capitulo vinte e sete: resiliencia ou fuga?
POV ANNA
Abro os olhos lentamente e dando um olhar panorâmico pelo local que eu estou, presumo que esse seja meu quarto. Eu não faço a mínima ideia de como cheguei aqui, mas o sol que adentra a minha janela por uma fresta da anuncia que seja o período da tarde.
Levanto-me devagar e vou até o banheiro do meu quarto, posso perceber que estou um caco: os olhos inchados de tanto chorar uma perda que eu nunca tive: mãe.
Volto a encarar o espelho. Merda. A mulher que está ali não é alguém que eu reconheça. Sempre tão forte, sempre no controle, dona de si e agora… apenas o reflexo de uma fraqueza que eu jurei nunca mais deixar vir à tona.
Lavo o rosto com a água fria da torneira, pego o sabonete facial no armário e passo pelo meu rosto, como se aquele skincare fosse apagar de mim o meu inchaço e todas as lembranças ruins do dia anterior. Preciso me recompor, preciso voltar a quem eu era antes dessa merd* toda acontecer e não deixar de forma alguma que isso me faça cair de novo.
Quando saio do banheiro, dou de cara com Fernanda. Ela está encostada na porta, me observando com um olhar preocupado.
— Você dormiu o suficiente? – ela pergunta
— Mais do que eu precisava. – A resposta sai seca. Desvio o olhar antes que ela veja o que está por trás da fachada.
Ela se aproxima, sua mão toca meu braço.
— Anna, sobre ontem…
— Foi a última vez – interrompo, olhando diretamente em seus olhos. – A última vez que você me viu vulnerável por causa da minha família.
Fernanda recua um pouco, surpresa pela firmeza com que eu acabei de dizer essas palavras. Ficamos em silêncio por alguns segundos e posso ver em seus olhos que ela quer dizer algo, mas hesita, talvez tentando buscar palavras certas.
Me desvencilho da sua mão e passo por ela, indo em direção ao armário. Pego uma roupa social para ir trabalhar e penso nas coisas que estão acumuladas no escritório. Começo a enumerá-las mentalmente e quando lembro que hoje seria o dia em que a Dra. Baldez iria anunciar a queda do Dr. Proetti, meu coração acelera.
Merda.
Eu estava atrasadíssima pra isso.
— Anna, você não precisa ser tão dura consigo mesma – ela finalmente diz
Sinto o aperto em meu peito, mas não posso ceder. Não agora.
— Você não entende – digo, sem olhar para ela, meus dedos fechando os botões da camisa. — Preciso estar no controle. Não há espaço para fraquezas.
— Eu entendo mais do que você pensa...
Por um momento, minha mão para no último botão da camisa. Quero acreditar nela. Quero me apoiar nela. Mas o risco de cair é grande demais.
Respiro fundo, fechando o botão e ajustando a gola antes de finalmente encará-la.
— Vou trabalhar – anuncio, como se fosse o desfecho lógico de tudo isso.
— Anna… você tem direito aos dias de luto.
— Não vou usá-los – corto, firme. — Não vou permitir que minha família ou essa situação tenham mais poder sobre mim.
— Eu tirei o dia de folga pra ficar com você hoje, você sabe o quanto é difícil, principalmente tratando-se de pedir para Roberto, quase tive que implorar. Por favor, Anna. — Suplica
Eu paro, a mão já na maçaneta da porta do quarto, e olho para ela por cima do ombro. Sua expressão é um misto de frustração.
— Por que você não entende? – Minha voz sai mais dura do que eu pretendia.
Fernanda deu um passo a minha frente, quase impedindo minha passagem.
— Eu entendo, Anna. Mas você também precisa entender que isso não é força, é fuga. Não foge do que você sente.
Suas palavras me atingem como um soco, mas eu mantenho o rosto inabalável. Não posso deixá-la ver o impacto que tiveram.
— Chame do que quiser – retruco, virando-me para encará-la. – Fugir, resistir, não importa. É o que eu preciso fazer.
— Não, o que você precisa é de tempo. De um momento pra respirar. De alguém que te apoie, e eu estou aqui! – A voz dela aumenta ligeiramente, mas ainda carrega mais dor do que raiva.
Meu olhar fixa no dela, tentando decifrar o que dizer, mas as palavras ficam presas. Então, desvio o olhar, abro a porta e saio sem responder.
