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TUDO NOVO por Donana

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Palavras: 5493
Acessos: 386   |  Postado em: 05/07/2025

Capitulo 9 - Decisoes precipitadas

A semana seguiu como devia — ou quase isso. Para Laura, tudo voltou ao seu eixo habitual: chegar cedo ao hospital, estacionar na sua vaga tradicional (de direito e por costume) e fingir que não se incomodava com a presença da “novata”. Era assim que agora se referia à Dra. Ana Júlia Carvalho, mesmo que, no fundo, soubesse perfeitamente o nome dela.

E o carro da novata? Que ficasse onde quisesse — não era problema seu. Laura a havia cruzado algumas vezes pelos corredores, sempre retribuindo os cumprimentos com aquela cordialidade protocolar que disfarçava muito bem qualquer emoção.

Mas, naquela sexta-feira, o universo decidiu testar sua compostura.

Um acidente entre um ônibus circular e um motoqueiro travou o trânsito. Laura chegou atrasada — o que por si só já era um mau presságio. Ao entrar no estacionamento, viu, com os próprios olhos e um certo ódio injustificável, o carro da novata se aproximando perigosamente da sua vaga. Aquela mesma. A preferida. O trono de quatro rodas.

Sua mente, que até então era treinada para tomar decisões rápidas em ambientes cirúrgicos, cometeu um colapso emocional. Sem pensar, fez uma manobra brusca, interceptando a entrada de Ana Júlia quase como se estivesse prestes a realizar um transplante... de vaga.

O carro da neurocirurgiã freou com tudo. Laura viu, em câmera lenta, o tranco no banco e a expressão furiosa que se formava no rosto da médica. Só então, ao sentir o próprio coração bater na garganta, teve a real consciência do tamanho da besteira que havia feito.

E quando a porta do carro da novata se abriu com força, e ela saiu com os olhos castanhos faiscando indignação, Laura só teve um pensamento:

"Parabéns, Laura. Você acabou de declarar guerra no estacionamento. Com a Dra. gostosa, protegida da sua avó, isso vai dar ruim"

Júlia desceu furiosa ajeitando a jaqueta de couro e passando a mão pelo cabelo solto que o vento insistia em desalinhar. Ela fechou a porta do carro com um estrondo sutilmente educado — o tipo de batida que dizia “não estou gritando, mas estou muito irritada”.

— Sério isso? — disse, ajeitando o cabelo novamente e caminhando até Laura, os olhos castanhos brilhando de indignação. — Eu quase bati o carro, doutora.

Laura, ainda com a mão na chave e o motor roncando, respirou fundo. Devia pedir desculpas. Era o certo a fazer. Mas em vez disso, saiu do carro com um sorrisinho irritante e deboche nos lábios.

— Bom dia pra você também, novata.

— Ana Júlia. Meu nome é Ana Júlia — respondeu com um sorriso tenso.

— Ah, claro… Dra. Ana Júlia Carvalho, neurocirurgiã brilhante, contratada a dedo pela minha avó. Como pude esquecer?

Júlia cruzou os braços, o cabelo agora esvoaçando com o vento daquela manhã, quase como um herói de HQ. Só faltava a trilha sonora dramática.

— Olha, se você tem algum problema comigo, resolve com maturidade. Jogar o carro em cima dos outros é coisa de quem precisa de terapia. Boa notícia: aqui tem ótimos profissionais.

— Eu não joguei o carro em cima de ninguém — Laura rebateu, claramente encenando surpresa. — Só tive um impulso... logístico. E, sinceramente, a vaga é minha. Todos aqui sabem disso.

— É uma vaga, Laura. Qual o seu problema? E, caso você não tenha notado, eu não estava indo para a sua preciosa vaga. Era duas vagas depois da sua, segundo me orientou o Jonas — sabe, o segurança da portaria? Ele disse que meu antecessor estacionava ali, já que a princesa mimada do reino Memorial tinha uma certa obsessão por essa bendita vaga aqui. E só pra constar, estacionei nela uma única vez. Não precisa matar ninguém por ela.

As duas se encaram por um segundo. Longo. Tenso. Quase elétrico.

— A gente vai mesmo ficar brigando por vaga no estacionamento como duas adolescentes de ensino médio? — Júlia suspirou, um pouco mais calma. — Ou você vai me dizer por que realmente está com raiva?

— Eu não estou com raiva — respondeu Laura, rápido demais.

