de sangue e arrependimento.

Com peso de tudo o que fomos e não conseguimos ser.

 

O beijo dela era cheio de dor.

E de desejo.

Ela me beijava como quem se afoga. Como quem tenta cravar na memória o que sabe que vai perder.

 

Senti seus dedos tremerem ao deslizarem pela minha cintura. A respiração entrecortada. Os gemidos que escapavam quando eu retribuía. Ela tentava ser cuidadosa, tentava controlar a força, mas às vezes falhava, e quando falhava, tremia de dor. Eu a segurava então, obrigando-a a respirar, a desacelerar, a lembrar que ainda estava viva. Que nós estávamos.

 

Meu corpo gritava por ela. E eu cedia, não por fraqueza, mas por verdade.

Porque meu orgulho doía, mas não mais que a ausência dela.

 

E enquanto a pele dela roçava a minha, quente, machucada, eu sentia tudo:

Raiva, desejo, saudade, medo, amor.

E o medo de amar mais do que eu podia suportar.

 

 

 

Mas o toque que veio depois não foi mais o de quem tenta consolar.

Foi o de quem exige.

O de quem arde por dentro, de quem sangra por fora, de quem já não distingue dor de prazer.

 

Desci as mãos com mais força do que devia, com mais raiva do que queria admitir, raiva dela, de mim, do que nos tornamos.

Raiva por ainda querer tanto.

Os dedos escorregaram pela pele quente e marcada, contornando cicatrizes novas e antigas, queimaduras ainda sensíveis. Ela estremeceu. Não de prazer. De dor.

 

 

(Varka) — Maeryn…

 

 

A voz dela falhou como um fiapo de vento prestes a apagar a última chama de uma vela.

 

 

(Maeryn) — Cala a boca. — foi tudo o que consegui dizer. Porque se ela falasse mais uma vez com aquela voz de quem pede desculpas por existir, eu cederia por pena. E essa noite não havia espaço pra pena.

 

 

Apoiei meu peso sobre ela, sentindo o corpo rígido, os músculos tensos, trêmulos, vivos.

Ela arfou quando beijei seu pescoço, contornando a curva do maxilar até o ombro machucado. O gosto de pomada amarga e de suor. Eu beijei mesmo assim.

Eu queria marcar.

Queria que ela lembrasse no dia seguinte, quando acordasse no meio da dor, que fui eu quem esteve ali. Que sempre fui eu.

 

Minhas mãos deslizaram até os quadris dela, e ela arqueou o corpo contra o meu, reagindo com mais força do que devia. Os dedos dela voltaram para minha cintura, subindo pelas minhas costas. E quando se prenderam na minha nuca de novo, puxando com desespero, eu soube que ela ainda me queria mais do que podia suportar.

 

E eu a queria do mesmo jeito.

 

Me ajeitei por cima dela, tentando encontrar um jeito de tocá-la sem machucá-la mais do que já estava. Mas era impossível. Os curativos cobriam parte do abdômen, e a pele em carne viva nos flancos me obrigava a frear a mão.

 

 

(Maeryn) — Você devia estar descansando. — falei, rouca, contra a pele do peito dela, sentindo o coração disparado. — Mas não consegue me deixar em paz, consegue?

 

 

Ela sorriu. Um sorriso ferido. Como se dissesse “você também não”.

 

 

Passei os dedos pela lateral do corpo dela, firme, lenta, traçando a linha do quadril até a coxa com reverência e raiva.

Ela gem*u baixo, contido, tentando esconder a dor.

Mas eu sentia.

Eu sentia tudo nela. O calor, o tremor, a tensão.

 

Aproximei meus lábios do ouvido dela, a respiração em brasa.

 

 

(Maeryn) — Ainda sente ela? — provoquei.

Ela travou.

 

 

(Maeryn) — Quando me toca… ainda pensa nela?

 

 

Os olhos dela se fecharam com força, como se as palavras fossem lâminas, e talvez fossem.

Mas eu precisava ferir.

Precisava devolver.

Porque por mais que a quisesse, o gosto do abandono ainda queimava na minha língua.

 

Ela não respondeu. Só me puxou com mais força, o que foi idiota, porque gem*u de dor logo em seguida.

