Bodas de Odio por Thaa
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Capitulo 3
Capítulo 3
Era no meado do verão, quando os dias de sol se externavam radiantes, que a flor mais estival e belíssima do ano chegava para encantar os espanhóis principalmente na região da Sevilha, lugar em que os campos costumavam ser mais floridos e mais bonitos. Aquele lugar era um verdadeiro paraíso na Terra. Há muito tempo, em séculos passados, foi a terra prometida do antigo Duque de Valloni e de sua amada esposa e, conforme o tempo passou, pertenceu aos sucessores, filhos, netos, bisnetos, tataranetos do primeiro Duque.
Ali, na zona rural da Sevilha, perto de um vilarejo bucólico, erguia-se imponente um palacete neoclássico, transformado com o passar dos anos. A velha estrutura perdera um pouco de suas características medievais, hoje em dia os detalhes eram mais modernos, consequências daqueles que um dia moraram por lá e quiseram deixar o palacete ao seu bel prazer.
A imagem daquele lugar lindo ainda estava muito viva na memória de Júlia. Foi ali que ela viveu os melhores anos de sua vida, antes que tudo viesse a ruir como castelos de areia ao vento.
Enquanto arrumava suas malas, sentada sobre a cama macia de seu quarto branco, recordava-se com certa nostalgia da vida que tivera ao lado da mulher que hoje em dia a odiava mortalmente. Já faziam exatos seis anos que não a via, de lá para cá nunca deixou de pensar nela um dia sequer, na forma como ela costumava amar. Honestamente, Amerah se tornou uma estranha conhecida em sua vida. Não era a mesma mulher com quem se casou, aquela Amerah que costumava ser gentil, sorrir, lhe abraçar e beijar com carinho. Aquela pessoa que, além de esposa era também amiga, companheira, um ombro amigo, um pilar. Não. Hoje em dia não conhecia a Duquesa de Valloni. Não sabia o que faria de sua vida se um dia a visse de novo. Mas graças a Deus isso dificilmente aconteceria, só precisava de mais um ano ali dentro daquele país. Pagaria sua pena, sim, a pena injusta a qual lhe atribuíram e depois disso regressaria ao seu país de origem. Deixaria toda aquela diplomacia e aquela vida para trás. Uma vida que um dia pertenceria a um passado seu qualquer.
Ainda sentada sobre a cama, relanceou os olhos pelo quarto simplório, em um tom fora do branco. Havia apenas um guarda-roupa de quatro portas, duas mesas de criado-mudo e uma cama antiga. E nada ali era seu, tirando as roupas e alguns outros pertences pessoais, a mobília pertencia toda ao imóvel. Não levaria nada, nem gostaria. Um dia se agarrou ao amor de alguém, quando esse alguém já não tinha nada a oferecer e, agora, “nada” foi tudo que lhe restou. Mas Deus era muito bom, misericordioso, então lhe deu um lindo presente: a pequena criaturinha que estava no jardim de infância àquela hora da manhã. Seria o último dia dela na escola de educação infantil. Assim que terminasse de organizar as roupas e o restante das coisas passaria na escola para conversar com a professora a diretora sobre a saída de Alice.
Sempre que ligava para seus pais e para seus irmãos, mentia, dizia que estava tudo bem, não os queria preocupar.
Júlia acabou de colocar as poucas roupas nas malas e levantou, com as duas mãos na cintura. Foi até o espelho impregnado da porta do guarda-roupa e parou diante dele. Ficou a olhar seu próprio reflexo. Sequer se reconhecia. Estava uns 2 ou 3 quilos mais magra do que os seus costumeiros 63 kg. Tinha bastante olheiras, isso era muito visível através da pele branca de seu rosto, cuja única cor que destoava era cor dos seus lábios meio rosados. Ela esboçou um suspiro que relembrava o de um velho animal cansado já no fim da jornada de sua vida. Mas ao contrário do animal, ela não desistira.
— Mas quem disse que a vida é justa, Júlia? Ninguém te falou isso. — Dizia a si mesma ainda parada diante do espelho. — E não adianta sair por aí se lamentando para as pessoas. No fundo, ninguém se importa com as suas dores ou com os seus problemas. A vida, definitivamente, não é para os fracos. Você só precisa dizer, quando perguntarem: eu estou bem e sorria. Ainda que no fundo você esteja só os cacos. É, não me restou nada a não ser seguir em frente. Continuarei, como sempre foi. — Virou as costas para o espelho. Com as duas mãos na cintura observava as malas prontas. Algumas sobre o chão, outras sobre a cama. Nem eram tantas, apenas cinco malas medianas que facilmente caberiam em seu carro.
Agora somente buscaria Alice na escola e faria os últimos ajustes antes de partir.
“É só mais um ano, Júlia. Só mais um ano.”
