O dia estava lindo de céu azul e bem movimentado na cidade e para sorte do Daniel meu humor estava melhorando.
Ele estacionou com seu carro em frente a uma cafeteria bem tradicional e familiar da cidade,o que só queria dizer que nada de prostitutas e gente estranha e acho que a gente pelo menos hoje estava livre desta restrição.
Ele me olhou animado e o olhei tentando não dar ele esperanças demais.

--tá tudo bem a gente comer aqui?tipo..sem problema com as pessoas?--perguntou ele atento as pessoas que passavam pela rua.

--tô de boa.eu não moro na cidade..e não é porque eu faço programa que eu já dormi com todo mundo.

--eu sei é que..foi mal.

Entramos e Daniel escolheu uma mesa e eu nunca tinha entrado ali.o lugar era bem iluminado com grandes vidraças, mesas alinhadas de toalhinhas vermelhas e sentamos com Daniel já pegando o grande menu sobre a mesa.
Olhei ao nosso redor e todo mundo estava animado e preocupado demais em rir das suas piadas e agradar os filhos do que ligar para nós.o que só me dizia que Daniel já era cliente por ali.

--antes de tudo eu quero dizer que vou fazer isso pela garota e pelo dinheiro.--deixei claro a ele que me olhou fingindo surpresa.

--não por mim?(rs) eu chorei horrores quando você me negou isto sabia?

--é, eu também fiquei mal, mas apesar do plano de cebolinha que você criou e o seu chororô acho que vai ser divertido.

--(rs) ela vai adorar você Summer. Eu tenho certeza.--disse ele com um grande sorriso no rosto,eu ia ser a nova boneca dela?

--não me chama assim.--falei com ele me encarando confuso mas calando a boca.toda aquela animação dele de golden retriver estava atacando minha ressaca.--meu nome é Abigail Collins.Summer é para meus programas e isto está longe de ser um.

--Abigail?--repetiu ele não entendendo talvez como um nome como aquele de tão elegante caiu em alguém como eu.

--achou mesmo que meus pais quando escolheram esse nome sabiam que eu ia ficar na estrada te esperando príncipe encantado?

--calma!você entra fácil na defensiva eu ein. É um nome lindo pra falar a verdade e fico feliz por ter aceitado..é um trabalho perigoso.a propósito, preciso que realize alguns exames..--ele falou baixinho mas aquilo me pegou de surpresa.

--sou puta mas sou limpa viu!--me exaltei e minha voz saiu mais alto do que o esperado. Ele calado cobriu o olhar se escondendo de vergonha de alguns curiosos que olharam para gente e droga eu tinha que disfarçar.--não se come sem lavar as mãos não é?--falei e o silêncio se quebrou e todos voltaram a comer.

--você vai ser ótima em Fortcastle.--disse ele enquanto lia o menu.

--você me pedir isso é uma piada.--sussurrei baixo para ninguém me ouvir surtar.

--é para o colégio.conversei com a diretora e ela concordou te aceitar lá contanto que seja uma aluna sem compromisso, o que é uma safadeza porque terei que pagar sua estadia por lá.

--(rs) então não vai valer nada o que eu fizer por lá?

--infelizmente.

--que milagre foi esse?(rs) quanta generosidade.Fortcastle é disputadíssimo entre os ricaços..como essa vaga surgiu assim de graça?

--eu conversei seriamente sobre minha filha e a diretora teve que escolher entre manter a fama do colégio ou ser denunciado pela imprudência em apurar o caso.minha filha é torturada por aqueles animais e só porque eles tem suas coleiras de ouro e diamantes eles podem tudo?eu não vou deixar.--mais uma vez aquele olhar de pai raivoso apareceu,e Daniel fazia o melhor,eu podia sentir verdade nas suas palavras.

--pegou ela de calças arriadas. Bom saber.

--você vai entrar com um sobrenome falso e tudo que tem direito.

--tô impressionada. Ama pra valer sua garota.

--depois de tudo que ela passou naquele colégio e das vezes que implorei a diretora para punir a todos era o mínimo que ela poderia fazer.minha filha é o meu primeiro passo para uma nova vida.

Recostei no banco e contemplei aquele olhar mais uma vez. Eu seria mais que uma amiga para essa garota.Daniel estava me moldando para ser sua protetora.foi aí que lembrei da foto que guardei.enfiei a mão dentro da minha jaqueta e a peguei.

--toma.--a foto o fez sorrir como um bobão apaixonado. Ele amava aquela garota pra valer.eu nunca tinha visto esse olhar no meu pai..infelizmente.

