34 por Luciane Ribeiro
Minha aluna
HELENA
Acordei na segunda de mau humor. Enquanto dirigia para o Instituto, pensava em como Erika tinha o dom de me colocar em situações desconfortáveis. E ser mentora de uma das alunas novas era uma eles.Eu não queria ensinar ninguém, muito menos adolescente, porém , ela nunca aceitava um não e sabia bem como me convencer. A central dos alunos me enviou a ficha da garota, mas eu nem abri.Eu saberia em campo se era apta ou não para estar ali.A norma do novo e mais avançado complexo Travinski, dizia que os mentores deveriam escolher uma cor para os representar. Nossos alunos deveriam usar uma faixa no braço com a cor de seu mentor, para que fossem rapidamente identificados caso necessário. Escolhi minha cor favorita para me representar. Ela deveria já estar com a faixa azul no uniforme ao entrar.A maioria dos mentores tinham em média seis a doze alunos que ficavam no mesmo dormitório. Como ela era minha primeira e única aluna, a coloquei na minha suíte particular que ficava nos em um dos meus laboratórios. Ali tinha banheiro privativo, cama kingsize,geladeira e ate uma pequena varanda . Sem falar que ficava próximo a uma das muitas cabines de segurança. Esperei por quarenta minutos e nada dela chegar. O atraso me irritou bastante, quando pensei que ela havia desistido, recebi uma ligação da portaria, perguntando se podiam liberar a entrada delas. Autorizei e esperei na entrada do estacionamento.
Esperava ver uma garota pálida de óculos, ao invés disso, desceu do carro uma garota negra aparentando ter dez anos, com um cabelo black gigante e um olhar atento e curioso. Estava acompanhada por uma mulher branca aparentando ter cinquenta anos. No momento que vi a garota, já me senti frustrada, como não haviam muitas pessoas negras no instituto, Erika costumava se empolgar demais com os candidatos que apareciam ,mas a maioria acabava por escolher áreas diferentes da nossa. Fiquei observando as duas enquanto retiravam a mala e outras coisas do carro. Possivelmente aquela mulher era uma daquelas solteironas que quando percebem que não vão arrumar um marido decidem adotar uma criança para cobrir o vazio. Esse tipo de pessoa tende a não ter pulso firme ,o que significava que a garota deveria ser do tipo mimada.
Apesar de já estar detestando tudo que se referia a minha pupila. Mantive minha postura profissional e as recebi educadamente.
-Bom dia! Sejam bem vindas ao Instituto Travinski.
-Bom dia! Doutora Helena ,eu presumo.
-Sim!
-Desculpe pelo atraso! Foi um pouco complicado encontrar esse lugar.Me chamo Aline e essa é minha filha Dandara.
-Bom dia, doutora. Estou muito ansiosa para aprender com a senhora!
-Me acompanhem por favor!Vou mostrar o lugar a vocês.
Bem!Pelo menos ela parecia ser educada. Mostrei a elas todas as instalações do campus como era de costume fazer com os novos alunos. Os olhos da menina brilhavam como luzes de natal quando entramos no meu laboratório. Por alguns instantes me lembrei de mim mesma na primeira vez que entrei na Travinski.
-É sua primeira vez em um laboratório?
-Não! Já estive algumas vezes nos laboratórios do centro de pesquisa Isabel Montello,mas obviamente não me deixaram tocar em nada.
-Dandara sempre se interessou por ciências. Confesso que algumas vezes isso foi um problema .Certa vez essa danadinha aprendeu uma mistura de químicos para fazer espuma colorida. Nossa cadela ficou com os pelos roxos por uma semana depois que nadou em nossa piscina que tinha sido usada para a experiência. E quando tinha dez anos, tentou construir um aparelho para ajudar as crises de ansiedade da sua melhor amiga, ela quase causou um incêndio porque o tal aparelho pegou fogo. Como já deve saber,a última que ela aprontou foi explodir o laboratório da escola...