No corredor, minha respiração está pesada. Cada passo que dou até a porta da frente faz com que ela fique ainda mais distante. Antes de sair, escuto Fernanda murmurar algo.
— Eu só queria que você se deixasse cuidar, só desta vez...
A frase me acompanha até eu entrar no Uber, como um eco que se recusa a desaparecer.
Ao entrar no prédio da Proetti-Baldez, ajusto a postura e os óculos escuros no rosto, forçando uma expressão neutra. Cada passo até o elevador é calculado, controlado. Não há espaço para hesitação aqui.
A recepcionista me cumprimenta com um sorriso que ignoro. No reflexo do espelho no elevador, eu mal reconheço a mulher que está ali. Mas, talvez, isso seja uma vantagem. Ninguém precisa enxergar as rachaduras.
Quando chego ao andar da diretoria, encontro Diana, a secretária da Dra. Baldez, ajustando papéis na mesa.
— Dra. Florence, meus sentimentos pela sua perda – ela diz, com uma voz baixa e sincera.
Aceno com a cabeça, agradecendo. Porém, não dou brecha e mudo de assunto.
— A Dra. Baldez está me esperando? – pergunto, o tom mais frio do que eu gostaria.
— Ela não te esperava aqui hoje, mas... – Diana hesita, parecendo buscar palavras. – Ela pediu que eu lembrasse que, se precisar de algo, está à disposição.
Ignoro o comentário e entro na sala sem bater. Dra. Baldez está ao telefone, mas desliga assim que me vê.
— Anna, sinto muito pela sua mãe. Eu realmente...
— Prefiro não falar sobre isso – corto, direta. – Apenas me diga quais casos estão precisando de atenção. Quero a carga mais pesada que você tiver.
Ela me encara, surpresa, mas logo ajusta sua expressão para algo mais profissional.
— Anna, ninguém espera que você esteja aqui hoje. Eu, inclusive, não esperava.
— Estou aqui, e isso é o que importa – respondo, cruzando os braços. – Então, vai me dar trabalho ou não?
Por um momento, ela parece hesitar. Mas então se recosta, na cadeira, avaliando-me.
— Certo. Vamos começar.
Dra. Baldez põe seus óculos, pega uma pasta na mesa e a desliza na minha direção.
— Proetti está fora, como você já deve saber. Vou anunciar isso oficialmente daqui a pouco. Mas antes... – Ela faz uma pausa, inclinando-se para frente. – Quero deixar claro que, já que está aqui, a sua promoção a advogada júnior será feita hoje. Você merece isso, Anna. Eu estava esperando você retornar e passar por... — Ela enxerga minha expressão e para de falar — Enfim, será hoje. Parabéns!
Meu peito aperta com uma mistura de surpresa e algo que se assemelha a orgulho. Mas não me permito sentir.
— Obrigada. Agora, sobre os casos...
Ela solta um suspiro baixo, percebendo que não conseguirá quebrar a minha barreira.
— Muito bem. Estes são os mais urgentes – diz, apontando para outra pilha de papéis.
Pego as pastas e me levanto.
— Boa sorte no anúncio – digo, sem emoção, enquanto saio.
No corredor, vejo Ralf parado perto da máquina de café. O que ele está fazendo aqui no meu setor, porr*? Não tem trabalho o suficiente no 12° andar? Seus olhos estreitam ao me ver com as pastas na mão.
— Ouvi dizer que alguém vai ser anunciado como advogado júnior, presumo que seja você – ele comenta, com um tom azedo. – Subindo rápido, hein?
Paro por um segundo, encaro-o, e um sorriso frio se forma em meus lábios.
— Subir rápido não é difícil quando não se carrega mediocridade nas costas.
Sua expressão muda para algo mais sombrio, mas não espero uma resposta. Passo por ele, pronta para enfrentar o que vier. Foda-se.
O auditório estava lotado. Todos os advogados e funcionários do Grupo Proetti-Baldez aguardavam em silêncio, as conversas baixas desaparecendo conforme a Dra. Baldez entrou com passos firmes, carregando sua presença imponente. Eu a segui, mantendo a expressão neutra.
O silêncio se intensificou quando ela se posicionou à frente, ajustando o microfone no pequeno pódio.
— Obrigada a todos por estarem aqui – começou, com a voz calma, mas firme. – Como sabem, nosso escritório sempre teve como pilar a ética e a excelência, conforme o estatuto da Ordem dos Advogados. No entanto, descobrimos recentemente uma quebra grave desses valores por parte de um de nossos sócios.
