Capitulo 31
Nunca Te Amarei -- Capítulo 31
João Vitor virou as costas e caminhou para o interior da empresa, desaparecendo do campo de visão dela, Luciana se sentiu desanimada sem saber o que fazer.
Jefferson apareceu minutos depois e sentou-se ao seu lado. Luciana sorriu expressando a satisfação pela companhia dele e estava sendo sincera. Sentia necessidade de desabafar seus problemas com alguém. Problemas que pioraram muito desde que ela e Kristen começaram a namorar.
-- O que faz aqui tão sozinha?
-- Buscando um pouco de paz -- ela riu, mostrando o pacote de sanduíches -- Ainda tenho um sanduíche, vai querer?
-- Não, obrigado -- ele riu e tirou do bolso um chiclete -- acabei de almoçar. Quer um chiclete?
Ela balançou a mão recusando.
-- Vim comer o meu sanduíche aqui no jardim porque precisava de um pouco de silêncio, de paz de espírito. Tudo normal.
Jefferson ficou um pouco em silêncio observando os pássaros alvoroçados com a quantidade de migalhas que Luciana deixou cair no chão.
-- Mas a preocupação que vi em seu rosto quando vinha me sentar aqui não me pareceu tão normal. E nem essa busca de paz de espírito de que falou há pouco.
Ele era um amigo verdadeiro. Luciana pensou. Nem a própria família a conhecia de tal forma.
-- Esse lugar é maravilhoso, os pássaros cantando transmitem algo divino, inocente e me fortalece para voltar ao trabalho mais focada.
Um a um os passarinhos vieram. Pareciam não ter nenhum medo de gente, acostumados por anos e anos de contato próximo. Luciana ficou assistindo, sorrindo, mas sentindo-se ainda incomodada por mentir ao amigo.
-- Aqueles relatórios que você está investigando -- ele falou de repente -- Já conseguiu descobrir algo comprometedor?
-- Comecei a revisá-los hoje.
-- E onde é que guardou?
-- Na gaveta da mesa, trancada. Por quê, Jeff? -- ela perguntou, preocupada, esperando por uma resposta que não veio.
-- Faça tudo com bastante cautela, nunca se sabe de que essas pessoas são capazes -- ele parecia preocupado.
-- Não tenho medo do senhor João.
-- Não é dele que tenho medo.
-- Você acha que tem mais alguém com ele?
-- É uma possibilidade -- disse Jeff, muito sério.
Luciana pegou o pacote de cima do banco.
-- Vou voltar para o escritório, minha hora de almoço acabou.
O telefone tocou quando Luciana estava lavando a louça da janta. Tinha passado uma tarde inquieta. Kristen estava treinando para a quarta etapa da Taça Brasil de surf em Matinhos, então, nem havia aparecido na empresa. Temia que pudesse ser João Vitor e suas ameaças, mas também podia ser Kristen, por isso, terminou correndo para atender.
-- Luciana? -- era a voz de Jefferson.
-- Eu mesma. Jeff? -- ela não conseguia esconder a ansiedade da voz -- O que aconteceu?
-- Estou telefonando para pedir a você que venha agora mesmo até o meu apartamento.
-- Porque? Pra que?
-- Confie em mim, quando chegar aqui eu respondo às suas perguntas.
Luciana disse que sim e saiu correndo pegar a chave do carro. Jefferson é um brincalhão, mas não ao ponto de fazê-la sair de casa tarde da noite sem um motivo real.
-- Entre, minha querida -- ele disse.
Luciana ficou olhando, séria e curiosa. Seus olhos estavam nele enquanto atravessava a sala.
-- O que é tão importante que não pode ficar para amanhã na empresa?
-- Contratos, minha deusa. Contratos com somas absurdas desviadas bem debaixo do nosso nariz e, absolutamente incompreensíveis para alguém sem formação científica -- disse Jefferson, rindo.
Jefferson levou-a pela sala, com um braço em torno de sua cintura, explicando as várias mutretas que estavam sendo realizadas na empresa.
-- Vamos para o meu quarto -- ele a levou pela mão para uma grande porta entalhada -- Eu tirei essas cópias quando ainda estava trabalhando no setor financeiro -- assim que entraram ele retirou o braço que estava no ombro dela, o sorriso desapareceu -- Aparentemente não tem nada de errado com esse contrato -- pararam diante de uma pequena escrivaninha no canto do quarto -- Porém, os dados bancários não conferem com o do cliente.