Júlia deu um passo para trás, rindo de leve.

— Claro. E eu sou só uma cirurgiã com habilidades medianas.

— Achei que fosse neurocirurgiã brilhante. — Laura rebateu com um olhar que misturava sarcasmo e… fascínio?

— Você que está dizendo — disse Júlia, sorrindo. — Isso te incomoda?

Laura não respondeu. Pegou sua mochila do banco de trás, fechou o carro, e começou a caminhar em direção à entrada do hospital. Mas antes de virar o rosto, jogou por cima do ombro:

— A gente se vê lá dentro… doutora.

Júlia ficou parada por alguns segundos, observando a loira de passos decididos. Então suspirou, balançou a cabeça e murmurou:

— Essa mulher vai acabar comigo ou me enlouquecer de vez.

E, ajeitando os cabelos no espelho retrovisor, seguiu para mais um dia de trabalho… e de tensão perfeitamente desnecessária.

Sem que ninguém notasse, um pouco mais afastada, um par de olhos verdes acompanhava atentamente o desenrolar da cena.

Camila havia estacionado pouco antes do incidente entre a filha e a outra médica. Ao ouvir o barulho da freada brusca, seu primeiro impulso foi correr até elas para verificar se estavam bem.

Mas parou no meio do caminho assim que percebeu o início do bate-boca — e por pouco não voltou ao carro para pegar a cinta. A filha estava pedindo uma surra.

Após o incidente no estacionamento, Camila tomou uma decisão. Pegou o celular e discou um número gravado na memória.

Na cobertura de um luxuoso prédio, enquanto aguardava a cafeteira completar seu trabalho, Eunice vestia um conjunto de camisola e robe de seda chinesa. Na mesa já posta com frutas, pães, queijos e leite, Hermes, em seu pijama azul de algodão, lia as notícias no tablet. Seu olhar desviou quando viu o nome de Camila piscar no visor do celular de Eunice.

— Querida, sua nora número um está ligando. Filhos ligando a essa hora da manhã geralmente não é bom sinal. Não vai atender?

Eunice caminhou até a mesa, pegou o celular com calma e respondeu, apontando o dedo entre ele e ela:

— Silêncio. Não quero que meus filhos descubram por acidente... o que quer que seja isso que estamos vivendo. Quero contar pessoalmente.

Hermes se levantou, deu um beijo no rosto dela e saiu da sala sorrindo:

— É um amor maduro, querida.

No toque seguinte, Eunice atendeu com a elegância de quem controla tudo, menos a curiosidade:

— Bom dia, Camila!

— Eunice, bom dia! Perdão por incomodar tão cedo, mas... será que podemos almoçar juntas hoje?

— Aconteceu alguma coisa, querida?

— Ainda não sei. Mas a minha Laura está... estranha.

— Almoçamos, então. Meio-dia, no mesmo restaurante de sempre.

O restaurante era discreto, elegante e bem iluminado. Um daqueles lugares onde as flores são trocadas diariamente e os garçons falam baixo. Eunice já estava sentada à mesa de sempre, com uma taça de vinho branco nas mãos e os óculos de leitura apoiados na ponta do nariz. Mexia no menu mais por hábito do que por necessidade — ali, o maître sabia exatamente o que ela gostava.

Camila chegou com um ar decidido, mas os olhos denunciavam a inquietação. Tirou os óculos escuros com elegância e beijou Eunice nas duas faces.

— Está linda como sempre, minha querida. — disse Eunice, sorrindo e apontando para a cadeira à sua frente.

— E você sempre a personificação da realeza. — respondeu Camila, sentando-se. — Não sei se quero almoçar ou pedir conselhos.

— Pode pedir os dois. Pedi uma salada de figo com queijo de cabra, é leve e nos dá espaço para o drama.

Camila riu com um suspiro.

— A Laura está estranha desde que reencontrou a Natália — disse Camila, com um suspiro. — A Olívia me contou. Anda bebendo demais, chegou em casa outro dia carregada pelo Leonardo, e veio trabalhar de ressaca. Chamei a atenção dela, claro, mas está se comportando como uma menina mimada e birrenta.

Fez uma pausa e então olhou para Eunice com seriedade.

— Você acha que ela ainda ama aquela mulher? continuou

— E agora deu de implicar com a nova médica. Ela se irrita toda vez que escuta o nome dela. Hoje quase atropelou a moça no estacionamento por causa de uma vaga. Uma vaga, Eunice!