Os olhos da sala inteira se arregalaram. Murmúrios começaram a se espalhar, e Ralf, sentado na primeira fileira, virou-se para trás, como se quisesse medir as reações dos outros.
A Dra. Baldez ergueu a mão, pedindo silêncio.
— O Dr. Gustavo Proetti não faz mais parte deste escritório. A investigação revelou condutas incompatíveis com a prática da advocacia e a gestão que prezamos aqui. E, por conta disso, ele foi desligado de todas as suas funções. No momento, ficaremos sem sócio gerente e eu tomarei a frente de todas as suas funções.
Um silêncio pesado tomou conta da sala, seguido por sussurros. Alguns pareciam surpresos, outros chocados.
— Com isso – continuou a Dra. Baldez – decidimos fazer algumas mudanças internas, reconhecendo os profissionais que se destacaram em integridade e compromisso.
Ela virou-se para mim. Meu estômago revirou, mas mantive a postura firme, como sempre.
— A partir de hoje, Anna Florence será promovida ao cargo de advogada júnior do setor de Direito Criminal.
O silêncio se quebrou com um aplauso hesitante, logo seguido por outros. Meu olhar se manteve fixo na Dra. Baldez, mas podia sentir os olhos de Ralf queimando em minha direção, o maxilar tenso, a cara vermelha, como se estivesse prestes a explodir.
— Anna, por favor, diga algumas palavras – disse Dra. Baldez, com um pequeno sorriso de encorajamento.
Engoli em seco. Discursos não eram meu forte, mas eu sabia que isso fazia parte do jogo. Dei um passo à frente, ajustando a postura.
— Obrigada, Dra. Baldez, e obrigada a todos – comecei, a voz firme, mas controlada. – Esta promoção significa muito para mim, mas também reforça que nosso trabalho e nossa ética sempre falarão mais alto. Estou pronta para continuar contribuindo com este escritório e com os valores que ele representa.
A sala explodiu em aplausos novamente, mas eu não procurei os rostos na multidão. Mantive minha atenção na Dra. Baldez, que parecia satisfeita.
Quando os aplausos cessaram, ela concluiu:
— Agora, todos de volta ao trabalho. Temos uma reputação a zelar. E sobre a mídia, não quero e proíbo funcionários falarem a respeito do caso à imprensa. Nosso setor de comunicação lidará com isso.
Enquanto os funcionários começavam a se dispersar, senti uma presença ao meu lado. Era Ralf, completamente puto comigo.
— Você realmente sabe como jogar o jogo, não é?
Virei-me para ele, meu sorriso frio surgindo novamente.
— Não é um jogo, Ralf. É competência. Algo que você claramente desconhece.
Ele apertou os lábios, mas antes que pudesse responder, a Dra. Baldez apareceu ao nosso lado.
— Algum problema, querido?
Ele se virou imediatamente, forçando um sorriso falso.
— Nenhum, Dra. Baldez.
— Ótimo. Porque não temos tempo para picuinhas – disse ela, olhando diretamente para ele. Depois, voltou-se para mim. – Anna, podemos falar no meu escritório?
Assenti, deixando Ralf para trás, mais uma vez derrotado.
Eu mal havia deixado o auditório quando Roberto surgiu no corredor, vindo em minha direção com passos largos e uma expressão de desdém que parecia ser sua marca registrada. Era o dia do caça às bruxas e eu não estava sabendo?
— Anna, podemos conversar? – perguntou, mas o tom ríspido denunciava que aquilo estava longe de ser um pedido.
Cruzei os braços, mantendo-me imóvel.
— Se for rápido. Tenho mais o que fazer.
Ele forçou um sorriso, claramente falso, antes de indicar com a cabeça uma sala de reuniões vazia. Suspirei e entrei, já me preparando mentalmente para o que vinha a seguir. Coloquei a mão sob as minhas têmporas, massageando-as rapidamente.
Assim que a porta se fechou, ele virou-se para mim, cruzando os braços.
— Parabéns pela promoção. Mas vamos ser honestos: todos sabem que isso foi armação sua com a Dra. Baldez. Você deve ter passado por cima de muita gente pra chegar aqui.
Senti o sangue ferver, apertei a mandíbula, mas mantive a postura calma, jogando meu peso em uma das pernas enquanto o encarava.