E foi aí que eu perdi o controle.

 

Beijei-a como se estivesse em guerra com o mundo.

Como se tudo o que sentia tivesse que sair pela boca, pela pele, pela força dos meus dedos cravando nos quadris dela.

Ela arfava. Tentava acompanhar. Tentava fingir que não doía. Mas eu via os olhos marejados.

E mesmo assim, ela não dizia para parar.

 

Eu a empurrei um pouco, fazendo-a deitar melhor sobre as almofadas.

Subi devagar, montando sobre o quadril dela, sentindo seu corpo ferido se moldar sob o meu.

As mãos dela vinham até minhas coxas, subindo com urgência. Mas logo voltavam a tremer.

 

 

(Maeryn) — Não precisa fingir força.

 

 

(Varka) — Não tô fingindo.

 

 

(Maeryn) — Tá, sim. Tá fingindo que não sente. Que não ama. Que não me destruiu.

 

 

Ela apertou os olhos de novo. A dor era visível. Mas não era mais só física.

 

Inclinei o corpo, os cabelos escorrendo sobre o rosto dela, e beijei sua boca com um misto de carinho e crueldade.

Ela retribuiu com fome, com culpa, com saudade.

As línguas se encontraram com mais fúria do que ternura.

E eu me perdi ali.

No gosto, no som, na maldita certeza de que, apesar de tudo, era nela que eu morava.

 

E mesmo quando as lágrimas começaram a escapar, minhas, não dela, mesmo quando minha raiva começou a desmoronar por dentro, mesmo quando a lembrança dela com outra ainda ardia sob a pele, eu continuei.

Porque havia algo em nós que nem a dor conseguia destruir.

 

E se fosse pra me queimar, que fosse no calor dela.

Se fosse pra me perder, que fosse entre os braços que me feriram, mas também me salvaram.

 

 

 

Eu a queria.

Com tudo o que havia em mim. Com tudo o que sangrava. Com tudo o que já havia quebrado.

 

O gosto dela ainda estava na minha boca, e era como fel e fogo.

O calor sob minha pele não vinha só do desejo, vinha da mágoa acumulada, da espera silenciosa, da ausência que ela me obrigou a engolir cada vez que virou as costas.

Mas ali, debaixo de mim, gem*ndo baixo, lutando contra a dor do corpo ferido e da alma despedaçada, ela era só minha.

 

Inclinei-me mais, a respiração dela roçando no meu queixo, quente, irregular.

Desci a mão pelo ventre, sobre as ataduras. Ela estremeceu, arfou.

Parei. O coração batia como um tambor de guerra, descompassado.

Ela olhou pra mim, os olhos ardendo. Não havia culpa ali agora. Nem arrependimento.

Havia fome.

 

E eu me rendi.

 

 

(Maeryn) — Me diz que sou eu. — sussurrei, os lábios quase encostando nos dela.

Ela não respondeu. Só me puxou pela nuca e me beijou como se dissesse com a língua aquilo que não conseguia dizer com palavras.

 

 

Era eu.

Sempre fui eu.

 

Meus quadris pressionaram os dela, os movimentos lentos, controlados, tentando evitar os pontos mais sensíveis. Mas ela não queria delicadeza.

Ela se arqueava contra mim, os olhos fechados, os dentes presos no próprio lábio.

 

Minhas mãos, antes hesitantes, agora exploravam sem perdão.

O contorno dos seios, as cicatrizes que cortavam o abdômen, a lateral das costelas onde as queimaduras ainda ardiam sob os curativos.

Eu sentia cada contração involuntária, cada estremecer, e mesmo assim… eu não parava.

 

Porque ela precisava sentir.

Precisava saber.

Precisava lembrar de quem era o corpo que ela abandonou.

E de quem era o corpo que agora ela implorava, mesmo sem voz.

 

Desci a boca pelo pescoço dela, mordiscando, marcando.

Ela gem*u baixo, me puxando mais, mesmo com a dor evidente.

As unhas cravaram levemente em minha pele, e aquilo me incendiou.

 

 

(Maeryn) — Você não vai fugir de novo. — sussurrei, feroz, contra o peito dela.

