Capitulo 9
Capítulo 9 – Sofia
O sol nascia devagar, tingindo o céu com tons suaves de laranja e dourado. Uma brisa leve passava pelas janelas abertas, trazendo o perfume fresco das flores do campo e o som distante do gado começando a se movimentar nos pastos. A vida na fazenda, depois de quase onze meses desde a morte de Fernando, pai de Sofia, havia ganhado um ritmo novo. Mais leve. Mais certo.
Sofia despertou com o som dos pássaros e o cheiro do café que Eunice já preparava na cozinha. Dez minutos depois, descia as escadas com os cabelos presos num coque e um sorriso no rosto.
— Dormiu bem, filha? — perguntou a mãe, colocando a xícara na mesa.
— Muito. Acho que estou pegando o ritmo — respondeu, sentando-se. — Incrível como a rotina da fazenda não perdoa o cansaço. Mas, de algum jeito, ela cura.
Eunice sorriu. Observava a filha com orgulho discreto. Já se completavam onze meses desde que o pai de Sofia falecera, e apesar da dor ainda morar ali, era visível como sua menina estava se transformando em uma mulher forte, serena, e cada vez mais parecida com o homem que tanto amavam.
— Você tem feito tudo muito bem — disse Eunice. — Eu sei que ele estaria orgulhoso.
Sofia assentiu em silêncio. A saudade ainda apertava, mas agora era diferente. Era uma saudade que impulsionava, que aquecia, e não mais aquela que paralisava.
Após o café, ela saiu para a varanda com uma prancheta na mão e uma caneta presa entre os dedos. Era dia de checar os estábulos e conversar com os funcionários sobre a colheita que se aproximava. Tudo estava em ordem, e a fazenda começava a prosperar de forma sólida. O gado estava saudável, os funcionários motivados, e Sofia, finalmente, se sentia segura em suas decisões.
Júlia chegou mais tarde, como fazia de tempos em tempos. Sempre com um sorriso largo e uma caixa de pães frescos debaixo do braço.
— Trouxe reforços pro lanche! — anunciou, entrando sem cerimônia pela porta dos fundos.
— Você é um anjo — disse Sofia, abraçando a amiga.
As duas se sentaram à sombra do alpendre com café e pão com manteiga, e a conversa fluiu fácil, como sempre acontecia entre elas.
— Você parece mais... em paz — observou Júlia, olhando Sofia com atenção.
— Eu estou — respondeu. — Ainda sinto falta dele. Todos os dias. Mas agora consigo lembrar e sorrir. Antes, só doía.
— Isso é bonito, Sofia. É crescimento. E também é amor. Amor de verdade deixa saudade, mas também dá força.
Sofia sorriu e abaixou os olhos, emocionada.
— E você? Como anda a escola?
Júlia sorriu.
— A bagunça de sempre. Mas os alunos me surpreendem todo dia. Um deles me deu um poema ontem. Lindo. E mal sabe escrever direito.
— É por isso que você ama o que faz — disse Sofia, tocando o braço da amiga com carinho.
Depois de algum tempo, caminharam juntas pelos campos. Os girassóis estavam começando a florir no trecho mais afastado, e as árvores frutíferas estavam carregadas. O ar tinha cheiro de terra e vida nova.
— Eu precisava disso aqui hoje — disse Júlia, fechando os olhos por um momento.
— Aqui sempre foi nosso refúgio, lembra? — Sofia disse. — E sempre vai ser.
Mais tarde, Sofia visitou os currais e conversou com Zé Carlos, um dos funcionários mais antigos da fazenda.
— Patrôa, a gente tá rendendo bem. O leite tá vindo mais que mês passado, e os bezerros tão crescendo firme — disse ele, enxugando o suor da testa com um pano.
— Isso é ótimo, Zé. Obrigada por continuar com a gente esse tempo todo.
— Eu que agradeço, dona Sofia. Seu pai confiava em mim, e eu confio na senhora. Tá levando isso aqui com o coração. Ele deve tá feliz lá em cima.
Sofia apertou a mão dele com gratidão. Sabia que essas palavras eram preciosas.
O resto do dia passou rápido, entre relatórios, risos com os funcionários, e uma pausa no final da tarde para ver o pôr do sol com a mãe. Sentadas lado a lado, em silêncio, apenas ouvindo o som da vida ao redor.
— Você tem ficado mais tempo lá fora — comentou Eunice.
— Tenho aprendido a não me esconder tanto — disse Sofia, com sinceridade. — Acho que por muito tempo eu achei que precisava sofrer quieta pra honrar a memória dele. Mas agora vejo que continuar vivendo bem também é uma forma de homenagem.
— É sim, minha filha. É a melhor delas.
Sofia recostou a cabeça no ombro da mãe, sentindo-se acolhida.
Naquela noite, antes de dormir, ela escreveu em seu caderno, como fazia toda noite. Uma forma de manter a mente organizada e o coração leve.
"Hoje eu ri mais do que chorei. E senti ele aqui. Não com tristeza, mas com orgulho. Onze meses sem o senhor, pai. E, ainda assim, com o senhor em tudo. Obrigada por me ensinar a amar esse chão. Eu sigo por nós dois."
Fechou o caderno e olhou pa
ra o teto com um sorriso sereno. A fazenda pulsava vida. E ela também.
Fim do capítulo
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