— Se por "passar por cima" você quer dizer "trabalhar duro e ser competente", obrigada pelo reconhecimento, Roberto. Agora, se terminou sua sessão de recalque, tenho coisas mais importantes a fazer.
Dei um passo em direção à porta, mas ele me bloqueou, sua expressão agora carregada de provocação.
— Não seja cínica, Anna. Todos sabemos que você é boa em manipular as coisas a seu favor. Só tome cuidado para não cair na própria armadilha.
Sorri de canto, sem humor, e dei um passo para trás, ajustando minha postura.
— É engraçado ouvir isso de você, Roberto. Porque, se estamos falando de manipulações, talvez você devesse me agradecer por não ter deixado Proetti colocar toda a culpa em você.
Ele piscou, confuso, e a confiança em sua postura vacilou levemente.
— Do que você está falando?
Inclinei-me levemente, deixando minha voz cair para um tom quase confidencial.
— Você não sabia? Proetti estava desviando dinheiro do escritório. E, se ele fosse pego, o plano dele era jogar tudo nas suas costas.
O rosto dele empalideceu.
— Isso é mentira.
— É mesmo? – rebati, mantendo meu olhar fixo no dele. — Você acha que Proetti se importava com você? Ele só precisava de alguém para levar a culpa, caso o esquema dele fosse descoberto. E, adivinha, Roberto? Você era o alvo perfeito. O "mago financeiro da empresa", como você mesmo se intitula, não seria a pessoa perfeita para forjar um esquema? Não seria?
O silêncio dele me deu a resposta que eu esperava. Aproveitei a pausa para me endireitar e ajustar o tom.
— Então, da próxima vez que quiser me acusar de algo, pense bem. Porque, se eu quisesse mesmo jogar sujo, você já estaria fora daqui.
Roberto parecia dividido entre raiva e medo. Seus punhos estavam fechados, mas ele não encontrou palavras para responder.
— Agora, a propósito – continuei, abrindo a porta. — Você vai deixar minha namorada em paz. Vai tratá-la com respeito e vai tratá-la com ética, eu poderia facilmente ter deixado você se foder junto com Proetti, mas não valeria a pena. Te ver caindo sozinho e te ver com esse olhar de peixe morto é a melhor vingança. — Encaro seus olhos e o fuzilo com o olhar, ele parece perdido — Você me deve, Roberto. E eu já estou te cobrando: deixe Fernanda em paz. Você vai tratá-la bem. O que aconteceu entre Bia e eu não é da sua conta. E minha namorada, a mulher que eu amo, não deve ser penalizada pelos meus erros. Estamos entendidos?
Ele assente com medo e saio da sala, deixando-o sozinho com seus pensamentos. O som dos meus passos ecoava pelo corredor enquanto eu me dirigia à sala da Dra. Baldez. Roberto podia até tentar me intimidar, mas agora ele sabia exatamente com quem estava lidando.
Quando alcancei a porta da sala da Dra Baldez eu bati duas vezes, aguardando sua permissão para entrar.
— Entre, Anna – a voz dela veio firme e controlada, como sempre.
Seu olhar levantou para me encontrar, ela me analisava e eu começo a me sentir desconfortável. Todo mundo resolveu me analisar agora? Ainda bem que ela não é Charles Xavier para ouvir meus pensamentos.
— Sente-se.
Fiz como solicitado, cruzando as pernas e mantendo minha expressão neutra.
— Primeiro, quero parabenizá-la novamente pela promoção – começou, um leve sorriso nos lábios. – Você merece esse reconhecimento.
— Obrigada – respondi, com um aceno breve. – Farei o possível para honrar a confiança que a senhora depositou em mim. E como eu disse no dia que derrubamos Proetti: você não está sozinha nessa.
Ela inclinou-se para frente, apoiando os cotovelos na mesa e cruzando as mãos. Havia algo em seu olhar que ia além do profissionalismo habitual.
— Sei que os últimos dias não foram fáceis para você – continuou, o tom mais brando agora. — Mas eu quero que você saiba que nesse momento que você está enfrentando, eu estou aqui também. Como amiga, Anna. Você sabe.
Meu instinto era rebater, minimizar o que ela dizia, mas algo na sinceridade dela me fez hesitar.
— Eu prefiro não misturar pessoal e profissional – respondi, finalmente.
