21. Vamos encontrar sua mãe.
SOPHIE LOPES
Eu tinha vacilado. Não consegui me controlar. Quando descobri que o Mateus era o cara que Lara tinha passado a noite, simplesmente não me segurei e fui pra cima dele. Só consegui acertar um soco antes que Rick me segurasse.
A Elisa tinha razão. Lara já é uma adulta e eu preciso que me acostumar com a idéia de que ela tem uma vida sexual ativa. O pior é que não sei como vou concertar essa burrada.
Minha namorada, linda e maravilhosa, já tinha ido trabalhar. Ela passou a noite aqui em casa e combinamos que dormiríamos na sua casa essa noite. Então eu precisava encontrar a Lara para me desculpar. O problema é que minha irmãzinha saiu cedo e até agora não deu notícias. Tenho certeza que ela fez de propósito. Quando Lara fica chateada não tem quem a acalme. Ela não grita ou xinga, mas sim, se afasta e me ignora totalmente. Aquela pequena sabe muito bem como me deixar mal.
Hoje só teria uma sessão de fotos a tarde, por isso Flávia me pediu uma folga na parte da manhã. Ela falou alguma coisa sobre visitar um orfanato. Não entendi muito bem, mas Flávia sempre foi envolvida com ações solidárias, então não duvido que seja mais um dos seus trabalhos voluntários. Eu mais do que ninguém, sei o quanto a infância e adolescência da minha amiga foi difícil. Morar na rua e muitas vezes não ter o que comer. Além de todos os perigos que ela enfrentou. Eu admiro muito a Flávia e estou muito orgulhosa dela ter concluído a faculdade de jornalismo. Sei que esse é o seu sonho e vou apoiá-la no que for preciso. Ela merece ser muito feliz. Minha amiga é de ouro e quem ela escolher para compartilhar a vida, terá que ser muito bom, pois não consigo imaginar uma pessoa tão perfeita quanto ela.
POV FLÁVIA
- Você gostou do orfanato? - Renata me perguntou ao entrarmos no carro dela.
- Sim.
- Não sei, sua voz está triste. Acho que não foi uma boa idéia. Desculpe-me. - Eu realmente tinha adorado o local, as crianças tinha um bom programa de assistência social e muitas já tinham sido adotadas. Mas visitar aquele orfanato fez com que eu me lembrasse da minha infância.
- Eu gostei Renata. De verdade, foi muito inspirador.
- Então me fala, o que está te deixando assim tão tristinha? - Renata seguro na minha mão me reconfortando.
- Sabe quando você lembra de alguns momentos ruins e é como se o tempo não tivesse passado? Você pensa que superou, mas de uma hora pra outra tudo volta de novo. - Tentei lhe explicar o que eu estava sentindo.
- Você lembrou de algum momento ruim?
- Sim.
- Me conta?
- Quando eu tinha 10 anos, um casal queria me adotar. Eu estava super feliz. Finalmente teria uma família. Era tudo o que eu sempre sonhei. A documentação estava quase pronta e eu iria passar um dia com os meus novos pais. Eles me levaram para conhecer sua casa , me mostraram onde seria o meu quarto. Tudo estava perfeito, minha cama era rosa como muitos ursos de pelúcia. Me sentei e fiquei brincando com algumas bonecas. O homem veio sentar ao meu lado e disse que sua mulher estava fazendo o almoço. Ele brincou comigo e foi muito legal. Eu sempre quis saber qual era a sensação de ter um pai. Foi então que ele fez algo que me assustou. Passou a mão na minha coxa. Eu não sabia o que fazer. - Renata me olhava aflita e continuava a segurar minha mão. Não sei por que estava lhe contando aquilo. Nunca tinha falado com ninguém sobre essa história, nem mesmo com soph.- Ele subiu até as minhas partes íntimas e falou: Esse vai ser o nosso segredo e eu sei que você vai gostar.
- Meu Deus Flá, ele abusou de você? Que raiva. Eu sinto muito. - Renata estava revoltada.
- A esposa dele chegou no quarto e ele disfarçou. Depois do almoço eles me levaram de volta para o orfanato. Eu não sabia o que fazer. Não queria ir morar com eles, estava com muito medo e assustada. Pedi para falar com a diretora do orfanato, a tia Sílvia, mas ela já tinha ido embora. Decidi que fugiria e não iria morar com aquele homem. Esperei todos dormirem e pulei o muro. Já tinha feito aquilo várias vezes, mas dessa vez eu não iria voltar. - Tentei segurar a dor que sentia todas as vezes que lembrava da minha infância, mas as lágrimas começaram a cair sem que eu pudesse controlar. Renata me abraçou.
- Me desculpa Flávia, não devia ter inventado essa visita. Por favor, não chora. - Ela estava aflita.
- Não Renata, foi bom. Eu precisava disso. Estava tão focada no meu TCC que acabei esquecendo do meu verdadeiro objetivo. Agora estou mais certa do que quero fazer. Obrigada.