Mentalizava para si mesma, numa tentativa de acalmar seu coração desassossegado.
***
— Será que você também fazia isso com a sua ex-esposa? Transava com ela à noite toda e depois saia da cama pela manhã sem sequer dar uma única palavra? — Bárbara perguntou encarando a bela Duquesa pelas costas, enquanto esta, nua, já se vestia com pressa para deixar o quarto do apartamento da mulher com quem tinha passado à noite. Observava a figura alta, vestida com aqueles ternos pretos que a deixavam com um ar bastante formal, elegante e infinitamente sedutor. Os cabelos negros pouco abaixo dos ombros se harmonizavam com a cor dos olhos, mas destoava da pele clara e dos lábios vermelhos. A Duquesa sempre fora uma mulher de beleza aterradora, mas de caráter bastante duvidoso também.
Bárbara torceu o nariz. Era também uma atraente mulher, na casa de seus 41 anos. Ruiva, olhos castanhos e um rosto de beleza incomum. Era uma parlamentar que, nos últimos anos, passava informações das estratégias políticas feitas por Gustav de Lutero e seu pai, Gonçalo de Lutero, primo terceiro da falecida Ana de Lutero.
— Prefiro que não fale sobre meu passado com a minha ex-esposa. — A voz baixa e meio rouca não escondia o tom e irritação.
— Ex? — Bárbara deu um sorriso indignado e saltou da cama. Nua, foi em busca do roupão azul que estava pendurado num cabide preto do seu quarto. — Em tese ela ainda é sua esposa, uma vez que ainda estão casadas.
— Apenas formalmente e você sabe disso.
— Então por que você não me assume? Faz mais de um ano que estamos saindo e você vem, trans* comigo, me usa e vai embora.
— Eu nunca disse que queria um compromisso, Bárbara. — Falou, séria, enquanto acabava de se vestir e já se preparava para ir embora.
— No fundo, você ainda ama sua esposa.
— Ex-esposa e basta, não quero mais falar sobre isso.
— Bom, Duquesa, seu brinquedo aqui não vai mais aceitar suas migalhas de sex*, não sou mulher apenas para isso. Quero muito mais, quero ser amada, formar uma família, ser feliz, não ser sua amante.
Amerah acabou de colocar as roupas e foi até a amante. Tomou-lhe as mãos e as beijou delicadamente.
— Você é quem sabe, meu amor, se me chuta da sua vida ou se me deixa ficar. Às vezes, ter migalhas é melhor que não ter nada. — Piscou um olho, pegou a bolsa e começou a caminhar para a porta.
— Você é uma canalha, Amerah!
— Uma canalha que você adora ter sobre sua cama, te dando prazer e te fazendo goz*r inúmeras vezes.
— E você acha que sex* é tudo na vida? O que é o sex* sem o amor? Senão uma erótica promiscuidade. — Verbalizou indignada com a indiferença e a frieza de Amerah.
— Somos apenas amigas e fazemos um bom sex* juntas, mas é só isso, por favor, não dê seus piti. Nunca te prometi nada.
Bárbara baixou a cabeça, magoada.
— E nada é tudo que tenho. Todos sabiam o quanto você amava Júlia Salazar. Ela pode até ter uma aparência frágil, meiga, doce, mas ela sabia direitinho como te domar. Porque ao contrário dos outros, Júlia sempre te enfrentou, nunca te temeu, igual a todos que conheço e que te rodeiam, você, com essa pose de poderosa, arrogante e imponente, nunca causou temor à sua ex-esposa.
Ignorando totalmente a ruiva, a Duquesa saiu deixando a outra plantada e sozinha naquele quarto solitário.
Brava, Amerah entrou em seu carro. Bateu a porta com toda força. Por que todos aqueles idiotas ainda insistam em tocar no nome daquela mulher? Pensou e passou uma das mãos pelos cabelos, completamente incomodada. Sempre ficava assim toda vez que ouvia alguém tocar no nome dela. Parecia até um karma, quem sabe uma maldição.
— Droga! — Bateu a mão com força sobre o volante.
Depois de passar algum tempo dentro do carro, decidiu dar partida e seguir para a empresa, tomaria um banho lá mesmo e se vestiria para as reuniões, mas antes precisava falar Ângelo, um dos seguranças responsáveis por levar Aurora até o palacete em Sevilha.
***
De malas prontas, Júlia abraçou Henry, que fora ajudá-la a colocar as malas dentro do carro. O homem a olhava com certo pesar, como se carregasse sobre os próprios ombros a culpa de não poder fazer muito mais pela grande amiga. Sabia os perrengues por que Júlia tinha passado nos últimos anos, retaliações para todos os lados, mas seu avô sempre lhe dizia “o mundo é comandado por aqueles que têm o poder” e agora depois de adulto percebia que seu experiente avô materno nunca mentiu, apesar da caducidade que adveio com os anos.