Eunice soltou um leve riso abafado.

— Ana Júlia Carvalho. — completou Eunice, erguendo uma sobrancelha. Brilhante. Discreta. Olhos de quem já viu muita coisa. Mas continue…

— Eu acho que Laura está se comportando como uma adolescente birrenta que teve a atenção desviada. E isso, Eunice, é sempre um mal sinal. Mandamos Laura para longe para ela se curar, mas acho que cometemos um erro, ela não aprendeu a lidar com a situação, não resolveu seus problemas com a Natália e nem com o primo. 

— Eu entendo o que você está dizendo. Também soube do reencontro com a Natália — disse Eunice, cruzando as pernas com elegância. — Mas sabe o que eu acho? A Laura não ama mais a Natália, mas carrega um orgulho ferido. Ela quer uma briga… e como a Natália não está disposta a dar isso a ela, transferiu o conflito para a Ana Júlia. Ou…

— Ou…? — Camila arqueou a sobrancelha, atenta.

— Ou a Laura esteja começando a sentir algo pela nova médica, e toda essa implicância seja só uma armadura. Uma tentativa de se proteger do amor... e da dor que pode vir com ele.

— Eunice, isso me preocupa — suspirou Camila. — A gente nem conhece essa moça. Tá certo que é uma profissional brilhante, mas e o resto? Será que ela é capaz de corresponder a esse possível amor da Laura? Eu não quero ver minha filha sofrendo de novo, muito menos por outra mulher que possa cair nos braços do primeiro homem que aparecer.

— Camila, por mais que a gente queira proteger nossos filhos de se machucar… eles ainda vão cair, ralar o joelho, tropeçar nos próprios sentimentos. Nosso papel é estar ali, com o merthiolate emocional, prontos pra ajudar a cicatrizar.

Fez uma pausa, depois disse com um sorriso contido:

— Hermes me contou um pouco sobre a Ana Júlia. Vem de uma família simples, batalhadora, ajuda os irmãos, tem um carinho enorme pela mãe e pela avó… Não me parece alguém que vai magoar a nossa Laura de forma leviana. Mas… — ela estreitou os olhos com um ar cúmplice — pode deixar que eu vou sondar essa menina. Com discrição, claro.

Camila soltou um suspiro longo, cruzando os braços como quem tenta se proteger de uma tempestade emocional.

— Só você mesmo pra usar “merthiolate emocional” e me fazer rir no meio da minha agonia. — Ela balançou a cabeça, meio rindo, meio aflita. — Mas vou te dizer, Eunice… essa sua neta é uma caixinha de surpresas, né?

Eunice assentiu, pousando a xícara de café na mesa.

— Sempre foi. Desde pequena. A mais calada, a mais difícil de decifrar… e, justamente por isso, a mais intensa.

— E agora essa tal Ana Júlia aparece com esses olhos castanhos, esse jeito calmo… e pronto. Laura se desestrutura inteira — disse Camila, erguendo os olhos ao teto como quem pedia socorro divino. — Como é que a gente compete com isso?

— A gente não compete, Camila. A gente observa. E, se for verdadeiro… a gente apoia — disse Eunice, firme, mas com doçura.

Camila bufou, resignada:

— Tá bom. Você observa com elegância de médica renomada. Eu observo com cara de mãe ciumenta. Mas vou tentar não assustar a moça. Só vou ficar de olho… bem aberto.

Eunice sorriu, quase divertida.

— E eu achando que a alcoviteira aqui era eu.

Camila sorriu também, mas seu olhar logo se perdeu por um instante na xícara que segurava.

— Só não quero ver minha menina com o coração quebrado de novo, Eunice. Só isso.

Eunice esticou a mão por cima da mesa e segurou a dela com firmeza e carinho.

— Ninguém quer. Mas se ela tiver que amar… que seja por inteiro. E se for pela Ana Júlia, que seja com tudo: coragem, paciência e, quem sabe, um novo começo.

Camila sorriu de leve, ainda desconfiada.

— Você fala bonito, sogra. Mas se essa menina fizer minha filha chorar, eu mesma levo pra fazer plantão no Alasca.

As duas riram — como duas mulheres que, apesar das gerações e experiências diferentes, partilhavam o mesmo amor incondicional.

