Era quinta-feira de manhã cedo e Bruna estava cortando algumas formas geométricas coloridas que usaria em uma atividade enquanto sua turma estava em uma aula extra, quando Ana entrou cumprimentando-a. Rapidamente Bruna tensionou. Não era comum Ana vir conversar com ela e a dona da escola parecia um pouco nervosa. Instintivamente ela ficou com medo de Ana saber sobre ela e Alice. O que era ridículo porque não tinha como ela desconfiar! Elas eram cuidadosas. Só que desde a última semana depois da festa junina quando passara o fim de semana inteiro com Alice algo parecia estar mudando. Até o encontro semanal de quarta-feira foi diferente e Bruna se pegou pensando se alguém havia visto ela caminhando da casa de Alice até a escola naquela manhã. Os encontros não pareciam mais ser algo tão casual como de inicio, o que aumentava a sua culpa e preocupação em relação ao seu trabalho e o que tudo aquilo poderia significar. Todo esse turbilhão de pensamentos e sensações passaram em segundos por sua cabeça e ela fez o que sempre fazia, empurrou tudo para longe de sua mente, prometendo a si mesma não pensar muito no assunto.

            – Eu tenho um favor para te pedir – Ana falou um pouco sem graça.

            – Claro – Bruna falou tentando esconder sua surpresa – Como posso ajudar?

            – Acabei de liberar a Carol porque a mãe dela está indo para o hospital – falou referindo-se a auxiliar que ficava com Bruna.

            – Caramba... O que houve? – perguntou preocupada com a sua colega de trabalho por quem ela tinha um grande carinho.

            – Eu não sei detalhes ainda, mas acho que ela caiu e possivelmente quebrou a perna. Algum vizinho viu e ligou aqui para escola.

            – Então é melhor eu ir ficar com as crianças – Bruna falou rapidamente levantando-se e arrumando os papeis que cortava.

            – Eu já pedi para Jenny ficar com eles. O que eu vou te pedir é um favor mais pessoal.

            Bruna ficou em silêncio tentando controlar a sua ansiedade. O que ela poderia querer?

            – A Carol ia trabalhar de babá amanhã a noite, mas agora com isso da mãe não vai poder. Eu sei que desde que você virou professora você não tem feito mais isso. Era comum as meninas trabalharem de babá para algumas famílias em busca de um dinheiro extra em datas específicas ou fins de semana. Normalmente a escola não se importava se não atrapalhasse o trabalho delas, mas todas costumavam avisar Ana ou a direção só para que ficassem cientes quando eram pais da escola. Bruna mesmo já tinha feito esse tipo de trabalho várias vezes quando era auxiliar, mas quando se formou, passou a evitar ao máximo pois queria que tanto a escola quanto as famílias a vissem de uma nova forma, nessa nova etapa de sua vida. Ela havia se esforçado muito para se formar e tornar-se professora, uma profissão que já era muito desvalorizada e por mais que soubesse que não havia nenhuma vergonha em ser babá, ela queria que os pais a vissem mais como uma educadora do que uma cuidadora.

            – Mas é para a Alice que é muito minha amiga e assim tão em cima da hora não é fácil achar alguém com quem o Enzo fique bem.

            Bruna não sabia muito bem o que dizer. Era no mínimo estranha a situação em que sua chefe a pedia para ser babá dos filhos da mulher com quem estava dormindo. Diante do silêncio de Bruna, Ana continuou.

– Eu vou falar com a Alice e exigir que ela pague um valor mais alto para você.

Não era sobre isso. Bruna sabia muito bem sobre o compromisso de Alice. Era o casamento de algum parente de Ana e Alice nem estava muito afim de ir, mas precisava pela aproximação e carinho que tinha com a família de Ana, que sempre fora muito acolhedora desde que chegara no Rio de Janeiro.

– Não é necessário... – Bruna se pegou dizendo.

A verdade é que ela sabia que a situação era estranha, mas o que ela poderia fazer? A sua chefe estava pessoalmente pedindo-a por um favor. Ela não tinha nenhum compromisso na sexta, apenas sábado quando havia combinado de ver sua prima. Que mal poderia fazer trabalhar de babá para dois meninos com quem ela já convivia diariamente? Ela poderia pensar em formas piores de passar a sua sexta do que com o lindo e fofo do Gael. E se ela fosse ainda ver Alice linda arrumada para um casamento e quem sabe agarrá-la um pouco seria um ótimo bônus!