Portas fechadas, chaves entregues às mãos do amigo, Júlia o abraçou forte.
— Obrigada, Henry, não sei o que seria da minha vida sem a tua valiosa ajuda.
— Oh, amiga, gostaria de poder fazer mais por você.
— Você já fez o que pôde e eu só tenho mesmo a te agradecer.
— De coração, espero que dê tudo certo na sua vida, nessa nova jornada, só mais um ano e você estará livre das represálias deste país.
Júlia baixou a cabeça e deu um longo suspiro.
— É...só mais um ano, Henry.
— Se cuida, Ju, em breve vou te visitar. Qualquer coisa me liga. Estarei aqui para o que precisar. Você sem dúvidas é a maior jornalista que eu já conheci na minha vida.
— E você está no caminho certo.
— Aprendi muito com você, minha mestra, minha professora, mulher sábia, guerreira e inteligente.
— Guerreira já não sei se sou, mas preciso continuar lutando, se não por mim, pela minha filha.
— Tudo passa, amiga. Até os dias ruins. Nossos dias de cão também chegam ao fim.
Os dois riram, se abraçaram mais uma vez e Júlia entrou no carro, enquanto partia para Sevilha, sob os olhos chorosos do amigo.
***
Aurora ainda choramingava ao pés do pai.
— Eu não acredito que o senhor vai deixar a minha irmã fazer isso comigo papai, não acredito! Não acredito!
Literalmente a adolescente gritava revoltada.
— Aurora, minha filha...
Arthur tentava em vão acalmar a garota.
— O senhor também me odeia, não é, papai? Me culpa também pela morte da minha mãe! Posso ser jovem, mas não sou idiota não. Tudo bem — puxou bem o ar dos pulmões — eu vou para aquele inferno! Mas digo que vocês nunca mais vão me ver, entendeu, papai?
Arthur sentiu a consciência pesar, e não, ele não culpava sua menina por nada do que aconteceu a sua querida Ana.
— Aurora, minha filha...
— Não quero saber do senhor nunca mais! — A adolescente correu para fora do escritório do pai e bateu a porta com força. — Vamos, Maria. Aqui já não é um bom lugar para mim. — Abraçou a empregada e saiu da propriedade.
***
— Deseja falar comigo, Duquesa?
Perguntou Ângelo, ao entrar no escritório da mulher e a observar sentada de maneira majestosa sobre sua cadeira executiva. Sentia-se tão desconfortável e relutante quanto qualquer outra pessoa que se via na presença imponente daquela mulher. O rosto inflexível, o olhar severo parecia penetrar até os confins das almas das pessoas.
Ela mirou o homem de quarenta e tantos anos, que trabalhava há mais de dez anos para os Valloni. Era um dos homens mais corretos e probos que conhecia, por isso não confiaria aquela adolescente inconsequente e que tinha vento na cabeça ao invés de juízo, a outra pessoa. Respirou fundo, tentando controlar a raiva que sentia ao imaginar a irmã rebelde cometendo asneiras com outros pirralhos mimados da laia dela.
— Chamei porque você já sabe bem o que precisa fazer. Mantenha aquela pirralha inconsequente distante desta cidade até que ela complete 18 anos. Não podemos deixar que outro escândalo acometa a nossa família, já basta o de seis anos atrás.
— Como a senhora quiser, Duquesa. Farei o possível para manter sua irmã distante.
— Pelo bem do país, é melhor que ela fique fora para ver se aprende a ser gente. Não tolero adolescentes e suas birras sem sentido. — Falou mirando os olhos vidrados do homem em sua direção. — Por que me olha dessa forma, Ângelo, até parece que está vendo o diabo.
Meio atordoado com o questionamento da mulher, Ângelo se mexeu desconfortável, sacudindo a cabeça de maneira rápida.
— Não, estava apenas observando o quanto você se parece com a sua mãe.
— Minha mãe faleceu há muito anos. — A irritação na voz era perceptível. — Não sei por que este assunto agora. Deixa-a descansar em paz, ao menos a memória dela merece isso.
— É claro, Duquesa.
— Todos sempre vêm a mim e dizem que pareço com minha mãe, mas minha mãe era uma mulher gentil, doce, não uma selvagem feito eu. Por acaso é assim que também pensa, Ângelo? — Inquiriu franzindo o cenho de maneira sádica.
Ângelo mirou a bela morena. Sim, a Duquesa parecia uma deusa, linda, atraente, sedutora, mas de modos um tanto quanto selvagens. Não entendia por que alguém como ela poderia ter um coração tão perverso. Mas pensando bem, havia um motivo: o coração partido pela mulher que um dia amou cegamente. Um amor que a destruiu.