--pensei que tinha perdido.está é a última vez que sorri genuinamente e faz tanto tempo..--ele se perdeu por alguns instantes em memórias e era triste de ver.

--eu ainda acho que deveria gastar sua grana com uma boa psicóloga e não com uma prostituta pra sua filha, mas o dinheiro é seu e o trabalho é meu então vamos falar de cash.preciso de dinheiro hoje.

--eu pago, claro.--ele pegou a carteira e já ia puxando uma boa grana da carteira.eu tive que para-lo.

--aqui não imbecil!--eu segurei a tempo suas notas e guardei em segurança na minha jaqueta antes que todo mundo visse.ele sorria com meu jeito mas ele certamente não conhecia a maioria dos caipiras dali. Contudo, ele chamou a garçonete e já queria fazer os pedidos a ela.não me impressionei quando ela lançou um olhar desconfiado a mim e a virou a ele para anotar tudo.

--o que quer comer?--perguntou ele a mim e claro eu precisava de algo forte.

--uma vitamina.

--e o que mais?

--um..croissant recheado.--falei e ela anotou rápida e ele passeou os olhos no menu e logo escolheu o dele.

--quero um café puro e algumas rosquinhas.

--anotado. Logo serão servidos.--ela voltou para a cozinha e Daniel me encarava e isto me incomodava,ele mantinha aquele sorrisinho na cara que inquietava para suas perguntas.

--você...só atende homens?--a pergunta foi incomum mas o olhei curiosa.

--por que tá me perguntando isso?

--por nada eu só..não quero mais nenhuma novidade estranha nessa história.

--aqui é Fortville.a única coisa estranha que vi por aqui foi um peixe de três olhos.e não se preocupe..não vou fazer programas enquanto estiver trabalhando nesta linda amizade.--falei e ele acenou a cabeça e nada mais disse até nossos pratos chegarem.

Comi feito uma onça faminta sob o olhar surpreso do Daniel ao me ver devorar tudo rapidinho.

--(rs) já sei que vai se dar super bem com minha filha.devorou tudo em segundos?

--não fode.não comi nada hoje e isso aqui tá bonzão.

--tá certo. Se você não se importar eu gostaria de realizar esses exames ainda hoje.amanhã quero me certificar que outras coisas estejam prontas para segunda começarmos.

--tá de boa. Eu conheço uma médica excelente aqui da cidade e acessível que pode ajudar a gente nessa.

--vai me desculpar mas não.--cuidadoso,ele recusou.

--não confia em mim?

--(rs) até demais, mas isso tem que ficar só entre nós entendeu?eu tenho um médico que cuida da nossa família e com ele será mais fácil de conseguir esses exames.

--você que sabe..mas me diz..como ela tá?

--é difícil saber.agora ela sai antes que eu me acorde e só volta para o jantar e..ela ainda come da minha comida mas parece que minha presença quando não é invisível é insuportável. Eu não posso perguntar nada que já estou abusando..se pelos menos as marcas e ferimentos sumissem.

--olha eu vou tentar o meu melhor e sua sorte é que eu não desisto fácil.

Terminamos o lanche e Daniel pagou tudo e já saímos atrás desse tal médico.
Daniel me guiou para dentro do seu consultório e o médico,um velho de olhar julgador me olhou e parecia impressionado e não de uma maneira boa. Ele esperava a filha do Daniel?com toda certeza que sim.

Dias melhores virão

Contemplei aquela frase e eu esperava com todo meu coração que sim.Daniel me caiu como um anjinho do pau grande na minha vida e agora eu seria sua alma salvadora. Aqueles exames eram um pequeno passo que eu trilharia e eu só pensava em como poderia gastar toda aquela grana que ele me pagaria.

--te ligo assim que ficar pronto Daniel.e me permita dizer que o que está fazendo em nome da sua filha é o que todo pai deveria fazer.a família sempre em primeiro. Ela merece todo seu esforço rapaz.

Daniel exibiu o breve sorriso contido pelo peso de seus duros dias nublados mas me permiti ficar em silêncio enquanto eles conversavam sobre os problemas daquela garota e que desafio eu teria. Será que ela me permitiria entrar no seu sombrio mundinho?eu tinha que fazer acontecer mais por mim do que por ela. Sem cair nessa porr* emocionada,sem me apegar. Eu só precisava lembrar do que eu faria com aquele dinheiro,o cacete da estrada que me levaria para onde eu quisesse.era só isso que eu tinha que focar.
Saímos de lá com Daniel confiante e ainda era dez da manhã.

--bom agora quero que descanse. amanhã, me encontre na Praça solitude.quero comprar umas coisas para você.