-Minha mãe está exagerando. Não foi uma explosão grande como ela fez parecer... Mas o importante é que eu consegui separar os compostos e identificar as moléculas.
-Você parece muito jovem! Quantos anos você tem Dandara?
-Tenho 12!
-Ainda me parece tão estranho ela já estar no ensino médio...tentamos manter ela nas séries para a idade dela mas fomos orientadas a permitir que ela adiantasse os estudos ,depois que descobrimos que é superdotada.
-Entendo...
Aquilo ia ser um completo desastre!!!Senti o que chamavam de dejavú.Aquela garota tinha a personalidade bem parecida com a de Eve! Até mesmo gostava de fazer experiências inapropriadas ,em lugares inapropriados. Possivelmente seria mais adequado ela ir para as turmas de química avançada. Comecei a me sentir feliz, acreditando que conseguiria convencer Erika a transferi la, mas quando entramos no meu centro de pesquisa. Aquela menina baixinha me mostrou que era bem mais do que parecia e que ela estava exatamente onde queria e devia.
Dandara manteve os olhos fixos nos dados da pesquisa que estavam nos quadros. Perguntou se poderia dar uma olhada no que estávamos trabalhando. Pensei um pouco, depois digitei minha senha do sistema em um dos computadores. Minha arrogância me fez crer que ela não conseguiria entender nada do que fosse lesse ali ,então coloquei os dados base do 34 na tela. Ela lia tudo atentamente. Quando terminou ,se virou pra mim e perguntou:
-Acredita mesmo que um dia será possível reiniciar de forma artificial as ondas cerebrais de um cérebro quase morto? Isso seria fantástico!
Fiquei tão surpresa por ela ter entendido o 34 ,que levou alguns segundos para meu cérebro processar que tinha que lhe dar uma resposta.
-Estamos trabalhando duro para isso.
-Isso mudaria a história. Milhares de pessoas seriam salvas.
-Com certeza...Pena que ainda estamos na teoria...!!!!
-Tenho certeza que a senhora vai conseguir realizar isso.
Saímos do laboratório e nos encaminhamos para onde seria o seu quarto. A mãe a ajudou a se instalar depois a acompanhamos até o seu carro.Eu continuava perplexa. Como aquela criança conseguiu absorver em minutos o que metade da minha equipe ainda tentava entender? E o 34 ?Como ela conseguiu entender tão rápido? Será que Erika tinha razão e aquela garota era o que faltava para nos aprofundarmos na pesquisa e finalmente ter o resultado final que esperávamos? Não! Aquela era um segredo e uma responsabilidade grande demais para alguém tão jovem! Mesmo que ela fosse realmente brilhante.
-Foi um prazer conhecê la ,Doutora Helena!
-O prazer foi meu!
-Filha !Nos ligue todos os dias!Tá bom?
-Tá!
-Não esqueça de tomar o "seu remédio"!
-Não vou esquecer!
-E tome cuidado com as coisas que vai comer. Preste atenção na quantidade de açúcar!
-Tá bom !
-Tem certeza que trouxe tudo que precisa? Se estiver precisando de alguma coisa ou se estiver com saudades de casa, nos ligue!
-Mãe!Eu vou ficar bem!
-Eu sei que vai ,porque você é brilhante ! Mas não quer dizer que seja fácil para mim te deixar aqui... Me dê um abraço meu bebê! Vou sentir tantas saudades...
-Mamãe...está me abraçando forte demais...
-Desculpe!Eu amo você filha!
-Também te amo!
-Melhor eu ir! Cuide bem da minha menina doutora. E se comporte Dandara. Nos vemos no fim de semana.
Ela finalmente entrou no carro e foi embora. Minutos depois, enquanto voltávamos ao laboratório ,o celular de Dandara começou a tocar.
