O toque da campainha fez com que eu despertasse do meu sono naquela manhã de domingo, levantei da cama deixando Lais dormindo, linda e graciosa com a baba escorrendo e os cachinhos jogados por cima dos seus olhos, desci a escada ainda de pijama, abrindo o portão encontrei Larissa com a mesma roupa de ontem, um sorriso pequeno em seus lábios e de óculos escuros  

-Bom dia irmãzinha - ela falou me fazendo rir, já entrando em minha casa. possuía em sua mão uma sacola que aparentemente despunha de alguns pães -Huum, as coisas aqui foram bem animadas - ela falou apontando para as taças que ficaram em cima da mesa de centro 

Peguei as taças, enquanto minha irmã deixava por ali as coisas que estavam em suas mãos, os óculos, as chaves e o celular, saindo de lá para a cozinha   

-No seu caso também...- apontei para o seu corpo, mostrando os motivos de eu dizer aquilo -Me diz como foi?  

-Há... Transei com a Fernanda e acabei de descobrir o motivo de você ser lésbica - ela falava de uma maneira muito natural -Nossa por que o beijo é tão bom? Sem pelo, é macio, delicado, e outra coisa... o oral, nossa senhora, durei dois minutos - eu ria a todo o momento  

Nós já estávamos na cozinha, onde deixei as taças e coloquei água no fogo para um café, enquanto ela sentou em um dos bancos da bancada 

-E você?... - Ela me olhou com a sobrancelha levantada e balançou a cabeça demonstrando que ela tinha entendido minha pergunta, e tinha realizado -E o que achou? 

-Achei boa a reação dela, mas não sei se fiz direito, ela demorou bem mais do que eu  

-Tem gente que é assim, demora mais, é normal, mas também leva em consideração que foi sua primeira vez, né? - ela balançou a cabeça de uma maneira engraçada  

-Então... quer dizer que eu sou Bi? - dei de ombros e ela me olhou com a sobrancelha levantada 

-Como eu vou saber? Não se coloque em caixa... você se sente atraída por mulher? Tipo, quando ver uma mulher bonita? 

-Não... eu sempre achei a Fernanda uma fofa, mas nunca tinha prestado tanta atenção nela assim, não sei explicar, só que quando finalmente pude conversar com ela e conhecer ela... percebi algo diferente e... - Ela saiu da bancada onde estava e abriu minha geladeira, dando pausa ao que falava como se ela estivesse pensando nas palavras -é como se eu tivesse me atraído por ela, partir daquele momento, entendeu? 

-Entendi - ela pegou queijo, manteiga, ovos e leite os colocando em cima da bancada 

-Faz aquela omelete? - ela tinha aquela cara que ela faz quando quer que eu faça algo. Balancei minha cabeça confirmando e ela sorriu -E vocês? Como foi ontem?  

-Mamãe - Lais correu para os braços da mãe a abraçando  

-Leva ela pra escovar os dentes que eu vou terminar nosso café... - as duas me deram as costas -E vê se toma um banho também! - escutei sua risada alta, me fazendo rir também  

[...] 

Os raios de sol se filtravam suavemente pela fresta da cortina, acariciando meu rosto, que era a única parte de mim ainda exposta, fora do calor do edredom. Com o toque da luz, abri os olhos devagar, sentindo a suavidade da manhã ao meu redor. Olhei para o relógio digital ao lado da cama, em cima da mesa de cabeceira, e, ao ver a hora, percebi com um suspiro suave que havia me entregado ao sono por mais tempo do que imaginava.  

Levantei da cama e fui para o banheiro tomar um banho, eu já estava atrasada para ir trabalhar, um minuto a mais um minuto a menos não ia fazer tanta diferença. 

Me despir do robe preto que eu vestia, e o joguei em cima da cama, tomei meu banho com calma, eu estava bem, eu dormir bem e estava tranquila, mesmo que estivesse atrasada. Coloquei uma calça social bege e uma blusa branca de botão acompanhado de um salto pequeno. 

Andei até o carro cantarolando uma música de Legião urbana, e foi o que coloquei para ouvir no trajeto até o trabalho. Eu parecia uma outra pessoa, parecia alguém um pouco mais feliz  

Deixei o carro no estacionamento do prédio e subi pelo elevador até o andar do meu escritório. Assim que as portas se abriram, o barulho invadiu meus ouvidos, quebrando a calma que eu carregava até aquele momento. Algumas pessoas conversavam ao telefone, outras digitavam de maneira exageradamente alta, e outras ainda conversavam entre si. Aquele ambiente parecia um verdadeiro caos. Um caos que, apesar de ser familiar e recorrente em meu dia a dia, por algum motivo, hoje ele parecia mais insuportável, mais intrusivo, como se cada ruído fosse uma agonia. 

