Sabrina voltou para casa mais cedo do que o costume naquele sábado depois de mais uma briga com o Fábio. Por que ele insistia em morarem juntos? Tudo estava ótimo do jeitinho que estava. Eles passavam muitas noites juntos já, não era o suficiente? Apesar de se sentir bem em seu apartamento, ela não via o local como sua casa e ela definitivamente não estava pronta para abrir mão do seu espaço.

            Ela estranhou o carro diferente estacionado em frente a casa que destoava da vizinhança, mas logo assumiu que era da mulher que encontrou no sofá da sua sala, junto da sua irmã. Bruna estava dormindo deitada em seu colo e logo que abriu a porta, conseguiu ver a ruiva olhando para sua irmã ao invés da televisão ligada. Sabrina não conseguia dizer se era ela que estava mais surpresa ou a mulher estranha que pareceu ter quase pulado do sofá com a sua chegada.

            – Você deve ser amiga da Bruna – ela falou tentando quebrar o silêncio.

            A mulher olhou para ela ainda assustada, mas respondeu com um simples sim.

            – Eu sou a irmã – Sabrina achou melhor esclarecer.

            A feição de dúvida e surpresa era algo com o qual ela já estava acostumada. Se ela ganhasse uma moeda para cada olhar de estranhamento das pessoas ao descobrirem que ela e Bruna eram irmãs, ela teria o suficiente para comprar uma mansão. Ainda assim, ela odiava e aquilo fez o seu humor piorar.

            Bruna acordou com o barulho e Sabrina movimentou-se até a cozinha.

            – Você chegou mais cedo – ela comentou enquanto se espreguiçava.

            Sabrina abriu a geladeira, deparando-se com vários recipientes de um restaurante caro. “Não sabia que estávamos ricas agora”, ela revirou os olhos agora que não estava mais no campo de visão da irmã e da madame que estava com ela.

            – Eu tenho uns trabalhos para avaliar – mentiu rapidamente pegando uma garrafa d’água e fechando a geladeira.

            A casa era pequena e a geladeira ficava bem perto da porta que dividia a cozinha e a sala, com isso ela conseguia ver as duas ajeitando-se no sofá, um pouco sem graça com a sua presença.

            – Mas eu posso fazer isso do meu quarto e você pode ficar aqui com a... – falou querendo saber o nome da madame de quem ela definitivamente não havia ido com a cara. Era melhor ficar longe em seu quarto.

            – Alice – a mulher se apresentou tentando parecer simpática, mas a primeira impressão foi o que grudou na mente de Sabrina.

            Aquele nome não era estranho. Sua irmã não havia falado de uma Alice antes?

            – Esse não é o nome daquela mãe que você odeia? – ela falou lembrando-se de alguma conversa que teve com Bruna.

            Aparentemente aquele comentário não foi a sua melhor ideia. Sua irmã olhava para a madame com uma feição sem graça e culpada.

            Aquela mulher era a Alice que Bruna odiava? Merda!

            =====

            Bruna a odiava. Foi o que a sua irmã disse. Aquilo doía. Alice sabia que não havia sido a melhor pessoa com Bruna e que as duas tiveram seus desentendimentos, mas ódio? Aquilo era um pouco demais e doía. Não que ela estivesse realmente começando a ter sentimentos por Bruna. Não mesmo! Mas elas dividiam tantos momentos íntimos... Não só sex*. Alice conseguia se abrir com ela mais do que fazia com a grande maioria das pessoas. Ela achava que estavam pelo menos virando... amigas? Por isso ouvir que Bruna a odiava incomodava, mais do que deveria.

– Então você me odeia? – ela falou tentando usar um tom de brincadeira, sem ter certeza se havia conseguido.

A menina olhava para ela claramente sem graça, sem saber o que dizer. O olhar fugia do seu e ela viu a raiva com que se virou para sua irmã, que rapidamente bebeu um gole de sua água, arrependida de ter aberto a boca.

– Isso foi antes... – foi o que Bruna conseguiu falar.

Aquilo não pareceu amenizar o desconforto de Alice.

– Desculpa – A irmã falou com uma expressão que era uma mistura de legítimo arrependimento e divertimento.

– Tudo bem – Alice falou no automático, tentando sorrir e fingir que ela não estava realmente incomodada com aquela nova informação – É melhor eu ir.

Levantou-se do sofá porque ela simplesmente precisava sair de lá. Não podia deixar a menina reparar o quanto aquilo havia deixado ela incomodada.

– Eu tenho um compromisso em algumas horas – inventou.

– Não pode ficar mais um pouco?

O olhar quase suplicante teria feito efeito dez minutos antes, quando ela queria passar o fim de semana inteiro agarrada a Bruna.

– É melhor eu ir logo, vou pegar minhas coisas – virando-se para a irmã, forçou um sorriso – Um prazer te conhecer.

Ela subiu as escadas até o quarto de Bruna e a menina seguiu-a rapidamente.

– Você não precisa ir só porque a minha irmã chegou – falou enquanto ela rapidamente pegava suas coisas.