 

 

(Varka) — Não posso… — a voz era um soluço preso.

 

 

Ela tremia.

Mas não era só o corpo.

Era o medo. O amor. A entrega.

E eu também tremia.

 

Levei as mãos até suas coxas, abrindo espaço com cuidado. A pele marcada, os hematomas ainda recentes.

Ela arfou alto, os olhos arregalados de desejo e dor.

 

 

(Maeryn) — Me deixa cuidar de você… do meu jeito.

 

 

Ela assentiu. Um aceno fraco, desesperado.

E eu fui.

Fui inteira.

 

Cada movimento meu era uma confissão.

Cada toque, um grito.

Beijei cada parte dela como se estivesse selando promessas antigas, como se minha boca pudesse apagar as cicatrizes, as traições, as ausências.

 

Ela se contorcia, se desfazia, se abria inteira debaixo de mim.

Gemia meu nome como se fosse a última palavra do mundo.

E talvez fosse.

Talvez fôssemos só isso, dois corpos tentando apagar as dores uma da outra na pele.

 

E quando ela veio contra mim, arqueando as costas, tremendo inteira, mordendo o meu ombro pra não gritar, eu soube:

Ela ainda era minha.

 

E eu era dela.

 

Mesmo quando isso nos destruía.

Mesmo quando doía mais do que qualquer ferida aberta.

Mesmo quando, depois, no silêncio pesado do quarto, tudo o que restaria seriam nossos corpos suados, ofegantes, abraçados demais pra fugir, mas distantes demais pra durar.

 

 

 

 

 

 

 

 

Ela se moveu.

 

Com esforço, com dor, com raiva de si mesma, do mundo, de tudo que nos afastou. Mas se moveu.

E quando o corpo dela virou o meu, com as mãos ainda trêmulas, com os músculos latejando sob a pele ferida, algo dentro de mim estilhaçou.

 

Ela me tomou.

 

Sem pedir.

Sem desculpas.

Sem medo.

 

Como quem reclama o que sempre foi seu.

 

O hálito quente soprou contra meu pescoço antes que os dentes cravassem de leve, me arrancando um gemido baixo, embriagado.

As mãos dela agarraram meus pulsos, prendendo-os contra o colchão, e eu nem lutei.

Não porque estivesse rendida, mas porque desejava aquilo, ser domada por aquela fúria que vinha de dentro dela, por aquela fome antiga, carregada de amor e arrependimento.

 

Ela me olhou de cima, os cabelos caindo em mechas coladas de suor, os olhos azuis ardendo como brasa prestes a consumir o último pedaço do que éramos.

O sangue começava a brotar, sutil, pelas ataduras em sua cintura.

Mas ela não parava.

 

 

(Varka) — Não me impede. — sussurrou, com a voz rouca, cravada de urgência.

 

 

E eu não impediria.

Nem que quisesse.

Nem que fosse o fim do mundo.

 

Ela desceu a boca até minha clavícula, beijando, sugando, mordendo.

Deixando marcas porque era o que sabia fazer.

Era assim que ela amava: na brutalidade de quem não aprendeu a ter, só a sobreviver.

 

Os dedos dela deslizaram pelas minhas costelas, fortes, firmes, os calos raspando na minha pele como pequenas faíscas.

A dor vinha misturada com prazer.

E o prazer vinha sujo, urgente, sem cuidado.

 

Ela me devorava.

 

Como quem quer esquecer tudo que causou.

Como quem tenta se redimir com o corpo.

Como quem implora, em silêncio, pra que eu não vá embora, mesmo que seja ela quem sempre parte.

 

Meu quadril reagia a cada investida desajeitada, e eu sentia o peso dela sobre mim, o calor que escorria entre nós.

A respiração arfante, os gemidos entrecortados, os beijos pesados.

 

Ela me beijava como se fosse morrer amanhã.

E talvez fosse.

Talvez nós duas fôssemos.

 

 

(Maeryn) — Você tá sangrando… — tentei dizer, entre beijos, entre suspiros, entre a lucidez que escapava pelas bordas.

 

 

Ela cravou os olhos nos meus.

Os dentes cerrados, os músculos contraídos, as mãos apertando minhas coxas como se fossem âncoras.