-Oi mãe !Está tudo bem!Claro que é seguro! Tem seguranças por todos os lados! Não mãe...Ainda não quero voltar para casa!Pare de chorar por favor!Eu vou ficar bem!Eu não te abandonei...Vou ver você no fim de semana! Mãe...eu te amo! Tchau!
Fiquei pensando no quanto a mãe dela era grudenta. Tinha acabado de sair dali e já estava ligando. Dandara desligou o telefone e olhou para mim um pouco envergonhada como qualquer pré adolescente.
-Desculpe! Sabe como são as mães... Ela chorou por uma semana quando minha irmã mais velha se mudou para fazer faculdade.
-Entendo...Bem...aqui está o seu cartão de acesso. Por hoje você está dispensada dos estudos. Começaremos amanhã bem cedo. Qualquer dúvida fale com a Gabriela. Ela é responsável pelos dormitórios e pelos quartos individuais como o seu. Boa tarde e até amanhã.
-Até amanhã. E obrigada pela oportunidade. Não irei decepciona la!
Depois de deixar Dandara em seu quarto, fui para casa e fiquei por um longo tempo pensando no quanto parecia que eu estava errada sobre minha aluna. Talvez não fosse ser tão ruim ensiná la...Na manhã seguinte ,me arrumei para dar minha primeira aula. Dandara já me esperava ansiosa no laboratório. Comecei dando a ela a tarefa de estudar e analisar tudo que estava sendo feito no laboratório naquele momento. Não demorou para ela perceber que os dados não batiam com os que eu havia lhe mostrado. Começou a fazer inúmeras perguntas as quais eu não podia responder. Por um instante agradeci por Erika estar me ligando ,mas meu alívio desapareceu quando ouvi sua voz.
-Lena...Aconteceu algo que não estava previsto. E eu precisei mudar meus planos.
-Mudar como?
-Precisei traze la para a casa Verde!
-Você enlouqueceu!!??
-Não tive escolha! Tem algo errado com ela! Os monitores estavam registrando algum tipo de anomalia, mas eu não estou conseguindo descobrir do que se trata! Não quis arriscar continuar a viagem.
-Porque não me ligou antes? Já faz dois dias...E se eu não conseguir resolver isso?
-Sei que consegue!Venha!
-O que faço com a Dandara? O doutor Carlos não tira os olhos de nós duas.
-Traga ela com você! Diga que vai fazer uma atividade fora do campus.
-Isso é uma péssima idéia!
-Eu cuido dela quando chegarem aqui.Venha logo. Antes que seja tarde demais.
Desliguei o telefone com o coração na mão. O que fazer com a Erika? Ela sempre me arrumava problemas. A maioria deles sempre me levavam a algo maravilhoso. Mas dessa vez ,aquele problema estava me deixando no limite da minha sanidade. Me aproximei de Dandara e falei em um tom baixo.
-Pegue suas coisas! E me encontre no estacionamento!
Dandara me olhou assustada ,mas ao mesmo tempo curiosa. Fui até o freezer digitei minha senha e peguei o que achei que fosse precisar .Depois fui em direção ao estacionamento. Coloquei as coisas no carro e esperei por Dandara que chegou apressada.
-Para onde vamos?
-Vou te levar para conhecer uma das cientistas mais brilhantes que já conheci. Ela foi minha primeira mentora.
-Vou conhecer a doutora Erika Carvalho?
-Sim...Já ouviu falar nela?
-Eu sei tudo sobre os neurocientistas do Instituto! Ela é um grande exemplo para mim.Foi a primeira cientista negra que vi na revista científica. E me interessei ainda mais pelo seu trabalho ,quando divulgou aquele estudo sobre os problemas neurológicos causados em crianças que são filhos de pais viciados em drogas.
-Ela fez inúmeras pesquisas muito mais interessantes e importantes do que essa. Por que se interessou logo por essa?
