Capitulo VIII
A minha primeira reunião como matriarca em treinamento foi desgastante. Tínhamos nos reunido para definir os preparativos do festival que marcaria o início do inverno, o temido Samhain. Sua proximidade me colocava ainda mais ansiosa do que o normal. Sabia que a Deusa esperava algo de mim, e aquela noite seria a primeira prova do que eu seria capaz.
Minhas aulas com Diana continuavam fluindo, apesar da expectativa implícita das sete para que eu fracassasse. Não ter um coven populoso ajudava bastante nesse aspecto. Não tinha a quem passar os conhecimentos do coven, não tinha bruxas para ajudar. Me restava auxiliar outros covens como podia, no entanto, minha presença era tolerada com relutância. Ah se aquelas mulheres soubessem o que estava em jogo!
Por outro lado, Amélie vinha conseguindo esconder a meia lua em sua testa, e não tinha tido uma nova visão, para meu alívio. Não sabíamos até quando manteríamos aquilo escondido, mas até que estávamos nos saindo muito bem. Devido a movimentação para o Samhain, os preparativos do casamento da minha amiga ainda não tinham avançado. Nossa atenção estava voltada para o festival e na busca de alguma informação útil que fosse me ajudar a controlar meu lado divino. Eu sentia minha magia crescendo a cada dia, mas nada como a noite que abençoei Amélie sem querer.
— Foque-se na energia, deixe-a se expandir mas se imagine segurando-a. – Amélie orientou pela centésima vez.
Estávamos no jardim da minha casa, sentadas uma de frente para outra, numa das inúmeras tentativas de me fazer acessar a centelha divina. Aos nossos pés havia alguns grimórios antigos das bruxas mais poderosas que já existiram – como se isso fosse ajudar. Como Amélie tinha conseguido ter acesso àqueles livros era um mistério que resolvi ignorar.
Cansada, segui suas instruções, sentindo o mesmo que das outras vezes. O poder dançava por minhas mãos inquietas no início e ia se perdendo no final.
— Não está funcionando, de novo! – bufei contrariada, vendo-a revirar os olhos entediada.
— Você tem que se concentrar!
— Estou tentando! – gruni, impaciente.
— Tenta lembrar o que sentiu naquela noite, talvez ajude! – sugeriu, insistindo.
Fiz o que ela pediu, repassando na minha cabeça as sensações que meu momento com Diana tinha causado. Na verdade era fácil acessar aquela lembrança, principalmente quando vínhamos tendo novos momentos iguais aquele. Durante algumas aulas não conseguíamos segurar nosso desejo e trocávamos alguns beijos e carinhos intensos. Não havíamos conversado sobre as implicações do nosso envolvimento, não parecia ser preciso. A reciprocidade só fluía, escalando naturalmente, então apenas vivíamos o momento.
Pensar em Diana sempre causava um frio gostoso na minha barriga e arrepiava fácil minha pele. Foi seguindo esses pensamentos que senti as pontas dos meus dedos formigarem com a intensidade daquele poder adormecido dentro de mim. Começou suave, até que rugiu com força, para logo em seguida se materializar em ondas escarlates rodopiando ao redor dos meus braços.
— Tente realizar algum feitiço! – Amélie falou animada.
Várias possibilidades passaram pela minha cabeça, mas uma em especial pareceu se fixar. Por alguma razão pensei no cão-lobo que tinha aparecido há alguns dias, e visto sua aparente conexão com a Deusa, me pareceu uma tentativa apropriada. Convocar animais familiares ligados à mãe das bruxas requeria um nível superior de domínio das artes mágicas, tal como uma matriarca ou abençoada possuíam, como eu estava além disso acreditava ser mais do que capaz.
“Cérbero, protetor, guardião, faça-se presente, eu peço!”, chamei-o mentalmente, sentido minha magia se expandir em ondas para além de mim, até se transformar num eco distante porém poderoso.
De início nada aconteceu, um silêncio sepulcral pairou entre nós, alimentando nossa expectativa. Amélie e eu nos olhávamos ansiosas, porém nada aconteceu até ouvirmos o inconfundível som de passos. Amélie olhou para um ponto atrás de mim com genuíno assombro, abrindo a boca sem emitir nenhum som. Não precisei olhar para saber que se tratava do cão-lobo, agora eu conseguia sentir a energia familiar que ele emanava. Não demorou para o focinho gelado roçar minha mão, num pedido mudo de carinho que cedi imediatamente. O pelo negro parecia brilhar intensamente sob a luz pálida da lua que enfeitava o céu estrelado acima de nós.