 

 

(Varka) — Deixa sangrar…

 

 

E então mergulhou.

Funda.

Violenta.

Cravando a alma dela dentro de mim como se fosse a única forma de continuar viva.

 

Eu gritei.

Não de dor.

De tudo.

De mim.

 

Minhas costas se arqueavam, o corpo se entregava inteiro, e ela me acompanhava com aquele olhar selvagem, como quem estava à beira do colapso e mesmo assim seguia, porque não sabia amar de outro jeito.

 

O quarto se encheu de suspiros e tremores, de nossos nomes sussurrados entre beijos, de promessas não ditas, de mágoas que ainda doíam, mas que, por um instante, não importavam.

 

Ela era guerra.

E eu fui campo aberto.

 

E quando o corpo dela desabou sobre o meu, quente, trêmulo, úmido de suor e sangue, eu a abracei. Forte.

Mesmo com a raiva, mesmo com a dor, mesmo sabendo que nada daquilo bastava.

 

Porque ali, no meio do caos, ela ainda era o meu lugar.

E eu ainda era o dela.

 

Mesmo que só por aquela noite.

Mesmo que só até sangrar tudo outra vez.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Varka

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O céu começava a clarear com aquele tom pálido e indeciso de um dia que não sabe se vem com sol ou chuva. A bruma rastejava entre as árvores como um segredo velho demais pra ser desenterrado. Eu já estava de pé fazia tempo.

 

Vestida com calma, os movimentos cuidadosos, mesmo quando cada gesto doía, uma lembrança viva do que enfrentei, do que perdi, do que sobrevivi. O corpo gritava, mas eu aprendi a ignorar o grito.

 

As ataduras estavam manchadas. Um pouco de sangue havia voltado durante a noite, esforço demais, entrega demais.

Mas eu não me arrependia.

 

Olhei por sobre o ombro.

Maeryn ainda dormia.

 

A luz tocava o rosto dela aos poucos, revelando o desenho suave da boca, as marcas deixadas por mim no pescoço, os cabelos espalhados como brasas negras sobre o tecido claro.

Ela era linda.

Linda de um jeito que me fazia querer fugir e ficar ao mesmo tempo.

O lençol descia pela curva dos ombros, e eu precisei me forçar a desviar o olhar.

 

Fui até a mesa, bebi um pouco de chá velho, rasguei um pedaço de pão duro.

O gosto era nada.

Tudo doía, por dentro e por fora.

 

Quando ela acordou, os olhos demoraram um instante pra focar em mim.

E havia silêncio.

Aquele silêncio denso, carregado, depois de um furacão.

 

 

(Maeryn) — Já em pé?

 

 

(Varka) — Desde antes do sol.

 

 

Ela se sentou, puxando o lençol com mais pudor do que esperava.

Talvez não fosse pudor.

Talvez fosse defesa.

Talvez fosse o que restava da armadura que ela ainda tentava manter diante de mim.

 

Se vestiu sem dizer muito.

Ela olhava pra mim como quem queria perguntar algo, mas já sabia que não teria resposta.

E eu a observava como quem tenta decorar um rosto antes de uma batalha.

 

Quando saímos da cabana, o ar da manhã era mais frio do que eu lembrava.

Os cavalos estavam prontos, os guerreiros também.

Estavam montados, os olhos atentos a tudo.

 

E ela estava lá.

 

Rinna.

 

De pé, perto da cerca de pedras, onde as hortas da mãe dela costumavam crescer.

Vestida com roupas simples, os cabelos trançados de forma apressada, os braços cruzados sobre o peito.

 

Ela não se aproximou.

Não sorriu.

Nem pareceu surpresa por já nos ver partindo. Ela sabia que aconteceria.

 

Seus olhos vieram direto até mim.

Depois, para Maeryn.

 

E pararam ali.

 

Maeryn também a viu.

A respiração dela vacilou, mínima.

Mas vacilou.

 

Aproximamo-nos. Juntas.

Parei a um passo de Rinna.

 

Ela me estudou por um instante. Não havia ódio.

Não havia mais amor.

Só um tipo antigo de resignação.

Como quem entende que certas coisas não são dela, nunca foram e mesmo assim, ficou até o fim.