--tá certo papai. (Rs) amanhã vou adorar torrar mais do seu dinheiro.--me despedi e já caminhei recuando.

--Abigail não se esqueça de levar isso a sério.

--cara você não me conhece mesmo.--respondi sorrindo vendo a cara dele preocupada ficar pra trás.

Agora com grana eu faria algo que há tempos eu não era capaz.voltei para casa e Vitor o responsável pelo parque dos visitantes já se encontrava na minha porta esmurrando ela. Ele mal sabia que todo mundo estava ocupado demais se escondendo para não pagar o aluguel.

--COLLINS!!EU SEI QUE ESTÁ AÍ!!COLLINS!--ele batia na porta e só faltava derrubar ela como um digno lobo mau.

--bom dia Vitor.--falei e ele virou pra mim até vermelho de tanto estresse.

--sua mãe ainda não me pagou o aluguel.

--ah não. Eu não acredito que ela fez isso.--fui bem sarcástica e isto estava fritando os miolos dele.o gordinho era gente boa apesar dos surtos em relação aos pagamentos em dia.

--você adora isso não é abby?!

--um pouco.--tirei da jaqueta o dinheiro do aluguel e ele contou nota por nota e sorriu.

--acho que deveria dar as chaves do trailer a você.

--essa porcaria?que tal as chaves de uma das casas?eu ficaria muito grata.

--(rs) vai ter que ch*par quantas rolas pra isso?

--mais que você?

--(rs) vou pensar no seu caso.

Entrei em casa e ela estava vazia.todo mundo tinha saído e isto era uma surpresa.
Segui para minha cama e me deitei. Eu ia fazer o que eu mais tinha vontade de fazer naquela casa e sozinha. Tirei meu coturno,a jaqueta e me joguei novamente a fria cama.
Não levou segundos pra mim apagar.como era bom dormir até mais tarde.
Me acordei com uma batida na minha bunda. Minha mãe trazia algumas roupas lavadas para guardar.

--oi.o que foi?--perguntei e ela tentou guardar tudo sem me olhar com desaprovação.

--eu trabalhando e você dormindo aí?

--eu acho que mereço né?um descanso.

--Vitor veio aí?

--veio e o paguei.

--foi mal filha..eu...fui fazer um bico lá na Regina..só que ela só vai me pagar amanhã.seu pai fez umas compras pra gente não ficar de barriga vazia esses dias mas..torrou tudo.

--eu tô de boa mãe.

--tá de boa né?por que?você ta muito de boa desde ontem.

respirei fundo e minha mãe tinha o dom de me atazanar. Eu não ia dizer nada a ela sobre Daniel. Minha mãe quando me via com dinheiro eu era a filha perfeita mas era só até tudo acabar então eu sabia exatamente o que não dizer.

--mãe eu só tô descansando um pouco e assim como você eu também tô cansada.

--é, mas a gente ainda precisa de grana. (Rs) quem me dera poder deitar o dia todo e dormir.

--já entendi.--peguei meu coturno e calcei na hora daquele discurso debochado.--eu só vou ter paz dando meu rabo né.

--sabe que não é isto!

--claro que não mãe, você e meu pai só não dão mais certo por causa da falta de responsabilidade com tudo dessa casa.--peguei minha jaqueta e desviei dela na saída.

--você acha que é a única que quer ter uma vida boa?eu também quero!--veio ela atrás de mim.

Deixei aquele trailer e o parque de visitantes para voltar para minha estradinha e posso dizer que pior que aquilo fosse eu me sentia melhor assim sozinha.

Foi inevitável não querer chorar.minhas lágrimas desciam sem nem eu mesma perceber e como eu queria aquela grana o mais rápido possível para ir embora logo de Fortville e deixar para trás aquela vida medíocre. Aquela vida que só me usava e tomava de mim toda a alegria de gostar do que eu era,do que eu queria sentir. Eu não queria mais entregar o meu amor para pessoas que nem conhecia e nem dar a ela a chance de me tocar onde mais eu amava e ser entregue pelos meus pais a essa vida ainda doía,doía todo dia quando isto acontecia.

Não abra velhas cicatrizes

Ler aquilo no braço da minha jaqueta esquerda só me lembrava de muita merd* que já fiz por causa dos outros,e como sempre me ergui sozinha a cada queda e hoje não seria diferente. Limpei meus olhos e peguei meu cigarro do bolso mas diferente de todas as vezes arremessei longe a cartela. Era tanta raiva que ele voou longe. Agora tudo mudaria.era uma promessa.

Fim do capítulo