Cumplicidade
Julia estava quase que literalmente nas nuvens, ela não se lembrava qual tinha sido a última vez que tinha ficado naquele estado de graça. Tudo parecia mais lindo, o mundo parecia estar finalmente caminhando do jeito que deveria. A arquiteta chegou no escritório aquela manhã emanando felicidade por onde passava. Manuela ainda não havia dito com todas as letras que a perdoava, muito menos tinha dito que amava Julia, mas a ruiva tinha sentido na pele que o amor ainda estava lá. Machucado, arredio, mas ainda estava lá. Julia estava tão feliz que nem mesmo o fato da mãe ter ligado para ela no primeiro horário da manhã foi capaz de abalar a sua alegria.
— Oi, mãe. — ela disse depois que a secretaria passou a ligação.
— Por que você não atendeu o seu celular? — Helena questionou.
— Ele ainda está na bolsa. Eu acabei de chegar no escritório, não deu tempo nem de ligar o computador ainda. — Julia explicou pacientemente.
— Percebo. — Helena disse no tom de voz impassível de sempre — Eu liguei ontem à noite também, o seu celular também estava na bolsa?
Julia fechou os olhos e se lembrou do beijo de despedida de Manuela. O sorriso que surgiu nos lábios da ruiva foi incontrolável.
— Na verdade o meu celular está na bolsa desde ontem à noite, mãe. Me desculpe por não ter te atendido. — ela falou com tranquilidade. Não era nenhuma mentira, desde o momento em que havia saído do escritório na tarde anterior que Julia mal se lembrava qual era seu nome, tudo era sobre Manuela.
— Você deveria ser mais cuidadosa, Julia. Poderia ser algo urgente e eu não saberia como lhe encontrar, já que você também não estava atendendo o telefone de casa. — Helena disse ríspida.
— Isso não vai se repetir, mãe. — Julia respondeu pensando que a vantagem de não morar no Rio era justamente poder se esconder da mãe de vez em quando — Qual era o assunto urgente que você queria conversar?
— Eu conversei com o meu genro ontem pela manhã. Eu acho que já está mais do que na hora de nós duas termos uma conversa séria sobre o seu casamento. — Helena usou o mesmo tom autoritário que Julia conhecia desde a infância.
— Eu já perdi as contas de quantas vezes eu repeti a mesma coisa pra você. Eu não tenho mais um casamento, consequentemente você não tem mais um genro. Se a senhora pretende manter qualquer tipo de relação com o Mateus, não é problema meu, mas sobre o meu casamento ficou tudo muito bem resolvido no dia em que nós assinamos o divórcio. — Julia falou perdendo a paciência diante da impertinência da mãe sobre aquele assunto.
— Você sabe muito bem que eu e o seu pai não concordamos com essa sua ideia maluca de se separar do Mateus. Muito menos com essa insanidade de voltar a morar em São Paulo. — Helena disse com frieza.
— Sorte a minha que você e o meu pai não mandam mais em mim. Eu não quero e não vou ter essa mesma discussão com você, muito menos pelo telefone. — Julia foi seca.
— Não pense você que eu vou aceitar o seu mesmo comportamento do passado, Julia. Naquela época eu resolvi a questão, dessa vez não será diferente.
— Naquela época eu não era metade da mulher que eu sou hoje. Eu não te devo nenhum tipo de satisfação sobre as minhas escolhas, mãe. E eu não tenho a mínima intenção de aceitar que você se meta na minha vida novamente. Eu tenho que trabalhar, a gente conversa uma outra hora. — Julia foi direta e desligou o telefone antes que a mãe pudesse responder.
Julia colocou o telefone no gancho e respirou fundo para acalmar o seu estado de nervos. Era incrível a capacidade que a mãe da ruiva tinha de tirar ela do sério. Não era possível que depois de tudo que tinha acontecido com ela durante o casamento, depois de toda aquela montanha russa de sentimentos dos últimos meses em que esteve com Mateus, os pais ainda achassem que Julia tinha obrigação de ficar casada. A arquiteta se recusava a estragar aquela manhã maravilhosa com aquele tipo de lembrança. Focando nas últimas horas que havia passado ao lado de Manu, Julia decidiu esquecer o telefonema da mãe e ir trabalhar.