 

 

(Varka) — Obrigada. — minha voz saiu mais baixa do que eu queria.

Mas sincera.

Mais sincera do que ela merecia ouvir de mim. — Por ter cuidado dela.

 

 

Ela não respondeu. Só assentiu, uma única vez, sem tirar os olhos de Maeryn.

 

As duas ficaram ali, frente a frente.

 

Poucas palavras, nenhum sorriso.

Duas mulheres que se conheciam apenas pelo contorno de minha presença.

E que sabiam, no fundo, que eu não era boa pra nenhuma das duas.

 

 

(Maeryn) — Vai ficar aqui?

 

 

Rinna ergueu o queixo.

O silêncio respondeu por ela.

 

 

(Maeryn) — Obrigada.

 

 

Foi tudo.

 

Mas no olhar entre elas, havia mais do que a fala alcançava.

Um duelo mudo, feroz, mas silencioso.

Não de posse.

De orgulho.

De passado.

 

E eu não podia fazer nada.

Porque já tinha feito demais.

 

Voltei para o cavalo.

Maeryn me seguiu.

Montamos.

Não olhei para trás.

 

A comitiva partiu com o nascer do sol.

E eu deixei Rinna ali.

 

Firme como uma pedra.

Solitária como sempre.

E ainda assim, digna como poucas. Ela foi mais que um corpo quente em noites frias, foi amiga por tempo demais.

 

 

 

 

 

 

O caminho até Valmont foi longo, mais do que eu esperava. Os dias arrastaram-se em silêncio espesso, e o calor do verão fazia ferver até os pensamentos. Parávamos pouco, apenas o suficiente para que os animais não tombassem de exaustão. A poeira da estrada colava-se à pele, aos cabelos, e a dor constante dos ferimentos mal curados me deixava num estado de vigília, como se meu corpo se negasse a esquecer que estava vivo.

 

Maeryn e eu... não voltamos a falar da noite em que nos tocamos. Nem dos sussurros no escuro, nem dos olhares que desviamos desde então. Ela cavalgava sempre um pouco à frente ou um pouco atrás, nunca ao meu lado. Quando seus olhos encontravam os meus por acidente, eram frios, ou talvez cautelosos demais para se deixarem sentir qualquer coisa. Ainda assim, havia algo no ar entre nós, como cinzas depois do incêndio. Restos de calor que nem a distância apagava por completo.

 

Não sabíamos como as coisas estavam em Skarn. Às vezes me pegava pensando que, ao chegar, saberíamos que havia sido destruído, estava em ruínas. Um massacre. Meus irmãos mortos, Kael enterrado às pressas sob uma pilha de pedras. Mas pensar nisso era como rasgar a própria pele por dentro. Eu afastava esses pensamentos. Não havia como saber. Não até chegarmos em Valmont e saber as notícias que os corvos trouxeram.

 

Ao final do quinto dia, quando o sol já começava a cair e a luz alaranjada tingia tudo de ouro e sangue, vislumbramos enfim as muralhas altas de Valmont. Erguidas em pedra e orgulho, refletindo a luz com um brilho antigo, quase sagrado. Meus dedos se fecharam com mais força nas rédeas, o coração acelerado apesar do cansaço. 

 

Os guardas avistaram-nos de longe. Estavam armados, atentos, mas assim que seus olhos caíram sobre Maeryn, abriram passagem sem uma única palavra de contestação. Era como se a reconhecessem não apenas pelo rosto, mas pela autoridade que ela carregava nos ombros. Baixaram as lanças, inclinaram a cabeça. A filha de Valmont havia voltado.

 

Cruzamos os portões entre olhares e cochichos. Um ou outro soldado me reconheceu, vi isso na tensão dos rostos. Mesmo que eu mal me aguentasse na sela.

 

Mas o que me fez hesitar, mesmo com a visão turva, foi o som que veio da escadaria de pedra: passos apressados, um grito abafado de surpresa. Teyrion apareceu primeiro, os olhos arregalados, as mãos sujas de tinta e papel. Atrás dele, Elsera. E então o rei Aldren. Rosto duro, olhos cheios de algo que parecia medo, ou alívio, ou os dois misturados. Quando viu Maeryn, os ombros dele cederam e pela primeira vez desde que me lembro, ele pareceu um pai antes de ser rei.

