Quase Encontro
Manuela levantou da cama e começou a se vestir. Uma mulher com cabelos loiros a olhava, ainda enrolada no lençol. As duas tinham acabado de passar horas na cama do motel, trans*ndo. Manu seguiu para o banheiro na intenção de acabar de se vestir para ir embora daquele lugar. A mulher deitada na cama, que ela nem se lembrava o nome — Bruna, Brenda, Bianca... certamente alguma coisa com B, pensava a publicitária — a encarava com o olhar de quem não havia compreendido bem como eram as coisas.
As duas se conheceram em uma boate, a publicitária a cercou de todas as formas possíveis e a convenceu a ir até um motel. Uma noite de sex*, nada mais. A menina era até boa de cama, mas Manu precisava viajar cedo no outro dia, por isso resolveu voltar para casa. Quando retornou ao quarto, a “B” já estava se vestindo, com um olhar de puro desagrado ela encarou Manuela nos olhos.
— Você é uma dessas caçadoras, não é?
Manu deu um sorriso sarcástico, não era a primeira vez que ela ouvia aquilo e certamente não seria a última.
— Todas as promessas que eu não lhe fiz foram concretizadas nessa cama, meu bem. Acredite em mim quando eu digo que você não vai querer nada mais que isso comigo.
Manuela chegou em casa por volta das 4 da manhã, dormiu por umas duas horas e partiu para Fortaleza, para seguir com as negociações iniciadas por Willian com uma empresa de calçados que queria trazer uma campanha da sua nova linha para a iDraw Publicidade. Não seria um trabalho fácil, mas faria muito bem aos cofres e à reputação da empresa. Ficaria fora por três dias, o que na verdade foi um alívio para ela, que não estava nem um pouco disposta a se encontrar com Pedro depois que soube que ele e Julia haviam finalmente conversado.
**
Willian e Isabela se divertiam na cozinha enquanto preparavam o jantar. Willian desempenhava o papel de chefe de cozinha enquanto Isa cortava algumas verduras para ajudar o rapaz. Pedro também estava no apartamento, em um telefonema interminável no escritório. Eles esperavam a chegada de Amanda, que vinha direto do hospital para jantar com a esposa e os amigos.
— E a Manu, Will? O que você acha? — Isa perguntou enquanto picava algumas batatas.
— Não sei viu. Eu até tentei conversar com ela, mas você conhece a peça, é mais escorregadia que sabonete de presídio.
Isa gargalhou.
— De onde você tirou essa agora?
— Querida, todas as situações da vida podem gerar trocadilhos muito pertinentes.
— E por um acaso você já foi preso para saber como é o sabonete da prisão?
— Nem preciso. Aqui no Brasil, com as condições dos presídios, esse trocadilho jamais se enquadraria, sejamos realistas. Mas eu estava em um almoço dia desses, fazendo o ‘hétero lindo de Paris’, e um delegado estava almoçando na mesa ao lado e falou isso de um criminoso que ele estava tentando prender, aí eu já associei ao meu vocabulário.
Isabela riu mais ainda. Só quem conhecia Willian intimamente sabia o quanto o rapaz era espirituoso e engraçado. A posição de publicitário e empresário bem-sucedido fazia com que ele assumisse certa seriedade fora do ambiente familiar, mas sempre que eles estavam em casa ele se libertava e era sempre hilário.
— Voltando a falar daquela lá, — falou o rapaz se virando para a amiga — eu acho que ela vai continuar fazendo a que não sente nada e não está nem aí para a volta da prima do meu amor.
— É o que parece. Eu queria mesmo era saber como é essa Julia. O Pedro não te falou nada?
— Outro que está fazendo o mudo. Não fala nada, não explica nada e menos ainda mata a minha curiosidade de saber como é a Julia. Não sei mais o que fazer para tentar arrancar alguma informação dele. — Concluiu com um suspiro.
Nesse momento o interfone tocou e Willian liberou a entrada de Amanda.
— A terceira parte da trindade silenciosa chegou. — Ele disse colocando o telefone no gancho enquanto olhava para Isabela.
— É meu amigo, silenciosa mesmo. A Amanda não me contou nada e não quer nem saber de tocar no assunto.