Luciana pegou o papel e leu-o rapidamente. Jefferson chamou a sua atenção para um detalhe.
-- Veja a segunda assinatura -- ele balançou a cabeça -- A Kristen tem que assumir as rédeas da empresa, antes que eles a levem a falência.
Na tarde de sexta-feira. Luciana sentia que a semana não ia acabar nunca. Tinha almoçado com Jefferson e ele lhe perguntou quando contaria a verdade para Kristen.
-- Estou guardando a melhor ocasião -- ela riu, sem jeito.
-- Isso quer dizer que ainda vai demorar.
Por um momento, Luciana não respondeu ao comentário do amigo. Queria dizer que não, mas seria verdade?
Chegou em casa cansada, atirou a bolsa numa cadeira e ia para a cozinha quando a campainha tocou. Correu para a porta com o rosto iluminado.
-- Olá, minha gostosa! -- Kristen agarrou-a pelos ombros e puxou-a para si.
Luciana aconchegou-se no abraço quente. Quando Kristen a soltou, havia nos olhos verdes um brilho que ela nunca tinha visto. E o sorriso nos lábios dela parecia um raio de sol.
-- Onde esteve o dia inteiro? Podia pelo menos ter ligado -- disse aborrecida -- Nunca desapareça sem me avisar onde está, por favor.
Kristen a olhou boquiaberta, lembrando-se de que havia dito onde estava.
-- Não pensei que fosse ficar preocupada, desculpe -- ela se justificou.
Quando Kristen havia desaparecido, sua primeira reação não tinha sido de preocupação e sim de ciúmes. Pensar que qualquer outra mulher pudesse estar com ela, tocando sua pele, desfrutando de seu perfume, a fizera sair do sério. Mas, que direito ela tinha de sentir ciúmes?
-- Minhas intenções foram boas, Lú -- ela se desculpou com voz doce -- Você deve confiar em mim.
Seus olhares se cruzaram. Luciana fez um leve movimento com os ombros, como se concordasse.
-- Você tem razão, não sei o que deu em mim. Juro que não sou assim.
Kristen segurou as mãos de Luciana entre as suas e as afagou com carinho.
-- Eu te entendo, o meu passado me condena -- ela riu e cantou:
Eu sosseguei
Ontem foi a despedida da balada
Dessa vida de solteiro
Eu sosseguei
Mudei a rota e meus planos
O que eu tava procurando
Eu achei, em vocêêê... (Jorge e Mateus)
Luciana sorriu. Uma onda de ternura a assaltou enquanto olhava para aquele rosto delicado.
-- Tá bom -- ela disse, sentindo-se tola -- Vamos para a cozinha, a mamãe fez uma sobremesa de leite ninho, maravilhosa!
-- Hum, delicia!
Seguiram em direção a cozinha.
-- Onde está todo mundo? -- perguntou Kristen sentando-se em uma das cadeiras.
-- A mamãe e o Dudu foram até a casa da minha tia, a Laura, foi em uma festa na Lagoa -- caminhou até a geladeira, pegou a tigela com a sobremesa e colocou sobre a mesa.
Kristen balançou a cabeça, com seu cabelo encaracolado batendo nos ombros.
-- Falando em festa, estou programando uma para amanhã à noite em meu apartamento. Convidei alguns amigos. O que você acha?
-- Porque está me perguntando o que eu acho?
Kristen não entendeu muito bem a pergunta, mas respondeu mesmo assim.
-- Porque você é a minha namorada. Quero saber a sua opinião -- ela disse, séria.
-- Não acha que é tarde para perguntar a minha opinião? A festa já não está confirmada?
-- Pensei que você gostaria de conhecer os meus amigos.
Luciana cruzou os braços sobre os seios.
-- Como posso namorar uma mulher que pede a minha opinião sobre uma festa depois de já ter chamado os convidados?
Kristen bufou irritada.
-- Da mesma forma que eu namoro uma mulher que não confia em mim.
-- Eu confio em você, sua maluca.
-- Não, não confia -- retrucou Kristen.
Luciana explodiu.
-- Eu não vou à sua maravilhosa festinha. Chame a sua assessora sexy. Garanto que os seus amigos preferem muito mais ela do que eu.