-Tenho interesse pessoal nessa pesquisa. Ela me ajudou a entender muitas coisas sobre mim mesma. Minha mãe biológica era usuária, só parou de usar na gravidez ,porque foi presa. Para minha sorte quando ela saiu eu já estava para nascer. Mesmo assim à medida que eu cresci e comecei a entender as coisas. Comecei a ter medo que isso fosse me afetar em algum momento da minha vida. O estudo que ela fez tirou esse peso das minhas costas.
-Entendo...
Ela parecia um pouco desconfortável e triste ao falar sobre aquele assunto, então resolvi falar de outra coisa para tentar acabar com o clima ruim.
-Me conte qual era a sua idéia para acabar com as crises de ansiedade de sua amiga.
-Minha mãe não devia ter contado isso...Eu era criança não sabia o que estava fazendo.
-Existem descobertas grandiosas que começaram com uma ideia maluca. Não tenha medo de tentar e errar.Me conte a sua idéia...
-O conceito era parecido com o de um marca passo. Seria uma pulseira que identificaria as crises através do aumento dos batimentos cardíacos e da frequência respiratória. Assim que identificada a crise a pulseira enviaria um impulso elétrico como um pequeno choque para o córtex cerebral...Como pode ver,eu não sabia o que estava fazendo...
-Me parece bem interessante. Se você continuar estudando e aperfeiçoando a idéia, tudo pode acontecer! Quem sabe esse não vai ser o trabalho da sua vida?
-Seria bem legal se isso fosse verdade. Mas desisti dessa ideia a muito tempo. Vou ter que encontrar outra coisa para me levar ao Nobel .
-Vai continuar na área da neurociência? Você parece gostar bastante da área química.
-Pretendo atuar nas duas áreas. Primeiro vou me formar em neuro ,depois fazer doutorado em Bioquímica.
-Você deve gostar bastante de estudar !
-Sim!Eu gosto bastante!
-Gosto de pessoas que estão sempre em busca de conhecimento.
-Minha mãe uma vez me disse. "O mundo vai te julgar e achar que você é menos do que realmente é, então tem que ser melhor do que eles são capazes de imaginar. "Nos estimula a aprender de tudo! De esportes a idiomas.
Me senti um pouco desconfortável com aquela frase, afinal, eu tinha julgado a capacidade intelectual dela inferior sem nem ter conversado com ela.
-Ela inclusive fala cinco idiomas e está aprendendo mais um.
-Vocês e suas irmãs também são multilíngues?
-A Rafa fala inglês, francês e italiano.Eu e minhas irmãs mais novas falamos inglês e elas estão aprendendo italiano.Eu escolhi alemão. Mamãe já começou a me ensinar. Dias atrás minha irmã Antonella ,aprendeu um palavrão em italiano com a tia Maristela. Minha mãe ficou muito brava ,mas eu e minhas irmãs ,rimos muito.
-Você parece gostar muito de suas irmãs!
-Eu adoro minhas três pestinhas mais novas, mesmo quando bagunçam meu quarto. Apesar de bagunceiras elas são muito carinhosas e sempre me animam quando estou triste. E a Rafa é minha conselheira e minha advogada. Sempre me defende quando estou em apuros. Confiamos uma na outra e nós apoiamos. A senhora tem irmãos?
-Como?
-Irmãos? A senhora tem?
-Tenho um! Ele é minha única familia.Também tinha uma irmã mais velha ,mas ela faleceu a muitos anos. Ela e eu,éramos como você e sua irmã mais velha. Ela também me protegia e cuidava de mim.
-Eu sinto muito por sua irmã.Eu e minhas irmãs brigamos às vezes ,mas não consigo imaginar minha vida sem elas.