Os dois suspiraram. Às vezes era difícil para eles entender toda aquela situação, mas ao menos elas tinham um ao outro para conversar. Levando em conta que os respectivos parceiros não estavam dispostos a contar a história e Manuela também não estava interessada nesse diálogo, eles podiam pelo menos discutir entre si e teorizar qual era o enredo trágico por trás daquela relação que Pedro, Amanda, Manuela e Julia compartilhavam. Willian ficou responsável por abrir a porta.
— Vem, Mandys. A gente está na cozinha preparando o jantar. — Will disse logo após cumprimentar a amiga e receber o vinho que ela trazia.
Amanda o seguiu e chegando na cozinha encontrou Isa concentrada lavando alguma coisa. Ao perceber a entrada dos dois, Isabela fechou a torneira e se aproximou da esposa secando as mãos em um pano de prato.
— Oi, meu amor. — Disse envolvendo a esposa pela cintura.
— Oi. Tudo bem?
— Sim. E você?
— Tudo. — As duas se beijaram e permaneceram abraçadas por alguns instantes.
— Onde está o Pedro? — Amanda questionou ainda dentro do abraço.
— Está ao telefone com a Silvia lá no escritório. — Foi Willian quem respondeu.
— Vocês precisam de alguma ajuda? — Amanda perguntou desfazendo o abraço e olhando para Isa com um sorriso.
— Não. — Isa respondeu.
— Sendo assim vou trocar duas palavrinhas com o Pedro. Tudo bem?
Isa assentiu com a cabeça e Amanda acariciou o rosto da esposa e depositou um beijo rápido em seus lábios antes de deixar a cozinha em busca de Pedro.
— Nossa, que pressa. O que será que ela tem de tão importante assim para conversar com ele? — Perguntou Will.
Nenhum dos dois soube a resposta para aquela pergunta.
**
Amanda deu duas leves batidas na porta antes de abri-la. Pedro estava virado para a janela com o celular na mão. Ele se virou achando que Will tinha vindo chamá-lo, mas era Amanda quem estava diante dele. Ele sorriu e se aproximou da médica a cumprimentando com um abraço e um beijo no rosto.
— Como vai a cardiologista mais linda que eu conheço?
— Eu sou a única cardiologista que você conhece, Pedro. Vou muito bem obrigada. E você?
Antes de responder, o rapaz indicou o sofá que ficava no canto da sala para eles se sentarem.
— Vou ficando cada dia mais louco com essa mãe que eu arrumei.
Amanda gargalhou. Silvia era mesmo uma figura e tanto. Ela gostava muito da mãe do amigo, mas sabia que ela às vezes levava Pedro à loucura.
— O que foi dessa vez? — Ela perguntou já sentada de frente para o rapaz.
— Ela agora cismou de advogar em favor da Julia. Está insuportável.
— Julia. Motivo pelo qual eu quero conversar com você.
Os dois se olharam. Depois do telefonema do rapaz no dia anterior a preocupação que os dois dividiam tinha nome, sobrenome e podia causar uma dor de cabeça sem precedentes.
— Você descobriu mais alguma coisa sobre o Mateus?— Amanda perguntou receosa da resposta.
— Como eu falei ontem, ele não está no Brasil. E isso é tudo que eu sei até o momento.
— A Julia não disse nada?
— Não. O que eu percebi é que ela não quer falar sobre ele. Quando eu toquei no nome dele ela foi bem evasiva e só disse que eles estão divorciados.
— E eles estão mesmo?
— Sim. Mamãe me confirmou tudo.
Amanda aquiesceu. Pelo menos Mateus não estava no Brasil, menos uma coisa com a qual se preocupar no momento.
— E afinal como você e a Julia ficaram? — Amanda questionou.
— Não ficamos, querida. Para ser sincero a nossa conversa foi mais um capricho da minha mãe. Nós acabamos sendo interrompidos por uma reunião que já estava marcada na minha agenda e não concluímos devidamente o nosso papo amistoso. — O rapaz finalizou com um tom irônico.
— Então vocês vão se encontrar novamente?
— Sim. Minha mãe já agendou o nosso reencontro e acabou de me dizer, por telefone, que se eu sair sem terminar a conversa posso aguardar por uma interferência direta da parte dela. Coisa para a qual eu não estou nem um pouco disposto.
— Bem, você e a Julia vão precisar se resolver. Você sabe disso. Resta saber o que você e ela pretendem fazer com a amizade de vocês.
