Capitulo 33 – Novos caminhos
Camila
Não sei quanto tempo dormi. O gosto amargo na minha boca indicava muitas horas sem comer e sem ingerir água. Tentei me mexer na cama e algo em meu braço doeu. Abri os olhos e vi a agulha. Eu estava tomando soro. Mas pelo menos era no meu quarto. Assim que escutou meus movimentos, Diana se sentou ao meu lado.
Ela buscou minha mão, apertando-a com carinho. Seus olhos me diziam que ela sentia muito por tudo, e os meus diziam que não queria mais falar naquele assunto.
- Quanto tempo eu dormi? – Questiono com a voz rouca.
- Dois dias. Você precisou ser sedada. Sinto muito.
- Algo que já posso riscar da minha lista do que fazer antes de morrer. Ter um surto e precisar ser sedada. – Forcei uma risada. – Onde está Samuel?
- Foi para a aula. Ele ficou aqui o tempo todo. Mas hoje o mandei para a aula.
- Ótimo. Ele precisa mesmo estudar. Eu preciso de um banho. Já pode tirar isso? – Aponto para a agulha.
- Como está se sentindo?
- Suja. Mas isso a água resolve.
- Quais as chances de você chorar no banho e resolver se afogar no chuveiro?
- A chance nunca é nula. Mas meu orgulho não vai me permitir chorar mais por aquela vagabunda. – Diana fita meus olhos. – Não vai me dizer que vocês deixaram que ela entrasse aqui.
- Ela insistiu. Queria te ver. Samuel quase bateu nela. Ele está furioso.
- Alguém precisa estar. – Fito o nada.
- Preciso de um banho. Vai tirar? – Aponto a agulha.
Diana faz o que eu pedi. Meu corpo está mesmo fraco, quando me sento na cama tudo parece girar à minha volta. Minhas pernas não parecem dispostas a sustentarem o peso do meu corpo. Mesmo assim me obrigo a ir para o banho.
Com parte da minha dignidade recuperada eu vou para a sala. Diana está preparando algo para comermos. Sei disso por conta do cheiro delicioso que me invade as narinas. Escuto o despertar da minha barriga.
- O cheiro está ótimo. – Afirmo.
- Espero que esteja se sentindo melhor. – Diana diz.
- Assim que você me alimentar vou até esquecer que levei um chifre. – Digo com um humor ácido.
- Vocês precisam conversar. – Ela argumenta.
- Não há o que conversar. Perdi a namorada e o emprego. Não coloco meus pés naquele lugar nunca mais. – afirmo.
- Como vai se manter? Esqueceu que agora tem o Samuel?
- Não esqueci. Mas encontro outra coisa. E se eu não encontrar posso aceitar a proposta que eu recebi.
- Proposta?
- Sim. Da Helen.
- Espera! Você esteve com a Helen?
- Sim. Será que podemos comer? – Ela me serve.
- O que aconteceu?
- Nada. – Minto. – Quer dizer, ela me pediu desculpas, nós saímos para jantar e conseguimos conversar. Só isso.
- E ela te ofereceu sociedade?
- Exatamente.
- Você a perdoou?
- Sim.
- Então significa que ainda pode perdoar a Mariana?
- São situações diferentes. – Afirmo. – Helen era adolescente como eu era na época, tudo muito confuso. Sei que o que aconteceu me deixou uma marca e me obriguei a tentar ser diferente de quem sou, Mariana me ajudou a compreender que eu sou lésbica, hoje sei que gosto de mulheres.
Terminamos o jantar enquanto ela falava sobre o emprego. Eu escutava tudo de modo automático. Na verdade, até comer parecia algo mecânico. Poderia muito bem voltar para a cama e simplesmente dormir para esquecer o que aconteceu.
- Vou deitar. – Digo quando termino de comer.
- Não vai mesmo trabalhar? – Questiona.
- Já disse que não coloco os pés naquele lugar. – Respondo de costas.
Entro no quarto, tranco a porta. Pego o celular e vejo a quantidade de mensagens que Mariana deixou, as ligações. Respiro fundo, travando-o. Deito para o lado e logo adormeço.
