Só se ama uma vez

Capítulo dois

ESTHER MOTTA

Eu tinha dezoito anos e nem ao menos dez minutos de tempo livre por dia. Era tudo tão corrido que às vezes eu me perguntava se aquilo realmente valia a pena.

Era apenas mais um desses dias exaustivos quando eu conheci aquela garota que mudaria minha vida completamente.

Ainda me lembro bem daqueles olhos castanhos brilhantes que ficaram grudados em mim a cada passo que eu dava na sala de aula em direção a professora.

Quando ela veio falar comigo durante o intervalo eu quase não acreditei que aquilo estava acontecendo. Eu estava sentada na praça de alimentação do campus quando ela se sentou bem ao meu lado e fez uma piada tão boba que chegou a ser engraçada.

Logo ela me disse seu nome, “Carolina” ou “Carol”, como ela mesma preferia ser chamada.

Carol tinha aquele sorriso tímido, mas de tímida não tinha nada, tinha uma covinha do lado esquerdo da bochecha e eu agradecia muito por ela não poder ler os meus pensamentos, pois era impossível não imaginar como seria beijá-la.

Seus cabelos ondulados com pontas vermelhas emolduravam um rosto delicado, que contrastava com a maquiagem forte nos olhos. Ela tinha um estilo que se destacava bastante em meio a sua turma de vestibulandos.

Até hoje eu não sei dizer se foi amor à primeira vista. Eu era uma eterna romântica, e secretamente, ainda sou. Mas sendo bem sincera, eu acredito que o amor verdadeiro só acontece uma vez.

E se isso for de fato verdade, meu amor não pode ter sido a Carol.

Quer dizer… A vida não me daria tamanho castigo.

Começamos a namorar muito rápido. Saíamos todo fim de semana pra comer fora e às vezes íamos para minha casa.

Meus pais sempre respeitaram minha sexualidade e me apoiavam muito, mas aquele era meu primeiro relacionamento sério, e eu logo notei que eles não gostaram nadinha da minha nova namorada, e era compreensível que não gostassem.

Carol era uma figura. O que tinha de linda, também tinha de irresponsável. Comigo, sempre havia se mostrado sensível, mas com outras pessoas, ela podia ser bastante egoísta, e até mesmo arrogante em alguns momentos.

Eu sabia que não eram bons sinais. Mas não me culpo mais por isso… Acho que se alguém fosse capaz de vê-la com os meus olhos na época, entenderia porque eu fui capaz de ignorar cada um daqueles defeitos.

Em uma das noites que ficaríamos maratonando alguma série aleatória, eu parei de recusar suas investidas e provocações. E de todas as vezes que imaginei nossa primeira vez, a realidade havia se superado.

Na minha cabeça, eu já sabia que eu a amava, eu queria dizer, mas tinha medo de soar ridículo demais. Me pegou de surpresa quando foi Carol que disse primeiro, e afastou os fios que grudavam na minha testa molhada pelo suor, enquanto tocava os meus lábios com a ponta dos dedos antes de me beijar em seguida. 

Seria ótimo se eu pudesse dizer que guardo essas memórias com carinho, mas não é verdade. Volta e meia, elas retornam de maneira involuntária. Tanto as lembranças boas, quanto as ruins.

Mas principalmente as ruins.

Foi no dia 15 de dezembro de 2012 que eu desapareci da vida da mulher que eu amava, com lágrimas nos olhos, dinheiro emprestado dos meus pais e uma passagem para Curitiba.

Desde então, eu nunca soube o que se sucedeu em sua vida, eu não fazia ideia de como ela estava, que corte de cabelo usava, se havia conhecido alguém, se terminou a faculdade ou sequer se ainda morava no mesmo lugar.

Eu gostava de pensar que se um dia a encontrasse na rua, sequer a reconheceria.

E era reconfortante… ainda que não fosse verdade.

Fim do capítulo