— Esse é o ponto, Amanda. Não há amizade, não mais.
— Você tem tanta certeza assim? — Amanda interrompeu.
Pedro hesitou. Sinceramente ele não sabia.
— Se você não tem absoluta certeza disso, é porque existe a possibilidade de vocês se acertarem. E para isso é preciso conversar, logo sua mãe tem razão. — Sentenciou.
— É... Provavelmente. Ainda assim eu não sei o que pensar a respeito disso tudo. Acho que eu não estou pronto para baixar a guarda pra Julia, entende?
— Claro que eu entendo. Conversar com ela não quer dizer perdoar e esquecer, mas para você ao menos imaginar restabelecer a sua antiga relação com ela, vocês precisam partir de algum lugar. Conversar parece o mais certo nesse momento.
Pedro concordou. Mesmo antes de Amanda dizer ele já estava pensando que se encontrar com a prima e tentar conversar mais uma vez era a melhor maneira de tentar ajeitar as coisas.
— Mudando o ângulo do assunto. O que nós vamos falar para a Manu sobre o Mateus? — Indagou o rapaz.
— Boa pergunta, meu amigo. — Amanda disse desanimada.
— Levando em consideração que ele não está no Brasil, talvez fosse melhor deixar isso de lado.
— Talvez você tenha razão, mas se ele aparecer eu não quero imaginar como será.
— A Manu está viajando, até ela voltar eu já vou ter conversado com a Julia. Eu posso tentar descobrir mais alguma coisa sobre o Mateus. De repente é melhor a gente esperar mesmo. — Argumentou o rapaz.
— É, boa ideia. Falando nisso, a Julia já sabe da sua relação com a Manu?
— Não. Por enquanto vai dá para não tocar no assunto, mas eu acredito que uma hora ela vai acabar descobrindo.
— Certamente. Vamos esperar a Manu voltar então, aí decidimos se falamos ou não no Mateus. — Concluiu Amanda.
— Isso. Acho que foi um bom momento pra Manu viajar, vai fazer bem a ela.
— Sim.
Nesse momento os dois foram interrompidos pela entrada de Isabela os chamando para jantar. O resto da noite correu agradável como de costume. Amanda se despediu de Pedro pedindo ao rapaz que entrasse em contato com qualquer novidade que surgisse, o empresário garantiu para a amiga que o faria.
**
Isabela chegou ao shopping onde encontraria Amanda, com alguns minutos de atraso. Elas haviam combinado de se encontrar na entrada do shopping. Como ela atrasou na conversa com um cliente e o trânsito não ajudou, ela sabia que a esposa certamente já estava lá esperando.
— Oi, amor. — Ela disse quando se aproximou de Amanda.
— Oi. Nossa, você demorou.
— Desculpa. Agarrei com um cliente e depois o trânsito estava, como sempre, horrível. — Explicou Isa enquanto elas caminhavam para dentro do shopping.
Isabela era designer de interiores e atualmente fazia trabalhos para o escritório de decoração de uma amiga. Naquele dia ela estava em uma reunião com uma cliente que era dona de uma loja de joias, a mulher estava trazendo a sua franquia do Rio de Janeiro para São Paulo. Era um trabalho grande e Isabela estava apenas no começo.
— E correu tudo bem com o cliente?
— Sim. Na verdade, é a cliente. Ela é um amor de pessoa, uma fofa e foi super simpática.
— É mesmo? Que sorte a sua de ter uma cliente tão cheia de qualidades.
— Realmente muita sorte. — Brincou Isa.
— Agora eu estou entendendo o seu ‘atraso com um cliente’.
— Amor, eu estava só imaginando o interior dela, apenas. — Isabela gargalhou e recebeu um tapa no braço.
— Deixa eu imaginar que você anda conhecendo o interior de alguém, sua safada.
As duas estavam na escada rolante e Isabela aproveitou para abraçar a mulher.
— Você está com ciúmes?
— Eu preciso estar? — Amanda perguntou com uma sobrancelha levantada.
— Claro que não. Eu é que preciso ficar de olho naquele monte de médica lá daquele hospital que estão doidas para roubar minha loira.
Amanda deu um sorriso que só os muito apaixonados conseguem e acariciou o rosto da esposa.