- Tem certeza?
-Sim. Eu estou melhor agora. Obrigada. - Renata me soltou, mas continuou a tocar em minha mão.
- De nada. Me conta uma coisa? -Ela perguntou.
- O que?
- Você ainda viu aquele homem depois daquele dia?
- Uma vez. Eu estava vendendo bala no sinal. Ofereci para algumas pessoas e vi ele em um dos carros. Me escondi até que ele fosse embora. Fiquei com tanto medo dele me reconhecer e me levar embora. Eu não tinha ninguém pra se preocupar comigo.
- Flá, sei que nos conhecemos ontem, mas pode contar comigo. Ok? Sempre que quiser conversar ou só desabafar eu vou está disponível. Esse é o meu número. - Renata me entregou um cartão. - Você pode me ligar a qualquer hora.
- Obrigada, você é uma amiga muito boa. - Peguei o papel e ela sorriu. Renata ligou o carro e seguimos em direção ao estúdio. Não falamos muito no caminho, mas eu me sentia muito confortável com ela e o silêncio foi bom para eu me recompor.
SOPHIE LOPES
Porque ela não atendia o celular? Eu já estava preocupada. Sei que Lara é teimosa, mas ela nunca me ignorou por tanto tempo. Sempre nos resolvemos depois de alguns minutos. A chamada caiu na caixa postal mais uma vez. Que raiva!
Deixo o celular na mesa e começo a preparar o estúdio para a sessão de fotos.
Flávia não demorou muito pra chegar. O que me deixou surpresa foi ver Renata com ela. O que aquela mulherzinha estava fazendo aqui?
- Oi amiga. - Flávia me cumprimentou com um beijo no rosto.
- Oi Flá. O que ela tá fazendo aqui?- Sussurrei enquanto observava Renata mexendo na minha estante de livros.
- A Renata me levou pra visitar um orfanato que ela dá assistência. Ela é uma pessoa legal Soph.
- Você é tão inocente Flávia. Essa mulher não presta.
- Sophie, você nem a conhece. Como pode falar assim? - Minha amiga sussurrou.
- Eu não gosto dela. - Falei chateada.
- Sinto muito Soph, você vai ter que se acostumar com a presença da Renata porque agora somos amigas.
- Não acredito que até você caiu na lábia dela.
- É tão bonitinho ver vocês fofocando sobre mim. - Renata falou nos assustando. Ela era tão debochada.
- Não estamos falando de você. - Menti.
- Ah não? Pensei ter ouvido meu nome.
- Você se acha o centro do universo, não é mesmo? - Falei provocativa.
- Soph. - Flávia chamou minha atenção.
- Tudo bem Flá. A Sophie só está se sentindo ameaçada.
- Por você? Até parece. - Ela me dava nos nervos.
- Vamos continuar o trabalho que é melhor. - Minha amiga me empurrou para a minha mesa e foi até Renata. Não consegui ouvir sobre o que elas conversavam, mas o assunto parecia interessante porque as duas sorriam que nem bobas. Logo Renata foi embora e eu me senti mais a vontade.
******
A tarde passou lentamente. Já estávamos fechando o estúdio e nada da Lara aparecer. Onde essa menina se meteu?
- Ela vai voltar Soph. -Flá tentou me acalmar.
- E se tiver acontecido alguma coisa? -Falei aflita.
- Não aconteceu nada, Lara está bem. Agora a pouco ela respondeu uma mensagem minha.
- Então quer dizer que pra você ela responde? -Falei indignada.
- Soph. Dá um tempo pra sua irmã.
- Tá, eu vou parar. Sei que pisei na bola. - revirei os olhos. -Mas vamos parar de falar sobre mim e vamos falar de você.
- De mim?
- Não se faça de desentendida. Desde quando você e a Renata são amigas?
- Desde ontem. Você estava lá lembra? Ela me deu uma carona e conversamos um pouco. A Renata é uma boa pessoa, ao contrário do que você pensa.
- Nossa, onde a minha amiga doce e meiga se meteu? -Falei irônica.
- Desculpa, eu não estou muito bem.
- O que aconteceu?
- A visita no orfanato fez com que eu me lembra-se de alguns momentos ruins da minha infância. - Flávia sentou no sofá e abraçou uma almofada.
- Quer conversar? - Sentei ao seu lado.
- As vezes me pergunto quem é a minha mãe? Será que ela se arrepende de ter me abandonado? Eu não sei muito o que pensar. Talvez ela não tivesse condições de me criar ou fosse muito nova e não tivesse ninguém para apoiá-la. Não sei, acho que só estou tentando me convencer de que ela teve um bom motivo. Sabe, quem é que abandona sua própria filha?
- Flá, eu não sei quais foram os motivos dela, mas eu sei que você é a pessoa mais forte que eu conheço. Superou tantas adversidades. Cuidou de si durante todos esses anos e agora vai se formar na faculdade. Eu e o Rick somos sua família e estamos orgulhosos.
- Obrigada Soph, sei que você é a única que pode me entender.