Dra. Baldez sorriu levemente, como se esperasse exatamente essa resposta.
— Entendo. Mas nós somos humanos, Anna. Os mundos pessoais e profissionais acabam colidindo, mesmo quando tentamos separá-los.
Desviei o olhar por um momento, fixando-o no porta-canetas perfeitamente alinhado na mesa dela.
— Se me chamou aqui para uma sessão de terapia, acho que está no lugar errado.
O sorriso dela se alargou ligeiramente, mas seu tom continuou sério.
— Não subestime a importância de cuidar de si mesma, Florence. Isso não é um sinal de fraqueza, mas de força.
Permaneci em silêncio. Não porque concordasse, mas porque sabia que discutir seria inútil. Ela tinha o poder de ver além das minhas palavras, o que tornava cada conversa com ela um território perigoso.
— Bem, vamos ao trabalho – disse ela, mudando de assunto, como se percebesse meu desconforto. – Agora que Proetti está fora, preciso que você assuma um caso que era dele. É um caso de grande visibilidade e exige alguém com sua competência e… digamos, tato. Vou enviar os detalhes para você ainda hoje.
Assenti, mais confortável com a transição para assuntos profissionais.
— Considere feito.
Dra. Baldez inclinou-se para trás, cruzando os braços.
— Eu não esperaria menos de você, Anna. Pode ir.
Levantei-me, pronta para sair, mas hesitei com a mão na maçaneta.
— Dra. Baldez – chamei, sem me virar completamente. – Obrigada... pela oportunidade.
Ela sorriu. Sabia que tinha duplo sentido naquela frase.
— Não a desperdice, Anna.
Saí da sala com uma nova energia, pronta para enfrentar o que viesse pela frente.
⚖🗒
Eu estava na minha mesa, enumerando a lista de tarefas que eu tinha pra fazer e não eram poucas. Eu havia pedido a maior carga de trabalho que pudesse para esquecer do problema da minha mãe. Suspiro. Não era exatamente um problema, né? Já que já tinha empacotado, enfim.
Morreu e eu não estava preparada pra lidar. O caixão fechou e ela levou consigo respostas que eu gostaria de ter feito as perguntas. Eu ainda esperava uma reconciliação, eu pensava em ligar e ir atrás dela, mas não deu tempo. A culpa e o remorso estava me consumindo, mas ela também poderia ter feito o mesmo. E o meu pai no enterro me encheu de ódio e nojo. Não quero pensar nisso, não quero pensar nele, nela ou em família. Não mais. Que se fodam longe de mim!
A pilha de processos estava alta, mas não podia fraquejar ou hesitar agora. Olho para meu smartwatch e são quase 15h da tarde, eu não iria sair daqui tão cedo e não queria deixar Fê esperando em casa preocupada, eu devia um pedido de desculpas à ela. Decido pegar o celular e me mandar uma mensagem.
**Anna Florence - adv:**
— Fui promovida à advogada júnior, estou numa felicidade que você nem imagina.
**monstrinha ❤:**
— Meus parabéns, amor. Sabia que você era capaz, só lamento não ter visto isso pra comemorar com você.
**Anna Florence - adv:**
— Te peço desculpas pela forma que lhe tratei, não está sendo fácil, confesso. Preciso me estabilizar emocionalmente e não estou conseguindo. Mas tbm não quero encarar isso, quero ignorar pra nunca mais pensar sobre o assunto e isso ter poder sobre mim, você entende?
**monstrinha ❤:**
Óbvio que eu entendo, mas não precisa se fechar pra mim... Sinceridade e honestidade, lembra? Isso inclui seus sentimentos, seus pensamentos, inclusive raiva, rancor, seja lá o que você esteja sentindo, converse comigo. Você quer uma namorada apenas pra te dar beijos, carinho e sex* ou uma namorada que queira dividir a vida (incluindo as dores) com você? Pense nisso.
**Anna Florence – adv:**
— Vou pensar, prometo. Está na minha casa?
**monstrinha ❤:**
— Sim, Anna Florence. Minha vontade foi de ir para minha casa e te virar as costas, mas a sua sorte é que eu amo você e isso inclui seus defeitos. Sei que está em um momento de luto, eu não te deixaria nunca.
**Anna Florence — adv:**
Me desculpe rs
Eu te amo, monstrinha. Logo estarei em casa.
Sou interrompida pela porta se abrindo. Preciso contratar uma secretária agora, meu Deus. Ninguém bate mais na porta?