— Quanto a isso você não precisa se preocupar. Eu só tenho olhos para você, meu amor.
As duas sorriram. Elas estavam juntas a 5 anos, casadas e felizes. A relação das duas era de muita cumplicidade. No começo foi tudo muito complicado, porque a carreira de Amanda exigia uma dedicação de tempo enorme. Mas as duas acabaram se arranjando, Isa aprendeu a conviver com a rotina complicada da amada e elas estavam em uma fase de entendimento mútuo.
Elas estavam chegando à praça de alimentação quando Isabela apontou para Pedro sentado sozinho em uma mesa. Amanda impediu a mulher de tentar se aproximar do amigo quando viu quem se aproximava da mesa do rapaz.
— Que foi, amor? É o Pedro. — Isabela falou olhando para a mulher que havia parado de andar e segurado seu braço, impedindo ela de continuar andando.
— Ele está acompanhado.
— Eu sei. Vamos só falar um ‘oi’ para ele. — Isa insistiu.
— Nem pensar. Vamos almoçar naquele restaurante no próximo piso. — Amanda falou já puxando a esposa de volta para a escada rolante.
— Mas…
— Vem, Isabela. Por favor.
Isabela ficou sem entender.
— Calma, Amanda. Quem é aquela mulher?
Amanda olhou mais uma vez para a mesa que o amigo ocupava, depois encarou Isa e respirou fundo antes de responder.
— A Julia.
Isabela abriu a boca para falar alguma coisa, mas sua primeira reação foi se virar para onde Pedro e Julia estavam sentados para olhar direito a mulher que o acompanhava. Então aquela era o motivo da recente comoção entre a esposa e os amigos. Ela queria conhecê-la.
— Nossa. — Falou Isabela.
— Nossa o quê? — Questionou Amanda.
— Olha pra Julia, com esse cabelão ruivo e dessa altura, ela e a Manu deviam arrasar quarteirões quando estavam juntas.
Amanda olhou para a mulher sentada conversando com Pedro. Daquela distância ela não podia afirmar com certeza, mas aparentemente o tempo em que viveu fora deixou Julia ainda mais bonita do que costumava ser.
— Vamos até lá, amor. O Pedro apresenta a gente. — Isa interrompeu os devaneios de Amanda.
Mais uma vez Amanda impediu o avanço de Isabela.
— De jeito nenhum. Eu não preciso ser apresentada pra Julia, ela já me conhece.
— Melhor ainda, você mesmo me apresenta.
— Sem chances, vem.
— Eu vou com uma condição. — Isabela disse sem sair do lugar.
— Se você acha que vai me chantagear para conseguir que eu te conte a história da Manu, desisti.
Amanda disse e foi em direção a escada rolante, Isabela seguiu a esposa contrariada.
— Por que você não me conta de uma vez essa história e acaba com isso? — Questionou Isa já sentada à mesa do restaurante.
— Eu já te falei, mais de uma vez, que essa história é da Manu. E você já sabe a maior parte.
— Mas não todos os detalhes.
— Coisa que nem eu sei.
Amanda encarou a esposa. Ela detestava quando o assunto era o passado de Manu, elas nunca conseguiam concordar. Isabela insistia em perguntar coisas que Amanda não queria dizer.
— Escuta, amor, eu não quero discutir por causa disso. O mais importante a se saber sobre essa história é que a Julia terminou com a Manu e foi embora do país, agora ela voltou e nós não sabemos como isso vai impactar na vida da nossa amiga.
Isabela não ficou satisfeita, mas também não queria brigar com a mulher por causa daquilo. A verdade é que ela até entendia a Manu não querer falar sobre o assunto, mas de tanto que aquilo ficou intocável gerou uma curiosidade sobremaneira a respeito do que realmente aconteceu naquela época.
Fim do capítulo
Mais um, meu povo.
Beijo pra vcs! ♥
Comentar este capítulo:
Marta Andrade dos Santos
Em: 06/06/2024
Estou curiosa também Isabela.
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Mmila
Em: 05/06/2024
E eu aqui também querendo saber dos detalhes dessa história da Manu com a Júlia!!!!!!
E esse casamento, em que circunstâncias ele aconteceu!?!?
Será que esse tempo (o da ausência) foi o limite da Júlia pra ela retonar?!?
Aguardando anciosa as cenas dos próximos capítulos.
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