Capitulo 24
YANA KIMI
- Filha, vamos juntos para casa, quero falar com você.
Meu pai me chamou antes que pudesse entrar no elevador. Estava ansiosa para ver Lívia, era a primeira vez que me permitia alimentar esperanças sobre nós. Afinal ela tinha me beijado. Algo tinha mudado, eu sabia que tinha.
- Pai, é muito importante? Tenho um compromisso.
- Na verdade, é um pouco filha. Que tal se eu te deixar no seu compromisso e no caminho conversamos? - Percebi o tom de preocupação do meu pai então concordei.
No caminho para a casa de Lívia meu pai falou sobre nossa filial em Nova York, disse que as coisas estavam crescendo por lá e que ele precisava que eu fosse lhe representar, cuidar de tudo por um tempo, fazer os negócios se estabelecerem por lá. Além de começar o meu mestrado.
Não era um bom momento, eu não queria viajar, muito menos começar meu mestrado agora. Não queria ficar longe de Lívia.
- Pai, eu entendo que é meu dever como vice-presidente da empresa, ficar a par de tudo e cuidar do nosso patrimônio. Mas não tem ninguém para ir em meu lugar? Não sei, talvez até o senhor pode ir, prometo que tomo conta de tudo por aqui. - Tentei argumentar, sabia que meu pai não me obrigaria a nada.
- Kimi, eu não sei o que está acontecendo com você, na outra noite você estava chorando. Só quero ajudar, achei que se passasse uma temporada em outro lugar, respirando novos ares, estudando, fazendo novas amizades, quem sabe não seria bom para você minha filha. - Ele me olhou apelativo.
Só conseguia pensar em Lili, não iria e não queria ficar longe dela. Jamais aceitaria viajar agora, não sem ter certeza que existe alguma chance para nós.
- Já estou melhor pai, naquela noite eu estava me sentindo cansada e sobrecarregada. São muitas mudanças ao mesmo tempo. Mas, prometo que já estou melhor. De verdade, tudo que preciso é ficar aqui. Não planejo começar o mestrado agora, acabei de me formar. Quero descansar um pouco e não quero ter novas amizades, gosto das que eu tenho aqui. Se quiser, posso supervisionar a filial de Nova York daqui mesmo, e ocasionalmente viajar para lá. Por favor, não me peça para sair daqui agora. - Suspirei frustrada.
- Tudo bem filha, não vou insistir. Você tem o direito de tomar decisões sobre a sua vida, só estou preocupado com você. Te vejo muito triste nesses últimos meses. - Conseguia ver o cuidado e amor nas palavras do meu pai.
- É impressão sua, estou bem. Como disse antes, é apenas todas as coisas que estão acontecendo, mas logo vou me adaptar e tudo vai ficar bem.
Fiquei aliviada quando meu pai compreendeu e aceitou minha decisão. Mudamos de assunto e o restou da caminho falamos sobre o meu final de semana, é claro que omiti a parte do beijo com Lívia, sei que podia conversar com meu pai sobre qualquer coisa, mas ainda não me sentia pronta.
Logo cheguei na casa de Lívia, me despedi do meu pai e caminhei até a porta de entrada. Toquei a campainha e aguardei a porta se abrir. Enquanto esperava, meu coração soava descompassado, minha mãos suavam e meu estomago dava voltas e mais voltas. A ansiedade de ver Lívia novamente tomava conta de mim.
O barulho da porta se abrindo interrompeu os meus pensamentos.
- Oi Kimi. - Lívia beijou meu rosto e segurou minha mão me puxando para dentro. - Vem, quero te mostrar uma coisa. - Ela me levou para o seu quarto. Quando chegamos ela me colocou sentada em sua cama. - Está pronta? - Sua voz era sussurrada como se estivesse prestes a me mostrar um segredo.
- Sim Lili, você está me deixando curiosa. - Ela foi até a sua gaveta e tirou de lá uma revista.
- Você sabe o quanto tenho uma admiração platônica por esse crítico né? - Ela abriu o jornal e me mostrou uma matéria de Allan Costa, ele nada mais era do que um dos críticos literários mais prestigiado do Brasil. Ela sempre teve fascinação por ele e por tudo que ele escrevia.
Ela começou a ler o que estava escrito no pequeno quadrado no canto da pagina 06 da Revista.
" Será que temos uma nova revelação da literatura Brasileira? Não serei precipitado quando digo que Lívia Duarte tem um escrita estimulante e desafiadora. A jovem de 22 anos trabalha na Editora Política e Economia Brasileira, vem desafiando a mídia com seus artigos empoderados e um tanto sarcásticos..."
Lívia continuou a ler enquanto caminhava de uma lado para o outro em seu quarto. Era hipnotizante ver o quão radiante ela estava. Só conseguia pensar no quanto ela ficava linda.
- Allan Costa disse que minha escrita é estimulante. - Ela se jogou na cama ao meu lado. - Você tem noção do quanto isso é importante para a minha carreira Kimi? - Deitei ao seu lado.