– Eu teria que ir mesmo – mentiu.

Bruna ficou analisando-a por alguns segundos.

– Você ficou chateada com o que ela falou?

– Não, não – falou logo tentando fingir que era bobagem, mas a menina olhou para ela duvidando.

– Eu já disse, eu falei aquilo antes... disso – falou sem saber exatamente como definir o que tinham.

– Está tudo bem – fingiu uma segurança que não tinha – Não se preocupa – forçou um sorriso.

Bruna não parecia totalmente convencida, mas Alice caminhou para a saída querendo encerrar a discussão e Bruna não tocou mais no assunto.

Tentando ignorar o desconforto em seu coração, saiu de lá o mais rápido possível.

=====

– Que porr* foi essa, Bri? – Bruna gritou com a irmã assim que Alice saiu.

Por que diabos ela foi falar aquilo? Não havia nenhuma necessidade!

– Eu que devia te perguntar isso! Você está saindo com a mãe de um aluno?

Ela odiava aquele olhar julgador vindo da sua irmã.

– Não é nada demais!

– Estar em uma relação com a mãe de um aluno seu não é nada demais? É no mínimo antiético!

– Eu não estou em uma relação com ela! Não é nada sério!

Ela e Alice nunca teriam nada sério. Era só algo divertido, sem compromisso, sem preocupações. Não havia nada de errado com aquilo.

– É só sex*! – completou.

Sua irmã riu de forma irônica.

– Não foi o que pareceu quando eu cheguei e vi as duas agarradinhas no sofá.

Elas só estavam descansando um pouco depois do almoço. O sex* ia acontecer!

– Eu não entendo – a irmã continuou – Ela azucrinava você! Não é ela que tem um filho autista e não aceita? Achei que você odiasse essa mulher!

– Eu não odeio ela! Tivemos uns desentendimentos, mas como eu falei, não é nada demais... Não é como se eu fosse casar com ela! É só sex*!

– Isso não melhora a sua situação! Você está arriscando o seu emprego por causa de um par de seios?

Bruna revirou os olhos. Sua irmã era tão dramática!

– Eu não estou arriscando meu emprego! Não é nada demais! Não precisa fazer tempestade em um copo d’água!

Sabrina parecia não acreditar no que ela falava.

– Não é exagero meu! Você está sendo imatura se acha que isso não coloca em risco o seu emprego. Eu tenho certeza que se alguém da escola descobrir eles vão te demitir em dois segundos. E você acha que essa madame vai fazer o que?

De repente um pensamento pior pareceu vir na mente da sua irmã e ela perguntou preocupada:

– Ela não é casada, né?

– Claro que não! Ela é divorciada! Eu não dormiria com uma mulher casada!

Tecnicamente ela ainda não estava oficialmente divorciada, mas sua irmã não precisava saber desse detalhe.

– Pelo menos isso... – falou aliviada – Mas você realmente acha que essa branquela rica vai querer algo sério com você?

Aquilo magoou Bruna, mas ela nunca admitiria.

– Eu não quero nada sério. Nem com ela nem com mais ninguém! É só algo divertido e você está complicando!

– Eu não achei que você era tão burra! – Sabrina quase gritou – Você é a única que tem algo a perder! Acha mesmo que se descobrirem ela não vai te deixar na mão? Não lembra o que a vovó fala? “A corda sempre arrebenta para o lado mais fraco”.

Claro que ela lembrava. A corda sempre parecia mais fraca do seu lado e ela nem saberia contar quantas vezes já havia arrebentado para o seu lado durante a sua vida. Mas aquilo era diferente.

– Ninguém vai descobrir – ela falou tentando se convencer – E isso não é da sua conta!

Querendo encerrar aquela discussão idiota, Bruna subiu para o seu quarto. Ela estava cansada da irmã julgando-a.

=====

Depois de algumas horas, Alice tentava se distrair com trabalho, mas aquela ideia de que Bruna a odiava não saía de sua cabeça. Por mais que tentasse afastar ela de seus pensamentos, não conseguia. Depois daquele pensamento martelar a sua cabeça o que parecia ser a trigésima sexta vez, ela recebeu uma mensagem de texto: "Só pra constar, eu não te odeio". Ela sorriu e sentiu o desconforto em seu peito diminuir um pouco. "Eu também não te odeio", respondeu em sequência e completou eu sua mente "não estou nada perto disso".

Apesar da mensagem ter melhorado levemente o seu humor, o desconforto permaneceu e aquilo fez com que Alice tivesse que começar a pensar sobre o motivo de algo tão pequeno a incomodar tanto.

Talvez ela precisasse admitir que estava gostando um pouquinho da Bruna. Ela sabia que a relação era apenas sex*, mas depois de conversarem tanto e passarem tanto tempo juntas, parecia que tinham estabelecido um tipo de amizade. Não parecia mais ser apenas sobre o sex*. Aquilo era perigoso. Talvez ela precisasse de espaço...

Fim do capítulo