Era estranho como Dandara estava me fazendo falar. Era tão fácil conversar com ela. Quase me esqueci que ela só tinha doze anos. Minha tensão havia diminuído um pouco ,mas voltou duas vezes maior quando meu celular tocou novamente com mais uma chamada de Erika.Como estava dirigindo , não atendi.As coisas não deviam estar nada bem na Casa Verde. Fiquei em silêncio o resto do caminho. Meia hora depois nós passamos pelo portão principal da propriedade. A Casa Verde já havia sido um pequeno e luxuoso laboratório, mas hoje em dia era apenas mais um dos imóveis do Instituto que estavam fechados. Digitei o código de segurança que Erika havia me dado e entramos. Tudo estava tranquilo e silencioso. Sê uma das alunas de Erika não tivesse vindo até nós ,acreditaria que o lugar estava vazio.
-Bom dia doutora ,Helena.
-Bom dia Carolina! Essa é minha aluna, Dandara!
-Muito prazer Dandara. Seja bem vinda a Casa Verde. A doutora Erika está precisando da senhora no laboratório. doutora Helena.
-Pode mostrar o lugar para Dandara?
-Claro!
-Eu volto logo!
Quando entrei no corredor minha calma , deixou de existir. Caminhei apressada até chegar no laboratório. Erika estava pálida e toda desalinhada.
-Oi...o que houve?
-Que bom que você chegou, Helena. Estamos em sérios apuros.
-Parece tudo normal!
-Não se engane...parece normal agora porque apliquei uma dose enorme de Diazepam nela.
-Por que?
-Porque ela voltou a ter convulsões! Helena... Acho que estamos perdendo ela... Talvez seja a hora de desistir...E deixa la ir....
-Não! Não vamos desistir !Fomos longe demais para voltar atrás. Vamos manter tudo do jeito que está até que não tenha mais jeito ou até que ela acorde. Vou analisar cada uma das partes do processo para ver o que está errado...
-Helena! Não dá mais para continuar...Eu não aguento mais ver ela assim...
-Você não aguenta? Foi você quem começou isso!!!Foi você quem me ligou e disse que queria testar o 34 nessa mulher que você nunca sequer me disse o nome!!!Eu me dediquei e me esforcei para manter ela viva, não quero desistir agora...
-Eu sei!Me desculpe!!!Eu acreditei que daria certo...Não queria perdê la...
-Não pode fazer isso comigo...!!!! Estamos quase lá. Recuperamos quase toda a funcionalidade do cérebro dela...Sinto que estamos perto.
-Recuperamos! Mas sempre que tentamos acorda la.As ondas cerebrais diminuem e o cérebro começa a morrer de novo!
-Só precisamos de mais tempo...
- Sequer temos certeza se ainda existe alguém ali! Talvez estamos apenas impedindo o corpo de se decompor!
-Não acredito que disse isso...
-Desculpe...Estou cansada! Ela está estável agora. Vou sair e tomar um ar fresco.Talvez seja isso que estou precisando...
Ela saiu do laboratório e me deixou ali pensativa. Iniciei minha análise. Comecei pelos últimos dados coletados ,depois peguei uma amostra de sangue para verificar se tinha alterações, não encontrei nada de anormal. O que eu não estava vendo? Porque não conseguia encontrar o problema? Tudo estava indo tão bem...Meu foco era tão grande que me esqueci de comer ,beber água ,ir ao banheiro.Me esqueci completamente de Dandara. Só fui perceber que já estava quase anoitecendo quando Erika voltou. Ela trazia um sanduíche e um copo de suco.
-Lena ! Você precisa comer! E está na hora de levar Dandara de volta. Já não tenho mais assuntos para falar e enrolar ela.
-Minha nossa!Eu me esqueci dela...
-Estou bastante impressionada com a sua inteligência Agora tenho absoluta certeza que não errei na hora de escolher sua primeira aluna.
-Não mesmo...
-Lena... Desculpe por mais cedo...Não vou desistir dela! Pode ficar tranquila. Agora deixe sua análise e coma!
Quando comecei a comer. Ouvimos os bips do monitor cardíaco e de todos os outros.