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No final do seu primeiro dia de trabalho, Ana Júlia teve uma conversa inesperada — e curiosa — com o segurança da entrada principal do hospital. Ela já estava prestes a entrar no carro, concentrada em abrir a porta, quando levou um susto com uma voz às suas costas.

— Dra. Ana Júlia...

— Ai, que susto, homem de Deus! Jonas, não é?

Ele estava vestido com uma calça jeans surrada, uma camiseta de time de futebol e mochilas penduradas nos ombros. Sorriu meio sem jeito, coçando a nuca.

— Isso mesmo, doutora. É que... preciso te falar uma coisa.

— Pode falar, meu caro — respondeu ela, ainda com a chave na mão.

— É que... tô até com vergonha, mas... a Dra. Laura é muito gente boa. Quando meu filho ficou doente, ela foi até a minha casa, consultou ele, levou remédio, comida... sabe?

— Que bom, Jonas! Fico feliz em saber disso. Mas não entendi ainda onde você quer chegar...

— É sobre a vaga do estacionamento, sabe? A Dra. Laura gosta muito dessa vaga. Todo mundo aqui sabe e respeita. Hoje ela ficou meio brava, né? Eu queria saber se a senhora... Poderia estacionar na outra vaga, ali do lado. Era onde o Dr. Almir parava o Mustang dele, antes de se aposentar. A sombra ali é boa e eu consigo ver seu carro da portaria. Posso vigiar pra você.

Júlia sorriu, genuinamente tocada com a abordagem e, mais ainda, intrigada com o comportamento da tal loira de olhos azuis furiosos. Como alguém capaz de tanta bondade podia ser tão mal-humorada?

— Jonas, primeiro: não precisa me chamar de “senhora”, pode me chamar de você. Segundo: sem problemas, posso sim estacionar na outra vaga. Terceiro: nem se preocupe em vigiar, fiz seguro total. O máximo que vou ter é dor de cabeça com papelada. E, o mais importante: seu filho está bem agora?

— Tá sim, graças a Deus. E à Dra. Laura. Ela... olha, essa família Becker é muito boa com a gente, os funcionários, mas a Dra. Laura é especial. Às vezes tem umas crises, né? Mas sabe o nome de quase todo mundo. Diferente de uns médicos aí que nem olham na nossa cara... Ah, e doutora... você pode não contar pra ela que falei contigo?

— Fica tranquilo, Jonas. Seu segredo está guardado comigo.

Desde aquele momento, Ana Júlia passou a pensar ainda mais em Laura. O gesto do segurança, a história do menino, os olhos azuis que agora também habitavam seus sonhos — tudo isso se misturava numa espécie de enigma emocional. Havia algo ali. Algo que escapava da lógica. E que, inevitavelmente, a puxava para mais perto.

Porém naquela manhã em particular, Laura passou dos limites, poderia causar um acidente muito grave, tudo por uma vaga no estacionamento, menina mimada e birrenta, insuportável. - Pensou e seguiu para sua rotina de trabalho.

Ana Júlia terminava de revisar o prontuário de um paciente quando ouviu duas batidinhas na porta. Antes que pudesse responder, Olivia Becker, com um blazer bege impecável, sorriso contido e uma pasta debaixo do braço, apareceu à porta.

— Posso? — perguntou, com a sutileza de quem já ia entrando.

— Claro, Olivia. Entra. Quer sentar?

— Só um minuto, não vou tomar muito do seu tempo. — Olivia se acomodou mesmo assim. — Vim conversar sobre um assunto que... digamos... virou tópico quente no cafezinho.

Júlia arqueou uma sobrancelha, já prevendo onde aquilo ia dar.

— É sobre o estacionamento, não é?

— Ah, ela é rápida — Olivia sorriu, abrindo a pasta como se fosse puxar um formulário de ocorrência. — Pois é, doutora. Digamos que, nesta instituição, até onde se estaciona um carro pode virar lenda urbana.

— Eu juro que não sabia que aquela vaga tinha nome e sobrenome quando estacionei nela pela primeira vez, e que o fato de estacionar em uma vaga que não tem nenhuma indicação de reservada, causaria tanto desconforto na prezada Dra. — disse Júlia, com as mãos erguidas em falsa rendição. — Nem placa de “reservada para a temperamental da ala cirúrgica”.

