Capitulo 17
Capítulo 17
O susto a atingiu como um raio. Seus olhos mal podiam crer no que Eduardo havia postado em sua página do Instagram. Lia e relia, uma e outra vez, a tela do celular, enquanto o coração batia descontrolado no peito e os olhos confirmavam a verdade estampada nos milhares de comentários e curtidas.
Eduardo negava veementemente qualquer envolvimento com a garota da foto, implorando desculpas e afirmando que tudo não passara de uma brincadeira de mau gosto. — Chegava a suplicar perdão por qualquer constrangimento que pudesse ter causado a Agata.
— Que feio, meu irmãozinho! Fingir que namora alguém. Continua sendo o mesmo crianção — murmurou para si mesma, a voz um pouco mais alta que o normal, cortando o silêncio profundo do sítio.
Desligou o celular e, com um suspiro pesado, dirigiu-se ao quarto. Pegou o edredom cuidadosamente dobrado sobre a cama de casal, armou uma rede na varanda e deitou-se. Admirava o céu noturno, com suas milhões de estrelas piscando como olhos curiosos, e sentiu a tensão dos momentos anteriores começar a se dissipar. Deu lugar a sonhos do futuro, a um fio de esperança. Agora, era apenas questão de paciência e de confiar — desconfiando, é claro — na justiça. Sabia que na corporação ainda trabalhavam muitos policiais que honravam a farda. Quanto à italiana... era hora de voltar a procurá-la. Um pressentimento estranho, quase um sussurro, dizia-lhe que o destino delas estava interligado.
Agata
Na cozinha, Agata observava o parquinho onde as crianças brincavam. Era seu dia de folga no shopping, mas o destino tinha outros planos. O rapaz encarregado do carrinho de pipoca e uma das moças que trabalhavam no parquinho tinham adoecido, e não havia tempo para contratar freelancers.
— Dona Agata, as pipocas estão prontas. É melhor a senhora colocar no saquinho para eles não fazerem bagunça — disse Lindenberg, o ajudante de cozinheiro, promovido a pipoqueiro oficial. Ele despejava o conteúdo da panela de pressão em uma enorme bacia vermelha, e o aroma tentador se espalhava pelo ambiente, atraindo todos os funcionários que passavam e pegavam um punhado.
— Gente, isso é das crianças! — Agata bateu nas mãos de dois funcionários com o pano de prato que pendia do seu ombro. Eles se esquivaram, derrubando algumas pipocas no chão. — Melhor fazer mais duas porções, antes de chegar no parquinho essa aqui já vai ter acabado.
— A outra panela já está quase pronta. Então, vamos ensiná-las? — Lindenberg falava, sem tirar os olhos da panela em que os grãos de milho explodiam.
— Não é perda de tempo, ali tem umas quinze crianças. Vou levar uma embalagem de copos descartáveis para colocar a pipoca, é bem mais prático.
Outra panela cheia de pipoca foi despejada na bacia que já quase transbordava. Agata caminhou lentamente em direção ao parquinho, um espaço nos fundos do restaurante, destinado aos filhos dos clientes.
Ao passar pelo salão, um garotinho de uns sete ou oito anos, ao lado do pai que pagava a conta no caixa, fixou os olhos no carrinho de pipoca. Foi então que Agata resolveu voltar ao balcão.
— Senhor, com licença.
O homem se virou educadamente, e o garoto saiu de trás dele. Era lindo, com um olhar estonteante que parecia ler a alma. Foi assim que Agata se sentiu sendo observada por ele.
— Senhor, temos um parquinho para crianças ali naquele espaço — apontou com um gesto de cabeça, pois suas mãos estavam ocupadas. — Seu filho pode se divertir um pouco, o espaço é para os filhos dos clientes da casa. A pulseira custa 5 reais.
O garoto logo olhou para o pai, aguardando autorização. O pai parecia resistente, olhando para Agata e para o espaço com dúvida, talvez pensando que o filho daria trabalho para ir embora ou que a mãe estaria faminta.
— O senhor pode ir, não pode entrar, mas pode sentar em uma mesa próxima enquanto seu filho brinca — insistiu Agata, vendo o garoto quase implorando para brincar. O pai concordou, pegando o telefone para ligar para alguém.
— Escuta, o Alex está querendo brincar no parquinho aqui do restaurante.
— Diga à sua esposa que eu mesma brinco com as crianças e seu filho estará em boas mãos — Agata virou-se para Alex e acrescentou: — Se sua mãe permitir, a sala é aquela ali. Antes de entrar, tire sapato e meias e entregue a seu pai. Eu vou estar no pula-pula, e daqui a pouco vai começar uma corrida de saco. Coloque a pulseira e me procure na entrada, tudo bem?