— Emily… – ela disse com a voz trêmula de pavor.
— Calma, Mel. Esse é o Cérbero, dá um oi para ela, garotão! – disse divertida, enquanto afagava atrás das orelhas pontudas enormes. O cão-lobo olhou para minha amiga atento, farejando o ar em reconhecimento, para então, se aproximar lentamente de Amélie que gelou o vendo tão próximo de si. Cérbero deitou ao seu lado indiferente, apesar da aparência amedrontante ele quase parecia um cachorro dócil. Quase.
— Em, pelas malditas sete, você invocou um cão infernal?
— Não era você que gostava de cachorros? – provoquei, com verdadeira satisfação ao vê-la tão inquieta.
— Mas não um cão infernal! – bradou, se recompondo depressa quando viu Cérbero levantar a cabeça em sua direção. — Sem ofensa, amigão!
Soltei uma risada divertida ao ver Amélie tentando manter a compostura, mas era evidente que o medo prevalecia. Cérbero, por sua vez, apenas bocejou preguiçoso, como se não se importasse menos com a inquietação da outra garota.
— Viu? Ele é inofensivo. — fiz um carinho na cabeça dele, sentindo a energia pulsante que nos conectava. Amélie cruzou os braços, desconfortável.
— Inofensivo? Emily, ele veio do submundo! — sua voz carregava um misto de espanto e respeito. Seu comentário fez meu coração acelerar. Eu já sabia que meu poder estava além do comum, mas ter convocado uma criatura como Cérbero sem muito esforço deixava claro que eu podia muito mais. Olhei para o cão-lobo, sentindo a certeza se enraizar dentro de mim. Foi um pequeno, mas satisfatório começo.
— Acho que estou pegando o jeito. – falei, com animação contida. Amélie soltou um suspiro, sorrindo de canto.
— Finalmente! Mas, por favor, da próxima vez, tenta invocar algo menos assustador. – sorri, sentindo uma confiança que nunca estivera tão forte antes. O poder dentro de mim havia despertado, e eu estava feliz de conseguir enfim usá-lo.
Fizemos mais algumas tentativas com feitiços pequenos mas que demandavam certa concentração e esforço, tendo sucesso em todas. Não nos demoramos muito no jardim, tínhamos uma reunião com as matriarcas ainda naquela noite, para finalizar as tratativas do Samhain. Não estava nenhum pouco animada para vê-las, no entanto era preciso.
Um tempo depois, me vi na sede das sete. Acabamos cruzando com algumas abençoadas que passeavam pelos corredores longos, e não pude evitar o arrepio tenso que percorreu meu corpo quando elas me olharam com atenção diferenciada. Por um segundo, tive a impressão de que elas sabiam de alguma coisa, mas tão logo surgiu essa sensação ela passou.
A sala de reunião estava fria devido ao ar condicionado, me fazendo apertar os braços cobertos por uma fina blusa de manga longa cinza. Amélie parecia pouco à vontade também, se remexendo a cada segundo na cadeira. Além de nós duas, haviam mais duas outras matriarcas em treinamento, e ver que não éramos as únicas apreensivas me causou certo alívio. Poucas eram as que nutriam algum apreço por aquelas agradáveis senhoras. E ao que parecia, nem mesmo a Deusa as tinha em bons termos.
— Todas de pé! – anunciou um dos secretários, num tom firme, quando as seis matriarcas adentraram o cômodo. Uma a uma foram se sentando uniformemente atrás da grande mesa que havia no ponto mais alto da sala. Eu as olhava com desinteresse dosado, não podia correr o risco de ser tão expressiva e causar um problema dos grandes. Enfrentar as sete de Salem significava enfrentar a Deusa, não que fosse ser esse o caso.
— Boa noite, a todas! Podem se sentar. – declarou, senhora Howe.
— Estamos aqui esta noite, para definir a função que cada uma de vocês desempenhará no ritual que acontecerá no festival. – matriarca Waterhouse disse, correndo os olhos azuis gélidos por cada uma de nós com verdadeira desaprovação, como se nossa simples existência fosse uma afronta inaceitável.