— Peço desculpas pelas atitudes de minha irmã em nome da família e do hospital, não sei o que tem havido com ela, mas prometo descobrir, vim para saber se está tudo bem e se quiser abrir uma reclamação contra ela, vamos chamá-la no RH, saiba que nesse hospital funcionários são tratados com a mesma justiça, mesmo sendo da família.

— Agradeço, mas não vejo necessidade. Quando descobrir o que está irritando sua irmã, me conte que quero saber, pelo que soube nos corredores, ela é uma pessoa muito querida. Talvez seja a minha pessoa que não a agrade.

Olivia riu de verdade, cruzando as pernas com elegância.

— Eu sabia que podia contar com sua diplomacia. Sinceramente, Julia, você tem sido uma boa adição ao time. A propósito se quiser saber mais sobre minha irmã estou à disposição para lhe dar a ficha corrida dela.

— Ah! fica tranquila se quiser ter outro embate com ela te procuro para saber suas defesas — Júlia respondeu num tom brincalhão, mas com brilho provocador nos olhos.

— Cuidado com esse olhar, doutora. Você pode estar entrando num campo minado sem perceber.

— Estou começando a perceber. Mas... às vezes minados são mais interessantes que asfaltados.

Olivia se levantou, recolhendo a pasta e dando um tapinha leve no ombro de Júlia.

— Bem-vinda, oficialmente, à verdadeira ala de cirurgia emocional do Memorial. Qualquer coisa, estou por aqui.

— Obrigada, chefe. Prometo evitar escândalos... no estacionamento.

— No estacionamento é essencial. O resto, bom... o resto a gente administra.

E saiu com ares de quem sabia mais do que dizia.

Júlia ficou olhando a porta se fechar, sorrindo sozinha. O hospital prometia ser muito mais do que um local de trabalho.

________________________________

BAR DO LÉO – NOITE DE SEXTA-FEIRA

O bar estava cheio, como toda sexta-feira no Bar do Léo. Músicas brasileiras dos anos 2000 tocavam ao fundo, o garçom mal dava conta de tantas porções de fritas e torresmo, e os copos de chope pareciam se multiplicar na mesa dos Becker.

Laura estava sentada ao lado de Fernanda e Leonardo, uma caipirinha de morango na mão e o cabelo solto em uma chapinha bem feita. Olivia ria alto de alguma história contada pelo novo namorado, Rodrigo, um engenheiro bonitinho com um humor previsível, mas eficaz.

— E aí, vocês acham mesmo que a Fernanda e o Leonardo são só "amigos"? — provocou Laura, com um sorriso debochado.

— Ui, lá vem... — murmurou Fernanda, sem olhar para ninguém, afundando os canudinhos de plástico no gelo da bebida como se fosse o ego do Leonardo.

— Somos amigos, com… vantagens logísticas — disse Leo, piscando para Fernanda, que respondeu apenas com um revirar de olhos e um leve sorriso.

Foi quando a porta do bar se abriu e a figura de Júlia surgiu, rindo de alguma coisa que Cadu disse, gesticulava exageradamente enquanto equilibrava dois copos de chope. Júlia vestia jeans escuro, uma camiseta branca meio colada e um blazer azul marinho dobrado nas mangas. Simples, mas impossível de não notar. Especialmente por Laura.

— Gente… olha quem chegou — murmurou Olivia, acenando para o casal.

Laura ergueu os olhos devagar, como quem não se importa. Mas importava. E muito.

Júlia também a viu. E, por um instante, seus olhos se prenderam nos de Laura como se o bar inteiro tivesse desaparecido em desfoque. A conexão elétrica de antes piscou de novo. Só que agora com público.

— Sem climão enhen! Comporte-se, sem causar confusão com a moça -  disse Leonardo, baixinho para Laura.

— Fique tranquilo, Leo. Vou agir como uma Lady — respondeu a irmã.

Antes que o casal chegasse a mesa, Fernanda puxou Laura pela manga:

— Você não vai beber mais se for continuar olhando assim pra ela. Tá quase derretendo o gelo da bebida.

— Cala a boca — respondeu Laura, engolindo a caipirinha como quem toma um antídoto.

Júlia se aproximou com um sorriso simpático.

— Oi, gente. Obrigado pelo convite, estava mesmo precisando ter um tempo de diversão?

Olivia foi a primeira a responder:

— É sempre um prazer ter gente bonita melhorando a estética do grupo! 

Rodrigo ergueu o copo em saudação e Cadu já puxava uma cadeira para Júlia.

