Capitulo 40
CAPÍTULO QUARENTA
O chão sumiu debaixo dos pés de Ágata. Sem palavras, ela ficou paralisada. Sua genitora, longe de ser a mãe do ano, escondia criminosos em sua casa? Era inaceitável. Mas a pergunta que a assombrava era: seria verdade? Afinal, o que ela sabia sobre a vida da mãe? Ágata a visitara apenas uma vez, e a experiência não fora boa. Durante a semana que passara lá, a mãe saía mais do que ficava em casa. Ágata se lembrava de pensar que ela estava escondendo algo. A jovem ficava com suas tias, as irmãs da mãe, e tinha a estranha sensação de que a mãe morava em outra casa.
Marcela, notando a confusão se formando no rosto de Ágata, tentou se justificar, mas só piorou a situação.
— Você conhece bem sua mãe? — perguntou, a voz tensa. — Pense bem no que vai responder. Não quero parecer desagradável com desconfianças, mas se isso vier à tona, você pode prejudicar minha vida e a de Alex.
Ágata não podia acreditar no que estava ouvindo. Desde quando ela se tornara uma persona non grata? Estaria ficando louca? Poucos minutos antes, Marcela estava beijando-a. Uma dor aguda, uma queimação, apertou-lhe o peito. Ela massageou a área, mas a dor só piorava. Uma vontade incontrolável de chorar a invadiu. O que estava acontecendo? Não podia ficar parada, sendo acusada e julgada sem saber do quê.
— Isso o quê? Pode ser mais clara? — Ágata pediu, pronta para sair dali e voltar para casa.
Marcela não se importou com o tom da voz da namorada, nem percebeu seu tremor ou os olhos que ameaçavam se encher de lágrimas. A frieza de Marcela a deixou ainda mais confusa.
— Isso, o fato da sua mãe estar metida com as facções do Rio de Janeiro e ser parente do criminoso mais procurado pela polícia. Eu só quero saber o quanto você conhece sua mãe.
— Marcela, você está desconfiando de mim? — o desespero de Ágata transbordou. — Está achando que eu estou mentindo? Por que diabos eu mentiria para você?
— Eu não desconfio de você, só quero entender as coisas e saber o quanto conhece da vida da sua mãe, dos seus parentes lá no Rio. Neste momento, Valesca está levantando a ficha de todos lá e vai ter o maior prazer em esfregar na minha cara tudo o que descobrir sobre sua mãe.
— Eu não sei da vida da minha mãe, nunca soube! Somos praticamente estranhas. Fui criada por meu pai e babás a vida toda.
— Eu não estou desconfiando de você, mas não quero ser pega de surpresa. Não quero que um colega, ou mesmo Valesca, me acuse de que você se aproximou de mim para passar informações para o tráfico.
A voz de Marcela, fria e distante, contrastava com seus olhos, que pareciam buscar, em seu rosto, a verdade ou alguma emoção que a tranquilizasse.
— Só o fato de me interrogar já diz muita coisa — Ágata retrucou. — Não sei o que sua amiguinha descobriu, mas não estou envolvida e não acredito que minha mãe também esteja. Papai teria comentado.
— Acho que nem mesmo seu pai sabe, ou então escondeu de vocês para não decepcioná-los.
Essa voz..., sim, essa era a voz da mulher por quem Ágata largaria tudo. Não a Marcela fria, que fazia perguntas como se já tivesse certeza de sua culpa. Ágata tentou ver as coisas com clareza: havia um quê de verdade em tudo o que ela dizia. Se o pai soubesse de algo, ele não contaria, para não estragar o pouco de amor que Ágata e o irmão sentiam pela mãe.
— Eu estou indo embora — declarou Ágata. — Vou tirar essa história a limpo. Se o que diz é verdade, eu mesma vou ao Rio e olho para esse homem de perto.
Levantou-se e entrou na casa, ignorando o chamado de dona Montserrat. Os gritos de Marcela pediam para ela esperar.
— Chiara, espera! Espera por mim, vamos conversar!
— O que está acontecendo, filha? Por que essa gritaria toda? — ouviu a mãe de Marcela perguntar.
O resto da conversa se perdeu no ar. Ágata entrou no quarto e juntou as poucas roupas que havia levado para o fim de semana. Colocou-as de qualquer jeito na mochila e a jogou nas costas, ajustando a alça. Nesse momento, Marcela, as irmãs e a mãe entraram no quarto, falando todas ao mesmo tempo.
— Não vá, Ágata, já está escuro! — Eve segurou sua mão gentilmente. — Essas estradas voltando para a cidade são mais perigosas do que vindo para o sertão. Sempre há irresponsáveis alcoolizados voltando de alguma festa, sem contar com os assaltos. Espera até amanhã.
— Eu sei que estou parecendo uma garotinha mimada que foge e faz birra quando algo a desagrada, mas não é isso. Marcela me fez perguntas e me acusou de coisas que até pouco tempo eu nem imaginei nos meus piores pesadelos. Eu tenho que ir para casa saber a verdade da boca do meu pai.
Marcela se aproximou, mas não a tocou. E Ágata achou melhor assim, para não descarregar nela as emoções conflitantes que estava sentindo.
— Eu não te acusei, só queria saber até onde você conhecia sua mãe para não cairmos em ciladas. Se ela estiver envolvida, Valesca vai querer usar isso contra você, principalmente quando amanhecer e souber que eu não viajei. Ela vai dar um jeito de vasculhar tudo para descobrir se você está envolvida ou não.
Ágata teve que concordar. Fazia sentido o que Marcela estava dizendo.