Pelo perfume masculino, era Ralf.
— O que foi, cara? Terceiro round agora? Me deixa em paz! Eu não tenho tempo pra você agora, rapaz.
— Não me leve a mal, Anna, mas você não tem ideia do que está acontecendo. Proetti caiu, mas quem você acha que vai ser o próximo alvo?
Franzi a testa. O que ele quis dizer com isso? Acaso ele achava que a Dra Baldez iria querer me derrubar do próprio cargo que ela me colocou? Pfff. Ou ele era burro ou não tinha discernimento mesmo. Após a queda de Proetti, uma caça às bruxas estava se formando.
— Você está me ameaçando, Ralf? — Perguntei com a minha voz de "corte rápido Tramontina"
— Não, não é isso. Só estou dizendo que, com todo esse burburinho, você pode ser a próxima.
Esse cara estava me dando nos nervos. Na verdade, desde que comecei a ficar com Fernanda, ele entrou em um recalque que não conseguia superar.
— Você realmente acha que vai me intimidar com isso? – desafiei, mantendo o olhar fixo nele. — Proetti foi afastado porque fez merd*. Eu estou aqui porque tenho competência, Ralf. E é isso que vai me manter em pé. Não precisa se preocupar com isso.
No entanto, antes que ele pudesse responder, ouvi a voz firme de Dra. Baldez vindo do corredor.
— Rapaz, você não tem trabalho no seu setor? Devo perguntar a Roberto se sua função é espionar o trabalho alheio? – Ela apareceu na porta da minha sala, com um olhar que não deixava margem para contestação.
Ralf saiu de fininho e Roberta me deu um singelo sorriso.
— Não ligue para ele, Anna. Ele está apenas tentando encontrar seu novo lugar no jogo.
Fui incapaz de esconder minha surpresa, mas a resposta foi imediata:
— Ele acha que sou a próxima vítima.
Dra. Baldez deu um passo à frente, fechando a porta atrás de si.
— Pode até ser. Mas a verdade, Anna, é que você não precisa ter medo de ninguém aqui, exceto de si mesma. Se tiver que derrubar alguém para seguir em frente, faça isso. Não espere que o mundo te dê permissão para conquistar o que é seu.
Eu estava mais uma vez frente a frente com ela, e dessa vez, em vez de me sentir intimidada, senti um impulso crescente de não deixar nada me parar.
— Não vou esperar – respondi
Agora era hora de seguir em frente. Eu tinha um novo cargo, novos desafios, e a certeza de que nada poderia me derrubar. Não mais.
Terminei de organizar meus pensamentos e retornei à pilha de processos. O trabalho, apesar de exaustivo, era minha válvula de escape. A mensagem de Fernanda ainda me fazia refletir. Ela estava ali, sempre tentando ser o apoio que eu precisava, mas eu ainda não sabia se conseguia me entregar completamente. Porr*, eu era um monstro. A vida havia me ensinado a não confiar tão fácil nas pessoas, especialmente nas que mais me importavam.
E, também, essa guerra de egos no escritório estava apenas começando. Mas é a minha profissão, né? Eu podia ter escolhido ser uma advogada autônoma, mas eu quis crescer na merd* de um escritório grande e agora tenho que colher os frutos disso. Inclusive, as maçãs podres.
A notificação do meu celular me tirou desses pensamentos. Era Fernanda.
**monstrinha ❤:**
— Eu sei que você está ocupada, mas se precisar de alguma coisa, me avise. E eu sei que você não vai querer ouvir isso, mas por favor, tenta relaxar um pouco. Não precisa carregar o peso de tudo sozinha. Eu estou aqui. Te amo.
Suspirei profundamente. Ela tinha razão, mas meu orgulho ainda estava me impedindo de aceitar ajuda como deveria. Estava tão acostumada a lidar com tudo sozinha, a ser a mulher forte que ninguém poderia abalar, que me esquecia de que ser vulnerável também fazia parte de ser humana.
**Anna Florence – adv:**
— Eu te amo, monstrinha. Em breve estarei em casa.
Quando eu chegasse em casa, como seria? Seria capaz de ser a pessoa que Fernanda merecia? Eu ainda não sabia. Tudo o que eu sabia era que, enquanto o mundo girava ao meu redor, eu não podia parar.