Júlia sentou-se ao lado de Olivia de frente para Laura. Por educação? Por provocação? Nem Deus sabia.

— Boa noite, Laura — disse, com aquele tom doce e firme que só ela conseguia.

Laura respondeu com um sorriso torto e um "Boa noite", como quem engole um comprimido amargo.

— Isso vai render… — murmurou Leonardo, quase se engasgando com a cerveja.

E o bar seguiu animado, entre piadas, rodadas de bebidas e os olhares que, por mais que tentassem evitar, se encontravam entre risos e silêncios carregados de coisas não ditas.

Quando o relógio passou das duas da manhã, o Bar do Léo começou a esvaziar. Olivia e Rodrigo anunciaram que o “turno dos responsáveis” havia acabado; Leonardo foi arrastado por Fernanda sob o pretexto de “buscar um Uber antes que o algoritmo fique cruel”; Cadu foi embora com o rapaz que estava paquerando durante toda a noite — sobraram Laura e Júlia, que ficaram sentadas à mesa, frente a frente, cercadas de copos vazios e farelos de torresmo.

Por um instante só se ouviu o batuque distante da banda de pagode improvisada perto do balcão. Júlia ajeitou o blazer sobre o encosto da cadeira; Laura girou a caipirinha vazia pelas mãos como se fosse um cubo de Rubik emocional.

— Então… — Júlia rompeu o silêncio — finalmente sem plateia.

— Nem me fale. Eles fazem parecer que somos protagonistas de novela das nove. — Laura tentou soar casual, mas a voz saiu mais baixa do que pretendia.

Júlia piscou devagar, os olhos castanhos cansados, porém atentos.

— Sobre o estacionamento… obrigada por ter cedido. Jonas me contou a história toda. E eu concordei com ele — Laura soltou de uma vez. — Aquilo foi… infantil.

— Foi um dia ruim. Todo mundo tem. — Júlia ergueu a mão como quem encerra o assunto. — Mas… por que achei que tinha mais coisa além de uma vaga?

Laura riu, breve, sem humor.

— Talvez porque tenha. Talvez eu… esteja numa transição complicada. Minha vida amorosa virou um dossiê inacabado e, se servir de consolo, você só levou o impacto da bagunça.

— Laura, eu entendo, mas não sou sua rival, não sou um experimento social. Sou só… eu. — Júlia apoiou o antebraço na mesa e inclinou-se um pouco. — E honestamente? Essa implicância toda me confunde. Num minuto você parece querer me matar, no outro fica me observando  de longe como se quisesse… se aproximar.

O rosto de Laura enrubesceu — culpa da caipirinha, talvez, mas também da lucidez daquelas palavras.

— Eu… observo você porque você me desarma. Você é calma demais. Boa demais. — Deu de ombros. — E eu funciono a base de sarcasmo e autodefesa. É o meu modo padrão.

— E se eu disser que também tenho modos de autodefesa? — Júlia sorriu de leve. — Mas não uso o sarcasmo. Uso a calma.

O garçom apareceu para recolher os copos vazios, interrompendo o momento. Quando se afastou, Laura inspirou fundo.

— Que tal um armistício oficial? — propôs. — Nada de guerra fria, nada de vagas disputadas. Só… respeito profissional. E talvez um café decente de vez em quando.

— Armistício aceito. — Júlia estendeu a mão, numa formalidade brincalhona.

Laura apertou, sentindo o calor da pele dela — forte, firme, mas sem pressa de soltar.

Eles se levantaram. Na porta do bar, o vento úmido da madrugada bateu nos rostos cansados, mas estranhamente leves. Caminaram lado a lado até o estacionamento, sem pressa, trocando comentários aleatórios sobre plantões e séries ruins da TV a cabo.

Diante dos carros, pararam. Júlia destravou o dela primeiro.

— Boa noite, Laura.

— Boa noite, Ana Júlia. Até segunda.

— Sem atropelamentos.

— Prometo. — Laura fechou a porta do carro, mas antes de entrar, virou-se: — E obrigada pelo cessar‑fogo.

Júlia apenas sorriu, piscou um “de nada” e ligou o motor. A luz vermelha das lanternas refletiu nos olhos azuis de Laura, que ficou ali parada mais um segundo, percebendo que, naquela noite, alguma coisa tinha, de fato, mudado — não no estacionamento, mas em território bem mais complicado: o próprio peito.