 

O reencontro deles me pareceu íntimo demais para assistir. Olhei para o chão. Quando ergui o olhar de novo, Ragan surgiu pouco depois que Alric. Vinha apressado, os cabelos desalinhados pelo vento, e o olhar... o olhar dele quase me desmontou mais do que os ferimentos. Não havia nada de pose ali, nada de bravura ou fúria. Só a expressão crua de um irmão que havia temido pelo pior.

 

 

(Ragan) — Varka! — Ele me alcançou ofegante, os dedos já na minha cintura, apoiando o lado onde eu mais mancava. — Por todos os deuses... você tá viva.

 

 

Assenti, mas não consegui sorrir. Apenas me deixei conduzir. Meu corpo pesava demais, e ainda assim, me recusei a cair. Atravessamos o pátio em silêncio tenso. Os olhos de todos estavam em nós. Sabiam que algo grande havia acontecido. Algo feio. Mas ninguém ousou perguntar ainda.

 

Ragan não soltou minha cintura até cruzarmos os portões do castelo. As pedras frias sob os pés, o cheiro de óleo me atingiram como um bafo de passado. 

 

 

(Guarda) — O rei quer ver todos vocês — avisou um guarda. — No salão. Agora.

 

 

Fui levada até lá com os outros. Maeryn já havia se recomposto, andava com o queixo erguido, o cabelo preso num nó alto e prático. Ela não me olhou quando entrei, mas seus olhos me buscaram depois, discretos. Elsera se aproximou, Corwin apenas assentiu, os ombros rígidos. Alric estava à esquerda do trono, Teyrion à direita. O rei Aldren esperava em pé, as mãos cruzadas nas costas, como quem já passou noites demais sem dormir.

 

 

(Aldren) — Fechem as portas — ele ordenou assim que entramos. A madeira rangeu às nossas costas.

 

 

O salão ficou em silêncio por um momento. E então os olhos do rei recaíram sobre mim.

 

 

(Aldren) — Está de pé. Milagrosamente.

 

 

Me mantive em silêncio, não sabia o que aquelas palavras carregavam.

 

 

(Maeryn) — Deveria estar na enfermaria — disse Maeryn, cortando a distância entre nós com dois passos decididos. — Está sangrando e tremendo.

 

 

(Varka) — Isso é normal. — Tentei afastar a mão dela quando encostou na minha lateral. Doeu. Mas não reclamei.

 

 

(Maeryn) — Ela precisa de curandeiros — insistiu.

 

 

(Varka) — Depois. — Minha voz saiu mais dura do que o necessário. — Primeiro, quero saber de Skarn.

 

 

O rei me observou por um instante, como se tentasse decidir se aquilo era teimosia ou loucura. Alric trocou um olhar com Maeryn. Ela respirou fundo, e se afastou.

 

 

(Aldren) — Recebemos corvos há três dias. Três diferentes. Todos confirmam que Skarn ainda está em pé. O rei Korgun resistiu. Mas...

 

 

(Varka) — Mas? — pressionei.

 

 

(Aldren) — Sofreram perdas — completou. — Tropas invadiram por uma das passagens do norte, que julgávamos segura. Houve uma emboscada. As muralhas resistiram, mas perderam quase cem homens. Três dos conselheiros morreram.

 

 

(Varka) — E meu pai? Nossos irmãos? — Minha garganta apertou. Encarei Ragan. Estava farta de ouvir o rei. Queria saber dele.

 

 

(Ragan) — Korgun vive. Está ferido, mas se recupera. — Respondeu com calma. 

 

 

Fechei os olhos por um segundo. O peso em meu peito era tão grande que quase me derrubava. E ao mesmo tempo... um alívio tão agudo que fez doer os ossos.

 

 

Senti a aproximação de Maeryn novamente. Abri os olhos e a encarei. Estava mais próxima do que antes. Havia preocupação no modo como me observava, no franzir leve entre as sobrancelhas. 

 

 

(Maeryn) — Você deveria estar deitada, Varka — murmurou de novo.