Acordo com o barulho da campainha. Coloco o travesseiro cobrindo minha cabeça, estou disposta a ignorar completamente caso alguém não vá abrir. Mas como se não bastasse a campainha, a pessoa resolveu esmurrar minha porta. Jogo o lençol para o lado, saio da cama furiosa. Pronta para mandar a merd* quem quer que esteja prestes a colocar minha porta a baixo. Quando abro a porta as palavras somem. Faz menção de fechá-la, mas sou impedida.
- Camila, você precisa me ouvir.
- Mariana, eu não quero. Então, por favor vá embora. – Pedi calma.
- Você não pode me colocar para fora da sua vida sem nem ao menos me ouvir. Não é justo.
- Não me venha falar do que é justo. Você dormiu com a primeira vagabunda que deu mole para você. Aliás, nem foi a primeira, foi a exclusiva, já que aquela não foi a primeira vez.
- Amor, não é nada disso. Aquilo foi um mal-entendido.
- Como um mal-entendido? Você por acaso errou o caminho de casa e caiu dentro das pernas dela? Me poupe, Mariana. A gente acabou. Eu não quero mais te ver nem pintada de ouro. Por favor, saia da minha casa e não me procure mais. – Ela passa as mãos nos cabelos. Seus olhos estão profundos, insônia, talvez. Ou apenas mais sex* com a amante.
- Seu emprego. Você não pode deixar de trabalhar lá. – Afirma.
- Posso e vou. Mandarei minha carta de demissão por e-mail. Sua mãe pode comemorar.
- Amor, não seja boba. Por favor, eu te amo. – Ela segura meus braços. Sua respiração está pesada, lágrimas ameaçam rolar de seus olhos.
- Não me chama de amor, não diz que ama. Quem ama não faz o que você fez. Eu só preciso ficar longe de você.
- Camila, por favor. – Suplica se aproximando, posso sentir o cheiro de seu hálito. Ela me agarra forçando um beijo, beijo esse que eu não queria.
Com força mordi seu lábio inferior, até o gosto de sangue invadir minha boca.
- NUNCA MAIS, VOCÊ ME OUVIU, NUNCA MAIS ENCOSTE UM DEDO EM MIM. EU TENHO NOJO DE VOCÊ. NOJO. – Grito. – Agora sai daqui, vai embora, desaparece da minha vida. – Seguro a porta para que ela passe. Fecho-a com força assim que ela o faz.
Meu corpo inteiro treme, Mariana me destruiu. Ela foi minha ruína. Não consigo pensar em nada além da raiva que estou sentindo dela. Pego tudo que vejo pela frente e arremesso contra a parede. Porta-retratos, copos, controles, livros. Por último deixo o sofá de ponta cabeça.
Caio no tapete chorando. Meu corpo inteiro vibra, doído, ferido, de um jeito que nunca pensei que poderia ficar. O amor mais uma vez me destrói. Mas desta vez ele me quebrou por inteira.
Com dificuldade fico de pé. Vou até a cozinha, buscar um remédio que possa me acalmar, coloco três deles na boca, engolindo-os. Arrasto-me até o quarto me atirando na cama. Choro mais, até que consigo adormecer.
Acordo na manhã seguinte. Todas as coisas estão no lugar, ao menos na casa, pois dentro de mim tudo parece fora de ordem. Quando Diana e Samuel me veem mudam de assunto. O que me faz pensar que eles falavam sobre mim, ou sobre meu chifre.
- A frase: “Corta o assunto, que o assunto chegou nunca fez tanto sentido”. – Digo para amenizar o clima.
Vou até o armário, pego um copo. Sirvo-me de café, me sento à mesa. Eles ficam me fitando.
- Relaxem, não vou surtar.
- Ótimo, não tô afim de arrumar sua bagunça. – Samuel sorri.
A campainha toca. Ele corre até a porta. Alguns segundos se passam até que ele volta com um enorme buquê de flores.
- O que eu faço com isso?
- Lixo. – Afirmo.
- Esse buquê foi caro. – Afirma.
- Então, presenteie seu namorado.
- Vai ler o cartão?
- Não. Me passa a torrada.
Os dias passam e Mariana insiste em falar comigo. Manda mensagem, os buquês continuam chegando diariamente no mesmo horário. Quem tem adorado isso é Samuel, já que ele segue levando flores para o namorado.