Guardei as minhas coisas e pedi um carro por aplicativo para ir para casa, nem a pau eu enfrentaria um metrô nesse momento, só queria chegar em casa, abraçar minha ruiva e dormir agarrada em seus braços.
Já dentro do carro, fecho os olhos e fico imaginando como ia ser daqui pra frente. O meu primeiro pensamento é que eu precisava urgentemente ir à concessionária comprar meu carro, eu não aguento mais andar de metrô e gastar com carro de aplicativo, sem falar que dirigir pra mim era libertador. Pensei no meu trabalho e no meu relacionamento com Fê, agora eu teria uma carga de trabalho maior e uma responsabilidade maior. Como iríamos lidar com isso? Continuaríamos a nos ver toda terça, quinta e sábado? Ou não sobraria mais tempo? Como iríamos resolver essa situação? Precisávamos ter essa conversa difícil.
O carro estaciona em frente à minha casa e agradeço ao motorista, giro a chave para destrancar a porta e vejo a sala vazia. Vou até a cozinha e encontro Fernanda com as mãos trêmulas e os olhos marejados. Flores em cima da mesa e um bilhete em suas mãos.
Ah, não.
Fim do capítulo
Olá, meninas! Como vocês estão?
Mais um capítulo fresquinho para vocês.
Tenho pensado se os capítulos não estão ficando muito longos e cansativos. Devo continuar assim ou vocês acham que é melhor dar uma diminuída?
Sobre a Anna, o que vocês acharam da forma de como ela está lidando com o luto? Ignorar mesmo é a melhor opção?
Quinta volto aqui com mais um cap pra vocês, obrigada por estarem acompanhando e estarem se envolvendo com a história! <3
Qualquer coisa, pode mandar um direct no insta que eu respondo: @rodriguesnathh
Beijos!
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HelOliveira
Em: 09/12/2024
Ana está fugindo e dificultando as coisas, tem uma pessoa incrível diz que ama mas não está dando atenção e a segurança necessária.
Quanto aos capítulos está ótimo, pode ser até maio
nath.rodriguess
Em: 09/12/2024
Autora da história
a anna eh uma cuz0n@ kkkkkkkkk
ah, obrigada pelo feedback sobre os capitulos
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Lilian Santos
Em: 08/12/2024
A Anna complica tanto as coisas que me deixa perdida kkk
Me diz pra que ficar assim com a morte da "mãe" ? Eu ficaria é feliz
E se ela ama a Fernanda porque não conversa cara a cara com a Beatriz colocando um fim?
Tudo bem que aí a história acaba logo kkk
Mas autora, os capítulos estão de ótimo tamanho por mim seriam até maiores
nath.rodriguess
Em: 09/12/2024
Autora da história
Quando o assunto eh família, pra Anna eh muito complicado, mas a bichinha se recusa a fazer terapia
até que seu comentário me deu uma ideia para um capitulo adiante, acompanhe as notas finais de cada capítulo que eu vou fazer um post te agradecendo
Lilian Santos
Em: 11/12/2024
Só se foi a ideia da conversa com a Beatriz, mas se for isso vai ser interessante e coloca aquela conversa de desenterrar defunto kkkk para as duas porém tudo para fora pois há mágoa de ambas aí na relação. Obrigada autora por considerar o meu comentário, vou ficar de olho. Abraço!
nath.rodriguess
Em: 20/12/2024
Autora da história
eu não anotei a ideia e esqueci kkkkkkkk mas eu vou lembrar, juro que vou lembrar
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Mmila
Em: 08/12/2024
Eu falei, Anna, eu falei, deixa passar o tempo em falar sobre essas flores.......
Anna, não carregue o mundo em suas costas, a Fernanda é a melhor pessoa que você pode dividir tudo.
Quem enviou essa surpresa para a Fê?!?!?!? Ralf, Roberto ou ......... Diana?
Força Anna e Fê, muita calma nessa hora.
Autora: Por favor, não reduza o tamanho dos capítulos, não é cansativo, é muito empolgante leitura.
Parabéns, sempre!
nath.rodriguess
Em: 09/12/2024
Autora da história
Hahaha, quem? Claro que foi a demônia da Bia
opa, dei spoiler
Pode deixar que não vou reduzir o tamanho, mas eu fico bastante preocupada pra não cansar vocês, principalmente agora que a Anna está em seu conflito interno.
Obrigada, amores! Vcs são meu combustível ?
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