Luciana voltou-se para sair da cozinha, mas Kristen segurou-a pelo braço.
-- Para com isso, Lú. Você está sendo infantil.
-- Infantil? Eu? Quem fala! -- Luciana saiu da cozinha pisando duro. Kristen a seguiu.
-- Eu só bolei essa festinha com a intenção de apresentar a minha namorada aos meus amigos -- murmurou Kristen, aproximando-se dela e passando o braço pela sua cintura -- Eu nunca fiz isso antes com nenhuma garota.
-- Acredito -- ela disse de forma irônica, desviando o rosto do beijo que Kristen tentava dar -- Não adianta insistir, eu não vou na festa.
Kristen virou-se e foi embora. Luciana ficou falando sozinha.
Um sono cheio de sonhos inacreditavelmente coloridos, que faziam sua cabeça se mover, inquieta, de um lado para o outro, os lábios murmurando palavras incompreensíveis. Estava deitada nua ao lado do corpo lindo e também nu de uma mulher. Para seu total encantamento, ela reagia a seus toques apaixonados com um ardor e sem inibição, os seios eram macios e quentes. Quando curvou-se sobre ela com os lábios levemente abertos, prontos para receber o calor de sua boca, acordou assustada.
-- Caramba, que sonho foi esse, que mulher é essa! -- levantou-se e foi para o banheiro. O que precisava agora era de um longo e frio banho de chuveiro. O sonho foi tão intenso, a mulher com quem estivera fazendo um amor tão apaixonado era incrivelmente quente.
-- Céus! -- exclamou, olhando para o relógio do celular. Era sábado e isso significava que era o dia da festa e tinha um milhão de coisas para resolver. Pegou o notebook e desceu para cozinha, onde o aroma de café fresco era maravilhoso. Rick estava sentado à mesa da copa, e estudou-a por um longo momento.
-- Bom dia -- ele disse, com um sorriso largo.
-- Bom dia -- ela respondeu, sentando-se -- Como estão os preparativos para a festa? -- serviu-se de café e adicionou açúcar.
-- A empresa que contratei para preparar a festa, vai chegar daqui a pouco, todos já confirmaram presença -- Rick selecionou torrada, frutas e iogurte, enquanto respondia: -- Falta alguns detalhezinhos que eu vou resolver pela manhã.
-- Estou confiando em você, hein. Sei que não existe ninguém melhor em preparar festas, portanto, não me decepcione -- Kristen consultou o relógio, bebeu o restante de seu café e se levantou -- Preciso ir.
-- Sou o melhor mesmo -- disse Rick, orgulhoso de si mesmo -- Não se preocupe.
-- Então tá -- murmurou ela levantando a cabeça -- Quero uma festa perfeita, como todas as outras -- ela pegou seu notebook, despediu-se de Rick, então, saiu da cozinha.
Rick bebeu mais um pouco de café puro, pegou seus pertences e saiu para cuidar de seus afazeres.
Eram quase oito horas e Luciana ainda estava deitada no sofá, tentando assistir a um filme na televisão. Vestia um pijama curto e estava comendo um pedaço de chocolate.
Estava com a boca cheia de chocolate quando Laura entrou na sala vestida elegantemente.
-- O que você faz aí deitada? Porque ainda não está pronta? -- perguntou Luciana, olhando-a dos pés à cabeça.
-- Não vou à festa -- ela disse, mordendo o chocolate com raiva.
-- Tá louca! A Kristen organizou esta festa para apresentar você aos amigos.
-- Eu não vou, já disse.
Laura perdeu a paciência, agarrou-a pelo braço e arrastou-a para o quarto. Abriu o guarda-roupas e cruzou os braços no peito.
-- Escolha o vestido mais elegante que você tiver.
-- Não -- disse Luciana, com firmeza -- Não vou escolher roupa nenhuma.
-- Então tá -- Laura voltou-se para as roupas e separou alguns cabides, olhando os vestidos -- Este aqui é maravilhoso -- disse, tirando um vestido azul, decotado nas costas, de alças finas.
-- Não posso usar isso -- ela protestou -- Esse vestido é inadequado para uma festinha.
-- Não é uma simples festinha, é uma festa chique, com gente importante e bonita.
-- Já disse. Eu não vou, que se dane! -- bateu o pé, irritada.
Laura já estava perdendo a paciência.
-- Se você não for à festa da Kristen, eu conto para a mamãe que você está namorando uma mulher.