Deixei minha bolsa sobre a mesa, pegando apenas o celular. Caminhei até o refeitório, servi-me de um pouco de café em um copo descartável, adicionei duas pequenas colheres de açúcar e mexi devagar, como se aquele gesto simples fosse o que me daria forças para encarar mais um dia. Dei um gole profundo e, no exato momento, vi o celular acender. 

O nome de Mariana brilhou na tela, seguido de um "bom dia" e um emoji de carinha feliz. Meu coração disparou e, sem querer, um sorriso surgiu no meu rosto, espontâneo e sincero. 

-Bom dia sorrisinho - Luana falava de uma maneira debochada - chegou atrasada, está tomando o café da empresa - ela falava apontando, notando cada coisa diferente em mim - você está sorrindo? Isso é um sorriso? E essa roupa, clara, nossa você está radiante - eu ria a cada palavra que ela falava  

-Deixa de ser gay - ela se serviu com um pouco de café e escorou o corpo na bancada me olhando, tomou um gole e quase cuspiu no copo - isso que dá ficar olhando a vida dos outros, esqueceu de pôr o açúcar  

-Então... senhorita Helena - ela falava enquanto colocava açúcar em seu copo -Vamos almoçar juntas para você me contar como foi o cinema sábado?  

-Vamos, Larissa também vai - ela deu um sorriso de canto me fazendo rir -Ela é hetero, você terá que conviver com isso  

-Só queria ser sua cunhada - ela tomou um gole do café e sorriu -Passa na minha mesa antes de ir... agora eu preciso ir, estou com um problemão - ela deu as costas e saiu do refeitório me deixando só  

Aproveitei para responder o bom dia, com um ou dois emojis a mais, bloqueei o celular o guardando em meu bolso e fui para minha mesa, para finalmente trabalhar 

A manhã passou rápida, e meu estomago gritava por alguma comida, a fome dominava até o meu humor.  liguei para Larissa que informou que já estava indo para o restaurante e fui até a mesa de Luana, que parecia muito concentrada  

-Vamos? - ela me olhou, colocou a mão na nuca, e bloqueou a tela do computador  

Entramos em meu carro e fomos até o restaurante próximo ao hospital, Luana não parava de falar sobre o trabalho, enquanto eu ouvia tudo calada só balançando a cabeça 

Chegando no restaurante passei o meu olhar pelas mesas, encontrando Larissa de cabeça baixa digitando no celular, nos sentamos de frente para ela que se assustou por não notar nossa chegada  

-Que susto - Larissa falou com a mão no peito -Luana, quanto tempo - as duas apertaram as mãos, e enquanto eu olhava para Luana percebia o nervosismo dela por estar de frente a seu crush supremo  

-Oi - foi a única resposta que a loira deu   

-Já pediu? Por que eu estou faminta - falei tomando a atenção de Larissa para mim  

-Já, e por isso, já pode contar - ela cruzou os braços e escorou o corpo na cadeira  

Comecei a detalhar como foi o sábado, falei da pizza, do filme e dos beijos, as duas me olhavam atentamente, enquanto eu falava com muito animo, eu realmente estava orgulhosa de mim, orgulhosa de não está surtando, orgulhosa de me permitir e de gostar disso  

-E nossa ela tem uma pegada - eu falei fazendo as duas rirem, a gente já comia, mas eu mais falava do que comia, por mais que eu estivesse com fome, eu estava eufórica por tudo que aconteceu -Ela nos chamou para ir ao condomínio dela, domingo você está de folga? - Larissa balançou a cabeça -Então vou marcar para domingo 

[...]  

A semana passou rápido, e todos os dias eu falei com Mariana, por ligação, por mensagem e as vezes por vídeo, as noites deixaram de ser só filmes e series, voltei para academia naquela segunda, a vida parecia fluir novamente  

-Então, que tal jantar comigo hoje? Eu prometo que vou te fazer uma carbonara incrível. - Era sexta-feira, e eu dirigia de volta para casa, falando com a Mariana ao telefone. O celular estava conectado ao carro, então eu ficava focada no trânsito, mas não conseguia esconder o sorriso. 

-Só carbonara não vai me convencer, quero mais do que isso. - Eu disse tentando ser provocante 

-Sorte sua que eu tenho algo muito melhor do que uma simples carbonara. Quando você chegar aqui, vai descobrir o que é. - eu podia sentir a tensão boa no ar. 

-Acho que a realidade vai ter que ser ainda mais surpreendente do que a expectativa. - Falei com uma risada mais tímida, mas com um friozinho na barriga que não mentia. 

-Pode deixar que vou te impressionar, Helena. - A voz dela soou mais baixa, mais doce. 

-Já estou quase chegando em casa, então me espera. - Respondi, o coração batendo mais rápido, sem conseguir disfarçar o sorriso. 

Fim do capítulo