Capitulo 42 - Jantar em família.
Camila
Alguns dias se passaram desde a morte de Eleanor. Eu cuidei de toda a parte burocrática para a cremação, Helen não tinha condições nenhuma de fazer nada, e assim tomei essa responsabilidade para mim. Agora as cinzas da mulher estão na minha mesinha de centro há quase dois dias. Helen não foi em casa desde que tudo aconteceu. Ela não consegue ir até lá. Da cozinha a observo fitando a TV, sei que não está prestando atenção a nada, seu olhar está vago. Distante daqui.
- Amor, o café está pronto. – sorri para mim. Esses são os únicos momentos que vejo seus olhos brilharem. Quando a chamo de “amor”.
Ela vem até o balcão. Senta-se em minha frente. Ainda não conversamos sobre os dois elefantes na sala. As cinzas de Eleonor, e a minha boca ferida. Não que ainda esteja. Minha mãe passou um remédio e melhorou em alguns dias, mas sei que em algum momento terei que dar explicações.
- Isso está bom. – Morde o bolo.
- Aprendi com a melhor. – Brinco.
- Ela é mesmo a melhor. – Ficamos em silêncio. – Em algum momento vamos ter que conversar sobre isso. – Aponta para nós.
- Pensei que já estivesse claro. Estamos juntas o tempo inteiro, eu gosto da sua companhia, você da minha. O sex* é maravilhoso. Então, pensei que já estava claro que precisamos nos casar. – Ela arregala os olhos. – Não faz essa cara. Vou pensar que não quer.
- Você está falando sério?
- Sim. Em algum momento isso vai acontecer. – Dou a volta indo até ela. Ponho-me entre duas pernas. – Você não está sozinha e nunca está. Mas eu quero oficializar, que isso por enquanto. – Aponto para nós. – É um namoro.
- Mila, não brinca comigo. Eu acabei de ficar órfã.
- Amor. – Arrumo seus cabelos atrás da orelha. – Eu não brincaria com isso. Algo nos uniu e eu jamais vou deixar que seja diferente. – Seguro sua mão contra meu peito. – Ficaremos juntas desde que esse seja o seu desejo.
Com um largo sorriso ela pula em mim, pendurando-se no meu pescoço, prende suas pernas em volta da minha cintura.
- Você não tem ideia de quantos anos esperei para ouvir isso. – Ela me beija. – Mas e os seus pais? O que eles irão pensar sobre estarmos romanticamente envolvidas?
- Amor, por favor! Meus pais já sabiam disso antes mesmo que eu soubesse. – Helen gargalha. – Seu sogro até quis me convencer de que você era um bom partido.
- Preciso dar um beijo no meu sogro por isso. Mas agora podemos comer?
A semana passou na mesma. Ficamos em casa boa parte do tempo, saímos apenas para trabalhar. Depois era filme, beijos, amassos, sex*, comida e dormir. Não estou reclamando. Mas minha mãe, sim, me ligou várias vezes na semana nos chamando para jantar com eles. Entendo que essa questão do luto é algo diferente para cada pessoa, mas Helen se tornou uma máquina de sex* nos últimos dias e isso nos prende quase todas as noites em casa.
Estou parada em frente à rodoviária, esperando por Samuel. Ele veio trazer minhas coisas e tentar se entender com meu pai. O que eu estou animada que aconteça durante o jantar que vamos contar sobre nosso namoro, assim aliviamos a tensão entre os dois.
- Pensei que nunca iria chegar. – Ele reclama entrando no carro.
- Oi! Saudades. – Brinco.
- Desculpa. Só pensei que iria demorar a colocar meus pés aqui. – Ele afunda no banco enquanto afivela o cinto.
- Não seja bobo. Dessa vez estou aqui. – Toco sua perna. – Se importa que eu vá no escritório antes de irmos para casa?
- Tanto faz. – Dá de ombros colocando os fones de volta aos ouvidos.
Enquanto vou até a minha sala buscar o embrulho que esqueci, Samuel espera no carro. Helen estava em casa nos esperando. Seria apenas o tempo de tomar banho para irmos jantar com meus pais.
Samuel cumprimenta Helen com um longo abraço. Enquanto deixo-os conversando vou para o banho. Escolho uma roupa confortável. Desço as escadas, escuto suas vozes na cozinha.