**
Pedro estava lendo alguns documentos no escritório quando ouviu leves batidas na porta e autorizou que a pessoa entrasse. O rapaz levantou a cabeça e viu a mãe surgir pela porta. Os dois sorriram e Pedro se levantou para receber a mãe com um abraço.
— Que surpresa é essa? — Pedro falou enquanto contornava a mesa para abraçar a mãe.
— Eu estava por aqui, resolvi dar uma passadinha. — Silvia respondeu com um sorriso.
— Vem, vamos sentar. — Pedro falou depois que os dois se abraçaram — A senhora tem que dar essa passadinha mais vezes. Tem vezes que a gente fica a semana toda se falando só pelo telefone.
— Pois é, muito trabalho. Muita coisa do casamento para resolver. Acaba que a gente se fala demais e se vê de menos. — Silvia falou com um sorriso, se sentando na cadeira de frente para a mesa do filho.
— Verdade. Eu não tô vendo nem o meu futuro esposo direito. Se eu tivesse a mais remota ideia de como ia dar trabalho, eu não tinha inventado essa história de casamento. — Pedro falou se acomodando na cadeira.
— Tudo vai valer a pena quando vocês dois estiverem naquele altar. — Silvia falou com tranquilidade.
— É o que eu espero. Mas, pelo visto, não foi pra falar sobre isso que você veio até aqui. — Pedro disse encarando o rosto da mãe.
Silvia sorriu para o filho. Aquela não era mesmo uma visita de cortesia.
— Você sabe o quanto eu andei preocupada com a sua prima quando ela chegou da Europa, certo!? — Pedro concordou e Silvia seguiu falando — Depois que vocês dois se acertaram eu fiquei mais tranquila e agora com essa aproximação que você comentou entre ela e a Manu, eu fico ainda mais propensa a acreditar que vai dar tudo certo.
— Mas? — Pedro falou curioso.
— Ontem eu recebi um telefonema que me deixou em um nível de alerta que eu ainda nem sei explicar. — Silvia falou com seriedade.
— Quem te ligou? — Pedro perguntou preocupado.
— Helena Medeiros Campana. — Silvia falou com rigidez.
Pedro abriu a boca, mas não soube como responder. Nada de bom poderia vir de um telefonema daquela mulher. O rapaz havia decidido, há muito tempo atrás, ignorar a existência da parte da família que carregava o sobrenome Campana. Isso significava que Pedro não estava interessado em guardar as dores do passado, na realidade sua vida estava bem melhor depois que ele havia se afastado de todas aquelas pessoas. Fazer parte de uma família como a do pai de Pedro era um exercício diário de resistência, coisa para a qual ele não pretendia voltar nunca mais.
— Como assim? Ela te ligou em casa? — ele falou depois de um tempo.
— Não, ligou no escritório. Como ninguém da família do seu pai costuma me ligar, eu atendi achando que poderia ser alguma coisa importante ou pelo menos que justificasse o telefonema. Enfim, era a Helena querendo falar sobre a Julia. — Silvia explicou.
— Falar o quê sobre a Julia?
— Ela queria saber como a Julia estava, se vocês dois tinham voltado a se falar, se ela nos visita com frequência e o que ela anda fazendo por aqui.
— E você? — Pedro questionou.
— Disse pra ela ligar pra filha dela e perguntar. O que mais eu poderia dizer?
— É, mas a questão é: por que ela ia te ligar assim do nada, pra perguntar sobre a Julia? — Pedro falou pensativo.
— Meu chute é que ela está desconfiada. — Silvia falou.
— Desconfiada com o quê?
— A Julia não me deu todos os detalhes, você deve saber muito melhor que eu porque ela foi embora e as coisas que aconteceram enquanto ela esteve fora do país. O ponto é que nós dois sabemos que a Helena teve um papel importante na separação da Ju e da Manu. Não seria nenhuma surpresa que ela não aprovasse um reencontro das duas agora. — Silvia falou com preocupação.
— Mas como é que ela ia saber que as duas estão se reaproximando? — Pedro perguntou.