— Eu não estou envolvida e tampouco sei do que pode estar acontecendo. A última vez que vi minha mãe foi no dia em que nos conhecemos. Ela veio para assinar o divórcio e foi embora no mesmo dia.
Dona Montserrat falou pela primeira vez desde que entrara no quarto.
— Seu pai ligou contando o ocorrido. Eles já estavam separados bem antes de você nascer. Ela queria te levar e deixar o Greg, mas seu pai não concordou. Por isso, ela vinha duas vezes ao ano. Gregório esperava que, quando vocês crescessem e entendessem as coisas, escolhessem com quem queriam morar.
— Ainda assim, dona Montserrat, eu preciso saber o que o papai não contou. Se eles já estavam separados, por que ela sempre vinha quando ficamos adultos? Isso não faz sentido.
Marcela a abraçou, alisando seus cabelos e olhando dentro dos seus olhos.
— Guarde essa mochila. Assim que o dia começar a nascer, voltamos para sua casa.
— Eu vou sozinha. Você fica com Alex, que não deve estar entendendo nada — Ágata respondeu, mais tranquila.
— Ágata está certa, filha. Se você preferir, vai deixá-la e volta para a fazenda.
A mãe de Marcela sugeriu e, percebendo que não haveria mais discussão, puxou Eve para fora, deixando-as a sós. Marcela aproveitou para tirar a mochila das costas de Ágata, colocando-a de volta no guarda-roupa, e a puxou para se deitar junto com ela.
— Nem pense que vai se livrar de mim assim tão fácil, meu amor. Eu vou junto até sua casa, depois resolvo o que fazer.
— E a Alex? No momento, ela precisa mais da sua presença do que eu.
— Eu sei. Na hora de deitar, vou ter uma conversa séria com ela. Agora, venha, vamos para a varanda nos reunir com a família e ouvir as histórias do Chicão falando de almas e espíritos que vagam por essas bandas.
Se ela estava brincando ou não, Ágata não conseguiu saber, mas o certo é que essas histórias a assustavam de verdade.
A casa estava silenciosa quando chegaram. O restaurante estava fechado, e, olhando para o relógio, ainda era cedo, não passava das oito. O pai de Ágata devia estar dormindo.
— Entre, vá tomar banho. Vou preparar café para nós.
Nesse momento, o celular de Marcela acendeu. Ela olhou para a tela e ignorou.
— Por que não atende de uma vez? Ela não vai parar de ligar, foi assim a noite toda.
Como se a ouvisse, o telefone tocou novamente. Marcela atendeu e escreveu poucas coisas, desligando em seguida.
— Expliquei por que não fui. Agora ela vai começar a colocar seus homens para trabalhar. Daqui a pouco tempo, ela terá tudo em suas mãos.
— Bambina, o que houve para já estar de volta?
O pai de Ágata entrou, vindo não se sabe de onde, com um pacote de pão fresquinho e com um semblante descansado, como se não tivesse trabalhado a noite toda.
— Sente, tenho umas coisas para perguntar.
— Vamos comendo enquanto conversamos.
Sentaram-se à mesa e Ágata colocou a garrafa de café junto com as xícaras. Cada um pegou um pãozinho, passando manteiga e colocando pedaços de queijo. O pai olhava para Ágata, tentando entender o que ela queria saber. Ela estava ansiosa demais para permanecer calada.
— Papai, tudo o que sabe da minha mãe, não esconda nada.
O olhar do pai foi para Marcela, que se ajeitou na cadeira, continuou tomando seu café sem olhar em direção a eles, mas com certeza atenta à resposta.
— Sobre o que exatamente você está perguntando?
— Sobre o fato de ela ser casada, ter uma família e estar envolvida com bandidos.
— A vida da sua mãe nunca me interessou muito antes de você nascer. Depois, o que ela faz da vida dela só diz respeito a ela, desde que não prejudique vocês dois.
— Pois pode prejudicar, sim. O criminoso do qual Marcela e Alex estão fugindo — a história que ela contou para o senhor — tudo indica que está foragido e se esconde na casa do irmão e da cunhada, ou seja, minha mãe.
No momento em que Ágata falou, a mão do pai, que segurava a xícara, tremeu. Ele a depositou rápido sobre a mesa, para não derramar o café, e ficou pálido.
— Papai, o senhor está bem? Está sentindo alguma coisa?
— Estou bem, foi só uma tontura. Isso é verdade, Marcela?
— Sua filha está dizendo a verdade. Ontem, era para eu ir disfarçada para o Rio fazer o reconhecimento do homem que estava escondido numa casa na Baixada Fluminense. A Chiara ia comigo, por isso pediu o endereço da mãe ao senhor. Então, descobrimos que o endereço é o mesmo. Ou seja, o bandido que todos querem pegar é cunhado da sua ex-esposa.
— E como isso pode te prejudicar? Ágata nunca esteve presente na vida da mãe, ou vice-versa.
— Se essa informação cair nas mãos dos meus superiores, vão acreditar que caí em uma cilada, que Chiara está envolvida. E até provar que ela não está, eu estarei suspensa, respondendo a processo, e a segurança dela, comprometida.
— Eu não sei muita coisa, mas dessa parte do envolvimento dela com o tráfico eu sabia. Nunca a proibi de ver os filhos quando ela vinha e se hospedava lá em casa, mas sempre que ela estava aqui, procurava umas pessoas que nunca me interessei em saber quem...
Fim do capítulo
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HelOliveira
Em: 10/08/2025
Nossa que agora complicou mais ainda...
A história está muito boa
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