Capitulo 2 - A estranha de calcinha.
Mariana
Meu dia mal começou e eu já estava mais que atarefada. A primeira a lotar minha agenda é a minha mãe. Nesse momento ela fala sobre a reunião que eu precisaria ir. Ainda preciso lidar com seu mau humor típico de todas as manhãs, e tardes também. Se bem que não consigo me lembrar de uma única vez que a mamãe tenha acordado de bom humor, ou ter simplesmente colocado um sorriso no rosto. Essa é minha rotina todas as manhãs, até parecia ser minha secretária do tanto que ela conhece minha agenda.
— Mariana, você me ouviu?
— Claro mamãe. — Na verdade, eu criei um método, sempre que ela começa a falar sem parar, eu me imagino em uma linda praia, tomando bebidas, assim nem escuto mais o que ela está falando. Aquele é meu lugar seguro de sua amargura.
— Então você sabe que o acordo de hoje é importante? Eu preciso que você vá comigo. O Erik iria adorar vê-la, o que tornaria a negociação um pouco mais fácil.
— Mãe, eu irei porque é meu trabalho, mas a senhora sabe que eu não gosto do Erik.
— Não entendo o porquê dessa sua resistência com o rapaz, ele claramente gosta de você.
— Não irei discutir mais uma vez.
Se você pode perceber, minha mãe tenta a todo custo me jogar para cima do único herdeiro do império dos Ferreiras Gullar. Agradeci aos céus quando meu pai se juntou a nós, assim o assunto poderia mudar.
— Bom dia! — ele beija o topo da minha cabeça. — Onde está Manuela?
— Aqui vovô. — Sentou-se, recebendo o olhar julgador de minha mãe.
— Isso são modos?
— Mamãe, deixe-a. — Ela me sorriu agradecendo.
Se você está pensando que a Senhora Lindalva Carvalho é uma verdadeira megera, terei que concordar. A cada dia ela se tornava ainda mais amarga, desde a morte de Marina, minha irmã mais velha. Mamãe nunca fez questão de esconder sua preferência por Marina, talvez por ser a primeira filha. Ou simplesmente por parecer tanto com ela em personalidade.
A morte de Marina nunca foi superada, parecia até que cada vez que olhava para a Manuela ela sentia ainda mais raiva, pois morreu na sala de parto, decidindo pela vida da filha. Isso nunca conformou minha mãe, que sempre que pode, faz questão de ser desagradável com minha sobrinha.
— Tia, a senhora me deixa na escola?
— Claro meu amor, vamos lá. — Segurei a mochila e caminhamos para o meu carro.
— Mariana, não esquece, às nove horas. — Mamãe grita da porta.
Gesticulei e entramos no carro. Notei Manuela mais calada que o normal.
— Está tudo bem? — Indaguei sem tirar o olho do trânsito.
— Acho que a vovó não gosta de mim. — Afirmou afundando no banco.
— Oh! Meu amor! Claro que ela gosta, é porque ela é assim mesmo, as pessoas amam de formas diferentes.
— Ela reclama de tudo que eu faço.
— Ela também reclama de tudo que eu faço, é apenas o jeito de ser dela. Não é uma pessoa carinhosa, nem mesmo comigo.
— E com a mamãe?
Pronto! Como eu lhe falaria que a Marina era exatamente igual à mamãe sem tornar minha irmã uma megera? Preciso evitar mais esse trauma para Manu.
— Elas sempre se deram bem, pois sua mãe sempre fazia tudo o que a mamãe queria.
Ficou em silêncio, parecia ponderar tudo o que falei. Não sei se isso é possível, mas não posso negar que por algumas vezes eu cheguei a pensar que a Manu deveria ser minha filha. Ela se parece muito mais comigo do que com Marina. Penso que de alguma forma a cegonha acertou o endereço, trocou apenas os nomes.
Chegamos à escola. Esperei que ela saísse do carro, não sem antes me beijar e agradecer a carona. Sorri esperando que entrasse e assim segui caminho. Cheguei a Carvalho Imobiliária em cima da hora, lá encontrei minha secretária que já me passou a agenda.
— Bom dia! Andreia, o que tenho para hoje?
— Pela manhã a senhora está livre, na verdade, precisará apenas conhecer a nova advogada, já que a outra candidata desistiu.
— Pode dizer que minha mãe a espantou. Espero que a outra não desista. Ela já chegou?
— Ainda não.