- Não sei o que aconteceu, juro. Sai antes da festa acabar, ela ficou lá.
- Ela estava com a boca machucada. – Helen diz.
- Então, talvez seja melhor perguntar a ela o que aconteceu. Afinal vocês estão juntas, não é?
- Sim. Tudo bem. Eu só não sei como tocar nesse assunto.
- Bom, eu preciso ir tomar banho. – Ele se levanta.
Passa por mim na escada.
- Cuide disso, sim?! – Sussurra para mim.
- Amor. – Grito por ela.
- Na cozinha.
Vou até lá. Seguro sua cintura, beijo seu pescoço. Ela sorri enquanto suas mãos me enlaçam o pescoço.
- Nossa! O que foi isso?
- Nada, apenas por que te amo. Não posso?
- Pode. Mas assim vamos nos atrasar.
- Samuel ainda demora. Por falar nele, nas coisas que ele trouxe veio um presente que comprei para você. – Seus olhos se iluminam.
- Um presente para mim?
- Isso. Acho que vai servir perfeitamente. – Afasto-me o suficiente para observá-la.
- Agora estou curiosa.
- Guarde sua curiosidade. Precisamos ir ou mamãe vem nos buscar.
- Isso não é justo, você me atiça a curiosidade e quer fugir. – Reclama vindo atrás de mim.
Samuel se junta a nós. Como somos vizinhos fomos caminhando até a casa dos meus pais. A mesa está posta no quintal, as luzes acesas deixam o clima familiar, como nos velhos tempos. Meu pai cuida da churrasqueira enquanto saboreia uma cerveja.
- Pensei que era apenas um jantar em família. – Digo rindo.
- Mas é. Apenas para conversar. – Meu pai sorri.
Vou até ele e o abraço. Samuel se mantém longe. Suponho que por medo. Meu pai olha para ele.
- Não vem falar com o seu pai, filho?
Minha mãe funga abraçada a Helen. Samuel olha do nosso pai para mim. Eu o incentivo a vir até nós com leve aceno de cabeça. Ele caminha incerto, posso ver o receio estampado em seus olhos.
- Que saudade, filho. – Meu pai diz. – Sinto muito por tudo que eu disse. Eu amo você, amo os dois e nada vai mudar isso. – Diz choroso. Nos abraçamos enquanto Helen nos observa. – Venha, querida. Você é parte dessa família.
Helen se junta a nós. O abraço é regado a lágrimas de felicidade. Helen sai de fininho dizendo que vai ajudar minha mãe a preparar a mesa. Deixo Samuel e meu pai conversando perto da churrasqueira. Sento-me observando o quanto as coisas mudaram para mim em um curto espaço de tempo. Fui de um namoro, a um par de chifres, voltei para a cidade que jurei nunca mais voltar. Aceitei meu amor por quem jurei nunca mais amar.
- Está tudo bem? – Helen indaga apoiando a mão em meu ombro.
- Sim. Está. Estava apenas pensando.
- Em mim?
- Principalmente em você. Será que podemos ir até o meu quarto?
- Claro.
Aproveitamos um momento de distração e seguimos para o segundo andar. Entro espero que ela passe e fecho a porta. Helen me fita ansiosa, mexe nas mãos demonstrando seu nervosismo.
- Está tudo bem mesmo?
- Sim. Está. Não se preocupe. Vem, senta aqui. – Fico no tapete indicando o meu lado para ela sentar, minhas costas estão apoiadas na cama. Helen senta-se.
Ela olha na mesma direção que eu olho. Podemos ver a janela de seu quarto. Acredito que nesse momento tudo o que ela menos quer é imaginar sua casa vazia.
- Perdi tantas noites de sono imaginando que Miguel estaria com você, no seu quarto. – Confesso.
- Mila, ele nunca foi ao meu quarto.
- Minha cabeça de adolescente apaixonada era bem fértil. – Brinco. Ela sorri. – Vai ser difícil voltar para lá, não vai? – Viro para olhá-la, ela concorda com a cabeça. – Talvez você não precise voltar.
- Como assim?
- Acho que deveria vir morar comigo de uma vez.
- Mila, você está falando sério?
- Sim. Estou. Você já vive lá em casa o tempo inteiro. Só precisamos mobiliar a casa para termos mais conforto. – Digo com um sorriso. – Nem precisa levar as coisas da sua casa. Podemos doar tudo, se preferir.