Luciana arregalou os olhos, perplexa.
-- Isso é chantagem, você não faria isso!
Laura foi em direção à porta e abriu-a, com um sorriso maldoso no rosto.
-- Repete.
Luciana suspirou e, por fim, aceitou. A irmã era capaz de tudo.
-- Não! Pare. Eu sei que perdi -- mantinha os braços cruzados sobre os seios.
-- Ah, finalmente.
-- Muito bem. Mas você vai ter que sair. Tenho que me vestir, maquiar, pentear e não quero ninguém me perturbando.
-- Tudo bem, mas não demora muito -- ela disse, sorrindo.
-- Vinte minutos -- falou, sem levantar os olhos do vestido.
Uma hora depois, elas pararam diante da porta do apartamento de Kristen.
-- Desemburra, Lú -- pediu Laura, apertando a campainha.
-- Me deixa.
Kristen abriu a porta para elas.
-- Que bom que chegaram, estava começando a pensar que não viriam.
Luciana revirou os olhos.
-- Vim praticamente obrigada.
Kristen levantou os braços.
-- Ainda tá nessa?
Do lado oposto da sala um senhor de cabelos grisalhos olhava fixamente para elas. Era alto, esguio apesar da idade, e havia algo de muito familiar em seu rosto. Bem vestido e elegante, era evidente que devia ser algum familiar da Kristen.
-- Vem, quero te apresentar ao pessoal.
Kristen levou Luciana pela mão, apresentando-a a várias pessoas. Havia muitos jovens, rapazes e garotas bonitas. A maioria deles não conhecia.
-- Luciana -- disse Kristen -- Este é meu avô, Francesco. Vô, esta é Luciana. Ela entendeu então a sensação que tivera de já conhecer aquele senhor que encontrava pela primeira vez. Tinha a mesma altivez do filho nos olhos claros, mas suas maneiras eram cálidas e generosas, nada parecidas ao gelo de Arthur.
-- Kristen já falou tanto de você, que parece que a conheço há anos -- disse Francesco Donati, sorrindo carinhosamente -- Mas estou vendo que é ainda mais bela do que ela falou.
Como será que Kristen a havia descrito para o avô? Pensou Luciana. Será que disse que eram amigas ou namoradas?
Francesco curvou-se ligeiramente e pegou a mão de Luciana.
-- Espero que minha neta a esteja respeitando -- Francesco riu, vendo a expressão de Luciana -- Kristen sempre foi assim. Não se apega e não assume compromisso -- disse o avô, carinhoso -- Enfim, acho que é assim mesmo. Cada geração tem a sua maneira de cortejar as mulheres.
-- Cortejar, vovô? Que palavra antiquada.
Luciana fuzilou Kristen com os olhos castanhos.
-- Não é antiquada, não! Acho muito romântico.
-- Gostei de você -- disse Francesco, rindo -- Enfim, alguém que pode domar a minha neta.
Kristen balançou a cabeça. Abriu a boca para falar algo, mas alguém a puxou para conversar sobre o próximo circuito de surf.
-- Você é muito bonita -- Francesco disse, sorrindo com muito charme -- Carinha de bravinha, mas muito bonita.
Luciana sorriu do modo como ele falou.
-- Não sou brava, essa cara é porque fiquei muito zangada com a Kristen por ter marcado essa festinha tão em cima da hora -- explicou Luciana, simpática.
Francesco olhou ao redor para ver se alguém escutava a conversa. Satisfeito, curvou-se e perguntou em voz baixa:
-- Você já trabalhava na empresa quando o meu filho era presidente?
Luciana surpreendeu-se com a pergunta, mas respondeu calmamente.
-- Sim, trabalhei há muitos anos com o senhor Arthur.
Francesco passou a mão pelo queixo bem barbeado, olhou novamente ao redor e apontou para a porta de vidro que dava para a sacada.
-- Podemos conversar em um lugar mais tranquilo? Acho que você poderá me ajudar a entender alguns detalhes sobre a morte do meu filho. Confesso que ainda não assimilei a perda, a forma como aconteceu. Conversei por telefone com Arthur um dia antes e ele fazia planos audaciosos para o próximo empreendimento da empresa. Não entendo o que pode ter acontecido.
Luciana engoliu em seco, um único pensamento gritando em sua mente: Vou me complicar.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]