– Eu posso cobrir a Carol, sem problemas. Que horas? – respondeu e observou o grande sorriso de Ana.

– Muito obrigada, Bruna! Vou passar o seu contato para a Alice, pode ser? E aí vocês combinam os detalhes! E ela vai sim pagar um valor mais alto para você. É o mínimo por ter aceitado assim tão em cima da hora.

– Obrigada – Bruna falou mais para acabar a conversa do que qualquer outra coisa.

Assim que Ana saiu ela pegou seu celular para mandar uma mensagem para Alice. Ela não costumava usar o celular durante o horário de trabalho e o tinha perto mais para tirar foto das atividades que fazia com as crianças, mas era uma emergência. Era uma situação um pouco estranha e era melhor que Alice soubesse por ela.

Depois de pensar exatamente sobre o que escrever, sem muito tempo ela digitou:

“Parece que eu vou ser sua babá amanhã! Carol teve uma emergência e Ana acabou de me pedir”.

Ela não esperou por uma resposta pois as crianças estavam voltando e ela tinha que trabalhar. Apenas na hora do almoço que viu o celular de novo.

“Não acredito que ela fez isso! Você não precisa! Eu nem quero ir nesse casamento”.

“Está tudo bem! Eu não me importo, mas eu vou cobrar uma taxa extra de orgasmos”.

Para a surpresa de Bruna, ao invés de responder, Alice ligou.

– Oi – ela atendeu procurando um lugar mais reservado na escola sem que ninguém ouvisse.

O pátio estava vazio visto que ou as crianças estavam no soninho naquele momento ou no salão grande de atividades onde ficavam as acordadas. Mesmo assim ela falou bem baixo para que nenhum curioso escutasse.

– Eu sinto muito que a Ana tenha te pedido isso. Eu sei que é estranho – ela ainda estava um pouco insegura.

– Está tudo bem! De verdade! – falou com sinceridade – Eu amo seus filhos e passar tempo com eles não é nenhuma tortura. Ver a mãe deles gostosa arrumada para um casamento também não é nada ruim...

Diante da provocação, Alice riu e pareceu mais leve.

– Então acho que podemos aproveitar o momento e você podia chegar um pouco mais cedo amanhã. O Gustavo vai pegar as crianças na escola para eu poder me arrumar e só vai deixar os meninos aqui mais perto da hora de ir.

Bruna sabia que o Gustavo também havia sido convidado, mas que eles não iriam juntos. Ele iria com a sua mãe que aparentemente também era muito próxima da família de Ana e Alice iria com a sua amiga e o marido dela. Ainda assim ouvir o nome dele depois da festa junina era ruim. Os ciúmes voltaram de novo e ela teve que respirar fundo e mais uma vez empurrá-los para longe.

– Eu posso ir direto do trabalho. Aliás, eu sou uma maquiadora decente e posso te ajudar – ofereceu.

– Ótimo!

Bruna precisou desligar logo em seguida para almoçar e apesar de saber que a situação era estranha, ela não conseguia evitar em sentir-se um pouco ansiosa para ver Alice no dia seguinte.

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Alice teve um dia muito estressante no trabalho depois de um vazamento na obra de uma cobertura que iria atrasar a entrega pelo menos duas semanas. Justamente de um cliente muito exigente. Ela chegou em casa apenas uns quinze minutos antes de Bruna e a simples visão da menina fez grande parte do estresse do seu dia evaporar como mágica.

O beijo que trocaram logo na porta foi saudoso, mas não faminto. Alice estava se sentindo vulnerável e tudo que ela queria era abraçar Bruna, sentir o seu cheiro e passar a noite inteira em seus braços. Infelizmente ela tinha um pouco menos de duas horas para se arrumar para um casamento que nem queria ir.

– Você nunca sai de casa! Precisa se divertir! – Ana insistiu quando ela tentou sair do compromisso.

– Casamentos não são exatamente divertidos para mim. Especialmente passando por um divórcio – tentou argumentar.

– Minha presença é muito divertida e você sabe que vai ser uma bela de uma festa!

Isso era verdade. A sobrinha de Ana estava se casando e a família não havia economizado na festa. A cerimônia e a recepção seriam em um salão muito renomado, conhecido por fazer eventos de pessoas famosas. Ela já havia confirmado presença há meses e sabia que seria muito ruim simplesmente não aparecer então ela se rendeu.