 

 

Aldren fez um gesto com a mão, sinalizando que estava tudo bem. 

 

 

(Aldren) — Descanse, Varka. Amanhã voltamos a falar. Há decisões a tomar. O sul ainda respira, mas não por muito tempo. As curandeiras irão vê-la.

 

 

Assenti, sentindo o mundo girar levemente. E quando me virei para sair, os olhos de Maeryn ainda estavam em mim. Quentes. Guardando algo. Algo que talvez não pudesse mais ser ignorado por muito tempo.

 

 

 

Ragan me acompanhou pelos corredores de pedra, um passo atrás, mas sempre perto o suficiente para me segurar se eu caísse. 

As chamas das tochas lançavam sombras largas nas paredes e, por um momento, tudo pareceu distante, como se eu caminhasse dentro de um sonho antigo. A cada passo, o silêncio entre nós ia se preenchendo com memórias. Algumas boas. A maioria... nem tanto.

 

 

(Ragan) — Escolheram um quarto para você no andar alto — disse ele, como se fosse um aviso, ou desculpa. — Com janelas. E longe das armas.

 

 

(Varka) — Eles tem medo de mim? — provoquei, a voz baixa, mais fraca do que queria.

 

 

(Ragan) — Tenho medo do que você pode fazer se perder a razão…

 

 

Soltei um som que poderia ser uma risada, mas parou no meio do caminho. O corpo doía demais até para sarcasmos completos. Paramos num lance de escada, e ele me ofereceu o braço. Recusei com um gesto da mão. Continuamos.

 

 

(Varka) — Como estão as coisas aqui, de verdade? — perguntei, quebrando o silêncio. — Valmont parece intacta, mas os rostos... não.

 

 

Ele demorou um segundo para responder. Seu maxilar se contraiu.

 

 

(Ragan) — O rei tem mantido as aparências. Tem enviado ajuda ao norte, mas... comedida. Como se tivesse medo de dar demais. Ou de se comprometer demais com Skarn. Os conselheiros discutem todo dia. Alric e os irmãos defendem a aliança, o restante dos nobres não.

 

 

(Varka) — E você? — perguntei, parando por um instante para apoiar a mão contra a parede de pedra fria. — Você confia no rei Aldren?

 

 

Ragan olhou para frente, o rosto endurecendo como pedra.

 

 

(Ragan) — Confio que ele ame Valmont. E que seja capaz de sacrificar qualquer um por isso. — Depois me encarou. — Inclusive nós.

 

 

Engoli em seco.

 

 

(Varka) — Então nada mudou.

 

 

(Ragan) — Mudou sim — murmurou. — Agora ele sabe quem você é. Antes, talvez ele só suspeitasse.

 

 

Seguimos mais alguns passos, e o quarto surgiu no fim do corredor. As portas de madeira polida estavam abertas, e as janelas deixavam entrar a luz dourada do fim da tarde. Um jarro com água fresca, lençóis limpos, uma mesa com pão e um pedaço de queijo. 

 

 

Ragan me ajudou a chegar até a cama, e quando me sentei na beirada, ele se agachou na minha frente, segurando meu olhar com firmeza.

 

 

(Ragan) — Pensei que você fosse morrer antes de chegar aqui.

 

 

(Varka) — Eu também. 

 

 

Ele assentiu, silencioso. Então se levantou.

 

 

(Ragan) — As curandeiras estão vindo. Vou deixá-las fazer o trabalho delas.

 

 

Ele me deu um último olhar, uma ponta de orgulho e preocupação misturados, e saiu.

 

Não demorou até que duas mulheres entrassem, cobertas por véus claros e carregando tigelas fumegantes, panos e frascos de óleo. As duas se curvaram brevemente, e uma delas começou a afastar com cuidado as camadas da minha roupa. O cheiro de ervas invadiu o quarto.

 

 

(Curandeira) — A pele está tentando fechar antes da carne — disse a mais velha, inspecionando minhas costelas. — Vamos precisar abrir de novo alguns pontos.

 

 

Assenti. Sem reclamar.

