Efeitos Colaterais
Assim que Willian estacionou em frente a escola de dança do namorado, o celular começou a tocar.
— Fala, Bela, meu amor. — ele respondeu saindo do carro.
— E aí, gato, tudo bem? — Isa cumprimentou o amigo.
— Tudo ótimo e você?
— Tranquilo. Lembra aquela peça que você viu e gostou? Pra colocar lá no escritório.
— Aquela maravilhosa, toda de madeira? — o rapaz falou animado.
— Exatamente.
— Você conseguiu?
— Sim. Vou mandar entregar lá hoje à tarde.
— Obrigada. Obrigada. Obrigada. Nossa, aquela peça vai ficar maravilhosa na sala de reuniões. — ele comemorou chegando à recepção.
— Não há de quê, meu querido. Onde você está?
— Vim almoçar com meu homem, já que a querida da minha sócia desapareceu e ainda não voltou.
— Ela está com a Amanda. Eu falei com a Mandys agora a pouco e ela me disse que elas iam almoçar juntas.
— Deve ser por causa do bafão lá na Silvia.
— Provavelmente. A Amanda não me disse uma vírgula, só que elas haviam se encontrado.
— Mas pelo que a minha sogrinha falou foi só isso mesmo, elas só se viram e não se falaram. — o rapaz explicou.
— Eu só espero que a Manu esteja bem. — Isa falou preocupada.
— Eu também. Só dela não ter fugido já é um avanço.
— Realmente. Vou deixar você ir ver seu homem. Mais tarde a peça chega lá na iDraw.
— Combinado, querida.
Willian desligou o telefone e cumprimentou a recepcionista antes de seguir para o escritório do namorado no segundo andar.
Pedro tinha acabado de entregar um copo de água para a prima quando alguém bateu na porta. Como Julia ainda estava se recuperando do choro recente, ele foi até a porta ao invés de simplesmente mandar a pessoa entrar.
— Amor. — ele falou com um sorriso esquisito sem abrir a porta totalmente.
— Oi. — ele falou beijando o namorado — Que foi? — ele perguntou sem entender o porquê de Pedro não sair da porta.
Pedro ficou estático por alguns segundos. Ele olhou para a prima sentada na cadeira e para o namorado parado do lado de fora da sala. Não havia o que fazer, ele abriu a porta e deu passagem para Willian entrar.
— É que a Julia está aqui. — ele falou apontando para a prima.
Willian fez um barulho estranho de surpresa ao olhar para Julia. A moça se levantou imediatamente ao ver que o primo havia entrado na sala acompanhado. Will não pode deixar de reparar na mulher mais uma vez, agora com mais calma ele teve a comprovação da beleza dela e pode imaginar o quanto devia ter sido perturbador para Manu estar na presença dela depois de tanto tempo.
— Vocês foram apresentados na festa tão rapidamente e nem tiveram tempo de se conhecer. — Pedro tentou quebrar o clima.
— Verdade, amor. — Will sorriu para o namorado e se adiantou para cumprimentar Julia — Como vai?
— Bem e você? — Julia falou feliz com o sorriso sincero que recebeu do namorado do primo.
— Tudo ótimo. Desculpa ter interrompido vocês. — falou olhando de um para o outro — Eu vim pra nós almoçarmos, mas eu espero você lá embaixo. — ele disse para Pedro.
— De maneira nenhuma, eu e o Pedro já conversamos. — Julia respondeu antes do primo.
— Porque não almoçamos os três? Assim você conhece o Will um pouco melhor, Ju. — Pedro sugeriu.
Julia sorriu, aquele convite era um sinal de que Pedro estava disposto a ter de volta a relação dos dois. Além do fato de Willian ser sócio de Manu, o que poderia ser mais uma possibilidade da arquiteta descobrir alguma coisa sobre a vida da ex-namorada. Ela estava tentando não pensar muito sobre o assunto, mas rever Manuela havia a perturbado de uma forma tão avassaladora que era difícil ignorar. O que só servia para aumentar a sua vontade de saber sobre ela.
— Me parece ótimo. — Will respondeu.
— E então? — Pedro falou olhando para a prima.
— Vai ser um prazer. — ela respondeu com um sorriso.
**
Manuela não voltou para o escritório naquele dia. Preferiu ir para casa e trabalhar de lá. Ela não estava disposta a encarar Willian naquele momento. Quando chegou ao apartamento encontrou Joana, que vinha a sua casa duas vezes por semana para organizar as coisas. A mulher de meia idade estava com Manu há tanto tempo que era considerada uma amiga e a publicitária adorava conversar com ela.
— Já chegou? — Joana disse quando Manuela entrou na cozinha.
— Já. Tudo bem? — Manu respondeu encostada no batente da porta.
— Tudo ótimo e você? Por que veio tão cedo, vai viajar?
— Não. Só quis vir trabalhar em casa mesmo.