- Você merece Lili, sempre acreditei em você. E eles seriam idiotas se pensassem menos do que isso. - Ela sorriu com a revista em seu peito. Olhava para o teto, sonhadora.
- Obrigada Kimi. Minha mãe me mostrou assim que cheguei. A primeira pessoa que pensei em contar foi para você. - Ela virou de frente pra mim e eu a imitei.
- Obrigada por pensar em mim.
- Sempre penso em você. - Lili pareceu se dar conta do que tinha falado. - Quer dizer, quando tenho uma novidade para contar, você é a primeira a saber.
- Eu entendi. - Sorri e toquei no seu rosto em seguida ajeitando uma mexa de cabelo. Ela cobriu minha mão com a sua.
- Podemos fazer de novo? - De imediato entendi, mas queria que ela tomasse a iniciativa.
- Fazer o que? - Me fiz de desentendida.
Lívia aproximou seu rosto do meu, conseguia sentir a sua respiração quente encostar na minha pele. Não acreditava que ela iria me beijar novamente. Mal conseguia me conter em lhe puxar para perto de mim, mas me mantive quieta esperando ela iniciar o beijo. Seu toque foi cauteloso, quase um roçar de lábios, depois ela prendeu meu lábio inferior em sua boca e senti uma leve mordida, abri um pouco minha boca fazendo com que ela se sentisse mais a vontade para explorar cada canto. Sua língua era lenta e ritmada, o que me provocava uma série de arrepios. Ela não teve pressa alguma, me beijou lentamente por alguns minutos e depois finalizou com um selinho.
Se virou e encaixou o seu corpo ao meu, puxando a minha mão para que lhe envolvesse em um abraço. Meu coração dava piruetas e estava muito difícil ficar tão próxima a ela sem explorar cada parte dessas novas sensações.
- Eu gosto de ficar assim com você. - Ela disse.
- Eu também, gosto muito. - Enfatizei.
Logo sua respiração ficou leve. Apesar da minha mente agitada, procurei me acalmar colando mais ainda nossos corpos e inspirando o aroma do seu cabelo.
- Você me acalma sabia? - Disse quase sussurrando.
- Que bom. Gosto de saber que tenho esse poder.
- Você não tem noção de quanto poder tem.
Sabia que não devia ser tão rápida, não queria assustar Lívia, mas precisava saber o que ela estava sentindo ou o que tudo aquilo significava.
- Posso te fazer uma pergunta?
- Pode.
- O que estamos fazendo? O que significa pra você?
Lívia não respondeu nada por um tempo.
- Não acho que temos que pensar demais sobre isso. Vamos só deixar rolar.
Era tão difícil pra mim apenas deixar rolar, já tinha esperado tanto tempo. Para uma pessoa metódica como eu, aquela resposta só me deixou mais apreensiva e ansiosa. Mesmo assim respondi.
- Tudo bem.
- Vamos dormir agora, o dia foi muito cansativo. - Lívia disse já se acomodando .
- Boa noite Lili.
- Boa noite Kimi.
Dava para sentir que Lívia ainda estava acordada. Será que ela estava se sentindo pressionada? Não sabia como deixar mais claro o meu interesse, tudo que sempre fiz foi demonstrar o quanto ela era importante pra mim. Resolvi não divagar por aqueles pensamentos incertos. Fechei meus olhos e me forcei a dormir.
....
Após deixar Lívia no trabalho fui para a empresa. Tinha coisas a fazer que já estavam acumuladas por conta da pequena viagem do final de semana.
- Bom dia Senhorita Yana.
- Bom dia Sam, Você pode vir até a minha sala, por favor?
Entramos juntas em meu escritório. Deixei minha bolsa de canto e sentei em minha cadeira.
- Como está a minha agenda hoje?
- Você tem muitos compromissos hoje, três reuniões, o pessoal de designer precisa de aprovação para alguns projetos e seu pai pediu para lhe avisar que está passando a empresa Novais para você. Eles querem promover um novo lançamento de celulares e querem que você assuma todos os detalhes do evento. - Samantha disse.
- Quanta coisa, mas já esperava. Então vamos ao trabalho.
- Como foi sua viagem? - Samantha perguntou.
- Foi boa. - Liguei meu computador e comecei uma parte do meu trabalho.
- Não vai me contar os detalhes? - Minha secretária sentou na cadeira em frente a minha e me olhou fixamente.
- Você quer saber o que exatamente?
- A Lívia tá bem? - Quase ri do esforço que Sam fez para perguntar sobre Lívia.
- Sei que vocês não se dão bem, então não precisa fingir preocupação. Mas se você quer saber se fizemos as pazes, a resposta é sim.
- Não é bem assim, é a Lívia que não gosta de mim. Que bom que fizeram as pazes. - Ela fez uma cara de inocência.
- A Lívia tem os motivos dela e você não é nenhuma santa. Mas vamos deixar de falar sobre isso, veja se a sala está pronta para a reunião, vou só terminar isso e já saio. Também quero que consiga um local para o evento da Empresa Novais.
- Como quiser chefinha. - Samantha sorriu e se retirou da sala. No fim das contas eu gostava dessa petulância dela, era muito melhor do que falsidade. Pelo menos ela deixava claro as suas intenções.