 

Fechei os olhos quando senti a lâmina aquecida rasgar o tecido da pele. O grito não saiu da garganta. Ficou preso entre os dentes, entre os ossos. As mãos delas eram firmes. Rápidas. Elas conheciam a dor, mas não a temiam.

 

 

Enquanto trabalhavam, tentei não pensar em Maeryn. Mas o cheiro da pele dela ainda estava na minha memória. O som da voz, mesmo em silêncio. O jeito como me olhou no salão, como se quisesse me dizer algo que já era tarde demais para ser dito.

 

Tentei não pensar.

 

Mas pensar nela... era a única coisa que me fazia esquecer a dor.

 

 

 

 

 

A noite caiu devagar, como um véu espesso cobrindo tudo com uma calma que não havia em mim. A luz das tochas lá fora lançava reflexos nas paredes do quarto, e as janelas abertas deixavam entrar a brisa fria das montanhas, cheirando a pedra molhada e resina de pinho. Valmont dormia, ou fingia dormir com a mesma tensão de um cão ferido. E eu estava ali, deitada numa cama limpa, em lençóis que não me pertenciam, tentando encontrar descanso num corpo que ainda latej*v* de dor.

 

As curandeiras haviam feito o que podiam. A queimadura do lado direito fora limpa, tratada com óleos escuros que ardiam no começo, depois adormeciam a pele como gelo. Teceram pontos onde era necessário, aplicaram uma pomada que cheirava a sal e hortelã, e me mandaram repousar. Como se fosse simples.

 

Tomar banho foi quase um ritual. A banheira de cobre fumegava no canto do quarto. A água, aquecida, era quase um luxo depois dos dias de poeira e sangue. Tirei as roupas devagar, gem*ndo quando o tecido grudado às feridas se soltava como pele arrancada. O espelho de bronze não mentia: eu parecia um animal caçado. Havia hematomas em todos os tons de roxo, cortes fechando com crostas negras, marcas de dedos, de unhas, de cordas. Meus olhos... pareciam de alguém que já cruzou o inferno e não tem mais certeza se voltou de verdade.

 

Entrei na água com cuidado, deixando que ela me envolvesse aos poucos. Não era prazer o que senti, era ausência de dor por um instante. E isso já era mais do que o suficiente. A sujeira se dissolvia aos poucos, criando redemoinhos escuros ao redor do meu corpo. Cada movimento me lembrava de onde estive. Do que fiz. Do que perdi.

 

Quando finalmente me sequei e me enrolei num tecido grosso, senti o peso do sono se aproximando, mas não o suficiente para me derrubar. Era o tipo de cansaço que não se resolve com descanso, era mais fundo, nas entranhas da alma.

 

Trouxeram comida logo depois: pão quente, uma tigela de caldo grosso com raízes, pedaços de carne macia, um cálice de vinho escuro. Comi devagar. Sem fome, mas por obrigação. O estômago não reclamava, mas o corpo precisava.

 

E então fiquei ali.

 

Sentada junto à janela, as pernas cobertas, os cabelos ainda úmidos escorrendo pelos ombros. Observando a escuridão lá fora, como se esperasse algo surgir do breu. Talvez uma resposta. Um sinal. O que quer que o futuro estivesse preparando, parecia tão incerto quanto as próprias guerras que travávamos. Eu não sabia o que viria, para Skarn, para Valmont, para mim. Haveria alianças ou rupturas. Haveria traições, ou redenção. Haveria Maeryn… ou não.

 

Meu nome ainda pesava como uma promessa por cumprir. Filha de Korgun. Comandante. Guerreira. E, agora, talvez... peça de um tabuleiro muito maior do que qualquer espada poderia vencer.

 

Inclinei a cabeça contra a parede de pedra fria e fechei os olhos por um instante. Não para dormir, ainda não. Mas para respirar. Para continuar. Porque era isso que restava, no fim de tudo: resistir mais um dia. E depois mais um.

 

 

 

Fim do capítulo


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Comentários para 11 - Capitulo 11:
Socorro
Socorro

Em: 18/08/2025

Fortes emoções!!!!

incertezas e dificuldades a vista 

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HelOliveira
HelOliveira

Em: 17/08/2025

Mais um capítulo maravilhoso, cheio de medos, incertezas e sentimentos apenas sentidos...

 

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