Eu já não choro mais com frequência, o que para mim é uma evolução. Resolvi mandar minha carta de demissão. O segundo passo foi limpar o celular. Apagar minhas fotos com Mariana. Fiz isso sem derramar uma única lágrima.
Derramei as coisas da minha bolsa na cama. Queria tirar todo e qualquer vestígio de Mariana. Quando as coisas caíram eu vi o cartão de Helen. Deslizei entre meus dedos o objeto. Talvez eu devesse mesmo pensar sobre a proposta dela. Naquele momento me parecia uma ótima ideia ficar longe de Mariana. Fora que eu preciso de um emprego.
Disco o número dela. Chama algumas vezes e vai direto para a caixa postal. Suspiro deixando de lado. Volto a minha limpeza. Já é quase noite quando meu celular acende. Meu quarto está escuro. Tirar os resquícios de Mariana da minha vida foi uma coisa dolorosa. E no momento me encontro no fundo do poço. Atendo o telefone.
- Alô.
- Mila?
- Hell, que bom que me retornou. – Me sentei na cama.
- Já tinha perdido as esperanças que você fosse me ligar. Já se passaram muitos dias. – Seu tom continha um pouco de mágoa pela demora.
- Desculpa. Eu só achei o seu cartão agora.
- Sua mochila continua uma bagunça? – Pergunta com ar de riso.
- Exatamente. – Gargalhamos juntas. – Eu precisava falar com você.
- Precisava?
- Sim. Preciso saber o quão sério você está falando sobre a sociedade?
- Pensando em aceitar minha proposta?
- Exatamente. – Ela ficou muda alguns segundos. – Você está aí?
- Sim. Claro. Eu só fiquei surpresa.
- Espero que de uma forma boa.
- Claro que é. Quando eu penso em você sou tomada por saudade e alegria, nunca é algo ruim. Pois até mesmo a saudade me faz bem. – Ela sorri. – O que te fez mudar de ideia?
- Se importa de não falarmos sobre isso?
- De forma alguma.
- Então, vamos tratar de negócios. Quero falar de dinheiro. – Ela gargalha.
- Tudo bem. Sou toda ouvidos.
Iniciamos uma conversa sonhadora sobre nossa possível sociedade. Durante o tempo que ficamos penduradas no telefone, consegui esquecer completamente a desgraça que assombra minha vida no momento.
Entramos pela madrugada conversando. Até que fomos vencidas pelo cansaço. Acordei na manhã seguinte ainda pensando na ligação e nos meus novos planos. Faltava apenas o principal, contar a Samuel e Diana.
Sai da cama, fui para o banho. Hoje eu já me sentia melhor. As lembranças de Mariana não me assombravam mais. A manhã de sábado está ensolarada. Escuto as vozes na sala. Diana, Samuel e Lívia conversam animados.
- Nossa! Quanta felicidade. – Beijo os três.
Eles me olham curiosos pelo meu bom humor.
- Perdi alguma coisa? – Samuel pergunta.
- Sim. Eu tomei uma decisão.
- Tomou? – Indagam curiosos.
- Decidi que vou me mudar.
- Mudar? Como assim?
Expliquei sobre a proposta de Hellen e que eu acabei aceitando. Não sei o que foi pior, se a reação de Samuel por eu estar voltando para a casa dos nossos pais ou se Diana não aceitar que eu mude completamente a minha vida por conta de um amor perdido. Mas consegui convencê-los que aquela era a melhor saída para mim.
Contei que me mudaria dali a um mês. Mas que iria visitar o escritório para me familiarizar em como as coisas funcionam para ter certeza que estou tomando a decisão correta. Não quero meter os pés pelas mãos.
Fim do capítulo
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jake
Em: 10/05/2025
Eita e agora? Será que não foi precipitada a decisão,pq Mari vai se sentir traída sabendo q durante a viagem Cami jantou com a Ex...
E agora vai trabalhar com a mesma quero ansiosa ler a visão da Mari ao relatar o que houve antes de ir pra cama com Charlotte.
maktube
Em: 10/05/2025
Autora da história
kkkk, São tantas nuances desse babado.
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