-Calma, Helena- meus pensamentos estavam a mil. Eu pensava minuciosamente sobre o que falar, como me comportar, o que fazer e se ela estava reparando em mim. Estávamos sentadas na mesma mesa, a sós. As mãos dela estavam juntas, formando uma concha sobre a mesa, os ombros levemente elevados. A roupa que usava combinava perfeitamente com ela: uma blusa sem mangas, com a gola que ia até o pescoço, em um tom pastel. Um lindo cordão também fazia parte do seu look, além de brincos pequenos e simples. 

Seu sorriso ao se expressar me dava vontade de vê-la conversar. Eu a via de uma forma diferente e, ao mesmo tempo, aquela sensação me era familiar, embora eu a tivesse sentido muito tempo atrás. 

Ok, pode ser que ela só seja muito bonita a ponto de me chamar tanta atenção, ou talvez seja o jeito dela, a simpatia... não sei. Só sei que há algo de diferente nela. 

- Então... já que você me deixou curiosa sobre esse seu gosto musical, posso perguntar qual é a sua música favorita? Ou é segredo? - Mariana me perguntava, depois de ouvir ela cantando a música infantil que passava e rir disso 

- Eu poderia dizer que é segredo, mas... acho que você vai descobrir de qualquer jeito. - Ela sorria enquanto esperava que eu continuasse - A minha favorita é algo mais tranquilo, sabe? Algo que faz o coração bater no ritmo da calma. 

- Isso foi poético... Eu posso apostar que você é uma dessas pessoas que faz o mundo parar de girar quando entra no lugar, né? - ela falava arqueando a sobrancelha, me fazendo ter certeza que o que ela queria mesmo, era me ver envergonhada 

- Acho que você está exagerando... Ou talvez você só esteja tentando me deixar tímida. - Eu já estava nervosa e agora estava corada. 

- Se eu quisesse te deixar tímida, você já teria percebido, mas eu prefiro te fazer sorrir. E você tem esse sorriso irresistível, sabia? 

- Oi! - Lais apareceu do nada, colocando a mão no peito, visivelmente cansada de tanto correr. Colocou a mão na minha cadeira e fez sinal com a outra mão, pedindo para que esperássemos. Depois de respirar fundo, ela encarou Mariana. - Vamos brincar comigo?  

Eu a encarei, levantando uma sobrancelha.  

- Lais, a Mariana não é criança para brincar com... - Eu nem consegui terminar a frase. 

- Não, está tudo bem - Ela olhou para Lais, tirando os olhos de mim. - Vamos! - Eu me surpreendi com a resposta dela. Ela levantou e pegou a mão de Lais, e as duas foram para a cama elástica, que era bem grande. Isso me fez levantar e segui-las. 

Mariana tirou os tênis brancos, deixando-os ali perto, subiu pela pequena escada, segurou as mãos de Lais e começou a pular com ela. Senti meu coração bater mais rápido. Foi impossível não sorrir com aquela cena. As duas pulavam, sorrindo uma para a outra, como se fossem amigas de longa data. Peguei meu celular da bolsa e registrei aquele momento. Algumas fotos e vídeos se juntaram aos outros registros que eu tinha de Lais, que já eram muitos. 

O tempo passou muito rápido. As duas continuaram conversando no balanço, que fazia parte do cenário alugado. Quando percebi, já era hora de cantar os parabéns. Quando Larissa anunciou os parabéns, as duas estavam usando o quebra-cabeça que Mariana tinha dado de presente para Lais. 

Ela ficou ao meu lado na hora dos parabéns. Todos cantavam e batiam palmas enquanto nossos braços estavam colados. Eu respirava fundo. Aquele perfume me dava uma sensação de nostalgia, me deixando um pouco desnorteada.  

Quando a festa acabou, fiquei para ajudar Larissa, e, para minha surpresa (ou talvez não tanto), Mariana também nos ajudou. Ela ficou com Lais, montando o que faltava do quebra-cabeça. Uma hora depois, todas nós estávamos do lado de fora. Lais segurava o cachorro e um cacho enorme de bolas rosas, saltitante e extremamente feliz, o que fazia meu coração transbordar de amor e me dava a sensação de que faria tudo por ela. 

Nos despedimos, e cada uma entrou em seu respectivo carro.   

- Ei? - Eu estava ajeitando as coisas que havia trazido para casa quando ela apareceu na janela do carro. - É... - Ela olhou para dentro do carro, vendo a cadeirinha. - Você tem filho? 