-É outra convulsão?
-Parece que sim.Me ajude !Acho que teremos que reiniciar e injetar o composto simultaneamente nos hemisférios.
-Precisaremos de ajuda para fazer isso! Vou chamar a Dandara e a Carol.
-Não!!!
-Ou chamamos elas. Ou tudo isso acaba hoje, porque ela vai morrer!
-Tá bom!Chame!
Erika saiu correndo pelo corredor e voltou com as meninas. Carolina era a aluna braço direito de Erika ,então já sabia o que estávamos fazendo ali. Já Dandara ficou em choque no primeiro instante .
-O que vocês estão fazendo ?
-Não dá pra explicar tudo agora! Preciso que vá ao microscópio e use a fórmula que eu vou te dizer. Assim que estiver pronta ,coloque 50ml em quatro seringas com agulhas de 2mm.
Ela rapidamente começou a fazer tudo que pedi, com a ajuda de Carolina. Assim que ficaram prontas elas se aproximaram. Dandara arregalou os olhos ao ver quem era.
-Meu Deus!É a tia Eve!
Noite de 18 de julho de 2019
-Alô Erika?
-Oi doutora, como vai você?
-É...não estou nada bem!Minha filha... Evelyn... ela está morrendo...
-Como assim morrendo? Falei com ela hoje a tarde e ela estava ótima!
-Pode vir ao hospital? Tenho certeza que ela gostaria que estivesse aqui...
-Em qual hospital vocês estão?
-Estamos no São Marcos.
Erika dirigiu sem acreditar no que tinha acabado de ouvir! Eve era uma das pessoas que ela mais gostava. Aquela garota de cabelos cacheados havia conquistado seu coração com seu jeito meigo e um pouco malandro de ser. E agora que voltaram a trabalhar juntas estavam cada dia mais próximas. Quando chegou ao hospital, encontrou seu pai e seus irmãos na sala de espera. Estavam abatidos e se abraçavam em busca de conforto e apoio.A mãe dela estava dentro do quarto, segurava firme a mão da filha tentando impedir o inevitável!
-Oi Aretta...O que aconteceu?
-Ela ...tentou ajudar alguém e foi atacada. Bateram nela com tanta força ,que abriram a cabeça dela. Depois a deixaram morrendo como se não fosse nada!
-Meu Deus! Que horror!!Conseguiram prender os responsáveis?
-Eles estão investigando, mas a garota que minha filha ajudou não quer falar. Está com muito medo. De qualquer forma isso não importa.
-Qual o estado clínico dela?
-A tomografia mostrou um grande coágulo provocado por um traumatismo craniano. O cérebro dela está inchado e morrendo a cada minuto que passa. Nós duas sabemos o que isso significa. Mesmo que ela acorde, o que é praticamente impossível de acontecer nessa altura.Eu nunca mais ouvirei a voz ou a risada dela...
-Não tenho palavras para dizer o quanto sinto muito. Ela é uma das melhores mentes que já tive o prazer de trabalhar. E se tornou uma grande amiga ao longo dos anos. É difícil acreditar que isso está acontecendo.
-Só queria que ela acordasse. Nem que por alguns instantes. Queria poder dizer a ela que a amo. E que sempre tive muito orgulho dela. Só queria poder sentir o seu abraço pela última vez...
Erika se aproximou daquela mulher que estava em pedaços e a abraçou.
-Logo o médico irá declarar a morte cerebral e vão desligar os aparelhos É por isso que chamei você aqui essa noite! Minha filha gostava muito de você , ela te respeitava e admirava. Acredito que vá entender o fato de eu deixar esse fardo com você. Nenhum de nós consegue assistir ela dar o último suspiro... mas não queremos que fique sozinha...
-Me sinto honrada de ficar, mas você tem certeza que é isso mesmo que desejam?