— Ela pode não ser o melhor exemplo de mãe, mas mesmo assim ela ainda é mãe da Julia. E toda mãe tem suas intuições. Além do mais, não é como se a Manuela tivesse sumido do mapa, com o sucesso que ela e Willian fazem com aquele escritório seria mais que compreensível que a Helena soubesse por onde ela tem andado.
— Logo ela saberia que a Manu ainda mora em São Paulo. — Pedro concluiu — E ligaria os pontos. Visto que a Julia não está realmente tentando esconder o empenho em ter a Manu de volta.
— A pergunta agora é se a Julia vai agir como há seis anos atrás ou se ela vai ficar e comprar essa briga com a família Campana. De uma forma ou de outra, a gente precisa contar pra ela que a Helena me ligou e você pode se preparar porque alguma coisa me diz que muito em breve a família do seu pai vai estar batendo na nossa porta. — Silvia conclui como se desse um aviso de que os problemas estavam a caminho.
Pedro sabia que a mãe estava certa. Desde a ida de Julia para fora do país, aquela era a primeira vez que alguém da família do pai entrava em contato com eles, pelo menos que ele soubesse, e o rapaz sabia que eles nunca agiam sozinhos. Se Helena tinha ligado era porque o marido sabia e se o tio do rapaz estava ciente daquele telefonema, o pai de Pedro, com quem ele não conversava desde o dia em que saiu de casa, também devia saber.
**
Manuela não estava muito interessada em racionalizar os últimos acontecimentos. Ela não podia dizer que tinha tomado uma decisão, mas resolveu deixar as coisas acontecerem. Ela ainda não tinha superado todas as coisas do passado, mas estava disposta a não se privar dos desejos e vontades que envolviam Julia. Os sentimentos ainda eram confusos, mas a publicitária tinha sido sincera na noite passada e isso era o melhor que ela podia oferecer no momento. Até trabalhar tinha ficado mais fácil naquela terça-feira, tanto que Manu nem percebeu a manhã passar. Ela só notou que já estava na hora do almoço quando Pedro projetou a cabeça para dentro do seu escritório pela porta.
— Vamos almoçar? — o rapaz falou com um sorriso.
— Pedro! Entra. — Manu falou retribuindo o sorriso do amigo.
— Não, você é que sai. Eu e o Will vamos almoçar com as meninas, pra atualizar todo mundo sobre o casamento. Vem com a gente? — ele convidou.
— Vou! — Manu falou já se levantando e pegando a bolsa.
Os dois encontraram Willian já esperando pelo elevador. Eles tinham combinado com as meninas de almoçar em um restaurante perto da iDraw e Manu achou muito providencial aquele almoço surpresa. Os três foram no carro de Pedro e encontraram Amanda e Isabela esperando por eles no restaurante.
— Olá. — Manu falou se aproximando da mesa, depois de cumprimentar as duas amigas a publicitária ocupou a cadeira que ficava ao lado de Amanda.
Os cinco se acomodaram e passaram algum tempo decidindo o que iriam comer.
— E então, já está tudo resolvido sobre a cerimônia? — Amanda perguntou olhando de Willian para Pedro.
— A maior parte, só faltam alguns detalhes. — Pedro respondeu.
— Razão pela qual as senhoritas estão aqui. — Willian completou.
— E seria...? — Isa perguntou.
— Nós vamos ter quatro madrinhas e vocês três estão incluídas nesse pacote. — Willian disse animado.
— Bom, é isso. — Pedro falou com um pouco menos de entusiasmo encarando o namorado.
— Quem é a outra? — Manuela perguntou rindo da cara de Pedro.
— Que outra? — Will falou.
— Outra madrinha, ora. — Amanda falou.
— A é… a outra. — Willian disse e olhou para Pedro.
— Cadê a sua animação agora? — Pedro falou.
Willian deu um sorriso amarelo antes de voltar a falar.
— Melhor ela saber por você, já que a ideia foi sua.
— Mas você aceitou. — Pedro disse.
— Qual o problema? — Isa falou.
— Não é com você, nem com a Mandys. — Pedro começou.
— Então é comigo? — Manu falou, imaginando muito bem o que viria a seguir.
— Eu não tenho certeza se ainda é um problema. — Pedro disse olhando nos olhos da amiga.
— Você convidou a Julia. — Manu concluiu.
— Ainda não, mas irei.