 


 


O tempo passou rápido para as belas doutoras, e já era meados de maio — mês em que, como de costume, a família Becker celebrava o aniversário da matriarca, Eunice. No entanto, aquele ano trazia um problema: seria a primeira comemoração com a presença de Laura, Eduardo e Natália após a famosa briga.

Tradicionalmente, a família Becker se reunia na fazenda da família para o evento. O fim de semana era regado a vinhos caros, churrascos fartos e longas conversas familiares. Mas, para surpresa de todos, naquele ano Eunice pediu à nora número 2 — Sofia, que sempre organizava essas ocasiões — que não queria festa alguma.

Quando Sofia, curiosa, tentou saber o motivo da decisão inusitada, Eunice desconversou, sem dar uma explicação plausível. Limitou-se a dizer que não estava no clima.

E foi justamente naquela manhã, inconformada com o "cancelamento do ano", que a recepção da unidade médica teve uma visitante inesperada…

Sofia, já conhecida pelos funcionários do hospital, chegou até o pronto-socorro sem dificuldades. Ao avistar a filha, Carla, caminhou apressada até ela.

— Carla, graças a Deus você está viva! Faz três dias que não aparece em casa!

— Mãe, eu sou residente. Sabe por que esse período se chama "residência"? Porque a gente praticamente mora no hospital.

— Carla, você é dona desse hospital. Não precisa trabalhar tanto assim...

Carla rapidamente puxou a mãe para um canto mais reservado.

— Mãe, fica quieta! Ninguém aqui precisa saber disso. É justamente por isso que uso o sobrenome da senhora, e não o do papai. Eu não quero que saibam que sou neta da poderosa Eunice Becker… Não quero tratamento especial.

Sofia apenas bufou, sem entender por que a filha caçula insistia tanto em não usar os privilégios de ser uma Becker. Mas estava ali por outro motivo — precisava falar com o pivô de toda a confusão e discórdia na família.

— Carlinha, preciso falar com a Laura. Sabe onde posso encontrá-la?

— Mãe, o que você quer com a Laura?

— Ora, Carlinha, preciso de uma opinião dela.

— Ela está na sala de tomografia… Mas olha lá o que você vai falar com ela, hein?

SALA DE TOMOGRAFIA – MANHÃ

A luz azulada das telas iluminava o rosto concentrado de Laura, que explicava calmamente um laudo para Júlia, ambas de jaleco, lado a lado. Os olhos azuis de Laura focavam nas imagens, enquanto Júlia ouvia com atenção, segurando uma prancheta.

A porta se abriu sem cerimônia. Sofia entrou com passos decididos, o salto marcando sua presença antes mesmo da voz. Os olhos dela pousaram primeiro em Júlia, depois em Laura, que nem sequer se virou.

— Laura, precisamos conversar. Em particular — disse Sofia com um sorriso tenso e educado demais para soar sincero.

Laura continuou olhando para a tela.

— Estou ocupada, como pode ver.

— Pode dispensar a outra médica por um instante, não pode? É um assunto de família.

Júlia virou-se, encarando Sofia com um aceno contido.

— Posso voltar depois, Laura... — murmurou, tentando aliviar a tensão no ar.

— Não, pode ficar, Júlia — respondeu Laura, firme. — Se for um assunto de família, que seja dito como sempre é feito: em voz alta e no meio dos outros.

Sofia revirou os olhos e cruzou os braços.

— Claro, porque você adora um espetáculo. É o que sempre faz. Desde pequena precisa ser a diferente, a complicada, a rebelde. Agora quer mostrar que também é a grossa.

— Se veio aqui me ofender, vai ter que esperar na fila, minha agenda tá cheia — disse Laura com ironia.

— Vim dizer que você precisa parar com esse teatro. A sua avó não quer mais comemorar seu aniversário. Basta dizer a ela que faça e que você não vai! Invente uma desculpa, afinal você é expert em armar confusões e sumir.

Laura respirou fundo, ainda olhando para a imagem da tomografia. Júlia observava, agora tensa, mas imóvel.

— Eu vou fazer o que achar que devo, Sofia. A Eunice me conhece melhor do que ninguém. Sabe que eu não sou de fingir o que não sinto, nem de sorrir pra quem me fere.

— Você se fere sozinha, Laura! Sempre se isolando, sempre bancando a mártir! E agora? Vai boicotar mais uma vez a família por birra? Só porque não consegue lidar com seus próprios sentimentos?