-Os amigos estiveram aqui para se despedirem. Assim como nossos familiares! Todos já se conformaram e estão prontos para deixar ela ir! Eu ainda não estou!
Aretta deu um beijo na testa da filha, depois se sentou novamente e voltou a segurar forte a sua mão. As palavras saiam entrecortadas e dava para sentir angústia e desespero em cada uma delas...
-Meu Deus! Devolve minha filha...Por favor! Não posso perder minha menina. Como poderei continuar vivendo sem meu leãozinho? Sei que desligar tudo é a melhor decisão ,mas não dá.Eu não consigo ...quero ela aqui mesmo que eu só possa ver...É egoísmo ,mas eu não consigo ...não posso perde la...
Erika que já estava de coração partido por estar vendo sua amiga morrendo. Ficou ainda mais angustiada com as palavras de sua mãe.Naquele momento ela tomou uma decisão desesperada.
-Aretta ...Talvez tenhamos uma chance de salva la.
-Como?
-Se lembra da pesquisa que pedi para a empresa de seu marido financiar e vocês só aceitaram financiar quando souberam quem seria a cientista a conduzi la?
-Oh sim! Helena! Eve fez uma coisa horrível com ela ,quando soubemos, tentamos fazer tudo que podíamos para ajuda la,mas não pudemos fazer muito. Venho acompanhando os progressos dela desde então. É uma garota realmente notável, mas o que ela tem a ver com minha situação?
-Parte do dinheiro que vocês me deram. Está sendo usado na pesquisa sobre desenvolvimento e criação artificial de nanochips capazes de identificar e neutralizar aneurismas e tumores cerebrais, mas a outra parte está sendo usada para desenvolver uma coisa especial e ainda mais inovadora. Ainda não testamos em humanos mas os resultados têm sido bastante promissores.
-De que realmente se trata?
-Ela está desenvolvendo uma fórmula que estimula o surgimento de células substitutas para células mortas do cérebro. Acreditamos que assim poderemos reiniciar as ondas e as funções do córtex e das outras áreas do cérebro.
-Isso é mesmo possível?
-Como eu disse antes, ainda não testamos em humanos...e talvez você não queira ver sua filha sendo uma ....
-O que eu preciso fazer? Precisa de minha autorização ?Eu assino!!!Aceito qualquer coisa que possa trazer ela de volta para mim
-Antes de tudo, preciso ter certeza que entende que não temos certeza se dará certo ou não! E ninguém pode saber disso. As consequências seriam catastróficas para mim ,para Lena e para todos os que se envolverem nessa experiência.
-Pode ser que não dê certo, mas pelo menos vou poder dormir sabendo que fizemos tudo que podíamos...Do que você precisa?
-Vou fazer algumas ligações. Peça aos médicos uma transferência. Diga que quer uma segunda opinião. E Aretta tem mais uma coisa que tenho que pedir a você, antes de fazer essa ligação. Talvez essa seja a parte mais difícil.
-O que é?
-Helena não pode saber quem ela é .Pelo menos por enquanto.
-Acha que ela não irá reconhece la?
-Tenho certeza que não ,ela não a vê a anos ,além disso o rosto está muito inchado e o cabelo tão característico de Eve foi cortado. Contarei a verdade a ela quando as coisas estiverem estáveis. Não quero que ela se culpe caso não dê certo...
-Entendo...E aceito!
Aretta disse a todos que Eve estava em coma profundo e que ela tinha decidido enviar ela para uma clínica no interior. Disse a verdade apenas a seu marido. Que não concordou de imediato. Ele não gostava da ideia de sua filhinha estar sendo usada como cobaia, porém, sua esposa o convenceu que desligar os aparelhos sem nem ter dado uma chance seria ainda pior.
Tiveram muitos altos e baixos. A fórmula de Helena sofreu e continuava sofrendo ajustes. Embora estivessem conseguindo criar novas células,Eve continuava sem demonstrar sinais de consciência.
Fim do capítulo
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