— Muito bem, não é um problema. É o seu casamento, você deve convidar quem quiser para ser sua madrinha. — Manuela disse com simplicidade.
Willian e Isabela ficaram encarando Manu, esperando que ela falasse mais alguma coisa. Amanda e Pedro, por outro lado, já imaginavam o que teria acontecido.
— Era só isso? — Manu falou depois de perceber que ninguém falaria nada.
— Era. Quer dizer, não. Tem os detalhes de como vai ser a cerimônia também, mas a gente achou que você fosse querer conversar sobre o fato da Julia ficar ao seu lado no altar, antes de saber o resto. — Willian disse.
— Como eu falei, é o casamento de vocês, não o meu. Vocês tomam as decisões e eu simplesmente estarei lá. — Manuela disse.
— Só isso? — Isa falou incrédula.
Manuela encarou o rosto da amiga por um tempo e antes de voltar a falar olhou para os outros também. Eles eram bons amigos, sempre tinham sido e por isso ela sabia que eles mereciam ao menos ficar sabendo das coisas. Embora Manuela não estivesse disposta a discutir suas decisões, ela sabia que precisava ao menos contar o que havia acontecido.
— Eu não quero que vocês façam disso um acontecimento, mas eu e a Julia resolvemos alguns detalhes, por assim dizer. Nós não oficialmente superamos todas as coisas, como vocês bem sabem é muito pra superar tão rapidamente. O fato é que nós duas estamos bem e mesmo que não estivéssemos, eu jamais iria causar qualquer mal estar no dia da cerimônia da união de vocês dois. — Manuela falou como se dissesse alguma coisa banal.
— Okay, mas isso significa o quê, exatamente? Vocês estarem bem? — Willian perguntou.
— Significa que elas estão dormindo juntas, mas ainda não assumiram nenhum compromisso oficial. — Amanda falou encarando o rosto da amiga com uma das sobrancelhas arqueadas em sinal de desafio.
Manuela apenas encarou a amiga de volta, mas não deu nenhum sinal de se aquilo era verdade ou não, ela sabia que Amanda estava curiosa sobre o que tinha acontecido desde a última conversa das duas. Pedro foi quem pareceu não gostar nenhum pouco da definição dada por Amanda.
— E você acha que essa é uma boa ideia? — Pedro perguntou com seriedade.
Manuela avaliou o tom de Pedro, antes de responder.
— Como assim? — Manu falou.
— Você sabe que eu não gosto de me meter nas suas decisões e eu sei muito bem que a Julia não é nenhuma menina indefesa, muito pelo contrário. Mas vocês duas não estão brincando com os sentimentos uma da outra? — ele perguntou em um tom sério que fez o clima do almoço, até então tranquilo, ficar um pouco tenso.
— Eu posso te garantir que não é esse o caso. E embora eu tenha voluntariado a informação de que eu e a sua prima estamos bem em alguma medida, eu estou abrindo esse assunto para debate tanto quanto eu me dispus a falar sobre ele durante todo o tempo que ela esteve fora e vocês todos devem se lembrar o tanto que isso significa. — ela disse olhando dentro dos olhos do rapaz.
Pedro encarou a amiga e teve que aceitar que era de se esperar que aquela fosse ser a postura dela com tudo aquilo. O rapaz confiava plenamente em Manuela e também respeitava totalmente a privacidade da amiga, por isso resolveu que deixaria aqueles questionamentos para a outra parte envolvida naquela confusão.
— Sendo assim, voltemos ao casamento. — Pedro sentenciou.
Manuela ficou grata pela mudança de assunto. Ela já tinha contado tudo que achava necessário os amigos saberem, o resto dizia respeito apenas a ela e Julia. Manu nunca tinha sido de contar todos os detalhes da sua vida, com isso os amigos já estavam acostumados, a exceção era Amanda. A médica acabava sempre sabendo mais e também podendo se meter muito mais, mas a relação das duas era muito mais antiga do que qualquer outra amizade na vida uma da outra. Por isso, era quase natural que elas compartilhassem todos os seus segredos. O restante do almoço correu sem maiores surpresas. Na saída do restaurante Manuela e Amanda combinaram de se falarem depois e o grupo se separou. Pedro levou o namorado e Manu para iDraw, enquanto Isa e Amanda foram juntas para outros compromissos.