O garoto, para surpresa de Agata, não disse uma palavra, mas gesticulava, sempre sorrindo. Ela se sentiu imediatamente apaixonada pelo menininho.
As crianças no parquinho começaram a gritar por Agata. Ela achou melhor ir até lá, mas saiu ainda olhando, na esperança de que o garoto se misturasse com as outras crianças. Não ouviu a conversa toda que transcorreu após sua saída, apenas pequenos trechos.
— Senhor, a sua conta. Quer que eu demore um pouco para sair seu pedido enquanto seu filho brinca? Quanto à jovem ali, ela é filha do dono e sempre ajuda no parque quando falta um funcionário. Pode ficar tranquilo, seu garoto está em boas mãos.
— Só um minuto, moça. Pode atender o próximo da fila, quanto deu minha conta? — Agata viu, pela cerca do parquinho, o homem se afastar para o lado, esperando a moça do caixa calcular.
— Duzentos e cinquenta reais. Qual a forma de pagamento?
— Vou transferir por Pix. Atenda o próximo, por favor.
— E então, posso deixar? Seu filho está me puxando sem parar — o homem falava, provavelmente com a esposa. Agata sorriu sem querer quando ele deu a ordem: — Alex, vá brincar um pouco no parquinho, sua mãe deixou.
Ele nem olhou para trás. Correu para a entrada do parque e sentou, atrapalhando-se com os sapatos e meias. Alex acompanhava o tempo todo os movimentos de Agata e sempre respondia seus olhares com um sorriso aberto.
Marcela
— Escuta, Jacinto. Pergunta a chave Pix da filha do dono, vou mandar o dinheiro direto para a conta dela — Marcela sabia que seu amigo estranharia esse interesse repentino. Mas ele acabaria fazendo sua vontade; afinal, uma transferência bancária podia deixar rastros quando feita em comércio, mas em conta particular, talvez fosse impossível quebrar o sigilo bancário. Uma ideia audaciosa, com um quê de risco e um toque de esperança secreta.
— Moça, qual a chave Pix da sua patroa? — ele perguntou.
— É esse que está no cartaz na parede. O nome é Agata D’Angelis.
Uma foto do cartaz chegou para Marcela. Ela fez a transferência para Agata Chiara D’Angellis Rossi. Esse era seu nome. Pronunciá-lo em voz alta enchia seu peito de uma emoção boba e, ao mesmo tempo, gostosa. Encheu-a de uma sensação que beirava a antecipação, um frio na barriga. Enviou o comprovante da transferência para Agata, na esperança de que ela descobrisse que era Marcela, e outro para Jacinto.
— Prontinho, o senhor pode aguardar que chamamos pelo nome.
Jacinto escolheu uma mesa próxima ao portão de entrada do parque e virou a câmera para que Marcela visse Alex correr por dentro de um tobogã e cair na piscina de bolinhas. Saindo de lá, correu para o pula-pula. Quando chamaram seu nome, já passava das nove horas.
Agata
Alex começou a demonstrar sinais de cansaço. Agata via que ele tentava resistir, mas não podia mais. Ele olhava para os brinquedos e para ela, o que a deixou inquieta. Talvez precisasse acordar cedo, ainda estava com o uniforme da escola.
— Cansou, amorzinho? Eu também cansei. Tomara que sua mãe não fique zangada com a quantidade de besteira que comeu.
Alex ria, passando a mão na barriga para mostrar o quanto estava cheia.
Agata ajudou as duas últimas crianças que ainda estavam no tobogã a calçar os sapatos e sair; os pais estavam lá fora aguardando. Alex calçava os sapatos. Quando Agata se aproximou, seus olhos pretos, intensos como nanquim, prenderam os dela. Havia algo neles, um segredo, talvez.
— Venha você também, seu pai deve estar morto de cansaço — Agata agachou-se para ajudar. Assim de pertinho, ele tinha um cheirinho bom, de um perfume infantil desconhecido por ela.
— Qual o problema, meu príncipe?
O garotinho fazia esforço para as palavras saírem.
— Jacinto... Amigo... Pai não.
Então era isso. O homem não era seu pai, segundo o garoto, mas um amigo da família. Agata aguardou com paciência, sem querer falar por ele como os adultos sempre fazem.
— Entendi, pensei que fosse seu pai. Enfim, ele parece gostar muito de você. Não para de olhar para nós. Venha, vou te levar.