Laura virou-se devagar, os olhos frios.

— E você tá aqui por quê? Pra bancar a mãe do ano? A conselheira da paz? Ou só porque cansou de não estar no centro da confusão?

— Eu tô aqui porque, apesar de tudo, me importo! Sua avó tá chateada, seus irmãos estão perdidos entre te defender ou evitar você! E tudo por quê? Porque você decidiu fazer da sua dor uma trincheira!

O silêncio caiu por um segundo. Júlia parecia prestes a sair da sala, mas Laura a segurou pelo braço, sem encará-la.

— Fique — disse, seca.

Depois voltou-se para Sofia, agora com um meio sorriso.

— Sabe o que é engraçado, tia Sofia? Todo mundo quer que eu me encaixe. Que eu seja menos intensa, menos direta, menos "Laura". Mas ninguém parece interessado em entender o porquê. Só apontam o dedo e chamam de "recalcada".

— Escute, eu não vou bancar a boazinha. Você tem que arranjar um namorado, um homem de verdade, alguém que te coloque no eixo. Está assim desde aquele episódio com a Natália — a voz dela agora subia, carregada de veneno —, e ainda tentou levar minha nora junto pro buraco. Sorte que o Eduardo apareceu e a salvou. Você, sinceramente, precisa de ajuda.

Júlia arregalou os olhos, o sangue lhe subiu ao rosto e, antes que pensasse nas consequências, deu um passo à frente e soltou alto, firme, furiosa:

— Laura não precisa de um namorado, senhora Sofia. Ela já tem uma namorada.

O silêncio caiu como uma bomba.

Laura virou o rosto, chocada. O ar ficou pesado. Sofia piscou, descrente.

— Como é que é? — sibilou Sofia, os olhos faiscando.

Júlia respirou fundo e, com a coluna ereta e o rosto vermelho de indignação, pegou a mão de Laura e completou:

— Sou eu. Eu sou a namorada dela. E, sim, eu vou com ela à festa da família, se ela quiser.

A porta da sala, que estava entreaberta, rangeu ao ser totalmente aberta. Eunice e Camila estavam ali paradas. Viram tudo. Ouviram tudo. O tempo pareceu congelar por um instante.

Os olhos de Eunice, arregalados, não sabiam se expressavam surpresa ou orgulho.

Camila, por sua vez, levou lentamente a mão ao peito, como se quisesse impedir que o coração saísse pela boca.

Sofia levou alguns segundos para processar.

— Você? — disse, voltando-se para Júlia com desdém. — Você é só uma funcionária, uma novata!

— Sou uma médica Senhora. Uma profissional, como sua sobrinha. — respondeu Júlia, firme. — E sou alguém que respeita e gosta dela do jeito que ela é. Coisa que, com todo respeito, a senhora claramente tem dificuldade em fazer.

Laura, atônita, finalmente falou:

— Júlia... você não precisava...

— Eu precisava sim. Alguém precisava dizer. — respondeu, sem tirar os olhos de Sofia. — Ela não está quebrada. Não precisa de conserto. Precisa de liberdade pra ser quem é.

Um novo silêncio caiu.

Eunice finalmente deu um passo à frente, colocando uma mão no ombro de Júlia.

— Bem-vinda à família, doutora Ana Júlia. Acho que a minha nora Sofia está precisando de um café... forte.

Camila apenas assentiu, os olhos marejados, olhando para a filha com uma mistura de espanto, admiração... e medo.

Laura, ainda sem fala, apenas olhou para Júlia. Os olhos azuis intensos, a respiração descompassada, o coração em guerra entre o pânico e... gratidão.

Júlia sorriu, agora mais calma, e sussurrou:

— Se você ainda quiser, eu vou com você nessa festa.

 

E, pela primeira vez em muito tempo, Laura sorriu de volta. Um sorriso pequeno, vulnerável. Mas real.

 

Fim do capítulo


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Comentários para 9 - Capitulo 9 - Decisoes precipitadas:
Mmila
Mmila

Em: 08/07/2025

Eita que agora vai....

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lia-andrade
lia-andrade

Em: 06/07/2025

É isso Júlia, mostre a que veio. Será que agora a festa sai? Ansiosa pra todos juntos e ver o desenrolar de tudo isso. 

Bjo, até breve.

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