**
Julia passou praticamente o dia todo atolada no trabalho. Na parte da tarde, depois de apresentar um projeto para uma cliente, ela finalmente conseguiu algum tempo para ligar para Manuela.
— Oi. — Manu atendeu depois de algum tempo.
— Oi. — Julia falou com um sorriso inevitável — Tudo bem?
—Tudo e você? — Manu falou educadamente.
— Estou tendo um dia cheio, mas estou bem.
— Muito trabalho? — Manu perguntou com curiosidade, agora que as duas estavam conseguindo conversar com mais tranquilidade, a publicitária tinha percebido que estava realmente curiosa sobre a vida da ruiva depois da sua volta para o Brasil.
— Bastante, e você? Conseguiu chegar a tempo hoje de manhã? — Julia perguntou.
— Consegui. Minha manhã foi bem cheia, mas eu tive tempo de almoçar com o seu primo. — Manu comentou.
— É mesmo? E como ele está?
— Preocupado com a nossa atual situação.
— Hummm… eu vou conversar com ele. Vou tranquilizá-lo sobre o assunto. — Julia falou.
— Essa é uma ótima ideia, eu gosto muito do Pedro e sei que ele se preocupa com nós duas. Eu não quero que ele ache ou tenha qualquer impressão errada sobre tudo o que está acontecendo. — Manu explicou.
— Eu também não quero, eu vou ligar pra ele e marcar de conversar, pode ficar despreocupada. — Julia falou com carinho.
— Eu fico feliz em saber. — Manu concluiu.
— Mudando um pouco o tema da conversa. Eu vejo você hoje? — Julia falou com uma certa ansiedade na voz.
Manuela sorriu da insegurança da ruiva.
— Se você quiser, você já sabe o meu endereço.
— Isso é um convite? — Julia falou mais tranquila.
— Só se a resposta for sim. — Manuela definiu a questão.
O telefonema serviu para Julia ter certeza que não estava sonhando. A noite passada realmente tinha acontecido e Manuela realmente estava dando para as duas uma chance de tentar chegar a algum lugar com aquilo que elas ainda sentiam. Quando a noite começava a cair, Julia resolveu que era hora de ir embora do escritório. A arquiteta resolveu passar em casa antes de ir para o apartamento de Manuela. Julia não sabia como as coisas aconteceriam, mas aparentemente o clima de cumplicidade e intimidade que estava se restabelecendo entre elas trataria de colocar tudo no lugar.
**
Julia chegou ao prédio em que Manuela morava por volta das oito da noite. A ruiva entrou na portaria e foi reconhecida pelo porteiro, com quem ela havia ficado de papo aquela manhã enquanto esperava o táxi. Ju conversou rapidamente com o senhor e avisou que ia visitar a casa de Manuela, para surpresa da arquiteta ele não pegou o interfone para ligar para o apartamento, simplesmente se despediu dela desejando que ela tivesse uma boa noite. Julia acabou gostando da ideia de chegar sem ser anunciada, certamente isso pegaria Manu de surpresa.
Manuela tinha acabado de entrar na cozinha quando a campainha tocou. Ela estava lendo alguns documentos da iDraw que tinha levado para casa para estudar e decidiu que iria comer alguma coisa, mas pelo visto os planos teriam que esperar. Ela não tinha a mínima ideia de quem poderia estar ali, a única pessoa que ela estava esperando era Julia, mas a ruiva precisava ser anunciada pelo porteiro antes de subir. Qual não foi a sua surpresa quando abriu a porta e deu de cara com Julia escorada no batente. Ela sorriu imediatamente, mas Julia parecia estática. Não que a ruiva tivesse consciência disso, era que ser recebida por Manuela vestindo uma saia longa preta, uma blusa branca que deixava parte da barriga da morena de fora, o cabelo preso naquele coque mal feito e óculos de grau era uma visão desconcertante.
— Você vai ficar parada aí do lado de fora me olhando com essa cara a noite toda? — Manu perguntou segurando a porta aberta, depois de um tempo em que Julia não falava nada.
— Não. — Julia falou se adiantando até a morena e a segurando pela cintura — Só olhando não. — ela concluiu antes de começar um beijo longo e intenso que fez Manu literalmente perder o ar.