Joana olhou para o semblante de Manu por um instante e percebeu que ela parecia cansada, provavelmente andava trabalhando demais.
— Senta aqui comigo, vamos tomar um suco e colocar o papo em dia. — Joana falou apontando uma das cadeiras da mesa da cozinha.
Manuela respirou fundo e se sentou. Ela queria mesmo conversar com alguém que não fosse ficar pergunto sobre os recentes acontecimentos da sua vida. Alguém que ignorasse o fato de que ela andava sendo perturbada por lembranças do passado que resolveram ganhar vida e vir morar no Brasil.
— Como estão as coisas em casa? — Manu perguntou assim que a mulher se sentou.
— Tudo como Deus quer. — ela respondeu com um sorriso, tomando o gole do suco.
— E as crianças? Que não são mais crianças, bem verdade. — Manu também experimentou o suco.
— Os dois estão ótimos. A Renatinha muito mais estudiosa que o Caíque, mas os dois não me dão trabalho nenhum. Você sabe.
— Sei mesmo. — ela concordou balançando a cabeça.
— E você? Estou te sentindo um pouco amuada, aconteceu alguma coisa?
— Não. Acho que é só cansaço mesmo. — Manu foi simplista.
— Por que você não vai pra BH descansar por uns dias?
— Eu estive lá no fim de semana passado. Eu acho que é só falta de dormir direito, por isso eu resolvi vir pra casa mais cedo hoje. — as duas voltaram a falar sobre os filhos de Joana e Manu agradeceu mentalmente o fato de não ter que ficar se explicando ou falando sobre si. Era muito bom poder falar sobre a vida de outra pessoa.
Mais tarde, depois de Joana ir embora, Manu ficou deitada em uma das espreguiçadeiras da sacada da sala vendo o sol se pôr. A publicitária sabia que precisava tomar uma decisão antes que toda aquela avalanche de coisas a atingisse mais uma vez. A sua natureza prática a impelia a racionalizar o problema como sempre fazia, a questão é que quando se tratava de Julia, ser racional não era fácil. Ela tentava encontrar uma maneira de resolver aquele impasse que era a relação dela com Pedro e Silvia, que eram parentes de Julia, e o seu medo de ter a arquiteta de volta em sua vida. Manuela simplesmente não sabia como lidar com tudo aquilo.
Além disso, ainda tinha as duas tentativas de contato de Mateus, que ela absolutamente não sabia o que queria dizer, mas que faziam seu sangue ferver de raiva sempre que lembrava. Manuela já havia notado a diferença de sentimentos que ela destinava ao ex-amigo e à ex-namorada. Julia havia partido o seu coração de uma maneira tão profunda e desesperadora que ela ainda não tinha aprendido como lidar completamente, por isso ela sentia mágoa e sentia dor, muita dor. Já Mateus havia feito o que Manu jamais poderia esperar, ele a traiu de um jeito que um amigo jamais seria capaz, por isso ela sentia ódio e raiva, por ter confiado e se aberto ao ponto de se colocar vulnerável ao que ele fez. Em ambos os casos só existia uma unanimidade: não havia perdão.
E mesmo com a certeza de não haver perdão, volta e meia ela se pegava lembrando do encontro com Julia na casa de Silvia. O cabelo mais curto do que costumava ser, um semblante mais maduro do que ela se lembrava, o jeito de se vestir totalmente diferente daquela época. A única coisa que pareceu, ao menos para Manu, não ter mudado, era o olhar. Os olhos verdes que a faziam esquecer de tudo à sua volta ainda eram os mesmos e isso não era só perturbador, era aterrorizante.
Manuela estava no meio dessas divagações quando o interfone tocou. Acreditando que era um dos amigos para checar como ela estava, ela levantou resignada.
— Silvia. — ela falou com um sorriso ao abrir a porta depois de liberar, pelo interfone, que a advogada subisse.
— Atrapalho? — a mulher falou retribuindo o sorriso.
— Claro que não, entra.
As duas se acomodaram no sofá antes de começarem a conversar.
— Aceita alguma coisa pra beber? — Manu perguntou.
— Não, obrigada. Eu vim para a gente conversar sobre domingo. — Silvia falou com a suavidade e firmeza de sempre.
— Imaginei. — Manuela concordou com a cabeça.
— Acredito que você já esteja um pouco saturada de todos quererem falar sobre esse assunto.
— Um pouco. — ela respondeu com sinceridade.
— Entendo. Ainda assim, eu sou obrigada a insistir que falemos sobre isso. — Silvia continuou.
— Sem problemas, Silvia. Vamos direto ao ponto. — Manu falou com um sorriso triste.
— Eu fiquei preocupada com você, com a forma como você saiu lá de casa. Por isso eu vim até aqui.
— Eu peço desculpas por aquele dia, eu fui pega de surpresa. Não era minha intenção deixar você preocupada.