— Certo, espero que ela chegue antes das nove, pois tenho um compromisso com minha mãegera. — Ela tomava nota de tudo. — Alguém me ligou a respeito dos apartamentos do centro?
— Ainda não.
— Este prazo já está mais que ultrapassado. Preciso da Advogada para tentar uma negociação ou a quebra desse contrato. Por enquanto é só, assim que a moça chegar, mande-a entrar.
— Pode deixar.
Saiu fechando a porta. Liguei o computador e fui responder alguns e-mails. Passados alguns minutos, me assustei quando constatei o número da escola da Manu me ligando.
— Senhorita Mariana?
— Sim.
— Estamos ligando para avisar que a Manuela sofreu uma queda na aula de educação física, está reclamando de dor na cabeça.
— Claro, estou indo agora. Fala para ela que estou chegando.
Peguei minha bolsa e sai apressada.
— Andreia, estou saindo, a Manu caiu, me ligaram da escola agora. Eu preciso ir.
— Claro, eu aviso a moça que ligamos marcando outro horário para a senhorita conhecê-la.
— Ótimo, pegue o telefone e o endereço dela, por favor.
Fui para o carro e dirigi o mais rápido possível para a escola. Encontrei a Manu em um sofá sentada encarando as mãos. De longe pude notar que ela chorava. Foi a primeira vez que percebi o quanto meu amor por ela aumentava a cada dia mais.
— Oi! Amor, você está bem? – Seus olhos claros me fitam.
— Oi! Tia, acho que sim, só fiz um machucado. — Levantou o cabelo e vi um fio de sangue correndo em sua testa.
— Vamos, vou te levar para ver o vovô no hospital.
Durante todo o trajeto ela não pronunciou uma única palavra. Chegamos ao hospital e procurei pelo meu pai na recepção. Não demorou e ele apareceu preocupado.
— O que houve?
— Ela se machucou na escola.
— Vamos para o consultório.
Peguei meu celular que tocava insistentemente. Olhei e revirei os olhos, me afastei um pouco e fui atender minha “mãegera” já preparando os ouvidos para toda a reclamação.
— Oi! Mãe.
— Onde você está?
— No hospital, a Manu se machucou na escola, trouxe ela para o papai dar uma olhada.
— Menina idiota, tinha que se machucar logo hoje. — Resmungou e eu perdi o controle.
— Isso é jeito de falar da sua neta? Ela é criança e isso acontece. Se fosse eu me envergonharia de falar dessa forma com uma criança que tem o seu sangue.
— Mariana, não me amola, você sabe que essa menina não deveria ter nascido, por culpa dela a sua irmã está morta. — Aí estava toda sua mágoa guardada por todos esses anos.
— Olha mãe, nem irei gastar meu tempo com você falando pela milionésima vez sobre isso. — Esfrego meu pescoço, esse assunto me deixa tensa.
Desliguei o celular e fui para o consultório. A Manu se comporta bem enquanto o meu pai a examina. Ela era uma menina linda, educada e inteligente, o que me deixava com mais raiva ainda da forma como a minha mãe a tratava.
— Foi apenas um susto, só um machucado na cabeça. Pode ser que sinta um pouco de tontura, mas isso é normal. Vou passar uma medicação para ela tomar, depois pode levá-la para casa.
— Obrigada, vovô. — O beijou carinhosamente.
— Vou cobrar essa consulta depois.
— Cobrar? — ela o encarou curiosa.
— Sim, que tal um chá com as suas bonecas?
— Claro. — deu de ombros sorrindo aberto.
Dirigi para casa e Manu acabou dormindo durante o percurso. Quando chegamos, fui para meu quarto tentar trabalhar um pouco, mas ela insistiu para que ficasse na minha cama. Enquanto eu fazia carinho em seus cabelos, respondia algumas propostas de negócios no meu laptop, quando escutei sua respiração mais profunda percebi que ela dormia. Sorri beijando sua testa e me deitei ao seu lado.
Acordei com o barulho de uma discussão dos meus pais. Isso já estava virando uma coisa rotineira. Ela reclamava que ele trabalhava demais, ele dizia que nada o prendia em casa. Você pode até pensar que quando eu disse que depois da morte de Marina minha mãe ficou amargurada, foi um exagero da minha parte. Porém, não foi exagero. Há anos o casamento dos dois não vai bem por conta das mudanças de humor constantes que dona Lindalva tem. Fora que meu pai, assim como eu, detesta como ela trata a Emanuela.