As duas separam as bocas depois de algum tempo e sorriram.
— Oi. — Julia falou olhando nos olhos castanhos mais lindos que existiam.
— Oi. — Manu falou devolvendo o olhar e se perdendo no verde dos olhos da ruiva.
— Você sempre recebe as suas visitas assim? — Julia provocou.
— Só as que subornam o meu porteiro pra subirem sem serem anunciadas. — Manu devolveu a provocação finalmente puxando Julia para dentro do apartamento e fechando a porta. Elas passaram direto pela sala e foram para a cozinha — Eu estava indo arrumar alguma coisa para comer. Você tá com fome? — ela perguntou.
— Não muita. — Julia disse se sentando em uma das cadeiras e olhando Manu abrir a geladeira — E pra sua informação eu não subornei ninguém, eu apenas cativei. — ela finalizou.
— Sei. — Manu falou pegando algumas coisas da geladeira para preparar um lanche — Quer dizer então que você anda por aí jogando charme pra conseguir o que quer? — foi a vez da morena provocar.
Julia gargalhou antes de responder.
— Só quando eu tenho certeza que vai funcionar. — a ruiva concluiu.
— Muito esperta você. Se eu tivesse esse olhão verde aí, também ia me aproveitar. — Manu falou divertida.
— Como se você precisasse. — Julia falou se levantando e se aproximando de Manu do outro lado da mesa — Linda do jeito que você é, nem jogar charme você precisa, basta você querer e é seu. — ela falou puxando a morena pela cintura mais uma vez.
Manuela passou os braços ao redor do pescoço de Julia e tomou a iniciativa do beijo. Era sempre como se elas fossem levadas para outra dimensão. O encaixe dos lábios, a sintonia das línguas, a compatibilidade dos corpos que se buscavam. As duas perdiam a noção do tempo e do espaço.
— Se você continuar me beijando assim eu não vou poder me responsabilizar pelos meus atos. — Manu falou depois que o beijo terminou, ainda de olhos fechados.
— A culpa não é minha. — Julia falou com um sorriso — É que toda vez que a gente fica perto é impossível me controlar. — ela conclui dando leves beijos no rosto da morena.
— Você vai deixar eu comer alguma coisa ou vai continuar tentando me seduzir? — Manu brincou.
— Melhor você comer, você vai precisar de bastante energia quando eu realmente estiver tentando te seduzir. — Julia falou com um sorriso sacana, voltando para o outro lado da mesa e Manuela simplesmente sorriu.
As duas ficaram conversando amenidades enquanto Manu terminava de comer um sanduíche, que Julia acabou comendo metade, e arrumava a cozinha. Julia voltou a falar sobre o almoço da publicitária com Pedro, a ruiva quis saber em detalhes o que o primo tinha dito para deixar Manu preocupada. A morena tomou cuidado para não contar sobre o convite para ser madrinha do casamento dos amigos, afinal era Pedro quem devia falar sobre aquele assunto com a ruiva.
— Vem, vou te mostrar uma coisa. — Manu falou depois de terminar de arrumar as coisas na cozinha.
Elas saíram da cozinha e voltaram para sala, mas a morena não parou e seguiu para uma porta dupla que ficava do outro lado do cômodo. Julia não tinha conhecido aquela parte do apartamento, mas imaginou que deveria ser um escritório ou algo do gênero. Manuela olhou para Julia e sorriu antes de abrir a porta. Julia ficou encantada. O lugar era lindo, as janelas longas iam do chão até o teto e davam uma visão privilegiada da cidade. O piso era todo de um marrom escuro e as paredes eram brancas, no lado direito tinha um futon virado para as janelas e do lado esquerdo um piano de cauda preto.
— Gostou? — Manu falou parada ao lado de Julia na porta.
— É lindo. Você ainda toca? — Julia falou apontando para o piano.
Antes de responder, Manuela pegou Julia pela mão e levou ela até onde o piano estava. As duas se sentaram lado a lado.
— Eu passei um tempo evitando, mas quando eu comprei esse apartamento a primeira coisa que eu coloquei aqui foi ele. — ela disse passando a mão pelas teclas do piano — Me fazia lembrar de você. — ela concluiu olhando para o rosto da mulher ao seu lado.