No entanto, naquele momento, com os lábios de Bruna nos seus, ela queria voltar atrás e aproveitar a companhia da menina. Ela precisou lembrar-se de que se não fosse pelo casamento Bruna nem estaria ali, pois era o seu fim de semana com os meninos. Dessa forma pelo menos ela teria um pouco dela naquele dia e teria que ser o suficiente.

– Você está bem? – Bruna perguntou carinhosa depois que a porta se fechou atrás dela.

Era impressionante o quanto Alice parecia um livro aberto perto dela.

– Só um pouco de estresse no trabalho.

Elas conversaram um pouco sobre seus dias enquanto lanchavam. Bruna sempre chegava com muita fome do trabalho.

– As crianças já chegaram? – Bruna perguntou decepcionada quando o interfone tocou.

– Não, é só a comida que pedi para você e para as crianças jantarem.

Alice rapidamente recebeu a entrega e observou o sorriso animado de Bruna ao ver que ela havia pedido o seu preferido: macarrão com almondegas. A menina já havia contado que sua mãe sempre fazia essa comida quando estava feliz na sua infância e por isso o prato tinha um afeto especial para ela.

– O Gael vai tentar te convencer a não comer os legumes porque é sexta-feira e porque ele diz que não combina com macarrão, mas não deixa!

– Não se preocupa – falou depois de uma risada – Já estou muito acostumada com essas desculpas!

– Eu preciso começar a me arrumar ou vou me atrasar. Quer tomar um banho comigo? – perguntou com um sorriso sensual.

– Você não precisa se arrumar? – Bruna provocou, enlaçando o pescoço de Alice e grudando seu corpo nela.

– Sim, mas eu também preciso pagar a dívida de orgasmos para você.

– Você certamente precisa – ela sussurrou perto de seus lábios antes de a beijar.

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Depois de um orgasmo delicioso no chuveiro, Bruna passou a ajudar Alice a se maquiar e o trabalho era ao mesmo tempo torturante e delicioso. Ela era tão linda! Bruna adorava poder observar de perto o seu rosto e tocar nele. Apesar de já ter algumas marcas de idade por ter uma pele muito branca, Alice era impecável. Mesmo sem maquiagem ela era estonteante e Bruna teve que admitir que fez um trabalho excepcional, pois ao fim ela estava absurdamente maravilhosa. Ainda mais depois que terminaram de ajeitar o seu cabelo.

– Eu quero muito te agarrar agora, mas não posso estragar sua maquiagem.

Ela observou o sorriso sem graça, mas ao mesmo tempo orgulhoso de Alice e precisou usar todas as suas forças para não a beijá-la e jogá-la naquela cama deliciosa.

Antes que Alice pudesse responder a campainha tocou e daquela vez ela tinha certeza que eram as crianças chegando.

– Droga, atrasei – ela falou olhando o relógio do celular – Mas valeu a pena – sorriu de forma sedutora e deu um estalinho em Bruna antes de vestir um enorme roupão e seguir para abrir a porta.

Bruna a acompanhou até a sala, tentando não parecer tão à vontade ali naquele espaço com o qual ela já estava muito familiarizada.

Assim que a porta abriu, Bruna reparou no olhar de desejo que Gustavo direcionou para Alice e ela não conseguiu impedir de sentir um aperto no peito e um sentimento de posse. Ela não gostava que Gustavo estivesse vendo Alice de roupão, mesmo que a roupa felpuda fosse grande e não mostrasse nada, parecia algo muito íntimo para outra pessoa além dela presenciar.

“Eles eram casados por anos! Ele já a viu de roupão muitas vezes! E também já viu ela com bem menos que isso...”, Bruna pensou nos instantes que levaram até Gael entrar e a abraçar fortemente.

– Tia Bru! Eu estou tão feliz que você vai ficar com a gente!

O sorriso sincero do menino fez o seu coração ficar leve e ela abaixou para abraçá-lo bem forte. Enzo permaneceu grudado nas pernas da mãe.

– Eu também, meu amor! A gente vai se divertir muito!

Gustavo se deu conta de que ela estava presente e parou de olhar fixamente para a ex mulher, caindo o olhar sobre ela, com um sorriso galanteador.

– Tudo bem, Bruna? Bom te ver! – falou simpático e mais uma vez ela teve vontade de socar aqueles dentes.

Disfarçou sorrindo para ele e observando o seu terno impecável. Ele era um homem bonito. Urgh! Que ódio!

– Tudo tranquilo – ela respondeu.

– Obrigada por deixar os meninos – Alice falou interrompendo-os – Eu te vejo mais tarde no casamento.