- Ah! Não, é da Lais. - Ela sorriu, ajeitou o cabelo e suspirou. 

- Você não quer sair qualquer dia desses? - O jeito que ela falou até me assustou um pouco. Eu olhei nos olhos dela para tentar me concentrar, mas quanto mais eu olhava, mais me perdia. - A gente pode sair para jantar, ir ao cinema, sei lá, você escolhe. 

- Pode... - Engoli em seco. - Pode ser! - Ela me entregou o celular desbloqueado, com o teclado numérico. 

- Me dá seu número. - Só balancei a cabeça e digitei meu número. Meu coração batia tão rápido que eu precisei respirar fundo para controlar. Assim que entreguei o celular para ela salvar meu número, o meu celular acendeu com o número dela na tela.  

- Salva o meu também. - Ela sorriu de canto e estendeu a mão para mim. Eu pensei que ela fosse apenas apertá-la, mas ela puxou meu braço, fazendo meu corpo se aproximar dela. Depositou um beijo na minha bochecha e sorriu. - Agora vou te deixar ir. Tchau! - Ela se afastou e foi em direção ao carro dela, que estava atrás do meu. 

Fechei os olhos por alguns segundos, sentindo aquela mesma sensação. Meu coração batia rápido, sentia um nervosismo enorme 

Ela passou ao lado do meu carro enquanto eu fiquei ali sozinha, pois até Larissa já tinha ido. Esperei mais alguns minutos e segui para casa. Desci com as coisas que trouxe, fui para o banho e, na minha cabeça, tudo que eu estava sentindo martelava: *Ela é bonita, ok, mas eu já fiquei com mulheres bonitas*. Meu cérebro pensava tanto que, se eu estivesse em um desenho animado, com certeza estaria saindo fumaça dos meus ouvidos. 

Quando saí do meu quarto só de toalha, vi meu celular aceso em cima da cama. O peguei, e um número que eu não tinha salvo estava ligando. 

- Alô? 

- Oi. - Era a voz de Mariana. 

- Oi. - Dei uma risadinha. 

- Não salvou meu número, né? 

- Não, eu estava no banho. 

- Quer sair para jantar amanhã? Eu te pego às dezenove. 

- Quero. - Respirei fundo. Nem pensei antes de responder. 

- Me passa seu endereço por mensagem. 

[...] 

- Bom dia, Helena.  

- Bom dia, Marília. - Minha terapeuta me encarava do mesmo jeito que ela faz todos os sábados. 

- Quais as novidades? 

- Nenhuma, só que... - Pensei antes de falar, mas lembrei que precisava contar. - Eu vou a um encontro hoje. 

Ela sorriu, colocando a mão no peito, como se estivesse surpresa. 

- Ela quem te convidou ou você? 

- Ela, mas... Eu... É... Eu estou sentindo isso, sabe? - Coloquei a mão na minha barriga, o que arrancou dela um sorriso. 

- Borboletas? - Confirmei, e ela colocou a mão na boca, surpresa. - Isso é muito bom... sério, é um avanço grande. Estou muito orgulhosa de você. E o que você acha que ela tem que te faz sentir isso? 

- Eu realmente não sei, eu sinto um nervosismo grande perto dela, ela é uma mulher incrível, se deu super bem com a Lais, é bonita, é simpática... até o perfume dela me deixa nervosa. - Ela começou a anotar no caderno dela, como sempre. 

- E o que você acha disso, em relação à Victória? - Só de ouvir o nome, meu corpo enrijeceu. - Você acha que essa mulher vai conseguir te fazer superar? 

- Não pensei nisso, sinceramente... A Victória é o amor da minha vida, sem dúvida, e nenhuma mulher vai tomar o lugar dela... Nenhuma. - Toda a sensação de que eu estava no caminho certo, de repente, desapareceu. 

Eu passei a sentir que tudo o que eu sentia perto de Mariana era uma traição em relação à Victória. Foram cinco anos sem esquecer dela nem por um segundo. E, agora, aqui estava eu, sentindo algo por outra mulher... Algo que, talvez, não fosse como me sentia por Victória, mas que era definitivamente diferente de todas as mulheres que eu conheci nesses cinco anos. Isso me deixou amedrontada e com uma tristeza profunda, me fez refletir. Saí da clínica destruída, entrei lá sorrindo e saí chorando. Eu achava que estava avançando, mas... 

Fim do capítulo