— Todas nós fomos pegas de surpresa. Agora a minha preocupação é sobre o que você pretende fazer com relação a isso tudo.
— Eu ainda não tomei uma decisão. Honestamente eu não acho que eu precise.
O tom sério e metálico que Manu usava só deixava claro para Silvia o quanto aquela confusão seria difícil de resolver. Julia precisaria ter muita paciência para saber lidar com tudo aquilo.
— Como assim? — Silvia perguntou curiosa.
— Não fui eu quem voltou, eu sempre estive aqui. A verdade é que minha vida está muito bem e eu não tenho que mudar nada nela por razão alguma.
— Eu não só entendo, como concordo com o que você está dizendo. Ainda assim eu preciso ser realista, não lidar com essa questão não vai mudar o fato de que ela existe. — Silvia foi direta.
— Todo mundo fica me dizendo isso, mas ninguém parece escutar quando eu respondo. — Manu falou séria, tentando manter a calma.
— E qual é a sua resposta?
— A mesma. A sua sobrinha foi embora, se casou com o meu melhor amigo, não deu a mínima para como eu fiquei ou para o que eu sentia. — Manu sentia cada constatação arder dentro do peito, mas se manteve firme ao concluir — Voltar depois de seis anos não dá a ela o direito de interferir na minha vida, Silvia. E isso é tudo que eu tenho a dizer sobre esse assunto.
— Racionalmente falando você tem toda razão, mas você já tentou não racionalizar e avaliar por uma outra perspectiva? — Silvia tentou. Depois do encontro inesperado das duas em sua casa, Silvia acabou tomando conhecimento de todos os detalhes daquela história através de Pedro. É claro que Manuela não iria ceder com facilidade, não depois de uma dupla traição como aquela.
— Não existe outra perspectiva nessa história. Eu lamento muito te desapontar nesse sentido, mas a minha decisão está tomada. Na verdade, eu fui obrigada a aceitá—la muito tempo atrás, mesmo a contra gosto.
Silvia olhou nos olhos de Manu antes de responder. A forma como a publicitária se debatia e tentava fugir era a reação mais natural que ela poderia ter. Fazia parte de quem Manu era não deixar que as pessoas lhe dissessem o que fazer ou como lidar com a sua vida, não seria diferente agora.
— Eu sempre admirei a maneira decidida que você encara a vida, Manu. Isso não vai mudar agora, mas eu temo que nessa questão você esteja enganada. Resolver essa parte da sua vida não é sobre a Julia ou o Mateus, é sobre você. Eu também lamento muito te desapontar nesse sentido, mas a minha opinião continua a mesma. Me parece, olhando de fora, que o seu passado é uma parte gigantesca de quem você é e negar isso a si mesma pode ter funcionado durante um tempo, mas não tem tido a mesma eficiência atualmente.
**
O aeroporto Internacional de Guarulhos estava com um movimento tranquilo naquela terça à tarde. O motorista já estava acostumado a ir buscar várias visitas de fora do país que vinham para reuniões ou vistorias na empresa, dessa vez ele foi instruído a tomar muito cuidado. O passageiro era ninguém mais que o maior acionista e presidente da companhia em pessoa, ele estava vindo ao Brasil pela primeira vez em muitos anos e os diretores da filial brasileira não queriam fazer feio.
Depois de quase doze horas de viagem, em um voo fretado de Londres para São Paulo, Mateus Bergmann Köller desembarcou exausto. Assim que saiu no portão de embarque identificou um homem com uma plaquinha escrito seu nome e foi até ele. O motorista tinha ordens de o levar direto para o hotel, mas Mateus quis dar uma volta pela cidade antes de ir descansar.
Voltar ao Brasil depois de tantos anos o deixou com saudade. Era impossível estar ali e não se lembrar da infância, da adolescência e de quando ele era só um moleque querendo se divertir na faculdade. Pensar no período da faculdade o fez lembrar o porquê de ter vindo fazer aquela visita ao seu passado. Quando tudo aconteceu e Julia resolveu voltar ao Brasil, ele soube que precisaria procurar Manuela. A resistência inicial dela não fez com que ele desistisse e por isso ele estava ali disposto a ir atrás dela, ela querendo ou não.
Fim do capítulo
Ei, gente! Mais um capítulo pra gente ir tentando entender os sentimentos todos que envolvem as personagens todas dessa história.
Os comentários de vocês aquecem muito o meu coração! Eu sei que fica todo mundo envolvido com essa confusão que é esse reencontro tão cheio de sentimentos e mágoas e tudo que vem junto. O futuro dessas duas? Só lendo pra saber! kkkkkk
Sigamos, vem muitas emoções ainda por aí! Beijo no coração e até amanhã antes ou depois do jogo de volêi da seleção feminina (aliás, um evento imperdível que eu convido todas a acompanhar!).
♥
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Marta Andrade dos Santos
Em: 22/06/2024
Oxente, tá querendo perdão cascavel.
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