- Sabe, mesmo que eu não tenha conhecido minha mãe biológica, eu tenho uma mãe de coração que me adotou e me ama muito. Eu não trocaria minha família por nada nesse mundo. E você teve a Nana, pelo que sei, ela te amou como uma mãe e até deixou tudo o que tinha pra você.
- Sim, a Nana foi a mãe que eu nunca tive. Os cinco anos que morei com ela foram muito especiais. Ela era atenciosa e carinhosa. Mesmo sem ter muitas condições ela me ajudou a terminar o ensino médio e sou muito grata.
- Mas?
- Não sei, sinto que devo encontrar minha mãe biológica. Alguma coisa me diz que ela não queria me abandonar.
- Você acha que ela foi obrigada?
- Pode ser uma possibilidade não é?
- Mas ela sabia onde você estava Flá. Porque ela não te procurou? Não foi ela que te colocou na porta do orfanato?
- As freiras disseram que não viram quem foi. Alguém tocou a campainha e quando elas abriram a porta não tinha mais ninguém além de mim.
- Porque eu não sabia disso?
- É só um detalhe. Nada de mais.
- Como assim nada de mais Flávia? Essa pode ser a resposta que você tanto procura.
- Do que você está falando amiga?
- Você acabou de dizer que quer encontrar sua mãe. Não temos certeza se ela queria te abandonar. As freiras não viram ninguém na porta. Eu já sei o que vamos fazer. - levantei do sofá e caminhei até o meu notebook.
- Soph, não estou gostando desse olhar. O que você vai fazer?
- Vamos contratar um detetive e encontrar sua mãe.
ELISA FRANCO
Depois de horas costurando consegui aprontar minha mais nova obra prima. Um terno feminino. Essa era uma das peças da minha nova coleção. Algo mais ousado e atual.
- Ficou incrível Elisa.
- Obrigada Levi. Eu estou tão inspirada. Não sei o que está acontecendo comigo.
- Talvez a sua namorada tenha alguma coisa a ver com isso. - Apesar do meu assistente não saber da minha sexualidade ele já tinha me visto com a Soph muitas vezes. Devo admitir que não éramos muito discretas. Levi era um rapaz discreto. Não conversávamos sobre nossa vida pessoal, mas eu tinha minhas suspeitas que ele também era do vale.
- Acho que você tem razão. Ela é minha maior inspiração. Facilmente eu vejo a Soph usando esse terno. A cor também é a sua preferida, azul claro, como o mar.
- Se me permite dizer senhorita Elisa. Eu acho vocês um lindo casal.
- Obrigada Levi. Você é muito gentil. - Meu telefone começou a tocar. Pedi licença para atender, era o Mateus.
- Oi Mat. Tudo bem?
- Elisa, aconteceu uma coisa.
- O que foi?
- Lembra daquela proposta de emprego em Londres?
- Lembro.
- Eles me chamaram Lizzy. Querem
que eu vá para a Inglaterra hoje mesmo.
- Hoje? Tão rápido.
- Eu sei. Mas eu não posso perder essa oportunidade. Esse é o emprego dos meus sonhos.
- E a Lara Mateus? Você gosta dela?
- Não sei Lizzy.
- Você já contou pra ela?
- Não. Eu sei que a irmã dela é sua namorada, mas não é como se eu tivesse tirado a pureza da Lara. Estávamos afim e dormimos juntos. Só isso.
- Porque sinto que está fugindo? É por causa do que aconteceu com a Mariana?
- Isso não tem nada haver com ela Elisa.
- Você não teve culpa Mat.
- Elisa, eu já estou no aeroporto.
- Não faz isso Mateus. Ao menos liga para a Lara e explica o porquê de você está indo embora. Tenho certeza que ela vai entender.
- Elisa, eu não sou bom pra ela. Vai ser melhor assim.
- Você tem certeza do que tá fazendo?
- É o melhor.
- Tudo bem.
- Elisa, é o certo a se fazer.
- Tenha uma boa viagem amigo. Estou feliz por você, sei que trabalhou muito por essa vaga. Se cuida e me manda notícias.
- Ok Lizzy. Obrigada por tudo. Beijos.
- Beijos.
Eu não acreditava que o Mateus estava realmente indo embora. O pior é que eu não podia impedir. Isso não era uma decisão minha. Eu não sei o quanto a Lara gosta dele, ainda não conversamos sobre. Mas pela forma como ela enfrentou a Soph na praia eu diria que o os dois tiveram bem mais do que parece. Conheço o Mateus, sei que ele estava me escondendo alguma coisa. Não sou de me meter na vida do meu amigo, mas desde o que aconteceu com Mariana ele nunca mais foi o mesmo.
Meu celular tocou novamente. Espero que seja o Mateus e que ele tenha mudado de idéia.
O nome da minha namorada apareceu na tela. E agora, como eu iria contar que o Mateus foi embora? Que droga Mat! Você poderia ter sido menos covarde.
Fim do capítulo
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