— Não, é claro que não penso assim, Duquesa Amerah. A senhora é apenas uma mulher que carrega muitas responsabilidades sobre os ombros justamente com o seu primo Felipe VII, futuro rei deste pais. Como um homem que já trabalha para sua família há muitos anos e que sempre viveu permeando as relações entre a monarquia e o parlamento, sei bem por que a senhora faz o que faz. E não se preocupe, garanto que sua irmã não vai causar nenhum tipo de escândalo aos Valloni de Lutero.
— Foi por isso que escolhi a você. Procure uma professora para que dê aulas particulares a ela. Em alguns meses já fará 16 anos, não pode ficar sem estudar este último ano.
— Farei isso, senhora.
— Então pode ir, aguardo notícias suas.
Ângelo assentiu e se retirou do ambiente, deixando a mulher sozinha, perdida em seus pensamentos.
Amerah tentou se concentrar no trabalho, mas volta e meia seus pensamentos eram atormentados por mil demônios. Sentada sobre a cadeira executiva, inclinou-se um pouco para o lado esquerdo e colocou uma senha de letras e dígitos numa parta da gaveta da escrivaninha marrom, que um dia pertenceu ao seu pai. Ali dentro havia um segredo inconfessável, algo que não podia revelar a ninguém. Puxou a pesada gaveta trabalhada em madeira antiga e no fundo surgiu um porta retrato com a foto de uma mulher num campo de girassóis, ela usava um vestido branco com algumas flores amarelas, como girassóis, um mocassim branco pouco se destacava na pele branca e macia dela. Um chapéu de palha escondia os fios loiros e brilhantes de seus cabelos. O sorriso era radiante. Ainda se lembrava do quanto ela amava girassóis e era fascinada porque os girassóis estavam sempre de frente para a luz.
“Ao contrário de mim que estou sempre de costas e na escuridão.”
Pensou e sacudiu a cabeça com toda força. Fechou a gaveta num baque fofo. Impaciente, levantou e foi até um outro móvel. Encheu uma taça com uísque e bebeu um longo gole, desejava dispersar aqueles pensamentos intrusivos. Não podia acreditar que mesmo depois de tanto tempo ainda pensava naquela infeliz.
— Maldita mulher. Maldita seja Júlia Salazar! — Falou de olhos semicerrados, bateu o copo seco sobre o móvel e caminhou devagar até a grande parede de vidro, de onde podia ver com clareza toda a beleza medieval de Madrid.
***
Apesar dos pesares, Júlia não se deixava abater por nada que insistisse em a deixar triste ou para baixo. Seguia levando a vida com otimismo, apesar de estar sempre com o coração na mão, em estado de alerta para enfrentar qualquer adversidade que viesse a surgir em seu caminho. Sua pena estava chegando ao fim. Os dias de aperreio também chegaram. Regressaria ao Brasil e tentaria refazer sua vida. Sabia que o jornalismo tinha acabado para ela, ou melhor, toda a carreira que passou anos para construir, mergulhou numa fatídica derrocada, mas no seu país poderia tentar voltar a fazer matérias, quem sabe teria uma nova chance de se reerguer, já que ali na Espanha isso seria impossível de acontecer. Isso a fez lembrar que a ex-esposa se tornara a presidente da empresa de radiofusão mais renomada daquele país. Era ali que trabalhava antigamente, tinha seu próprio programa, mas após tudo acontecer o programa foi tirado do ar e Romani demitido expulso como um vira-lata pela dona da empresa. Romani sempre estivera junto com Gustav de Lutero e a ganância acabou o corrompendo. Hoje em dia ele era CEO de uma outra grande emissora rival declarada da empresa de Amerah. Tudo foi muito bem arquitetado, o plano sujo de Romani junto com Gustav. E ele acabaram por conseguir o que queriam. Só uma coisa Gustav jamais conseguiria: Amerah.
Enquanto almoçava em um restaurante discreto, já nos limites de Madrid, Júlia observava Alice e o quanto aquela pequena criaturinha crescia lindamente a cada dia.
Alice era o amor da sua vida.
A herança que uma grande amiga deixou.
Uma filha.
Sua luz no fim do túnel.
Amava aquela menina mais do que a si mesma.
Como se ela tivesse saído de seu próprio ventre.
Júlia ainda passou algum tempo no restaurante, antes de pagar a conta e seguir seu caminho para o palacete em que um dia também foi seu lar.
O campo de girassóis...o veria novamente.
Pensar nisso fez o coração dela se encher de felicidade.
Então sorriu e seguiu seu novo caminho.
Fim do capítulo
Oi, minhas queridas, :).
Demorou um pouco, mas saiu.
Bjsss, e até o próximo.
Thaa
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