— Aline Abbot e Zara Mahlin, vocês duas farão a recepção das bruxas visitantes. Amélie ficará responsável pelo altar ritualístico. – definiu senhora Fairfall categórica, pousando o olhar afiado sobre mim. — Emily Maycler, você irá acompanhar as abençoadas. – orientou, por fim. Não me escapou o tom desdenhoso com o qual ela falou meu sobrenome, como se tivesse um gosto ruim. Ri amarga.
Não pude impedir o sentimento de satisfação absoluta que vibrou dentro de mim, ao imaginar a possível reação dela ao descobrir o nível da minha conexão com a Deusa. Seria orgulho? Eu não sabia, mas era muito boa aquela sensação.
A função de estar com as abençoadas me assustava um pouco, dentre todas as bruxas, elas eram as que tinham mais afinidade com a Deusa. Estar na presença delas era um risco enorme, mas o que eu poderia fazer. As abençoadas eram jovens entre 20 a 30 anos, cada uma de um coven diferente: Dalina Mahlin, Joana e Rafaela Waterhouse, Milena Valdez e Agatha Howe. Nenhuma Fairfall havia sido abençoada antes de Amélie, e talvez fosse por isso que a matriarca Fairfall desgotasse tanto das Maycler. Nosso coven tinha sido intensamente abençoado quando haviam muitas de nós.
Os dias seguintes avançaram com rapidez, e meus poderes pareciam cada vez mais fortes. Eu conjurava uma tempestade com uma palavra, conseguia fazer florescer um jardim inteiro com um simples estalar de dedos, e tinha feito um feitiço de ocultamento na marca de Amélie sem que ela precissasse se preocupar em ter de escondê-la com quilos de maquiagem. Foi muito difícil conter a avalanche do poder divino durante os treinamentos com Diana, os efeitos que ela tinha sobre mim, me deixava à beira do descontrole. No entanto, tentei encarar aquilo como mais uma forma de dominar melhor o que eu poderia fazer.
A noite do festival tinha chegado, e a correria começou cedo. Ajudei Amélie com os itens da mesa ritualística, velas pretas, flores, frutas e objetos próprios para um evento grande como aquele. Philip assim como os demais bruxos, providenciaram a estrutura do festival que aconteceria na clareira. Bruxas de todo o mundo vinham até a capital para participar daquela noite tão mágica e poderosa. Fazia anos desde a última vez que tantas de nós se reuniram, e a percepção disso só reforçou a veracidade da visão que Amélie teve.
Tinha uma ansiedade incomum correndo pelas minhas veias, uma expectativa enervante pinicando minha pele. Era como se eu soubesse que algo grande estava por vir, e ansiasse por isso. Estava sendo particularmente desafiador conter meus poderes que pareciam especialmente instáveis naquele dia. Por vezes, os vidros da minha casa trincaram e as madeiras rangiam devido a vibração causada pela menor manifestação dos meus poderes. Me exigiu um esforço monumental controlá-lo, e eu sabia que era pelo nervosismo que insistia em me castigar.
Ao contrário do funeral, naquela noite, a regra de vestimenta exigia tons escuros. Por isso, havia escolhido um vestido leve e longo de alças finas com um decote discreto, tinha fendas generosas nos dois lados que davam uma fluidez provocante quando eu andava. A noite estava bem fresca, mas minha agitação aquecia meu corpo dispensando qualquer casaco. Esperava Amélie e Philip, que não tardaram a aparecer, ambos igualmente de preto da cabeça aos pés.
Outra vez estávamos na clareira, cercada de tochas de bambu acesas com fogo mágico iluminando todo o local. No centro podia-se ver o altar, que mais cedo, tanto eu quanto Philip tínhamos ajudado a montar. O céu noturno parecia mais escuro que o normal, isento de estrelas, como se o próprio véu entre os mundos estivesse mais fino e prestes a se romper. Não demorou muito para que meus olhos capturassem a silhueta de Diana em meio a multidão. Ela estava belíssima vestida de um vestido semelhante ao meu num tom escuro de vermelho. A cor rubra também pintava seus lábios grossos, e o cabelo preso num coque desleixado só contribuía para que meus olhos não se desviassem.