Agata jogou todos os bonecos e brinquedos espalhados em uma caixa grande para serem higienizados no dia seguinte.
— Pronto, senhor, aqui está o príncipe Alex. Acredito que ele vá chegar em casa dormindo.
O homem sorriu cordialmente, levantou e pegou na mão de Alex. A outra estendeu para se despedir.
— Boa noite. Obrigado por aturar esse pestinha.
Ele passou a mão na cabeça de Alex, assanhando os poucos fios de cabelo.
— Foi um prazer, ele é muito participativo e uma criança alegre — Agata chegou mais perto e falou baixinho para não ser ouvida pelos outros clientes. — As crianças são em geral boas, os pais é que são chatos.
Os dois riram. Alex agarrou a mão de Agata e disse:
— Minha mãe é legal. Vai gostar dela, Agata.
Agata olhou espantada. O garoto falou naturalmente, sem esforço algum, diferente de momentos antes, quando pronunciar algo parecia ser doloroso. Uma sensação estranha percorreu-a.
— Alex, vá lá no caixa e peça à moça um sorvete. Vou pedir à sua mãe para fazer a transferência.
Alex correu.
— Moça, muito obrigado. Eu não sei qual a magia que usou, mas é a primeira vez que o vejo falar uma frase inteira. A mãe dele vai pular de alegria.
— A Gata tem o pó de pirlimpim — a voz grossa e alegre que surgiu atrás dela a assustou, fazendo com que ela se desequilibrasse ao virar bruscamente. Se não fosse a agilidade do cliente, que segurou seus braços impedindo o tombo, com certeza teria caído de bunda no chão.
— Desculpe, amiga, esqueci que você tem problema de equilíbrio — Danilo a abraçou carinhosamente como sempre fazia quando se encontravam.
— O chão me ama. Ainda outro dia quase me lasquei toda ali no calçadão, só que eu não tive culpa. Uma moto bateu em mim.
Os dois a olharam espantados com a revelação, e mais uma pessoa que chegou, toda interessada na conversa, parou de lamber o sorvete e olhou cheio de curiosidade.
— Não chegou a ser um atropelamento. Eu caí com o susto quando a moto freou em cima de mim, mas não foi nada demais, só um susto. Ai, gente, desculpa a falta de educação. Danilo, esse é o Jacinto e esse ao seu lado é meu príncipe Alex.
Eles se cumprimentaram e uma conversa despreocupada se iniciou. A impressão que Agata tinha era de que os dois já se conheciam, tamanha a conexão entre eles. Alex, no entanto, parecia procurar alguém. Sem achar o que procurava, sorriu satisfeito, voltando a lamber o sorvete despreocupado.
— Danilo, como estão as coisas lá no shopping? Quem ficou com a Gorete?
— O Saulo está lá. Eu vim porque o queijo está quase acabando e tinha que pegar mais talheres. Nem tem como lavar, estamos sem tempo. Jacinto, foi um prazer. A gente se vê por aqui, ou pelo shopping, aparece por lá. A praça de alimentação encerra às 22 horas, mas a gente fica até quase meia-noite para organizar tudo — ele se despediu.
Agata estava pasma com o recente interesse do amigo. Danilo sempre foi o mais calado do grupo e agora parecia uma matraca chamando atenção que, a seu ver, era correspondido. O outro parecia igualmente interessado.
— Talvez eu ainda passe por lá hoje, assim que entregar Alex em casa.
— Vou ficar esperando.
Valha-me Cristo! Esse não era o seu amigo. Agata ficou olhando ele se apressar para pegar as coisas que faltavam e desaparecer na cozinha. Voltou a atenção para Jacinto, que olhava cada movimento do amigo dela com um brilho misterioso nos olhos.
— Bem, obrigado à senhora e à hospitalidade da casa. Para esse pestinha foi inesquecível.
Agata abaixou e abraçou Alex, que retribuiu colocando o sorvete bem distante deles, mas não distante o suficiente para não sujar os cabelos que caíam do boné.
— Eu sou uma menina, não sou menino. Sou fugitiva da justiça eu e minha mãe... — as palavras foram ditas tão baixinho que Agata pensou estar delirando, mas quando se afastou, seus olhos pareciam sinceros, carregados de um peso que não condizia com a idade.
O que as duas não viram, entretidas, foi Jacinto filmando tudo e enviando para Marcela. Um novo mistério se desenrolava, e o destino de Agata parecia cada vez mais entrelaçado com segredos e verdades ocultas.
Fim do capítulo
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