- Minha mãe não iria querer isso. Digo, ela iria desejar que eu ficasse com algumas coisas.
- Então, isso é um sim?
- Óbvio. – Ela sorri.
- Ótimo. Assim não preciso me desfazer disso.
Abro a caixinha vermelha. Hellen me fita com curiosidade.
- Abre. – Com os dedos trêmulos ela pega a caixa.
- São lindas.
Dentro há duas delicadas alianças de ouro branco com uma pedrinha na parte de cima.
- Esse não é um pedido de casamento. – Digo. – É apenas uma promessa que estamos fazendo um juramento que caminharemos juntas, independente do que aconteça. – Pego a aliança e ponho em seu dedo. – O casamento virá depois que você conseguir virar promotora e eu juíza. – Ela sorri.
- Então, vai estudar?
- Sim. Noite e dia. Para termos a vida que merecemos. A vida que sua mãe queria que você tivesse. – Ela coloca minha aliança.
- Eu amo você.
- Eu também te amo. – Confesso tomando seus lábios.
- Amor, já que estamos oficializando nossa parceria contra o crime e no amor. – Ela sorri. – Precisamos ser honestas. Saber tudo sobre a vida da outra.
- Mas você já sabe. Acredito que nós já sabemos tudo uma da vida outra. – Brinco com seus dedos nos meus.
- Nem tudo. E eu tenho evitado o assunto. Mas acho que agora é um bom momento para perguntar.
- Eu sei. Você quer saber sobre o ferimento na minha boca.
- Sim. – Afirma.
- Hell, eu preciso que me escute sem julgamentos. E entenda que eu amo você, que isso. Nós somos algo para valer, somos algo pelo qual vale a pena lutar. Não posso deixar que aquele erro estúpido acabe com que estamos construindo.
- Você a beijou? – É direta.
Dou um longo suspiro. Conto tudo exatamente como aconteceu. Sinto-me envergonhada. Ela me escuta sem esboçar nenhuma reação. Apenas fica lá, sentada, me ouvindo falar sobre meu encontro com Mariana. Eu choro, talvez pela vergonha do que fiz, ou pela mágoa que não consigo deixar para lá.
- Bom, foi isso. – Concluo secando as lágrimas.
Hellen me abraça.
- Sinto muito, meu amor. Sinto muito por toda essa raiva, pela mágoa. Pelo medo. A vergonha. Obrigada por não esconder isso de mim. – Seu abraço é ainda mais apertado. – Eu amo você. Vamos cuidar disso na terapia? Se livrar desse sentimento ruim que você tem por ela? – Concordo com a cabeça.
- Você é perfeita. – A beijo.
- Desculpa interromper o casal, mas nossos pais mandaram as madames descerem. – Samuel diz escorado na porta.
Descemos e antes mesmo que eu pudesse dizer que estamos juntas, minha mãe fez isso gritando quando viu nossas alianças. Meu pai nos abraçou, já deixando claro seu interesse em netos, adotados, inseminados. Segundo ele, não importa o meio, ele só queria netos.
O jantar foi regado a muita conversa e planos para o casamento. Mesmo que nós tenhamos dito que não temos pretensão de casar ainda. Ficamos por lá até quase meia noite. Meu pai conseguiu convencer Samuel a ficar com eles. No fim da noite voltamos apenas nós duas para casa.
- Estou louca para te ver usando meu presente. – Sussurro abraçando-a enquanto caminhamos pela calçada.
- Então o presente é para o seu bel prazer? – Questiona rindo.
- Para o nosso bel prazer. – Aperto-a em meus braços.
A noite foi mais que prazerosa, eu acertei em cheio no presente. Helen ficou simplesmente perfeita nele. Dessa vez foi mais que sex*. Fizemos amor por horas seguidas. Entramos de madrugada trocando juras de amor e fazendo planos para nossas carreiras.
Eu me sinto viva. Viva de um jeito que nunca pensei que poderia me sentir. Perdoar Helen me deu liberdade para sentir o mais sublime dos sentimentos, o amor. Isso não tem preço. Agora estou aqui, observando-a dormir em meus braços. Enquanto penso no quanto desejo fazê-la a mulher mais feliz do mundo. E torcendo para que um dia eu não guarde mais mágoas do que Mariana fez.
Fim do capítulo
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