As horas seguintes passaram depressa em meio a várias taças de vinho e danças de pés descalços. O som alto de vozes cantando e rindo preenchiam o ar mágico da clareira. Ninguém parecia sentir o frio que insistia em açoitar nossas peles desnudas. Em meio ao mar de corpos agitados, Diana surgiu, o balançar de seus quadris hipinotizando qualquer pobre coitado que ousava a olhar, inclusive a mim. Ela foi se aproximando despretensiosa, gingando com a música que permeava o ar ao nosso redor. Quando dei por mim, a mulher encantadora estava a um palmo de distância, e o soprar quente da sua respiração pesada queimava a pele do meu rosto. Por incontáveis minutos dançamos em silêncio, apenas como nossos olhos conectados. Eu via meu desejo e ansiedade espelhados em suas íris castanhas.
Quando não mais consegui resistir à vontade insana de findar aquela distância toda entre nós, a música parou, e a voz das matriarcas entoando um feitiço de chamada silenciou qualquer barulho alheio. Estávamos próximos do altar, tendo uma vista privilegiada do ritual que se iniciava. Lembrando-me da minha função, busquei as abençoadas com o olhar nervoso, vendo-as não muito longe de mim. Suspirando aliviada, me aproximei delas o mais discretamente o possível, mantendo uma distância segura.
— Essa noite marca não somente o início de mais uma estação, mas também tem a função de nós lembrar da fragilidade do véu que separa este mundo do outro. – começou, matriarca Fairfall. Sua voz era profunda e quase ancestral. Quando mais nova eu admirava como aquelas mulheres emanavam tanto poder apenas com palavras, hoje eu sentia desprezo sabendo das reais intenções por trás delas. — A Deusa tem seus olhos voltados para nós, mas hoje, ela se faz presente também espírito. Honremos os dons que nos foi dado. Abençoados sejam!
O mar de vozes repetindo as últimas palavras rompeu o silêncio sepulcral da multidão que as observava atentamente. Uma a uma, as matriarcas iam acendendo velas pretas dispostas circularmente ao redor da estátua de Hécate no centro do altar. Pouco depois, o som de suas vozes se unindo num louvor poderoso a Deusa se fez presente, sendo imitado por todos até chegar ao fim.
— Hoje também marca uma nova era, uma oportunidade de unirmos ainda mais os covens e a comunidade bruxa! – prosseguiu, senhora Fairfall com orgulho mal contido na voz profunda. Seus olhos brilhavam soberba, e se eu não soubesse o que estava por vir talvez tivesse ignorado. Amélie surgiu ao meu lado, apertando minha mão, como se sinalizasse que sua profecia estava se cumprindo. E a ansiedade do que estava por vir, arrepiou minha pele. — A Deusa falou, e quem seríamos nós a contradizê-la. – emendou, em falsa humildade. — Essa noite iremos conhecer a bruxa pela qual recairá a mais importante função. Conheceremos a sacerdotisa que nos guiará rumo a ascensão.
A cacofonia de vozes surpresas interrompeu o discurso odioso daquela mulher. Um novo arrepio cortou minha espinha. A coragem dela em se pronunciar como se fosse o arauto de sabedoria e imponência agitou algo desconhecido em mim.
Mal percebi, quando meus pés avançaram em sua direção. A cada passo, podia sentir o chão vibrar sob meus pés como se reconhecesse minha presença. Os murmúrios das bruxas reunidas ecoavam ao redor, abafados apenas pelo estalar constante das tochas encantadas.
Ao me aproximar do altar, uma sensação familiar e inebriante me atingiu. Era como se uma presença invisível sussurrasse meu nome. Me impelindo. Era Ela. A Deusa. Minha mãe. Sentia-a de forma tão clara que meus olhos arderam com a intensidade daquela conexão. Meu coração batia em descompasso, e meu corpo inteiro vibrava com a centelha que enfim não conseguia mais se conter.
— Emily — a voz de Diana cortou o ar ao meu lado, baixa e carregada de urgência. Seus olhos estavam arregalados, brilhando com um reflexo âmbar que eu nunca tinha visto antes. — Você está... irradiando poder.
Assenti, sem conseguir falar. O ar estava denso, e minha pele parecia coberta por faíscas escarlates que se dissolviam no vento. O momento havia chegado. E ninguém poderia evitar o que estava prestes a acontecer.
Foi quando o olhar de todas as bruxas presentes recaiu sobre mim, inclusive das matriarcas que não escondiam a irritação devido à minha audácia. A energia não fluía mais para o altar. Fluía para mim. Diretamente.