Julia acariciou o rosto de Manu e a morena fechou os olhos por uns segundos. Elas sabiam que estavam lembrando da mesma coisa, que estavam revivendo o mesmo momento. O primeiro beijo delas.
— Era difícil? — Julia perguntou com a voz um pouco embargada.
— Ficar aqui? — Manu perguntou carinhosamente.
— Também. — a ruiva falou olhando a mão de Manuela na sua.
— Bom, eu tomei alguns porres naquele futon. — Manu disse com um sorriso — Mas depois de um tempo eu me acostumei e sempre vinha pra cá quando... — Manu parou de falar e baixou a cabeça.
— Quando? — Julia insistiu olhando para o rosto da morena.
— Quando ficava insuportável. — Manuela falou depois de algum tempo.
Julia ficou em silêncio absorvendo aquelas informações. Ela sabia o quanto tinha feito Manuela sofrer, mas ouvir aquilo da boca de Manu, mesmo quando não era em tom acusatório, era horrível.
— Eu também costumava ir sempre para o mesmo lugar quando a saudade de você, de nós, ficava insuportável. — Julia disse depois de um tempo — Na verdade Londres inteira me lembrava de você, a cidade toda é a sua cara.
— Uma amiga costuma me dizer isso, mas eu mesmo não conheço a Inglaterra. — Manu falou pensativa.
— Você nunca foi à Inglaterra? Mas você vivia dizendo que era um dos lugares que você mais queria conhecer quando fosse pra Europa. — Julia falou incrédula.
— Eu fiz algumas viagens internacionais, conheci boa parte da América Latina. Morei em Nova Iorque por uns meses. Fui pra Europa de férias uma vez, mas não passei pela Inglaterra. — Manu explicou.
— Por que não?
— Você estava lá. — Manu disse como se fosse uma coisa óbvia — E mesmo sabendo que Londres é uma cidade grande, eu não quis arriscar de a gente acabar se encontrando.
Julia simplesmente concordou com a cabeça. Se era doloroso ter aquele tipo de conversa, ao menos confirmava que as duas estavam tentando superar tudo aquilo, mesmo que Manuela não estivesse disposta a admitir aquela parte ainda. Além de confirmar a teoria de Julia de que a cumplicidade e a intimidade entre elas seriam fundamentais naquele recomeço.
— Você não vai tocar nada pra mim? — Julia finalmente falou.
Manuela pensou durante alguns segundos, depois tirou os óculos de grau que ela percebeu que ainda estava usando e virou o rosto para o de Julia com um sorriso.
— Ao invés de tocar para você, eu preferia tocar em você. — ela disse no pé do ouvida da ruiva e aquele foi início de mais uma noite de muito amor entre as duas.
O processo de cura de uma ferida tão dolorosa quanto a do relacionamento das duas era difícil de definir. Quanto tempo elas levariam para verdadeiramente superar os traumas do passado não dava para saber, mas o mais importante já estava acontecendo. Elas estavam se permitindo.
Fim do capítulo
Olá! UFA! Demorei hoje, mas cheguei.
Esse capítulo parece ser tãaaaaooooo grande, mas pode ser só porque acontecem várias coisas e várias conversas e várias fofuras para aquelas que estão aí achando que #MAJU tem algum futuro. Pode ser que tenha mesmo, mas eu não sei de nada...
Enfim, amanhã tem mais e eu espero que vocês gostem da leitura de hoje. Beijo pra todas e muito obrigada pelos comentários todos lindos! ♥
Comentar este capítulo:
Marta Andrade dos Santos
Em: 12/07/2024
Elas estão se ajeitando devagarinho, devagar.
A secretária de Lúcifer vulgo Helena aparecer pra melar a relação das duas.
[Faça o login para poder comentar]
patty-321
Em: 11/07/2024
Amei o capítulo grande. Essa cumplicidade é tão gostosa. Elas conversando assim...
Nem parece as duas pessoas do início da estória. Sim, a manu está se curando, aliás ,ambos os corações. E a dona Helena pegou um sai pra lá da Júlia bem bonito. Quero final feliz, não inventa. Rs. Bjs
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]