Ela tentou fechar a porta, mas ele impediu.

– Espera! – falou rápido – A Ana pediu para eu te dar uma carona.

A feição de Alice que estava relaxada, rapidamente ficou fechada. E ele passou a se explicar.

– Como eu já vinha deixar os meninos aqui mesmo, ela se ofereceu para dar uma carona para minha mãe e assim podemos ir juntos – ele falou um pouco sem graça.

Bruna não sabia se sentia mais raiva de Ana ou de Gustavo no momento. Aquela era uma clara tentativa para os dois passarem mais tempo juntos.

Alice também não parecia feliz com a situação.

– Eu vou ligar para a Ana – ela falou séria.

– Alice – ele falou sério, lançando um olhar para Bruna. Claramente não querendo discutir em sua frente – Ela já está a caminho, disse que precisava ir um pouco antes. Eu estou aqui e podemos muito bem ir juntos no mesmo carro.

– Obrigada, mas eu posso pegar um uber – falou ainda séria.

– Isso não faz sentido. Estamos indo para o mesmo lugar!

Alice olhou rapidamente para Bruna, que se esforçou para manter uma aparência normal, não deixando transparecer o quanto estava incomodada com toda aquela situação.

– Isso não quer dizer nada – ele argumentou – É só uma carona!

– Tudo bem – finalmente ela respondeu depois de alguns segundos em silêncio – Eu me atrasei um pouco – Alice explicou – Entra um pouco enquanto eu coloco o vestido.

– Precisa de ajuda? – ele ofereceu e aquilo fez Bruna sentir uma raiva fenomenal subindo.

– Não – ela respondeu rapidamente, não dando nenhuma oportunidade de argumentação.

– Eu posso ajudar – Bruna ofereceu sem nem pensar – Não queremos que a sua maquiagem estrague.

Ela não ia deixar aquele cara colocar as mãos em Alice!

– Obrigada, Bruna – então virando para Gustavo – Você pode olhar os meninos rapinho?

– Claro! – ele falou prontamente e as duas entraram.

– Eu sinto muito por isso – Alice falou claramente sem graça quando chegaram no quarto.

– Não se preocupe! – Bruna tentou parecer não estar afetada pela situação e deu um sorriso leve para Alice.

Em silêncio Bruna ajudou-a a entrar no vestido e fechou o zíper em suas costas lentamente, aproveitando a proximidade com aquele corpo. Naquele momento, tudo que Bruna estava tentando manter longe de sua cabeça, veio como um furacão e ela sentiu-se um pouco ridícula por estar ali, arrumando aquela mulher linda para sair com o ex marido.

– Você está maravilhosa – ela falou com um tom muito mais gentil que gostaria, olhando como uma idiota para Alice.

– Eu tive uma ótima maquiadora – ela brincou e aproximou-se de Bruna, acariciando seu rosto gentilmente.

O seu coração pulou dez vezes mais rápido com o toque e o olhar que Alice direcionou para ela.

– Você vai ficar bem? – ela perguntou ainda gentil.

– Claro – Bruna respondeu esforçando-se para que o turbilhão de sentimentos de seu coração não ficasse em evidência.

 – Os meninos não devem demorar muito para dormir depois de comerem e você fica à vontade. Pode usar a banheira se quiser, abrir um vinho... O que quiser!

– Obrigada – Bruna falou sem saber muito bem o que dizer.

– Eu tenho que ir – Alice falou um pouco contrariada.

Tudo que Bruna queria naquele momento era falar para que ela não fosse. Que ficasse ali, entrasse na banheira com ela e dividisse um vinho. Mas ela sabia que não podia, então apenas concordou com a cabeça e as duas seguiram para a sala.

– Se divirtam! – Alice falou enquanto se despedia dos meninos – Qualquer coisa me liga – falou para Bruna.

– Muito obrigada! – Gustavo disse e eles saíram.

Enzo chorou um pouco quando a mãe saiu, mas nem aquilo conseguiu distrair Bruna da dor que estava sentindo no momento ao ver o lindo casal saindo pela porta. Ela se sentia uma intrusa naquela casa e naquela família. Eles tinham uma história, um amor, dois filhos lindos e uma vida inteira construída. Ela era apenas um sex* casual. Ela era apenas a professora das crianças e mais uma babá que havia entrado naquela história e acabaria se machucando se continuasse alimentando sentimentos que não eram para existir.

Fim do capítulo