Meus joelhos fraquejaram por um segundo, e Amélie, que foi rapidamente ao meu lado, me segurou com firmeza. Ao toque dela, uma explosão de calor percorreu meu corpo, e então – diante de todos – meu poder se manifestou. As tochas estremeceram e, num instante, o fogo de todas elas se ergueu em espirais alaranjadas, como se fossem serpentes dançando ao nosso redor. Eu olhei para cada matriarca com uma superioridade incomum.
— Que bonito discurso, uma pena que são apenas mentiras adoçadas. – falei, e minha voz pareceu estranha, quase sobrenatural.
— O que pensa que está fazendo Maycler? – bradou, senhora Mahlin. Os olhos dela estavam esbugalhados de raiva. Eu quase ri em deboche. Nem mesmo diante a intensidade clara do meu poder aquelas mulheres se intimidavam.
— Esse legado de tirania acaba hoje! – decretei, ignorando-a.
— Muita presunção da sua parte pensar que sua opinião tem algum valor, criança! – senhora Fairfall disse com uma calma fingida. — Se acabou com seu show, temos assuntos mais importantes a tratar.
Sua afronta nada velada fez as chamas se agitarem ao nosso redor, atraindo os olhares de todos para elas. A dança parecia um espetáculo pirotécnico fascinante, se não fosse a intensidade esmagadora que irradiava delas. Num gesto despreocupado, estalei a língua no céu da boca desprezando suas palavras ácidas.
— Sabe, Elizabeth, ser mesquinha não é um dom, apesar de você tentar fazer com que pareça. – afrontei-a, vendo seu maxilar se apertar de ira. — A vontade da Deusa, você diz… Mas só vejo ambições egoístas. Deixe eu adivinhar, você é a tal sacerdotisa?
— Quem mais seria, criança? – ousou, não vacilando nenhum pouco em demonstrar sua arrogância natural. Eu ri, audivelmente, causando ainda mais comoção entre as bruxas ao nosso redor.
— Vou te mostrar a verdadeira vontade da Deusa! – declarei, firme. Antes que a senhora Fairfall pudesse fazer qualquer coisa, as chamas se uniram, vindo diretamente a mim. A dança que elas faziam se concentrou ao meu redor, formando um manto incandescente impressionante. Eu vi o temor tomar conta dos olhos dela, o que me deu uma satisfação enorme. — Abençoada seja! – me ouvi dizendo, mas não era minha voz, e sim, uma mais poderosa, etérea.
Hécate se pronunciava através de mim.
Tomada por uma força desmedida girei minhas mãos, fazendo as chamas alcançarem o céu acima de nós, para então cair na direção de Diana que as recebeu involuntariamente, sem escapatória. Ela estava com os olhos fechados, os cabelos esvoaçando ao redor do rosto, e uma aura flamejante envolvia seu corpo. O chão ao redor começou a rachar levemente, pequenas linhas douradas serpenteando a terra como raízes de luz.
— Diana... — murmurei, completamente hipnotizada.
Ela abriu os olhos e sorriu. O fogo, antes indomável, respondeu ao seu comando como se fizesse parte dela. Era lindo e devastador. As abençoadas uma a uma se ajoelharam perante a mim. A marca na testa de Amélie brilhou vermelho, assim como a meia lua que surgiu na de Diana. Olhares fascinados e temerosos me miravam com verdadeira atenção.
— Abençoada seja, a filha da noite! – as abençoadas entoaram uníssonas.
Num ato de coragem estúpida, Elizabeth me atacou com seu poder. Bom, ela pelo menos tentou, pois as chamas de Diana blindaram meu corpo na mesma hora, diluindo aquela demonstração medíocre de poder. Com um aceno, dispensei as chamas, ficando cara a cara com Elizabeth. O sentimento de triunfo enchia meu peito, vendo seus olhos se perderem em meio a névoa de pavor.
— Você tem apenas mais uma chance, Elizabeth! Não a desperdice. – a Deusa disse baixinho, usando minha boca para despejar sua sentença. O reconhecimento contido nas feições da mulher à minha frente foi indescritível. Vencida, Elizabeth ajoelhou-se à minha frente com visível relutância, como se o simples ato lhe doesse a alma.
Satisfeita, olhei a multidão ao meu redor com lentidão. O silêncio abraçava a todos com implícita expectativa.
— Abençoados, sejam! – entoei, firme, sendo imitada por todos sem exceção.
Fim do capítulo
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