Desci as escadas devagar, odiaria que a Manu presenciasse aquela discussão.
— Gente, que gritaria é essa? — Pergunto do topo da escada.
— Chegou a outra irresponsável, não consegui fechar o negócio porque você não foi à reunião. Está satisfeita? — Indagou furiosa.
— Eu não fui por um motivo de força maior.
— Qual motivo? A pirralha ter se machucado?
— Lindalva, não fale assim da nossa neta.
— É isso que ela é, uma fedelha. Que matou minha filha! — Indagou alto.
— Chega! Você só pode estar maluca, se continuar falando dela desse jeito eu irei embora desta casa. — Meu pai gritou apontando para ela.
Ele sabia onde tocar para amenizar o ataque de histeria dela. Ela jamais aceitaria se divorciar, pois, isso seria uma vergonha para a sociedade, uma mulher desquitada. Calou-se por um instante, caminhou até o bar e se serviu de uma bebida. Juro que não sei como meu pai aguentou essa mulher por tanto tempo. Ele passou por mim, indo para o quarto de hóspedes. Há meses que dormiam separados.
Naquela noite foi impossível dormir direito, tive muitos sonhos estranhos. Julgo que o fato de estar acostumada a dormir sozinha e naquela noite está acompanhada de uma linda menina de cabelos negros, colaborou para minha noite mal dormida.
Como não havia trabalhado no dia anterior, decidi ir até o escritório no sábado, mas antes precisava entrar em contato com a nova advogada. Pedi a foto da ficha dela a Andreia. E como liguei diversas vezes e não obtive resposta resolvi ir até o endereço já que não ficava longe de casa.
Para não parecer tão invasiva eu liguei mais umas duas vezes. Ela não atendeu, parei em frente ao prédio, que me parecia quase para cair. Não havia portaria, aproveitei que uma senhora ia saindo e corri para pedir informação.
— Bom dia! A senhora mora nesse prédio?
— Sim, minha filha.
— Será que a senhora sabe se a...- peguei o celular para olhar o nome da moça. — Camila Godoy mora aqui?
— Ah! A Camila, claro que mora, minha filha, ela é uma menina ótima, pena que não tem sorte no amor. — Sorriu. E eu fiquei sem graça, ela estava me passando informação demais.
— Será que a senhora me deixaria entrar? — ela me olhou curiosa. — É que já tentei ligar, mas ela não me atendeu. Eu preciso falar com ela sobre o emprego.
— Sei, o emprego que ela está esperando a resposta?
— Sim! Exatamente, então pode me deixar entrar?
— Sim. Ela mora no quinto andar, se eu fosse você tiraria esse salto. O elevador está quebrado. Boa sorte. — Destrancou o portão de ferro e entrei encarando as escadas. Será que eu chegaria viva em seu apartamento?
Juro que depois de hoje, eu preciso voltar a malhar. Cheguei ao quinto andar tentando me recompor. Olhei a numeração dos apartamentos e fui até o 502. Toquei a campainha uma, duas, três vezes. Até que, diante de mim, surge a criatura mais linda que já pude ver. Ela ficou parada me encarando com os fios loiros em desalinho. Vestia uma camiseta surrada, com um dos ombros à mostra, que exibe tatuagens que não pude observar o que era. As pernas estavam de fora, e que pernas se diga de passagem.
Mariana, que história é essa de ficar reparando em mulher? Mas até mesmo um cego consegue ver a sua beleza. Como eu percebi que ela estava paralisada resolvi falar.
— Bom dia! Você é a Camila?
— Eu...eu...eu...
— No seu currículo não falava que você tinha deficiência. - Digo impaciente com sua cara de paisagem.
— Eu não sou deficiente.
— Ótimo. Será que posso entrar? - Questiono irritadamente, precisava mesmo me sentar.
Fim do capítulo
Oiee! Vim animar o feriado de vocês. Espero que estejam gostando e por favor comentemmmmm. Preciso saber o que estão achando.
Beijos, bom feriadão.
Comentar este capítulo:
jake
Em: 08/05/2025
Olá Autora desculpa ter apagado o comentário e que o Corretor não ajuda...
Bom vim dizer que não gosto nem um pouquinho da Lindalva que horror culpar a neta pela morte da filha...Agora já amo a Mari
maktube
Em: 09/05/2025
Autora da história
kk, sem problema. Ela foi a única que não soube lidar com o luto.
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