O dia passou muito lentamente, uma reunião atrás da outra e muitos assuntos para ficar a par de tudo que estava acontecendo com a minha empresa. Mesmo com várias distrações, não deixei de pensar em Lívia. As coisas estavam diferentes do que eu tinha imaginado, ela não me mandou uma mensagem durante o dia todo, nem ao menos deixou um recado. Não espero que ela me dê satisfação de nada, mas para quem conversava todos os dias, várias horas por dia, era no mínimo estranho esse sumiço. Principalmente depois da noite passada.
Estava cansada de correr atrás dela, muitas das suas atitudes me deixavam confusa. Primeiro ela sente ciúmes, depois me beija, para que no dia seguinte fique estranha e inacessível. Era estranho ver esse lado de Lívia, porque como amigas sempre fomos inseparáveis, sei que ela é carinhosa, espontânea e brincalhona. Mas agora, é como um terreno novo e inconstante. Ela não fala muito, tá diferente. Ou talvez eu esteja só surtando por conta de tudo que está acontecendo entre a gente. Não devo ser prepotente, não sou o centro do universo dela, ela deve está com muito trabalho. Ainda mais depois da crítica que recebeu de Allan Costa.
Estava meio que surtando, os pensamentos me afligiam durante todo caminho até a casa de Cris. Ela me chamou para bater papo e beber um pouco.
- Entra gostosa. Pensei que não viria, tá tão sumida. - Falou me abraçando e colocando uma cerveja na minha mão.
- Deixa de drama, aconteceram muitas coisas, mas é claro que sempre vou ter tempo para você.
- Conquistadora como sempre. Mas me fala, o que está acontecendo? Pela sua cara não deve ser coisa boa. - Cris sentou no sofá e eu a acompanhei.
- Sei lá, seria mais fácil se as coisas fossem mais claras para mim entende-las.
- Não, seria mais fácil se você me contasse as fofocas com clareza. - Ela sorriu e coloca mais um pouco de vinho em sua taça.
- Eu e Lívia nos beijamos algumas vezes. Só que eu não estou entendendo nada.
- Sabia que ela estava escondendo o jogo. Aquela carinha de ciúmes na sua festa de formatura, nunca me enganou. E o que mais? - Falou empolgada.
- Não tem mais, ontem dormi na casa dela, mas não conversamos muito. Ela tá mais calada, hoje não me mandou mensagem durante o dia todo.
- Nossa Yana, vou te contar em, você tem um imã para meninas complicadas.
- Ela não é complicada, só preciso descobrir o que está acontecendo. Porque tem momentos que a conversa flui, sabe. Mas também tem momentos que ela se fecha e não consigo saber o que ela tá sentindo.
- Bom, eu não sou muito boa para dar conselhos. Olhe para a minha vida amorosa, uma perfeita loucura. Mas até eu sei que vocês precisam conversar mais. Você já contou o que sente para ela?
- Não. Ontem ela pediu pra gente deixar rolar, então não quero assustá-la.
- E você não vai tomar uma atitude?
- Como assim?
- Ai Yana, as vezes esqueço que você é lenta. Parte pra cima garota, flerta com ela, mostra que você tá a fim.
- Talvez você tenha razão, mas não sei o que fazer.
- Meu Deus! Ela é sua melhor amiga, devia conhecê-la melhor do que ninguém.
- Eu a conheço, mas esse é o problema. A conheço como minha melhor amiga, não sei o que fazer nessa situação. Nunca achei que ela me beijaria ou que mostraria interesse, já tinha perdido as esperanças e agora que realmente aconteceu, nem sei se já caiu a minha ficha. A Lívia sabe muito bem como esconder os sentimentos, não sei o que ela tá pensando, não sei como conduzir essa situação sem estragar tudo e não sei o que posso ou não falar. - Desabafei.
- Nossa, você tá pensando demais.
- Eu sei, sempre estrago tudo.
- Ei pode parando. A única coisa que eu sei é que a garota que você tá apaixonada a quase 6 anos, pela primeira vez te deu esperanças e você está aqui parada sem saber o que fazer. Se eu fosse você levantava essa bundinha linda e iria descobrir um jeito de esclarecer tudo, até porque você não é nenhuma estranha pra ela, seja você mesma.
- Você tem razão. - De repente as palavras de Cris me deixaram empolgada. Ela estava certa, o que eu estava fazendo? Precisava me abrir com Lívia e foda-se o resto. Já tem muito tempo que guardo tudo isso pra mim.
- Sempre tenho razão. - Ela tomou um gole do seu vinho e sorriu convencida.
- Vou concordar dessa vez, mas não fica se achando. - Levantei e lhe dei um beijo no rosto e depois fui em direção a porta.
- Ei, você está me devendo uma. Vou começar a cobrar essas sessões de terapia.- Ela gritou.
Apenas sorri e saí pela porta. Já chega de me esconder, eu iria tomar o controle da situação e me jogar de uma vez nesse amor que sentia por Lívia. Se não desce certo, pelo menos não teria arrependimentos.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]